A Filha Do Mar escrita por Emm J Ás


Capítulo 30
Trato


Notas iniciais do capítulo

E para comemorar com chave de ouro, aqui está meu trigésimo capítulo!
Juro que esperava escrever um livro de vinte ou vinte e dois capítulos, mas trinta? É mais que um recorde. Então vamos comemorar pessoal!
Espero que curtam a leitura! ;)



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Agora eu entendo. Estou apostando tudo, não me importo com o que vá acontecer comigo, eu não quero que ninguém morra. Ninguém, absolutamente. Emily ainda está deitada no chão, o fio de sangue em sua cabeça está seco e misturando-se ao sangue ainda molhado que sai do ferimento. Se ela não beber logo água de luz ela morrerá. E contando que nós pegamos cinco ampolas, e provavelmente usamos umas quatro com Kalyssa e Jack, agora deve ter restado uma. É para o que eu estou torcendo. Pois mesmo nunca tendo ouvido falar nesse instrumento de cura antes, eu sei que é preciso concentrar a água em fogo ardente para que faça um efeito maior, é o que se faz com qualquer poção. Devem ter concentrado bastante. Torço para que tenha sobrado um pouco.

Está na hora de acabar com essa luta. Achamos que distraindo Valtor eu conseguiria nos tirar logo daqui, mas a verdade é que os zumbis são muito fortes. E Valtor também. Não adiantaria chegar a La Isla, eu não conseguiria vencer Valtor. Esse é o melhor jeito de sair disto sem ferir ninguém.

— Está louca?! — Ouço Alex gritar. Ele está no terceiro convés, nem mesmo vi quando ele foi para lá.

Nesse momento ele decapita o zumbi a sua frente com tal força e brutalidade que é como se aquela fosse a minha cabeça que ele estava atingindo. Seus olhos expressam raiva, mas no fundo deles consigo ver preocupação.

— Eu preciso. — Olho para Valtor. — Solte a todos e saia daqui, eu vou com você sem lutar.

Valtor parece considerar a ideia. Então ele tira a espada do pescoço de Kaly, e nesse momento sei que ele aceitou. Ele olha para um zumbi ao seu lado e balança a cabeça assentindo, o zumbi tira aos poucos sua mão de dentro do braço de Vinny. A cada segundo a cor retorna a sua pele, seu cabelo volta ao vermelho ferrugem e suas sardas são visíveis novamente. Ele abre os olhos, aparentemente enjoado. Quando olho para os outros vejo que também acordam.

— Olhem para cá. — Valtor fala com os tripulantes, apontando para Kalyssa que está quase desmaiada. Ele a joga no chão chutando suas costas. Ela grita. — Esta é a sua traidora. Aquela que me trouxe aqui.

Ninguém parece estar realmente revigorado, mas sei que eles entendem as palavras que Valtor diz. Vejo Carlos se debater, mas um zumbi o segura com muita força. Ao contrário dos outros ele parece completamente bem. Os cabelos loiros, a pele clara, os olhos negros, ainda mais negros do que o normal. Fico pensando, será que ele é humano? A tripulação já tem uma tigresa e uma fada, talvez hajam outros seres que não humanos.

— Deixe-a em paz! — Carlos grita. Seus olhos negros parecem cintilar com uma luz branca repentina. Ele está falando para Valtor deixar Kalyssa.

Ela apenas geme e se levanta devagar. Valtor ri. Ela consegue ficar de pé e o encarar, mas sem sua espada ela não pode lutar. Ela mal consegue se aguentar em pé.

— Como vocês podem proteger tanto alguém que os traiu? — Valtor pergunta.

Alex pula para degolar o zumbi que segura Carlos, mas no mesmo momento vejo um morto-vivo agarrá-lo ainda no ar. Alex se debate e sua espada de cerras brilhante cai no chão enquanto o zumbi o leva para longe e o segura ao lado dos outros, que aos poucos se recuperam para entoar gemidos que parecem perguntas. Não entendo nenhuma, mas acho que Sony diz “Mamãe comprou sorvete...?”. Acho que ouvi errado.

— Kalyssa. — Carlos diz, mais se parece com um aviso. — Se afaste.

Kalyssa não o ouve. Vejo em câmera lenta seus olhos cor de turquesa praticamente explodirem em cor enquanto ela se transforma. Parece que vários ossos seus estão se quebrando enquanto ela grita e geme. Mais devagar do que nunca ela se transforma no grande tigre albino tão belo que eu vi quando fui sequestrada. Olhos azuis turquesa transbordando de ódio enquanto ela caminha lentamente encarando Valtor. Parece revigorada, mas faz sentido. Ela estava com ossos quebrados, e se para se transformar seus ossos se quebram e se reagrupam no esqueleto de um tigre, então nada mais normal que eles estejam menos fraturados.

