23 de Agosto de 2024 – 67° Andar

Ambos tentávamos analisar e ao mesmo tempo esconder o máximo de informações um do outro. Não tínhamos dado nenhum passo, mas a batalha já havia começado. A tensão de não saber o que fazer e do que o meu inimigo era capaz me apavorava. Então soltei a respiração bem lentamente e girei minha espada do meu lado esquerdo e depois do lado direito, apenas para aliviar a tensão. O pequeno zumbido, que misturava um tom agudo seguido de um tom baixo, da lâmina cortando o ar me acalmava e ajudava a me concentrar.

Ao voltar minha espada novamente em posição, eu avancei o mais rápido que pude para cima de Heathcliff. Durante a corrida, posicionei minha arma para desferir um golpe perfurante. Mas a um metro de distância antes de atingi-lo, girei meu corpo em sentido horário e me abaixei. Minha intenção era enganar Heathcliff, fazendo-o pensar que eu iria atacar o seu pescoço pelo lado esquerdo. Entretanto, quando fiz meu movimento, meu alvo foi redirecionado para o seu joelho direito com o objetivo de imobilizá-lo ganhando, no mínimo, uma vantagem no combate.

Meu movimento saiu como planejado, quando Heathcliff posicionou o escudo para defender o golpe falso, eu girei meu corpo a fim de atingi-lo por baixo. Porém Heathcliff foi muito rápido e conseguiu reposicionar o escudo para defender o golpe verdadeiro.

Uma explosão de faíscas emanou no encontro da minha espada com o seu escudo. Meu braço tremeu por completo devido a vibração do baque. Foi como se eu tivesse batido em uma parede de aço. O impacto me deu um impulso contrário que permitiu desferir um novo ataque girando meu corpo novamente e atacando o outro lado de Heathcliff. E mais uma vez ele moveu seu escudo rapidamente para se defender. Só que desta vez, em vez de parar o escudo na frente do meu ataque ele simplesmente o interceptou, distanciando minha lâmina de seu corpo.

O golpe foi forte demais para que eu pudesse controlar meu movimento e ainda de quebra me desequilibrou, tirando todo o impulso que meu corpo ganhou durante a corrida.

Antes que eu pudesse me recuperar, meu oponente desferiu um golpe com uma habilidade já carregada, fazendo um corte diagonal de baixo para cima. Por muito pouco, fui capaz de me esquivar do ataque que passou a centímetros da minha face. Sua lâmina brilhava com uma intensidade vermelha quando estava com a habilidade carregada. E por isso fui capaz de dar uma boa checada em sua arma.

A espada de Heathcliff era de uma mão e tinha uma empunhadura de cor prata mais escura com detalhes em vermelho. Sua lâmina era de aço negro e tinha um aspecto interessante, o centro dela era fino e ao se expandir tornava-se grosso até ficar fino novamente para criar o fio de corte. Um designer mais leve voltado para conseguir velocidade no golpe, porém era menos resistente. O segredo estava em utilizá-la junto ao escudo, dessa forma, os danos seriam restritos aos impactos ofensivos.

A habilidade que Heathcliff usou continuou ativa e realizou um corte na horizontal logo em seguida. Eu ligeiramente me abaixei e retaliei novamente, mas seu escudo já estava posicionado no local certo para defender.

Heathcliff eliminou minha investida inicial e o combate começou. Imponentemente, ele avançava passo a passo sempre forçando um engajamento com seu escudo pronto para me empurrar e defender uma retaliação ou ataque. Em contra partida, eu tentava sempre acertar os postos extremos de seu corpo em alta velocidade. Sempre variando, eu mirava um ataque na esquerda e depois na direta, fazendo Heathcliff se esforçar para defendê-los. Sua velocidade e mobilidade eram baixas, mas dentro de seu espaço, Heathcliff movia seus braços rápido o suficiente para prevenir todo e qualquer golpe ou investida que eu realizava.

Faíscas explodiam a cada encontro, e muita poeira se levantou devido aos nossos movimentos. Meus ataques não causavam nem metade do que eu esperava que causassem na barra de vida de Heathcliff. Sua defesa era muito alta, além de defender precisa e antecipadamente cada golpe que eu desferia. Seus ataques eram extremamente certeiros e eram realizados nos momentos mais críticos dos meus movimentos, me obrigando a recuar e reposicionar, reiniciando toda a minha investida. Entretanto alguns de seus ataques eram inevitáveis de se esquivar, obrigando-me a bloqueá-los com minha espada. E justamente esses ataques eram os que ele aplicava mais força.

Minha barra de HP já estava chegando em 80%, enquanto a dele ainda estava um pouco acima dos 95%. Ao ver isso, eu ataquei bruscamente seu escudo para poder me afastar e ganhar um espaço para poder pensar em alguma outra estratégia. Heathcliff defendeu o golpe e ficou parado, me observando recuar a uma distância de 15 metros. Nós ficamos encarando um ao outro.

“Droga. Se continuar assim.” Eu já estava ofegante, mas tentava de tudo para controlar minha respiração para que ele não percebesse isso. Já Heathcliff não aparentava ter nenhum rastro de cansaço. “A habilidade única. Só pode ser isso.” Além de ser conhecido como um excelente jogador, Heathcliff se tornou famoso também por ser o primeiro, de conhecimento público, a obter uma habilidade única. De acordo com a Casa dos Informantes, a sua habilidade se baseava no combate com espada de uma mão e escudo. Sua especialização era em conceder bônus altíssimos de defesa ou ataque, variando de acordo com a situação, ou talvez a bel prazer do usuário. Essa análise não estava completa e nem tinha confirmação de Heathcliff, podendo estar errada ou não. Mas era inegável que sua defesa e seu ataque, mesmo para o estilo cavaleiro, eram extremamente acima da média. E além disso tudo, a habilidade da minha espada de criar ilusões da lâmina não o atrapalhou em nenhum momento.

