A Filha Do Mar escrita por Emm J Ás


Capítulo 29
Zumbi fofo


Notas iniciais do capítulo

Haha, quem diria que um zumbi pode ser fofinho?



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No mesmo momento Alex avança até ela e a segura pelo pescoço, empurrando-a contra a parede e quase enforcando-a.

— Alex! — Eu grito e vou até ele.

Tento segurá-lo pelos ombros, mas ele me empurra para longe. Meu rosto ainda dói.

— Traidora. — Ouço-o falar enquanto ainda me levanto do tombo. Eu bati com as costas na sua escrivaninha e me machuquei. Mas talvez seja a adrenalina ou eu só esteja maluca. Eu consigo me levantar sem gritar. — Eu devia ter te expulsado da tripulação da primeira vez.

Kalyssa segura as mãos de Alex, afrouxando um pouco e conseguindo respirar. Ainda fico um pouco surpresa ao ver o quanto os tigres são fortes. Ela consegue separar as mãos dele o suficiente para respirar calmamente e encará-lo.

— Eu fiz isso por todos nós. — Ela diz. — Por toda a tripulação. Essa garota estava separando a gente...

Ela diz e sua voz está tremula. Ela está chorando, e é como se todo o tempo que ela passou controlando a si mesma tivesse servido como uma barreira, segurando um lago que enchia cada vez mais até que agora se quebrou. Acabo de ver que Kalyssa não é tão forte quanto costumava demonstrar.

— Nós planejamos tudo! Você agiu por trás da gente, você nos traiu.

Mais lágrimas. Aproximo-me dele, tomando o cuidado de não chegar tão perto. Não quero ser atacada de novo.

— Alex, se acalme... — Tento soar com a voz serena e calma, assim como Emily.

Não consigo. Ainda me pergunto inúmeras vezes por dia, como a Emily consegue se controlar tanto? Ela está sempre calma, sempre consegue acalmar os outros. Eu não consigo fazer isso. Minha voz está trêmula. Eu quase estou chorando.

Alex aperta com mais força o pescoço dela e ela cede. Volta a enforca-la.

— Alex! — Soo mais imperativa. — Você vai mata-la!

Ele olha para mim pela primeira vez desde que entramos nesse quarto. Depois para Kalyssa, e então seus olhos parecem se acalmar. Ele a solta e se afasta. Ela cai no chão. Eu nem havia percebido que ela havia sido suspensa no ar enquanto Alex a enforcava.

E por mais que eu não deva fazer isso, eu vou até ela e a ajudo a levantar. Ela me olha confusa e desconfiada, mas aceita minha mão e eu a apoio. Depois disso ela se afasta de cabeça baixa.

Dez segundos de silêncio enquanto estamos uns separados dos outros. Alex está perto de sua rede, onde há também uma janela enorme e quadriculada com vidros que deixam a luz entrar, mas a janela não parece ter como abrir. Há apenas duas pequenas comportas dos lados de cima, para arejar o lugar.

— Por sua culpa agora todos vamos morrer. — Alex diz finalmente.

— Me desculpe...

— Desculpas não adiantam. — Ele se vira para nós, depois de ter ficado todo esse tempo de costas. — Temos que arrumar um jeito de consertar isso. Podemos enganar o Valtor e, sei lá...

Ele bate com o punho na mesa. Não tem ideias.

— Eu posso acelerar o navio. — Digo. — Como fiz ontem à noite.

Alex me encara. Kalyssa ainda está de cabeça baixa.

Você que acelerou o curso do navio? — Ele não parece acreditar.

— Sou uma filha do mar, lembra? Se me deixarem solta, posso subir aqui e tentar de novo. —Aponto para cima, para o telhado da sala.

— Precisamos tirar os zumbis daqui. — Kalyssa diz. — E distrair o Valtor.

Olhamos para ela. Alex parece estar se controlando para não ir até ela novamente e a enforcar.

— Eu distraio. — Digo.

— Não pode distraí-lo e acelerar o navio ao mesmo tempo. — Alex fala.

— Eu distraio. — Kalyssa diz. — Fui a causadora disso. E posso deixa-lo bem ocupado.

— E os zumbis?

— Ele vai precisar manda-los lutar. Vão soltar a tripulação, todo mundo vai ficar bem. — Kalyssa continua.

