Estou viajando no navio de meu pai, estamos voltando para não sei aonde, sem destino, sem objetivo. Depois de várias horas de choro incessante eu finalmente consegui levantar da cama e sair do quarto. Mesmo assim, o navio parece estar vazio. O Brianna não é tão acolhedor quanto o Andrômeda era, e eu sinto que não sou a única pensando assim. Sei que todos os tripulantes que restaram sentem falta de seu antigo lar, principalmente o Alex. Mas não o vejo há horas. Ando pelos corredores vazios com os pés descalços e com a respiração lenta. Tudo está tão vazio que me parece um navio fantasma.

Então eu subo as escadas e quando vejo estou no segundo convés, o maior e mais largo. Ainda é estranho olhar para cima e ver que só há mais um convés para subir, e não mais dois como havia no Andrômeda. Tudo é estranho fora daquele navio, sem o Alex por perto, sem o Luke...

Arg! Bato com o punho na madeira do navio de propósito. Um soco tão forte que quase estraçalha meus dedos e minhas juntas. A dor não me incomoda.

Estou com tanta raiva, tanta raiva. Tenho ódio daquele príncipe mimado e ridículo. Nunca mais quero vê-lo na vida. Ele me manipulou. Mentiu para mim, me se... me seduziu e deixou que eu acreditasse nele. Tudo para depois só me trair.

E se ele estivesse falando a verdade?

O quê?

Se o que ele disse sobre ter chegado depois foi verdade? Você não o deixou explicar.

Querida consciência. Você passou todo esse tempo comigo incitando minha raiva, me fazendo ficar maluca e me sugerindo coisas ruins a fazer, escolhas mal vistas, erradas. Agora você quer que eu seja boazinha e perdoe ele?

Não. Eu quero que você pense com clareza. O eclipse solar chegará em breve, e seria muito bom ter um príncipe por perto...

Segundas intenções?

“Beeeeeeep... Beeeep!”

Algo começa a vibrar no bolso de minha calça. Eu até tinha esquecido que tinha posto isso ali. Ouço uma vozinha fraca e eufórica, parece vir dele, como um rádio ou um celular.

Tiro o objeto cortante com cuidado, o caco de espelho que Jack me dera, o mesmo que Kalyssa tinha e que usava para se comunicar com Valtor. Há algo estranho nele... Ao invés de mostrar meu reflexo o espelho mostra... Mostra uma imagem distorcida muito familiar. Uma garota, a voz é de uma garota.

— Quem...? — Eu falo confusa para o espelho.

Como se atendesse à minha resposta a imagem fica finalmente nítida e a voz antes deturpada se torna inteiramente audível, clara como diamante. E quando reconheço a garota no espelho (Note que não sou eu) eu praticamente dou pulos de alegria. Ou daria se não estivesse tão surpresa e sem forças para sequer correr dois quilômetros seguidos.

— Elizabeth?! — A garota confirma com alegria a visão que tem. — Finalmente te encontrei!

A jovem tem longos cabelos ruivos dispostos numa trança jogada para o seu ombro esquerdo. Sua pele é clara e ela tem sardas nas bochechas, que acompanham fielmente seus olhos verdes como esmeraldas. Usa um vestido simples, mas o espelho só mostra sua imagem dos ombros para cima. Ela não parece muito descansada, culpa das olheiras e da palidez em seus cabelos que pelo que me lembro, eram belíssimos e sedosos com uma cor singularmente saturada. Agora ela não parece tão bonita como era antes, ou talvez fosse apenas meu cérebro maquiando as lembranças antigas que me dão tanta saudade. Mesmo assim, eu não consigo parar de sorrir e ela também não. Achei que tivesse morrido.

— Miranda?