Cheguei à conclusão que eu teria que arrancar mais informações à força. Eu tinha que entender como funcionava essa habilidade única e assim descobrir uma brecha ou fraqueza para dominar o combate.

“Isso é tudo que o Lobo Prateado é capaz de fazer?” Provocou Heathcliff com um leve sorriso. Eu não queria admitir, mas ele estava dominando o combate até o momento.

“Haha... Só estou começando.” Respondi ironicamente, pois sabia que era uma tentativa de me irritar, mas no fundo eu realmente estava com raiva.

Em seguida eu investi contra Heathcliff carregando uma das minhas habilidades favoritas. Ela era uma habilidade da árvore de espadas de uma mão, simples, mas muito eficiente para iniciar um engajamento. Realizando três cortes, minha espada impactou o escudo de Heathcliff por três vezes causando uma chuva de faíscas.

“Primeiro. Tenho que descobrir o que exatamente a habilidade única dele faz e quando ela é ativada.” Todas as habilidades, sem exceção, ocorriam juntamente com algum tipo de efeito áudio visual. Então eu prestei atenção aos mínimos detalhes, a cada movimento.

Heathcliff retaliava sempre encaixando o seu ataque num ponto vital do meu corpo. Às vezes, ele apenas fazia um corte diagonal ou simplesmente tentava me perfurar. Outras vezes, ele conseguia realizar um combo de habilidade de espada de uma mão, que eu precisava fazer diversas acrobacias para desviar.

O tempo estava correndo, e minha barra de HP ia se esvaziando pouco a pouco, enquanto isso, a de Heathcliff parecia nunca sair do lugar. Finalmente, após concluir um combo complexo de habilidade, eu percebi um padrão nas habilidades de Heathcliff. A cada ataque consideravelmente forte que eu realizava, o escudo de Heathcliff emanava uma pequena áurea amarela, bem discreta. Quando eu realizava um ataque fraco essa áurea não aparecia, porém em seguida ele retaliava com a espada carregando uma habilidade ou golpeando junto de um intenso brilho vermelho.

“Deve ser isso! O brilho amarelo indica aumento de defesa enquanto o vermelho significa ataque. Devido ao fato dele utilizar o amarelo só para os ataques fortes, significa que é ele quem controla quando vai ou não utilizá-lo.” Meus pensamentos eram turvos devido à concentração que eu tinha que dar ao combate, por isso, a cada pausa de milésimos de segundos entre uma habilidade e outra, eu usava para organizava meus pensamentos enquanto recuperava o folego. “Mas por que ele não utiliza sempre que eu ataco, restringindo apenas aos golpes mais fortes?” Entretanto, Heathcliff utilizava essas pequenas pausas para avançar e ganhar terreno, imponente e incansavelmente sempre me pressionando. Um erro era o suficiente para ele aplicar um golpe fatal.

A resposta da minha pergunta veio logo em seguida. Tentando me perfurar, Heathcliff aproveitou meu pequeno momento de devaneio. Seu golpe tinha como alvo o meu coração, que se não fosse pela minha posição, teria sido perfurado. Porém, o ataque ainda perfurou de raspão o meu ombro esquerdo. Institivamente, carreguei uma Habilidade forte de espada e contra-ataquei para afastá-lo. O golpe bateu pesadamente no centro do escudo de Heathcliff, explodindo faíscas para todos os lados.

“O escudo não brilhou!” Ao perceber isso, eu rapidamente recuei e ganhei um espaço entre nós, novamente para avaliar o combate.

Dessa vez eu nem tentei esconder que eu estava cansado, eu realmente precisava respirar. Entretanto, Heathcliff também estava arfando com uma expressão séria. O meu HP estava entre 65 e 70%, enquanto o de Heathcliff parecia estar no 90%. Olhando apenas os números, parecia que o combate não estava nem um pouco a meu favor, mas eu tinha conseguido a informação que eu queria.

“É um ou outro. Ele só pode ativar um de cada vez, ou é só ataque ou é só defesa!” A informação batia de acordo com a análise incompleta da Casa dos Informantes e ia conforme o combate atual entre nós. “Agora, segundo. Preciso ir até os limites da habilidade dele.” Essa era a segunda etapa, eu sabia que a habilidade única dele era uma árvore de habilidades como a minha, mas ao saber que ela se baseava em combate com espada e escudo e se especializava em fortalecimento de ataque e defesa, não haveria grandes surpresas me esperando.

“Esta é sua última chance, Hikaru-kun. Se desistir agora deste combate, eu o deixarei partir sem quaisquer punições e diremos que isso foi apenas um mal entendido. Dessa forma não irá manchar sua reputação.” Desta vez Heathcliff tinha um tom sério em sua voz. Era uma proposta generosa e piedosa aos olhos dos que nos assistiam. Senti que a qualquer momento alguém da plateia iria gritar elogios a sua grandeza e tamanho de sua piedade.

Não demonstrei, mas eu me senti enfurecido e humilhado pelo pouco caso ao me oferecer isso. Era como se ele nem tivesse levando a sério o combate. Apesar de eu também ter mais cartas na manga e ainda nem ter apresentado a minha habilidade única.

“Então a partir de agora você vai parar de se esconder atrás desse escudo e lutar de verdade?” Pude ouvir os múrmuros de ofensa que os jogadores em nossa volta jogavam em mim. Heathcliff soltou sua respiração com um leve sorriso.

“Muito bem...” E novamente ele se posicionou “Já prolongamos isso demais.”

