Moody: Uma História a ser conhecida escrita por Emanuel Antunes


Capítulo 6
Vive la France




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Luzes vermelhas e azuis iam em direção ao céu Francês. Centenas de pessoas passavam juntas no meio do “Arco do Triunfo”. Todas entoando a mesma canção:

“...Aux armes citoyens

Formez vos bataillons

Marchons, marchons

Qu'un sang impur abreuve nos sillons...”

O hino de um povo que enfrentou diversas guerras civis. Diversas vitórias acompanhadas de confusões internas. Mas a maior batalha que a França já vira estava para acontecer. Paris arderia em chamas... colunas iriam despencar.

5 DIAS ANTES

– É um mapa. – disse Rebecca.

Moody, o órfão, apenas observou. Suas lágrimas cessaram. O garoto não sabia como agir. Primeiro, mortes... perdas... agora um mapa. Marco, seu melhor amigo deixou os olhos se esbugalharem ainda mais... era muita magia para um mero trouxa. Depois de segundos os últimos traços daquela carta geográfica surgiram.

– O que ele diz? – Perguntou Marco. Ninguém sabia direito naquela etapa do campeonato, mas Frederick observava atentamente. Na superfície recém-molhada do pergaminho só riscos poderiam ser vistos. Formas e contornos... nada de nomes ou indicações. Parecia que tudo aquilo era uma obra infantil, desenhada com lápis de cera em um dia chuvoso. Mas Alastor percebeu a verdade antes dos outros.

– É o mapa da Europa... aqui está a Itália – Disse ele apontando para um desenho que mais se parecia com uma bota. – Aqui a Alemanha e mais para o lado esquerdo está a Inglaterra. – Como o ser humano só acredita no que vê... bem, os dois amigos foram conferir se tudo era verídico. Depois de segundos analíticos eles concluíram que aquele era sim um mapa do seu continente.

Ao redor do trio, policiais trouxas procuravam respostas fantasmas. Respostas que eles nunca veriam. A morte de Robert e Elizabeth Tuck não seria registrada em nenhum instituto médico ou noticiada nos jornais. Se não havia provas de que um crime ocorrera, ele não poderia circular por ai. A polícia seria interpretada como fraca e sem profissionais capazes de solucionar um simples caso.

– Inspetor... não encontramos nada! – Falou um dos agentes trouxa. – Revistamos os quartos, as salas, a cozinha. Nada!

– Isso mesmo, senhor. A única prova de crime que temos é o portão de entrada destruído. Fora isso...nada. Os corpos estão intactos. Agora só falta o interrogatório com o menino. – Completou um segundo agente. Na sua camisa estava escrito: Lucciano Fontana. Um senhor de no máximo sessenta anos. Estava perto de se aposentar. Mas ainda insistia em ser vigilante de Fulford. – Os três policiais se entreolharam. -...Eu poderia interrogá-lo, senhor?

– Não. Eu já o interroguei... – Os homens se entreolharam. – Nada também. O garoto só levou uma pancada na cabeça e apareceu acordado no meio dos pais.

– O que faremos, Inspetor? – Perguntou Antonie, o segundo agente. – Não temos provas de assassinato e nenhum culpado...

– Temos sim! – Lucciano que até então estava um pouco disperso, com o pensamento em algo bem longe se assustou ao ouvir a breve frase do Inspetor.

– Quem senhor? – Os olhos de Bertrand sangravam de malicia.

– Vocês não percebem, amigos? – Mais uma vez os dois agentes trocaram afirmações pelo olhar. – Quando não se tem um assassino... bem, nós criamos um.

Os dedos do Inspetor varreram o terreno. Passaram por cima das colinas a norte, por sobre os policiais procurando pistas, até cair em um trio de adolescentes segurando um pedaço de pergaminho...

– Nosso assassino sempre esteve aqui. – Antonie e Lucciano ficaram abismados... Alguém deveria agir.

. . .

A respiração ofegante... As pernas bambas... Ela não servia mais para aquilo.

Batilda Bagshot pousou sua vassoura na parede fria e socou a porta o mais forte que pode.

– August! August! – Os gritos da velha acordaram o sobrinho forte e alto que naquele momento adormecia no andar superior. O homem coçou os olhos, passou a mão em toda superfície do rosto e encarou o dia recém-amanhecido. Ao colocar a cabeça para fora por meio da janela, August conseguiu ver a cabeça grisalha de sua tia.