— Então eu subo no teto e acelero o navio enquanto ninguém presta atenção em mim.

— Eu te ajudo a subir. — Ele diz.

— Eu já sei sozinha. — Falo enquanto coloco a mão nos ombros. Doeu a última vez que subi sozinha, mas dessa vez eu já aprendi.

— Então está tudo certo. Eu e Kalyssa lutamos com eles.

— Preciso da minha espada. — Digo.

Eu a deixei cair, está do outro lado do convés. Provavelmente terei que lutar também.

— Então pegue-a. — Alex fala.

— Eu a deixei cair quando fomos atacados.

— Deixou? — Kalyssa parece confusa.

Eu também fico. Olho para mim, então percebo que a Darklight está presa á minha cintura, assim como estava antes. Mas eu lembro de tê-la visto cair... Como ela apareceu aqui?

— Então vamos logo. — Alex diz.

— Valtor acha que estamos brigando. — Kalyssa diz. — Melhor continuarmos.

— Não vou ter problemas com isso. — Digo.

— Traidora! — Alex grita, exatamente para que os outros ouçam.

— Sua vadia! — Grito, mas tento não rir. É que tudo agora parece uma piada. — Você quer me matar?!

— Eu vou te matar! — Kalyssa grita também e vem para cima de mim.

Era para ser brincadeira, mas ela me empurra com força na parede. A dor de quando machuquei minhas costas na mesa lateja. Ai.

— Ei ei! — Valtor abre a porta e nos interrompe.

Ele pega Kalyssa segurando meu pescoço e quase me enforcando. Ela me solta imediatamente. Alexander se aproxima da porta.

— Não pode mata-la. — Ele diz. — Eu vou mata-la.

Kalyssa só revira os olhos.

Então Valtor abre mais a porta e vários zumbis entram.

— Não precisamos disso. — Digo e saio por conta própria.

Alex e Kalyssa fazem o mesmo.

— Bom saber que estão cooperando. — Valtor sorri.

— Só me tire de perto dessa vadia. — Falo.

— Puta. — Kalyssa me xinga.

Olho para trás e vejo Alex revirando os olhos. Sinto um imenso impulso de rir, mas reprimo isso.

Vamos ver se dá certo.

¬¬¬

Valtor vai na frente, seus zumbis atrás deles. Então depois de um último olhar de cumplicidade, os três iniciam seu plano.

Kalyssa e Alex empurra Valtor pelas costas, que cai pelo parapeito quebrando-o em cheio. Seus zumbis começam a atacar, mas com um movimento rápido de sua espada Alex atinge o coração de um deles. Mas mesmo assim, o morto-vivo ainda ataca.

Elizabeth pega sua espada e quando a move é como se o mundo estivesse mais lento. É como se ela tivesse todo o tempo do mundo, como se tudo corresse mais devagar. Com um único corte ela degola o zumbi que luta com Alex, e no mesmo momento o corpo deformado do morto se transforma num monte de cinzas. A única coisa que sobra é a cabeça que cai em cima das cinzas sangrando e sujando o primeiro convés.

— Cortem as cabeças! — Kalyssa grita.

Elizabeth nem mesmo tinha percebido o quão rápida Kalyssa fora, afinal ela já está no terceiro convés com Valtor.

— Agora que você diz isso?! — Alex reclama.

Ele corta a cabeça de outro zumbi, que ao ter sua cabeça separada de seu corpo acaba com o mesmo efeito que o outro. Um monte de cinzas com uma cabeça nojenta em cima. A visão deixa Elizabeth com enjoo, mas ao ver que só falta mais um zumbi, ela também vê que está na hora de fazer a sua parte.

O morto-vivo tem uma espada longa e afiada em cada uma das mãos, e está difícil para Alex atingi-lo. Ele ataca com uma estocada entre duas costelas esquerdas, mas o zumbi defende com uma espada e ataca com a outra, obrigando Alex a desviar muito rápido. Ainda assim o golpe do monstro passa por sua orelha deixando um corte leve que sangra pouco.

— Agora você me paga. — E Alex vai com tudo ao encontro do zumbi.