Para cumprir meu segundo objetivo, eu teria que lutar ao máximo, devido a meu oponente ser justamente ele. Então não pensei duas vezes, carreguei minha habilidade mais forte da árvore de habilidade única. Seu nome era Comet, um golpe que utilizava uma espada de uma mão e tinha quase a mesma aparência de uma habilidade primaria dos usuários de florete. Eu cobria velozmente um espaço de 10 metros e acertava um único corte poderosíssimo no meu alvo. Todas as vezes em que a utilizei, eu eliminei instantaneamente todos os monstros que eu acertava, porém a recarga dessa habilidade era de 30 minutos e eu não podia usá-la enquanto eu tivesse com os bônus de velocidade que ganho quando sou atacado em grupo. Eu nunca planejei utilizá-la contra um jogador, por medo de matá-lo instantaneamente. Mas levando em conta sua incrível defesa, ele iria sobreviver. E tudo o que eu queria era retirar aquele sorriso de seu rosto.

Como um cometa, eu disparei numa velocidade incrível e cobri os 10 metros que nos separavam. Enquanto eu passava pela direta de Heathcliff, acertei o golpe em horizontal, na altura de seu peito. Por muito pouco, ele conseguiu posicionar o escudo a tempo e impedir que meu ataque acertasse seu corpo. Durante o choque eu puder ver como o rosto de Heathcliff ficou surpreso. Logo em seguida houve uma explosão de fagulhas de cor azul que se estendeu a uns dois metros por todos os lados. O choque também produziu um enorme som de metal que ecoou pelo local. O golpe fez meu corpo inteiro tremer, e Heathcliff finalmente deu alguns passos recuando. Se fosse uma luta em grupo, aquele seria um momento ideal para utilizar um movimento de Switch.

Sem dar tempo para Heathcliff se recuperar, eu tomei impulso e voltei a atacá-lo novamente. Alterando minha estratégia, comecei a utilizar golpes e habilidades enquanto eu pulava.

As habilidades em SAO eram todas realizadas através do sistema, onde cada jogador podia apenas alterar o local em que cada golpe seria dado. Porém todo o resto, trajetória da arma, área de impacto e efeitos pós impacto são todos realizados pelo sistema. Dessa forma, se o jogador conhecesse todas as habilidades de seu estilo, ele também saberia a trajetória e automaticamente saberia onde provavelmente iriam acertar, facilitando assim o bloqueio detes. Mas o que poucos jogadores sabiam é que, enquanto estivessem no ar, era possível alterar o seu eixo do seu corpo, mudando os locais em que suas habilidades iriam acertar. Dessa forma, se o jogador pulasse e ficasse de cabeça para baixo no momento do ataque, uma habilidade que iria acertar a região esquerda do inimigo, acertaria o lado direito.

Essa estratégia era especificamente melhor contra adversários mais experientes e que possuem mais habilidade. Além de ter mais variedades de combos, isso acaba confundidos os jogadores que já são acostumados com os ataques normais.

Cada vez que utilizava uma habilidade enquanto estava no ar, eu ganhava mais impulso que era usada para um novo ataque. Mas não importava o quão rápido eu me movesse, todos os meus ataques paravam na defesa precisa de Heathcliff, só que desta vez ele estava tendo dificuldades em contra-atacar.

Comecei então a testar vários tipos de movimentos que obrigavam Heathcliff a alterar os padrões de defesa e ataque. Eu queria saber se aquilo tinha algum tipo de tempo de efeito e tempo de recarga.

Após uma série de combos, consegui obter informações mais precisas. Novamente me esquivei dos ataques de Heathcliff e me distanciei. Dessa vez eu havia tomado vantagem, minha barra de HP estava em 60%, enquanto a de Heathcliff ficou um pouco abaixo de 80%. E mais uma vez a defesa dele me surpreendeu, pois eu esperava que a barra dele tivesse caído drasticamente após o meu ataque.

“10 segundos... É o tempo que dura o efeito. Mais 5 segundos para reutilizar ou trocar para o outro...” Ambos estavam cansados, o combate já durava cerca de 10 minutos. “Terceira e última parte...” Naquele momento eu queria realmente acabar com a luta. Meu plano era simples, utilizar esses intervalos de tempo de suas habilidades para surpreendê-lo com minha habilidade única e destruir seu escudo. Sem o escudo, Heathcliff ficaria incapacitado de utilizar todo o potencial de sua habilidade única além de não poder mais se defender com eficiência.

Novamente eu parti para o ataque. Investindo com habilidades mais básicas, minha intenção era forçá-lo a me atacar, criando um momento perfeito para executar meu plano. Os meus dois primeiros golpes acertaram em cheio o escudo e logo em seguida Heathcliff já contra-atacou. Ao me esquivar dos possíveis ataques, me joguei para o lado esquerdo e em seguida saltei por cima de Heathcliff para executar mais um combo de habilidade.

Neste momento, Heathcliff alterou seu padrão de movimento. Até aquele minuto, ele havia usado um método bem eficaz em combate que nós chamamos de conquistar e manter posição. Era simplesmente resistir, incansavelmente, a todo e qualquer ataque, e quando o inimigo abrir um espaço, por menor que seja, avançar com força encurralando inimigo. Mas agora Heathcliff resolveu se mover por completo, ajustando a sua posição e recuar quando preciso. Ele não era tão rápido quanto eu, mas ele também não me deixava entrar em seu espaço, fazendo com que eu saísse da minha área segura para arriscar qualquer investida contra ele.

A eficiência dele dentro do combate melhorou muito, e em vez de defender todos os meus ataques, ele desviava do máximo possível. Irritado por não conseguir seguir meus planos, comecei a realizar mais investidas aéreas. Minha velocidade enquanto no ar aumentava drasticamente, eu conseguia desferir quatro a cinco golpes com um único pulo.

Foi quando Heathcliff me surpreendeu. Em vez de ele tentar defender ou se esquivar, ele viu uma brecha em minha guarda que o permitiu dar um golpe com o escudo enquanto eu estava no ar.

Quando pulei com uma habilidade carregada, Heathcliff a reconheceu e avançou, pois ele já sabia os movimentos que eu iria realizar. E por estar no ar, eu não seria capaz de desviar de seus ataques. Pouco antes de acertar um ataque na diagonal que mirei em seu ombro esquerdo e pescoço, Heathcliff golpeou a minha perna esquerda com o escudo. Isso me fez ser arremessado para o lado. O golpe foi dado de uma forma que meu corpo começou a girar no ar, me desorientando completamente.