– Titia! Como é bom ver a se... – A velha não esperou August completar a frase.

– Deixe de conversa fiada e dessa logo. – Um dos líderes mais poderosos da magia europeia ficou jogado na parede por uma idosa... Mas ela era Batilda Bagshot, e a conversa era urgente.

O homem apertou o roupão e correu rumo ao arco de entrada. Pelo tom da tia aquela não era apenas uma visita rotineira para contar as novidades e fofocar sobre a vida dos outros. Aquela era uma missão oficial.

– O que aconteceu, Titia? – Após uma breve corrida escada abaixo e o medo do que poderia estar havendo, August Bagshot ficou estatelado entre a porta e sua tia... pois a mesma já atravessava o arco sem nem olhar para o rosto do sobrinho.

Ele seguiu o rastro de seus passos que lhe levaram até a sala que naquele momento recebia os primeiros sinais de alvorada britânica. A senhora sentou-se na sua cadeira especial (Sempre que Batilda visitava a casa do líder da Ordo Lumen, bem, aquele era o seu lugar. Segundo a mesma era ali onde se via todos e se ouvia qualquer coisa.) Já August não tinha lugar marcado, sendo assim ficou defronte a velha, esperando algum sinal de explicação. Depois de demorados segundos, eles vieram.

– Aconteceu o que temíamos, meu sobrinho. – A feição acolhedora e curiosa do homem transformou-se em uma mistura de pânico e premonição. – Tudo está arruinado em Fulford. Eles já sabem do garoto, da chave...

– E como a senhora deixou o menino lá? Sozinho? – Interrompeu August. – Poderia me mandar uma carta...

– Ele não está sozinho. Rebecca está vigiando o garoto... como sempre fez. –A pele negra de August deixou de refletir tanta preocupação depois daquela declaração... mas algo o incomodava. Mesmo depois de tanto treinar a prima e saber que ela era uma guardiã perfeita, no final das contas ela era apenas uma. Uma adolescente contra uma legião de loucos assassinos. – E ainda tem o Lucciano e o Tintim de tocaia. Ele está disfarçado de trouxa por dez anos... dez anos, isso não significa nada para você, August? E o Tintim, que mesmo depois da tragédia continuou servindo a organização? – A cabeça do homem balançou lentamente. O passado incomodava August mais do que qualquer coisa. Ele tentou desviar a conversa.

– Temos que mandar reforços para lá. Temos que contar tudo para os pais do menino... – A voz de Batilda interrompeu a fala de August e desse modo a sobrepôs.

– Eles estão mortos. Robert e Elizabeth Tuck estão mortos. – A mulher a qual Batilda ajudou a dar a luz e o homem que lhe entregou a maior história da todas. Estavam naquele momento esparramados no chão frio da mansão que outrora fora sua. – Ontem, durante o Festival, alguém entrou na mansão e assassinou os dois. Quando Frederick chegou em casa, bem... deu de cara com a mãe sem nenhum sinal de vida – Os olhos de August estavam prestes a cair da caixa. – Depois, provavelmente, ele foi conferir como estava o pai... no fim o garoto deve ter levado um feitiço estuporante e amanheceu do lado de um Robert morto.

– Mas titia... – Batilda sabia qual seria a pergunta que se seguiria.

– Não... não mataram o garoto. – A surpresa de August foi tremenda. Naquela sala quem poderia ler mentes era somente ele, assim pensava o mesmo. – É o que mais temo. Com toda certeza, os filhos da mãe usarão Fredy como ponte até o que desejam. Esse foi um dos motivos pelo qual não o trouxe comigo. Se eles o quisessem ter matado, bem, já teriam feito isso ontem à noite.

– Certo... a senhora veio voando? – Batilda confirmou gestualmente. – Espere só um minuto, irei me trocar e pegarei minha vassoura.

August subiu as escadas e demorou cerca de cinco minutos no andar superior. Desceu com uma capa impecável. Um cinza claro que dava ao líder da Ordo Lumen o real sentido da sociedade.

. . .

Do outro lado do país um trio adolescente continuava tentando decifrar o pergaminho que magicamente se transformara em mapa.

– Bem, até agora temos apenas a Europa. Só isso. Nenhuma pista ou ordem direta. – Falou Marco. Moody buscava respostas em qualquer traço, em qualquer linha do mapa. Nada apareceu para ele. O garoto notou o Inspetor apontando para o grupo mas não mostrou interesse. Desvendar o mistério era sua prioridade. – Devemos esperar... ou então você poderia chorar novamente, Fredy.