Enquanto isso Liz dá um pulo e se segura na parede. Suas juntas, tanto dos braços quanto das pernas começas a doer, sofrendo com a memória dos hematomas que sofreram a última vez que ela tentou isso. Mas ela ignora e começa a se suspender, com toda a força que pode. Metade de seu corpo já está acima da parede e ela consegue se impulsionar para frente, caindo deitada em cima do “terraço”. Ela se segura para não sair rolando e olha lá para baixo. Kalyssa luta com sua espada contra Valtor, que mais parece rir do que realmente se importar. Alex ainda luta com o mesmo morto-vivo, ele está dando trabalho.

— Ei! — Liz diz. — Zumbi fofo!

No mesmo momento o zumbi com quem Alex luta se vira para ela, e ela pode jurar que havia uma expressão de confusão em seu rosto deformado. Mas antes que ele possa ter alguma outra reação, Alex corta seu pescoço com sua espada de cerras. E seu corpo definha em cinzas, restando apenas sua cabeça com barba negra cheia de musgo e um olho mais solto que o outro. Depois de dois segundos Alex olha para ela.

— Zumbi fofo? — Ele diz. — Foi o melhor que você pôde pensar?

— Funcionou não?

— Então tá. — Ele diz e pula do primeiro convés ao segundo de uma vez.

Liz se lembra de quando ele fez isso a primeira vez. Ela ainda estava presa, havia acabado de ter sido retirada da despensa. Foi seu primeiro dia no Andrômeda. Ela ri. Ele já deve ter muita prática para saltar de toda essa altura, nem mesmo machuca.

— Zumbi fofo? — Ela o ouve resmungando enquanto luta com outro zumbi que o encurralou no meio do caminho.

Ela ri.

Então se levanta e vai fazer o que havia planejado. La Isla está marcada, é para lá que o navio está indo. Se ela apenas acelerar o navio, então vão acabar indo para lá de qualquer modo. Sua maior esperança é a de que seu pai é um homem bom, e sendo o Rei do Mar não vai permitir que Valtor a mate. Ela suspira. É a sua única opção.

Ela ergue os braços para o mar. Respira fundo e fecha os olhos. Então, como da última vez, ela ordena. Agite-se. E o mar começa a se agitar atrás do Andrômeda, empurrando-o com velocidade. Juntando isso ao vento forte, então eles vão chegar ainda mais rápido em La Isla de la Muerte.

¬¬¬

As ondas movem-se rapidamente seguindo os movimentos ds minhas mãos. Estou calma, estou perfeitamente calma e pela primeira vez em minha vida eu sinto paz. Uma paz que percorre todo meu corpo, a benção de não estar pensando em nada, de esquecer os problemas mesmo que por alguns segundos.

Eu guardei minha espada de volta à bainha presa em minha cintura pouco antes de subir no telhado. Ela ainda está aqui, sinto pelo peso que pende do lado esquerdo do meu corpo. Nunca pensei antes que teria uma espada, sou uma princesa, se minha mãe soubesse que eu tenho uma agora, e que ainda por cima ela foi roubada, ela me deserdaria. Mas eu nem sei se ainda sou herdeira de alguma coisa.

Sem problemas. Não há nada para pensar, minha mente está vazia. A única coisa que ouço são... Bater de espadas. Reconheço duas, uma com o som entre cortado, provavelmente a do Alex por ter serras. E a outra deve ser a da Kalyssa. Estão lutando contra os zumbis enquanto estou aqui em cima.

Abro os olhos. O mar está muito devagar, eu me acalmei demais. Ordeno que ele se agite novamente e ele volta a borbulhar como antes. Mas nesse segundo de interrupção eu ouço um grito. Um grito agudo e coberto de ódio, raiva e ferocidade. Ainda assim, um grito de dor.

Olho para trás. Os mortos-vivos ainda seguram a tripulação com os dedos esqueléticos enfiados em seus braços, todos desmaiados. Daqui de cima noto que estão em círculo, com Valtor no meio enquanto luta com Kalyssa. Luke está ali, desmaiado como se estivesse morto. Vejo Alexander lutar contra um dos mortos-vivos, acertando-lhe em vários pontos inutilmente. Qualquer outro ser já estaria completamente picotado. Mas esse monstro só morre sendo decapitado, e o Alex não consegue acertar-lhe o pescoço. Mas o grito não se originou daí, ele veio mais de longe.