Tudo o que pude interpretar enquanto estava girando foi um brilho vermelho. Instintivamente saquei a lâmina oculta e a posicionei na direção do brilho. Em seguida veio um choque forte. Um poderoso ataque na vertical de cima para baixo me acertou em cheio no ar fazendo com que eu fosse jogado em direção ao chão, como quando um jogador de tênis faz um saque na bola. Ao atingir o chão, o impacto me fez quicar e me arrastar por alguns metros.

Quando meus sentidos voltaram, vi Heathcliff em posição e me observando. Minha lâmina oculta foi destruída e se desfez em vários polígonos. Ela suportou a maior parte do ataque que provavelmente teria me partido em dois no ar. Minha barra de Hp caiu para um pouco menos de 40%.

“Você é cheio de segredos, Hikaru-kun. Se eu quiser continuar vivo, não posso me conter contra você, então sugiro que também me leve a sério.” Enquanto Heathcliff falava, os outros jogadores em volta ficaram cochichando impressionados pela luta.

Notei naquele momento que um jogador que possuía uma habilidade única não deveria ser menosprezado. Provavelmente todos que as tinham eram sempre poderosos, não por esse fato, mas talvez por serem jogadores fortes é que tenham recebido uma habilidade única.

Heathcliff me esperou levantar. Com calma, me posicionei novamente e tentei reorganizar meus pensamentos para criar uma nova estratégia.

Os outros jogadores tinham formado um círculo em nossa volta com espaço suficiente para nos mexermos livremente. Contudo, de vez enquanto eu chegava perto da borda desse círculo. Quando isso acontecia, os jogadores simplesmente desmembravam aquela parte e depois se reorganizavam, mas era algo feito inconscientemente movido apenas pela curiosidade dos jogadores em assistir a luta.

Precisamente naquele momento percebi algo que poderia me dar uma chance de vitória esmagadora. Quando me levantei, o contador da minha habilidade passiva aumentou para um. Ele aumentava minha velocidade conforme o número de inimigos que me tinham como alvo. Ao olhar para o lado, vi um jogador prestes a sacar sua espada e com um olhar fixo em mim. Já que o contador necessitava de no mínimo duas intenções ofensivas direcionada ao meu corpo, bastava apenas eu provocar todos os jogadores em volta para me lançarem uma intenção ofensiva. Já que eram jogadores da elite da linha de frente, todos tinham reflexos tão bons quantos o meus. Envolvidos com o calor do momento, eles responderiam inconscientemente a qualquer tentativa de atacá-los, por mais que os meus golpes nunca os atingissem. Quando o contador da minha habilidade Balance Justice chegasse ao máximo de 15, com 16 ou mais pessoas com intenções ofensivas, minha velocidade aumentaria em 375% e a taxa de dano crítico aumentaria para 750%. Com essa taxa eu seria capaz de eliminar uma criatura do meu nível e de categoria elite com apenas um único golpe crítico.

Eu tinha em mente que esse plano só funcionaria da primeira vez, mesmo os outros jogadores não tendo consciência sobre a minha habilidade. Provavelmente depois que percebessem que eu não tinha a real intenção de atacá-los, eles iriam segurar suas emoções e se manteriam calmos. Já que esse bônus concedido pela habilidade iria durar apenas 15 segundos, eu tinha que derrotar Heathcliff numa única investida com o máximo de golpes e habilidade que era capaz de executar.

“Você aguenta, não é?” Minha pergunta fez Heathcliff segurar mais firmemente a sua espada e seu escudo, e firmando mais seus pés no chão. “Só espero que isso não te mate...” meu tom de voz saiu serenamente sério, sem sarcasmo.

Aspirei o ar e o soltei lentamente. Eu sabia que a luta estava em seus últimos instantes. A parte crítica do plano era provocar todos os jogadores em volta, incitando-os a direcionar intenções ofensivas a mim. Se isso desse certo, eu já contava como uma vitória garantida.

Carreguei uma habilidade e a direcionei para as minhas costas, em direção aos jogadores. Quando a habilidade marcou uma linha horizontal no ar em frente a eles, o contador da Balance Justice subiu para quatro. “Próximo!” Sem tempo para olhar a reação deles, parti para cima de Heathcliff. Mas cinco metros antes de chegar até ele, mudei meu percurso indo em direção ao resto dos jogadores. Comecei a executar um combo com várias habilidades que abrangiam o maior espaço que eu podia. Minha velocidade foi aumentando gradativamente conforme o contador ia aumentando. As animações das habilidades pareciam realmente acertar os outros jogadores, mas na verdade eu me movia tão rápido que eles não viam que a minha lâmina passara a centímetros de seus corpos. Alguns deles instintivamente puxaram suas armas. Em pouquíssimos segundos eu pude subir o contador para treze pontos.

“Não interfiram, idiotas!” Gritou Heathcliff, parado e incapaz de me deter por causa da distância entre nós.

“Tarde demais! Isso é suficiente para acabar você!” Mesmo não sendo capaz de aumentar o contador para o máximo, treze já era um valor extremamente alto.

Terminei de executar minha última habilidade e investi em linha reta com toda a minha velocidade para cima de Heathcliff. Em milésimos de segundos cobri a diferença de espaço que nos separava.

Gritando brutalmente, comecei a executar inúmeros golpes combinando habilidades de espada de uma mão com ataques de minha própria autoria. Todos os golpes estavam sendo bloqueados pelo forte escudo de Heathcliff, posicionado bem a sua frente. Por causa da grande velocidade e do pouco tempo que eu tinha da habilidade ativada, eu não podia desperdiçar essa chance calculando precisamente onde meus ataques acertariam. Então resolvi atacar, atacar e atacar até a defesa de Heathcliff ser destruída.