Moody encarou seu melhor amigo com um olhar de incredulidade.

– Isso é o que? Ópera? Teatro? Onde posso chorar quando quiser?

– Acalme-se. – disse Rebecca com um tom rígido e fora do normal. Os dois garotos perceberam que ela assumira uma nova personalidade. Deixara de ser a garota gentil e de voz doce para tornar-se rude e decidida. Tudo mudara em apenas uma noite. Enquanto o garoto Tuck dormia no solo frio de sua mansão a cidade produzia especulações e criava assassinos para o caso que se tornaria famoso. – Se brigarmos tudo piorará. Olhem, o Inspetor está vindo aqui mais uma vez. Que homem irritante.

Bertrand caminhava rapidamente. Rebecca estranhou toda aquela pressa, e por precaução colocou a mão no bolso em busca da varinha. Ao tocar o pedaço de madeira sentiu-se mais segura e apta para qualquer ação. Do lado esquerdo do Inspetor dois policiais o acompanhavam. Após segundos o trio investigador encontrou o trio adolescente. Na mente de Moody mais perguntas iriam ser feitas, mas nada disso aconteceu. Com uma voz fria Bertrand anunciou:

– De acordo com as leis Britânicas, você, Frederick Tuck está preso... – Todos se entreolharam. – acusado pelo assassinato de Elizabeth e Robert Tuck! – O policial partiu para cima do garoto mesmo sem ele ter reagido. Moody estava paralisado.

– Não! – Gritou Rebecca. – Qual a lógica disso? – A jovem alterou a voz de um modo fantasmagórico. Elevou-se entre os homens ali presentes.

– Eu sou a lógica aqui, mocinha. – Bertrand desviou seu olhar de Becca e retirou um par de algemas do bolso direito da calça. Puxou as mãos do menino Tuck que não conseguia se mexer. Atrás do Inspetor, o antigo jardineiro da mansão que presenciara tantas mortes naquele lugar tentava fazer contato visual com a garota Bagshot. Mas a mesma não olhava ao redor. Todas as suas forças se encontravam concentradas em solucionar aquele problema. E ela o fez. Com um movimento rápido e inesperado a menina enfiou a mão no bolso direito e retirou sua varinha. Com um balançar quase balístico de braço , Rebecca apontou o pedaço de madeira para o inspetor e sem pensar enviou a maldição:

– Crucio! – O feitiço atingiu Bertrand em cheio. O homem estrebuchava no chão enquanto Alastor continuava imóvel.

– Moody! – gritou Rebecca. Ele apenas vez um movimento com o pescoço. Seus olhos fixavam-se no inspetor. O policial que acompanhava Bertrand e Lucciano, o pobre Antonie, arregalou os olhos e partiu em disparada morro acima. O único oficial que ficou também retirou uma varinha do bolso. Marco gritou no mesmo momento:

– Rebecca! Cuidado! – A garota deu as costas para o policial a procura de algo, mas nada veio ao seu ataque. Ao voltar para a posição inicial Becca pode perceber que Marco se referia a Lucciano.

– Não se preocupe. Ele é amigo. – Com Moody sem reação alguma e Bertrand ainda pulando de dor, a garota caminhou em direção ao ex-jardineiro.

– Fuja! Vá para a sede, eles resolverão essa bagunça. – disse Lucciano em tom ofegante. Atrás dele os demais policiais que faziam ronda desciam o morro em direção aos jovens. Antonie subira e aos gritos já havia chamado a atenção de todos. Os homens atiravam a esmo. As balas pareciam não querer atingir os jovens. De modo rápido o velho Lucciano balançou sua varinha e gritou:

– Protego Repelium ! – Uma parede quase invisível pulou da ponta da varinha e fixou-se a frente do homem, assim protegendo as outras quatro pessoas ali. – Corram crianças !

Os tiros de pistola continuaram a ser disparados, o diferencial é que as capsulas ricocheteavam e enquanto Marco, Rebecca e um Moody sendo puxado pelo braço corriam, alguns policiais já se encontravam estirados com furos na testa.