Enquanto se transformava sua roupa se rasgava aos poucos. Um pequeno caco de vidro voa de um bolso de sua calça, o espelho mágico. E junto à ele também cai o saco de couro que Valtor deu a Kalyssa, aquele com as safiras azuis.

— Não seja tola. — Valtor também avisa, mas Kalyssa é orgulhosa demais para ouvir.

Ela ruge, um rugido tão assustador e feroz que meus ouvidos latejam. Então apenas a vejo saltando na direção de Valtor atacando-o, com suas garras apontadas e presas de tigre dentes de sabre preparadas para arrancar seu pescoço.

Valtor já está com o braço erguido e vejo que dele sai uma espécie de fumaça negra. Magia. Como eu consigo ver a magia dele se desprendendo? Ele é um bruxo? A magia dos bruxos é invisível, não há como enxerga-las. A fumaça atinge o corpo felino de Kalyssa, que se contorce e para no ar como se ele segurasse seu pescoço e a enforcasse. Quero dizer algo, mas as palavras se prenderam em minha garganta. Então como se ele mudasse de ideia com relação a ela, ele a deixa cair no chão.

E ela cai. Choraminga como um gatinho e parece estar tonta. Valtor apenas ri. Ela se levanta e o encara, rosnando, mas seu rosnado parece diferente. Parece mais... Animal.

Ouço outro rosnado. Um mais feroz e assustador. Então olho para sua origem e vejo Carlos numa forma que nunca presenciei antes. Ele está completamente negro, como uma sombra de fumaça. Seus olhos brilham com uma luz branca e seus cabelos parecem não existir. Só sei que é ele pois está no mesmo lugar em que antes estivera, preso pelo mesmo zumbi de antes. Ele rosna novamente e ao ver seus dentes gigantes e brancos eu me lembro do sonho. O sonho que tive, com o homem de fumaça assustador e a garota morta acima de minha cabeça. A visão me faz tremer, o sonho me faz quase chorar novamente. Era o Carlos? Não, ele é diferente. Era um ser parecido, talvez uma espécie irmã. Mas agora eu tenho ainda mais certeza de que foi real.

— Um demônio negro. — Valtor diz, com um sorriso mais de admiração do que de medo. — Espécie muito poderosa.

— O que fez a ela?! — Carlos pergunta. Sua voz não é sua, são três vozes graves e sombrias unidas por um eco enlouquecedor. Só de olhá-lo já consigo ter pesadelos.

— Nada, apenas uma maldição simples. — Valtor ri e começa a andar, aproximando-se de Carlos.

Kalyssa está tonta em sua forma de tigresa e não se move. Ela ainda rosna, mas não ataca novamente. Seus olhos cor de turquesa perderam um pouco do brilho. Ela começa a choramingar como um gatinho e se deita no chão. Não entendo.

— Traga-a de volta. — Carlos exige com sua voz demoníaca.

— Não. — Valtor diz ainda rindo. — Você não pode me atingir com seus pesadelos.

Seus pesadelos. — Carlos corrige.

Então eu entendo. E me lembro do ensino que criaturas obscuras. Demônios negros são uma espécie irmã de Sombras e pesadelos mortais, só que pesadelos mortais são irracionais criaturas de três metros de altura, completamente negros e famintos. Foram extintos há anos. Sombras são praticamente como demônios negros, só que eles costumavam viver no subterrâneo e se alimentavam de almas de humanos e de seus medos, eles provocavam pesadelos nas pessoas até eles terem tanto medo que não conseguiam mais controlar a si mesmos, então se apoderavam de seus corpos e viviam como humanos por décadas até precisarem trocar de corpo novamente. Sombras nunca morrem. Mas também não são vistas há milênios. Os humanos que tinham sombras em seus corpos não conseguiam se controlar e eram obrigados a se alimentar de sangue, como vampiros. Aliás, os primeiros vampiros foram os filhos das mulheres que tinham sombras as controlando. Mas como estes não podiam ter filhos, sempre que mordiam outro humano e não o matavam este humano também se transformava num vampiro. Mas a história é muito grande, a questão é que eu vi um desenho de uma sombra em um livro, e agora eu tenho certeza.

O monstro no meu sonho era uma sombra.

E os demônios negros são como sombras, mas eles não precisam se apoderar dos corpos de ninguém e podem se alimentar de almas ou de comida humana. São os seres da noite mais pacíficos, embora ainda sejam mortais. Eles também podem manipular as mentes das pessoas, transformando seus maiores pesadelos em realidade, e também acho que podem entrar na mente de algumas espécies singulares. Como... Fadas. Então foi a isso que Emily tinha se referido quando disse que entrar na mente dos outros deveria ser proibido, e ela disse que deveria ser proibido entrar na mente dela. Carlos é um demônio negro. Ele podia entrar na mente dela.