“Você disse que aguentava, não? Então...” Sem parar de gritar e atacar, carreguei a habilidade Power Brake e o soquei bem no meio do escudo de Heathcliff. O som do impacto metálico sobrepôs todos os outros por um momento.

O escudo se manteve intacto, sem nenhum arranhão. Eu já calculava que precisaria bem mais do que apenas um para quebrá-lo. Por isso não cessei os ataques, e logo em seguida apliquei mais um Power Brake. Novamente ecoou o som metálico pelo local.

Continuei atacando mais e mais. Uma vantagem clara dessa habilidade é que o tempo de recarga dela de apenas meio segundo, possibilitando aplicá-la quase que instantaneamente uma após a outra.

Mais um estrondo ecoou e dessa vez tinha sido mais agudo. A poeira começou a subir virando quase uma névoa no epicentro da batalha. Outro estrondo ocorreu com o quarto impacto, fazendo a poeira se dissipar por um momento.

Executei todas as habilidades que possuía uma após a outra, e as que tinham um tempo de recarga baixo, eu as ativa de novo e de novo. O quinto impacto soou como os outros e novamente continuei sequenciando os meus golpes junto as habilidades.

Heathcliff não conseguia fazer nada além de segurar e manter seu escondo a frente. A força da minha investida fazia com que cada ataque meu o empurrasse para trás. Ainda assim, Heathcliff resistia fortemente a cada impacto que recebia.

Estive completamente concentrado em meus movimentos, porém no fundo eu contava cada segundo que faltava para a habilidade acabar.

“Preciso intensificar os golpes... Precisam ser mais rápidos!” Faltando cinco segundos para acabar o bônus de velocidade, eu acabei me perdendo no meio das minhas próprias habilidades. Nunca tinha executado tantos movimentos e tantas habilidades em sequência em tão pouco tempo. Resolvi então usar apenas golpes de minha autoria e continuei a atacar.

“Quatro. Tem que ser mais forte!” Acompanhado de um intenso grito, meu sexto golpe com o Power Brake acertou o escudo como um martelo. Intensifiquei mais ainda a quantidade de golpe. Era quase como atacar uma parede, mas me mantive firme aumentando a intensidade cada vez mais.

“Três. Eu vou te destruir!” Joguei toda a minha fúria em meus ataques e o sétimo golpe do Power Brake foi um soco de baixo para cima. Uma enorme fagulha se originou devido ao bruto impacto. Nesse momento, Heathcliff se inclinou para trás levantando poucos graus o escudo. Finalmente eu tinha abalado a invencível postura daquele homem que era considerado o melhor jogador. Pela primeira vez na luta eu finalmente tinha aberto por um breve momento a sua defesa.

“Dois.” Aquela era a hora para o meu maior segredo. O melhor momento para uma habilidade que eu tinha usado apenas duas únicas vezes. A última habilidade da arvore da habilidade única. Diferente da Comet, ela era uma habilidade que dava um alto dano de destruição em equipamentos e construções. Seu nome era:

“Pentagram of...” Comecei a carregá-la imediatamente. Ao mesmo tempo Heathcliff firmou seus pés no chão. Com uma expressão dura ele gritou:

“Holy...” Seu escudo começou a brilhar amarelo intensamente.

“Chaos!! – Shield!!” Nossas palavra saíram ao mesmo tempo.

Com a habilidade carregada eu investi contra Heathcliff que fincou seu escudo no chão e se posicionou atrás.

“Um!” Meu punho esquerdo e minha espada estavam brilhando em vermelho “Eu vou...” Usando a habilidade fiz cinco poderosos cortes, desenhando uma estrela de cinco pontas. “Definitivamente eu vou...” E com o punho ainda brilhando vermelho eu desferi um soco poderosíssimo bem no centro do escudo de Heathcliff. “...Vencer!”.

O impacto ensurdecedor fez uma onda de choque que varreu a poeira para todos os cantos, além de criar um enorme brilho que me impossibilitou de ver o resultado antes que a poeira voltasse a cobrir tudo.

Quando terminou, eu recuei dois passos. Eu não estava vendo Heathcliff, mas eu o sentia a minha frente. E durante o impacto, antes de ficar cego pelo brilho, senti meu punho estilhaçando algo. Eu estava exausto, sem forças e com minha visão turva.

Mas me sentia feliz, pois no fundo acreditei que finalmente tinha conseguido.

Então a poeira se dissipou, e vagarosamente vi aparecer o emblema da KoB que cobria o escudo. Ele estava arranhado e amassado, porém inteiro. E atrás estava Heathcliff se levantando, todo sujo e com a armadura bem arranhada e danificada. Ele estava com sinais de exaustão também, entretanto em melhores condições que eu.

Ao olhar para a minha mão esquerda vi que minha manopla estava altamente avariada com trincas e rachaduras no punho. Os jogadores em volta se recuperavam devido à onda de choque que também os acertou. Todos estavam surpresos e fazendo comentários impressionados com a batalha que testemunhavam.

Heathcliff estava muito sério e com uma leve expressão de impaciência. Sua Barra de HP ainda estava verde e em torno de 55%, era inegável que ele estava em melhor estado que eu. Enquanto isso, eu estava ainda zonzo com barra de HP em amarelo, quase encostando nos 40%.

“Ele não é brincadeira mesmo.” Me reposicionei novamente, afinal a batalha ainda não havia terminado. Porém eu já estava esgotado e depois de executar todas as minhas habilidades, também já estava sem esperanças de vitória. Mas não queria desistir, eu não queria recuar e nem facilitar. Estava disposto a continuar até o final.

Heathcliff se posicionou e investiu para me atacar. Era esperado que ele fizesse isso, eu já não aparentava mais estar em condições de continuar. Ele então executou dois ataques, instintivamente joguei minha espada para bloquear os seus golpes.