Kalyssa. Reconheço a voz dela. Ela está se afastando de Valtor, com um braço erguido na direção dele, sua espada em punho. Porém sua outra mão segura um ponto em seu ombro que jorra sangue enquanto ela o pressiona com uma expressão de dor contínua. Valtor não se move, ele anda calmo na direção dela, apenas rindo de sua dor. Ele nem mesmo está atacando-a com a espada, apenas aproveitando o momento.

Eu sei. Eu sei que isso é culpa da Kalyssa. Eu sei que foi ela quem nos traiu, que usou aquele espelho mágico para contatar Valtor e contar a ele cada passo que nós dávamos. Mas eu não posso deixa-la morrer. Eu não posso deixar mais ninguém nesse navio morrer.

— Valtor! — Grito.

Largo as ondas e sinto-as desprender de meus dedos como um lençol de seda. Também sinto a agulhada, aquela sempre do lado esquerdo do meu peito. Ela some.

Caminho até a ponta do telhado e encaro Valtor, que agora me olha interessado.

— Princesa. — Ele diz lentamente com sua voz semicerrada. — Havia me esquecido de você. Quão bobo eu sou. — E o riso diabólico retorna.

Kalyssa para de andar e continua de frente para ele.

Essa não. Eu não leio mentes, mas consigo entender exatamente o que ela vai fazer. Tenho vontade de gritar “Não!”, mas eu sei que só ajudaria a alertar Valtor. Antes que eu decida dizer algo, ela põe o plano em prática. Não é bem um plano, Kalyssa corre até ele com sua super velocidade felina, mesmo em forma humana, e ataca-o com sua espada.

Um guincho alto de metal se chocando.

— Como...? — Eu não entendo.

Valtor não a viu se movendo, como ele se protegeu tão rápido? Ele me olhava num segundo e num piscar de olhos sua espada já estava frente ao seu corpo, exatamente onde Kalyssa iria atingi-lo. Eu não entendo. Ele é humano. Ele era humano, a última vez que lutamos. Como...?

Seu riso ecoa por todo navio como uma risada fantasma. Kalyssa está tão atônica quanto eu, e embora ela seja bem mais alta que eu, perto dele com seu corpo esguio e olhar felino ela se parece com uma gatinha assustada. Valtor a segura pelo braço antes que ela possa reagir e a puxa como se fosse um saco de batatas, erguendo-a no ar e depois deixando-a cair no chão. Ela grita e ele ri disso. A espada dela voa para o outro lado do navio, e diferente da minha ela não voltará á sua bainha tão cedo.

Ele a segura pelos cabelos pálidos e puxa para a sua frente, arrastando-a no chão como um esfregão. Ela está muito machucada para lutar, apenas geme. Deve ter quebrado alguns ossos na queda.

— Valtor! — Grito.

Ele para por um momento e me olha. Depois com um olhar sádico ele sorri e voltara a esfregar Kalyssa no chão. Depois a levanta até ela ficar de joelhos no chão e põe sua espada em seu pescoço. Ele vai mata-la. Não. Não.

Pulo do telhado ao primeiro convés e durante a queda me arrependo imediatamente. O nervosismo diante o instinto idiota me faz perder o equilíbrio e quando caio no chão minhas pernas viram, eu rolo até cair pelo buraco do parapeito onde o zumbi com quem Alex lutara caiu. Passo por ali sem nem tocar a pouca madeira que restou no parapeito, sou pequena demais. Caio de lado no segundo convés e a dor que se aloja em meus ombros, costelas e quadril me fazem gritar. Foram os mais atingidos. Mas eu me levanto e me esforço para encarar Valtor, que ri de mim. Ainda bem, ele ainda não a matou.

— Solte-a. — Digo ofegante. Minha voz não parece mais tão imperativa e firme como antes, é tremulante e transparece o medo que eu não queria demonstrar.

— E por que você deseja isso? Foi ela quem te entregou. Foi a traidora. — Valtor olha em volta, para seus homens zumbis e ri para todos.

— Não a mate, e eu vou com você sem lutar. — Digo.




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Notas finais do capítulo

Alguém conhece a Anaklusmos? Contra-corrente? Bem, a Darklight não tem nada a ver com a espada do Percy Jackson!

Um dia eu explico o porquê dessa espada ser tão esquisita, é só no próximo livro. =P
~~~

Adoro manter o suspense, Muahahahahahahaha!!!