E nesse tempo todo que eu fiquei explicando a mim mesma sobre as três criaturas negras mais poderosas, Carlos e Valtor conversavam. E agora Carlos está em sua forma humana novamente enquanto Valtor sai dai sorrindo. O que houve?

Acho que nunca vou saber. Valtor então finalmente olha para mim. Eu sou burra, muito burra. Deveria ter usado meus poderes de filha do mar para vencê-lo agora, enquanto ele estava distraído, mas fiquei tão atônica que não tomei nenhuma decisão. Só agora que solto o ar percebo que passei todo esse tempo prendendo a respiração.

— Vamos princesa? — Ele diz para mim. Ao ver minha hesitação ele continua. — Ainda posso matar todos aqui para leva-la.

— Eu vou. Não os machuque.

Desço pela escada e o acompanho. Atrás de mim Alex que encara como se eu fosse louca, mas agora a preocupação ocupa quase seu rosto inteiro. Luke ainda não está muito bem, mas eu o vejo tentando me dizer para parar, mas sem conseguir falar direito. Acho que quanto mais tempo sobre o efeito entorpecedor dos zumbis, mais difícil fica voltar ao normal. Eles ainda parecem semimortos.

— E eles? — Digo antes de atravessar a ponte improvisada que leva até o navio fantasma de Valtor.

— Vou soltá-los. — Ele responde. — Mas você cumpre sua parte primeiro.

Sei que não deveria confiar. Ele é um pirata, assim como Alex me disse, não existe honra na pirataria. Nenhum pirata tem escrúpulos. Mas eu confio, só posso confiar. Atravesso a ponte tão preocupada com os tripulantes do Andrômeda que nem me preocupo com as ondas que quase me jogam ao mar. Desço no navio fantasma e vejo Valtor bem atrás de mim. Ele embarca no navio também.

— Agora solte-os. — Digo.

— Ok. — Ele confirma sorrindo para mim.

Então ele segura a madeira longa e a arrasta, jogando-a ao mar. E antes que eu possa protestar ele estala os dedos e seus zumbis se desfazem em cinzas, desaparecendo de meu navio. Digo, do Andrômeda.

— O que você fez??

Alex sai correndo quando se vê solto do zumbi e quase pula para este navio, mas a distância é muito longa e ele apara antes. Me olha e quase consigo vê-lo pensar “Você é doida?! Está maluca??!”.

Olho para Valtor que ri e estala os dedos novamente. As cinzas dos mortos-vivos voam com a brisa até este navio e como mágica elas se transformam novamente nos zumbis. Até os zumbis que matamos estão aqui. Então de que adiantou decapitá-los se Valtor pode “revivê-los” quando quiser?

Um deles segura meus pulsos imediatamente com força.

— Elizabeth. — Vejo Alex balbuciar.

— Cuide dos outros. — Digo. — Emily está ferida. Não deixe ninguém se machucar.

Olho para os outros. A maioria ainda está deitada no chão, tentando se recuperar. Carlos, completamente bem está ajoelhado ao lado do corpo de Kalyssa, ainda como tigresa. O que será que Valtor fez a ela?

E enquanto isso o navio em que estou começa a se movimentar mais rápido e o Andrômeda vai ficando para trás.

— Sabe princesa, — Valtor diz ainda do meu lado. — Nunca pensei que seria tão fácil captura-la.

Olho para trás. O navio negro têm dois conveses ao invés de três como no Andrômeda, mas é muito maior. Os zumbis estão trabalhando como tripulantes comuns, ajeitando as velas e limpando os conveses.

— Você não queria me matar? — Comento derrotada.

— Foi bom você ter me vencido da primeira vez. — Ele responde sorrindo. — Descobri que o melhor jeito de ter o trono não é te matando para ser o próximo na fila, mas sim te capturando. E acho que já consegui.

— Já é o rei? — Pergunto olhando para o mar. O zumbi me segurando volta a agir como escudo, mesmo que eu esteja de frente para o mar. Minha força se esvai aos poucos.

— Ainda não. Mas seu pai não vai lutar sabendo que estou com você. Então, muito obrigado princesa. — Ele ri.

Estou perdida. Bem, ao menos não vou morrer. E agora La Isla de La Muerte está muito mais próxima, no máximo trinta minutos.

O zumbi me carrega até uma sala com uma porta de ferro e me joga ali dentro, depois me tranca.

Legal. Amarrada e presa numa salinha de novo. E dessa vez não há nenhum prego para soltar as amarras.




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Notas finais do capítulo

Quem imaginaria? Sério, estou começando a desconfiar do meu cérebro. De onde eu tiro tanta criatividade para criar essa fauna tão farta? Quer dizer, Demônio Negro?
Já é quase minha espécie favorita. ^^ Kkk,
E então? O que acharam?