Surpreendentemente Heathcliff também estava bem lento e seus ataques não tinham nem metade da intensidade que antes. “Ele está exausto também”.

Em sequência, ele executou uma habilidade em diagonal que foi capaz de defletir para o lado, porém ele se virou e me chutou. O golpe acertou minha costela esquerda e me jogou a alguns metros de distância.

Tentei me levantar com dificuldade, entretanto desta vez Heathcliff não me esperou como antes. Sua paciência tinha acabado, porém ele também deixou de ser cuidadoso com seus movimentos.

Enquanto eu ainda estava de joelhos, ele correu para desferir um golpe de cima para baixo mirando meu ombro esquerdo. Gastei todo o restante da minha força no movimento a seguir.

Bloqueei o ataque de Heathcliff e usando a empunhadura da minha espada eu prendi a lâmina de Heathcliff junto da minha. Esse movimento o desorientou por tempo suficiente para aplicar um último Power Brake, só que desta vez mirando na espada.

“Se não sou capaz de quebrar sua defesa, vou quebrar o seu ataque e empatar essa luta!” Eu já não tinha mais esperança de vitória, mas também não o deixaria vencer essa tão facilmente.

Fechei meus olhos esperando até o momento em que meu ataque atingisse a espada de Heathcliff. Meu soco acertou em cheio o meio da lâmina criando um brilho ofuscante e depois se espalhando em fagulhas. O impacto fez todo o meu braço vibrar e ficar adormecido.

“Mentira... Isso só pode ser brincadeira...” Foi o que passou pela minha mente quando eu vi meu punho parado bem no lugar onde havia acertado. A espada de Heathcliff suportou tudo o impacto, sofrendo apenas algumas trincas no local de impacto. Ela possuía um discreto brilho amarelo que logo se apagou.

Sem hesitar, Heathcliff aproveitou meu momento de incerteza e puxou a espada de volta. Ao mesmo tempo ele utilizou o escudo para me jogar para longe.

“A espada... ele aumentou a defesa e resistência da espada com a habilidade única...” O escudo atingiu meu braço esquerdo pressionando-o contra meu corpo. O golpe me arremessou para traz enquanto me deixava sem ar.

Mas não parou por aí, rapidamente após me atingir e antes que eu fosse jogado para fora de seu alcance, Heathcliff ainda executou um ataque com a espada fazendo um corte de cima para baixo.

Eu estava incapacitado de defender. O golpe com escudo que Heathcliff me desferiu foi justamente para me desestabilizar por completo. Eu não conseguia mexer meu braço esquerdo, e minha mão direita se atrapalhou deixando minha espada cair no momento que sofri o impacto. Eu estava sem nem um ponto de equilíbrio e em queda eminente. Tudo que fui capaz de fazer foi abaixar levemente minha cabeça para talvez proteger um pouco o meu pescoço, torcendo para que não fosse um golpe fatal.

Finalmente a lâmina de Heathcliff me acertou. Ela atingiu o final da minha testa e desceu cortando minha sobrancelha e olho esquerdo até o queixo. Depois ela continuou cortando do meio do meu peito até a lateral direita da cintura.

A dor foi intensa, era como se tivesse sido cortado com uma lâmina de gelo. Minha visão ficou embaçada e um tom vermelho substituiu todas as outras cores. Até que finamente senti o baque do meu corpo caindo no chão. O meu olho esquerdo começou a queimar de dor, mas eu não tinha mais forças nem para gritar. Tudo o que eu podia ver claramente era minha barra de HP se esvaziando.

Ela estava vermelha em 20% e descendo. Meu coração acelerou e comecei a me desesperar. Mas eu não conseguia me mover, não conseguia falar e ela continuava a descer. Em fração de segundos ela atingiu os 10% e o vermelho começou a piscar.

“Então é assim que eu vou terminar?” Naquele momento eu já tinha perdido a noção do tempo, eu não sabia mais o que era um segundo ou o que era um minuto, não sabia dizer se aquilo estava rápido ou lento. Eu não queria morrer, é claro. Mas eu também não sabia o porquê que eu sobrevivia todos os dias dentro de Aincrad. Nunca gostei muito do mundo real, para falar a verdade eu sempre o troquei pelo virtual. Eu não entendia o que me fazia ajudar na linha de frente, ajudar na finalização do jogo para que todos saíssem de SAO. No fim de tudo, para mim parecia que não importava se fôssemos sair ou não. Desde o início, parecia que eu só estava ajudando por eu estava interessado no jogo apenas. As seis mortes que eu tinha causado e a quantidade de jogadores que se envolveram comigo e também tiveram esse fim não me assustavam. Isso me atormentava. Eu matei seis pessoas e senti como se as tivesse matado em outro jogo normal. Eu apenas continuei brandindo minha espada mais e mais num ciclo vicioso e ganancioso.

“No fim, eu sou só uma péssima pessoa que deveria ter morrido já há muito tempo...”

“NÃOOO! POR FAVOR NÃO FAZ ISSO!” Aquele grito me fez voltar a respirar fundo novamente e recobrei minha consciência, porém ainda zonzo com a visão em vermelho e embaçada, sem forças para me mover. Um pequeno alarme agudo soava pausadamente. Minha barra de HP estava piscando em vermelho nos 2%, felizmente ela estava parada.

Meu olho esquerdo ainda estava ardendo, menos que antes, mas ainda não podia enxergar com ele. Movi minha cabeça lentamente para esquerda e vi Samanta aos prantos sendo segurada por outros dois jogadores.

“Mate-o agora Heathcliff-sama, ele é claramente uma ameaça!” Era a voz de Hanzo, mas eu não o tinha no meu campo de visão.

“NÃO! Você não pode fazer isso!” Protestou Nalius.

“Ele é perigoso assim como os jogadores PK’s. Aliás, ele também é um assassino!” Argumentou Hanzo.