Os jovens disparam vilarejo adentro. As ruas de Fulford mantinham-se lotadas de mulheres fofoqueiras e homens sem emprego. Todos discutiam sobre o assassinato na Mansão Tuck. Rebecca guiava o trio por entre vielas e becos até conseguirem achar um lugar seguro para parar. Nada parecia a salvo naquele lugar. Nas esquinas mendigos pediam esmola. Crianças e adolescentes partiam para mais um exaustivo dia escolar. Foi então que Becca sacou outro objeto do bolso direito. Uma espécie de apito com dois furos de saída. Colocou na boca e soprou. Um som agudo e agourento foi expulso do objeto e para a surpresa de Marco e Moody nada aconteceu de imediato.

– O que foi isso? – Falou Alastor, para o espanto de Marco e Rebecca. O garoto não abrira a boca em nenhum momento desde que o Inspetor lhe dera ordem de prisão.

Ignorando a mudança repentina de comportamento do garoto Becca tentou explicar:

– Estou chamando... – Antes de concluir a frase algo chamou a atenção da garota. No céu um ponto negro ia se aproximando aos poucos. A cada segundo ele tomava proporções maiores, até que onde existia uma pequena bola escura surgira asas. De forma avassaladora e soberana um cavalo-alado tomou conta do céu Fulfordiano. Negro e reluzente ele pousou no piso áspero da Rua Skimmel. O cavalo trotou e afugentou os trouxas, que no mesmo instante correram desesperados em direções opostas ao grandioso animal.

– Venham! – gritou Rebecca que partiu ao encontro da fera.- Tyron, já estava com saudades! – Com a mão esquerda ela alisou graciosamente a parte superior da cabeça mitológica do cavalo e em segundos já estava montada em seu dorso. – Vocês estão esperando o que?

Impressionados com o que viam, Marco e Moody seguiram os passos da amiga e juntaram-se a ela em um banco de passageiros imaginário. O cavalo-alado levantou as patas dianteiras e bateu suas grandiosas asas. Os três adolescentes sentiram um pequeno impulso e logo após se viram flutuando no ar. Moody segurou-se na cintura de Rebecca e Marco abraçou-se ao seu melhor amigo. Desse modo o trio tomou altura e partiu de Fulford. O jovem Tuck viu sua mansão ser deixada para trás. Os corpos de seus pais persistiam estirados no chão de sua casa. Mas ele continuava lutando. Em um dia fatos que mudariam a sua vida e a de muitos tomaram forma. Pesadelos viraram realidade. Nesse momento a verdade se expos a Frederick Tuck de forma simples e pura, ela pedia para ser tocada. E ele o fez.

. . .

“Do you hear the people sing?” – Cantarolou o rapaz. A garota ao seu lado respondeu:

“It is the music of a people who will not be slaves again.” – Ela sorriu para ele. Os dois estavam sentados sobre um dos maiores monumentos da história mundial. O Arco do Triunfo. Construído por ordem de Napoleão há séculos, ainda mantinha seu poderio e beleza. Entre as duas pilastras de puro mármore passavam centenas de pessoas entoando uma música que significava muito nas comemorações que estavam por vir. A música de um povo que não será escravo novamente. A festa da liberdade estava por vir e o povo entrava no clima. Acima de suas cabeças pés balançavam lentamente.

– Ele está vindo até mim, Joana. Eu sinto. – A voz do assassino soou fria entre a música forte da ralé.

– O sequestro foi uma jogada de mestre. Você foi incrível. – A moça chegou mais perto do psicopata. – Agora ele virá atrás do irmão.

– Sabe, as vezes sinto pena dele. Muita pena... mas depois lembro que só eu posso vencer. Somente eu... – Seus olhos brilharam sobre a capa negra e se encontraram com o de Joana Tuck. A bela e traidora Joana Tuck. Os dois se aproximaram ainda mais e ela concluiu.

– Só você, meu amor, só você irá vencer... – Os lábios se tocaram, e juntos a trilha sonora revolucionária os jovens se deitaram sobre o artefato de guerra. Após segundos o casal insano se desentrelaçou e ambos gritaram, acompanhando o desfile que seguia sob seus corpos:

– Vive la France!

– Vive la France!


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Notas finais do capítulo

Demorei quase dois meses escrevendo, eu sei pessoal, é tempo demais, mas devido as circunstâncias foi o melhor que pude fazer. Espero que agrade a cada um e se poderem mandem reviews, comentem o que errei (gramaticalmente também, isso ajuda muito) e o que acertei é claro :) Obrigado pela paciência de ler um capítulo por vez e até a próxima!