“CALA A BOCA! VOCÊ é o que tem menos direito de acusá-lo disso!” Retrucou Nalius. Ao mesmo tempo sons baixos metálicos ecoavam. Parecia que ainda estavam segurando Nalius e ele estava tentando resistir.

“Vê?! Esses caçadores são uma ameaça aos outros jogadores. Ainda tentam fazer acusações falsas para provocar desordem!” Insistiu Hanzo.

“Mas eles são caçadores, eles prendem os jogadores PK’s.” Eu não conhecia aquela voz. Era uma voz masculina, e não aparentava ser muito jovem e nem muito velha, porém eu também não o tinha no meu campo de visão para confirmar.

“É aí que está, meu amigo. Eles se misturaram e interagiram tanto com jogadores PK’s que eles não se acostumam mais com o convívio com outros jogadores normais. E todos aqui sabem qual é a fama deles e do que são capazes por dinheiro. Não duvido que num futuro não muito distante eles comecem a servir como assassinos de aluguel, uma vez que as guildas PK’s, o ganha pão deles, estão sumindo. O caçador de hoje vai ser o PK amanhã.” Hanzo era bem insinuante com seus argumentos, o que fazia os outros jogadores ponderarem. Ao perceber que o jogador que me defendeu antes não tinha contra argumentos para retrucar, ele continuou. “E aqui nós temos o pior exemplo deles, bem na nossa frente. Que graças a Heathcliff-sama foi subjugado. E ainda tem outros dois que estão capturados. Temos que aproveitar essa oportunidade e eliminá-los aqui e agora!”

“NÃO! Por favor só nos deixe ir embora...” Disse Samanta. Eu não conseguia falar, minhas palavras não saíam da minha boca por mais que eu quisesse.

Os jogadores em volta pareciam estar bem hesitantes para apoiar qualquer decisão. Por isso Hanzo ainda insistiu.

“Vocês vão esperar até que um deles mate um amigo de vocês ou até mesmo vocês?! Heim?!”

“Seu bastardo idiota. Se nos matar agora vocês não serão diferentes dos jogadores de quem nós viemos os protegendo até aqui!” Indagou Nalius. Graças a isso o argumento anterior de Hanzo não teve o impacto que ele esperava.

“Há! Proteger?! Você diz sobre aquela cruzada ridícula que culminou no maior massacre de Aincrad?” Provocou Hanzo.

“Chega!” O jogador que tinha me protegido interrompeu a discussão “Isso é um assunto repugnante que não deveria nem sequer ser decidido aqui... Comandante, por favor...” Para impedir que Hanzo continuasse, ele fez com que Heathcliff, que se manteve em silêncio, decidisse algo. Ouvi alguns passos em minha direção e de repente Heathcliff entrou no meu campo de visão.

“Muito bem...” Começou Heathcliff enquanto olhava para os jogadores ao redor. Ele parecia exausto, mas ainda assim não perdia a postura de comando.

“PARAAAAAAAA!” Um grito interrompeu tudo. Eu olhei para cima de onde eu estava. Minha visão embaçada não permitiu reconhecer visualmente o rosto de quem gritou, mas pela voz eu sabia que era Nagi. Ela estava ofegante, e aparentava estar toda machucada e com a armadura em péssimas condições. “O que...” Continuou ela, pausadamente. “Você pensam que estão fazendo?!”

“Ela é um deles!” Gritou Hanzo. Alguns jogadores começaram caminhar em direção a Nagi.

“Ei ei, o que vocês... ?” O jogador mais próximo dela tentou pegar os seus braços para imobiliza-la “Você tinham que prender ele!” Nagi apontou na direção de Hanzo “E não eu!”

“Você também vai tentar me incriminar?!” Desdenhou Hanzo. Sem ninguém perceber, Nagi retirou um item de seu inventario rapidamente.

“...Se os comandantes ficam sabendo que eu venho passando informações da linha de frente desde o começo, os caçadores serão a menor das minhas preocupações...” A gravação da voz de Hanzo foi acionada por Nagi no momento mais preciso. Hanzo ficou pálido, e o resto dos jogadores paralisaram em silêncio.

“Is-Isso... Isso só pode ser uma montagem!” Alegou Hanzo, todos os jogadores olharam para ele duvidosamente. E ao mesmo tempo, os que seguravam Nalius e Samanta os soltaram. “É claro... Isso é uma montagem! É fácil fazer esse tipo de coisa hoje em dia...” Continuou Hanzo.

“Pode até ser fácil fazer uma montagem de áudio. Mas para nós, que estamos todos presos aqui... É impossível!” Após Nalius dizer isso, dois jogadores agarraram os braços de Hanzo e o amarram. Nalius acenou com a cabeça para Heathcliff que acabou retribuindo com o mesmo gesto. Depois Heathcliff se virou para Hanzo e olhou com frieza.

“Nogara-san, Hoshi-san. Levem-no para o quartel general e o tranquem na masmorra. Ele será Interrogado mais tarde.” Os dois membros da KoB que amarram Hanzo, o pegou e partiram em seguida.

“Atenção todos. A linha de frente não pode parar por culpas dos acontecimentos de agora. Faremos hoje ainda a incursão para derrotarmos o Chefe deste andar. Então, por favor, dirijam-se ao local marcado anteriormente. Também peço a todos que não digam e nem comentem sobre o que viram hoje aqui. Não quero segredos desnecessários sendo entregues para a Casa dos Informantes e nem que se espalhe rumores sobre a existência de espiões dentro das guildas da linha de frente.” Não muito contentes, os jogadores a volta começaram a conversarem entre si, mas ninguém contestou. Alguns deles ainda estavam eufóricos devido à luta anterior. “Obrigado.”

Após isso o contingente de jogadores começou a se mexer em grupos, de volta para a área segura.

“Hugar-kun, envie uma mensagem para Mishoziro-san ir ao nosso quartel general e diga também que leve suas ferramentas. Preciso de reparos urgentes na armadura e acho que está na hora de trocar minha espada.” Heathcliff embainhou sua espada cuidadosamente.

“Certo, comandante.” Respondeu o seu companheiro.

Nagi veio caminhando lentamente em minha direção, um pouco cabisbaixa. Sua aparência estava tão ruim quanto a minha, mas pelo menos ela era capaz de andar e conseguiu chegar até o local.

“Desculpa... Shizuharo acabou caindo numa colmeia e muitas abelhas gigantes começaram a nos atacar. Ficamos cercados e...” Neste momento Samanta veio correndo até mim e me abraçou. Nagi se calou e se virou para Nalius que falava com Heathcliff.

“Eu coloquei você em risco trazendo-a aqui... Me desculpa, Samanta...” Se Nagi não tivesse aparecido, provavelmente Hanzo teria convencido os outros jogares a nos eliminar e isso incluía Samanta também.

“Idiota... Me deixar em risco? Você se quer tem ideia...” Ela deu uma pausa e respirou novamente “Se você tivesse me deixado sozinha agora... Mais uma vez você está fazendo isso...”

Ao abraçá-la de volta, me lembrei porque eu queria finalizar o jogo. A liberdade e a vida de Samanta e Any estavam em jogo. Talvez eu só tenha me esforçado em todas essas caçadas para isso. Mas Samanta me fez entender naquele momento que a minha vida também tinha valor. Eu não era descartável e nem estava mais sozinho.

“Sengoku-san, volte com os outros jogadores para o local de encontro e diga para Asuna-san assumir o comando da incursão. Explique que não estarei presente pois... tive alguns contratempos e um assunto para tratar em pessoa.” Ordenou Heathcliff para um dos membros da KoB que por sua vez partiu imediatamente. Ao ultimo que ficou, Heathcliff ordenou. “DK, ajude e escolte Hikaru-kun e seus companheiros até a área segura. Irei voltar imediatamente para o Quartel General” Sem esperar alguma resposta de seu companheiro, Heathcliff se virou e começou a mexer em seu inventario.

“Hikaru-san... Er... Olá, é um prazer conhecê-lo.” Disse o rapaz. Eu reconheci a sua voz na mesma hora. Era o jogador que tentou argumentar a meu favor quando Hanzo tentava convencer os outros a me eliminar.

Eu o cumprimentei e agradeci e então ele e Samanta me ajudaram a levantar.

“Hikaru-kun.” Chamou Heathcliff. “Não se preocupe mais. Nós assumiremos as investigações a partir daqui. Então espero que coopere conosco mais frequentemente na linha de frente. Além disso, a KoB está precisando de membros valiosos.” Oficialmente não me pareceu um convite para a guilda, mas acredito que Heathcliff o fez assim pois sabia qual seria minha resposta naquela época.

“Obrigado...” Apesar de ter mais coisas que eu gostaria de falar com ele, foi tudo o que pude dizer no momento. Ele se virou e usou uma pedra de teleporte.

Durante o caminho de volta, Nalius disse o que conversou com Heathcliff. Ele queria dar uma recompensa para mim e Nalius. E pelo que Nalius entendeu, a recompensa não passava de um valor significativo para não divulgarmos que o espião era Hanzo, um membro da KoB. Nalius recusou a proposta, mas fez um acordo com Heathcliff para sempre mantê-lo informado sobre o andamento da investigação até que finalmente achem o responsável.

Nagi nos contou também o que havia acontecido depois de começar a perseguir Shizuharo. Dez minutos depois que ele saiu correndo, ele acabou caindo num pequeno precipício que continha uma colmeia de abelhas gigantes e Nagi pulou atrás para salvá-lo. Com dificuldade, ela conseguiu subjugar a maioria das abelhas, então ela pegou o cristal de gravação e fez Shizuharo usar um de teleporte para voltar a área segura. Mas antes que ela pudesse sair do local, a abelha rainha apareceu junto de um grupo de zangões guerreiros. Por muito pouco ela conseguiu escapar seguindo para dentro de uma cadeia de cavernas mais abaixo, o que a fez demorar para voltar ao local onde todos estavam.

Ao chegarmos a área segura, nós agradecemos a ajuda que o cavaleiro da KoB nos deu e seguimos de volta para a casa de Samanta no 17° andar. Meu olho ainda não tinha se regenerado, mas graças às poções de vida, eu já podia me mexer normalmente, mas exausto assim como o restante de nós.

Após passar o caminho de volta inteiro pensando sobre os fatos ocorridos e sobre o que Heathcliff disse, tomei minha decisão e resolvi compartilhá-la com todos quando chegamos na casa de Samanta.

Continuar a ser um caçador de recompensas provavelmente me mataria em algum momento do jogo, e a linha de frente estava cada vez mais difícil de acompanhar. Agora com a investigação nas mãos de um clã, eu não precisava me arriscar a continuar sozinho. Então resolvi desistir das caçadas. Nalius e Nagi sabiam exatamente o que eu estava sentindo e o que provavelmente nos aguardava. Samanta ficou aliviada pela minha decisão e agora poderíamos passar mais tempo juntos também.

Conforme o jogo progredia, as guildas iam formando bases e tomando controle dos andares limpos. Por isso iniciou-se disputas entre elas por melhores territórios, mas nada que desencadeasse uma batalha. E também havia os problemas com os PK’s. Mas assim que a cruzada derrotou a guilda mais problemática e mais tarde a notícia de que Kisaro havia sido capturado se espalhou, o número de PK’s diminuiu drasticamente. Existiam apenas casos isolados que eram solucionados pelas próprias guildas que dominavam a região da ocorrência.

Os quadros de avisos sobre caçadas no Castelo de Ferro Negro foram retirados, e os poucos caçadores restantes se dispersaram para outras profissões ou foram adicionados ao Exército. Provavelmente, eu, Nalius e Nagi fazíamos parte dos últimos caçadores que não eram influenciados por nenhum clã.

E assim, a era dos caçadores de recompensa terminou.