Um Outro Conto de Fadas escrita por Ryuuzaki


Capítulo 11
Olhares, Cacos, Tiros - Parte 5




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***

Ignorando a sentença despreocupada de seu oponente, A Fada continuou em seu grito bestial, ainda tentando quebrar a moral do adversário e fazer com que ele recuasse. Mas Owen não recuou. Ao invés disso ele esperou pacientemente que o monstro terminasse seu berro, ainda com a arma apontada para ele e pronto para atirar. Não demorou muito para que tal feito acontecesse e tão logo ele se fez, o monstro voltou novamente seus olhos para o inimigo onde, em um instante fugaz, o olhar dos dois desafiantes se encontrou e um silêncio onde nem pensamentos pareciam ser processados tomou conta daquele quarto não muito diferente dos inúmeros outros que existiam em Santa Felícia.

 

O tempo pareceu andar vagarosamente como que a própria realidade quisesse aumentar a força daquele momento.  Os três presentes na cena prenderam ligeiramente a respiração, tensos com a expectativa e cada qual se preparando da maneira que podiam. A fada se empertigou sabendo que algo aconteceria com ele em breve. Faye arregalou os olhos, imaginando que a seguir viria o derradeiro golpe que seu príncipe encantado usaria para derrubar o monstro.  Já Owen se preparava para o poderoso coice que sua arma daria ao ser disparada, ele sabia que precisaria resistir a alguns destes recuos antes de por um fim à vida miserável daquele monstro.

 

O poderoso ruído causado pelo disparo quebrou aquele estranho silêncio como uma pedra terminando a quietude de um lago, fazendo com que os ouvidos dos humanos presentes zunissem devido ao ambiente fechado. No entanto o caçador não se abalou, além de estar acostumado com aquela explosão sonora sabia que a magia da fada envolvia o recinto em um bolsão de silencio e nenhuma onda de som escaparia. Já Faye, nunca tendo visto o disparo de uma arma de perto e desconhecendo a potencia de uma bala, levou as mãos à boca, assustada ao ver o modo como o fada havia sido projetada para trás devido à força do impacto e batera novamente na porta onde o caçador a havia empurrado segundos atrás.

 

Um pequeno filete de sangue escorria do enorme ferimento no ombro da criatura. Carne e ossos estavam à vista, rodeados de pêlos chamuscados, o projétil podia ser visto, este havia se instalado em um músculo e estava amassado como se houvesse ido de encontro à uma parede de metal. Qualquer pessoa perderia o braço e entraria em choque com aquele tiro, porem a fada não estava em tal classificação, era muito mais resistente que um humano e possuía uma poderosa magia de proteção e, mesmo que o ferimento que ganhara parecesse grotesco – embora leve se comparado ao que deveria ter acontecido, ele praticamente não oferecia muito risco à vida da fada, mas dor parecia lacerar sua alma.

 

A despeito de sua surreal resistência, o monstro ficou atordoado e confuso, imaginando que as lendas que falavam sobre o caçador ser um dos poucos Irtinkwa a saber magia eram verdadeiras. Ick-Renor sentia uma dor que julgara nunca poder ser acometida a si enquanto estivesse naquele mundo falso, no entanto não se abalou por muito tempo, seu sangue ainda estava quente e sua língua queria sentir o gosto da carne daqueles que estavam no recinto. Balouçou a cabeça, tentando afastar a pequena vertigem que o acometera e então com seus olhos humanos, voltou-se com ódio para o caçador com um olhar tão carregado de bestialidade e vontade assassina que por si só parecia poder estripar uma pessoa.

 

A fada começou a se mexer, tencionando um novo ataque semelhante ao que falhara outrora, contudo seu oponente estava bem atento e assim que viu o menor movimento nas asas da criatura soube que era a hora de retaliar. O caçador atirou, ainda com uma atípica expressão de desprezo no rosto – a qual parecera congelar em sua face desde o inicio da luta. A cada leve pressionar no gatilho uma nova bala era disparada, para então em questão de menos de um segundo a mira ser refeita e mais um projétil ser lançado em direção ao monstro. Tão logo baixava novamente o braço que havia sido empurrado para cima pelo coice, imediatamente após todo o quarto parecer vibrar pelo poderoso estouro, Owen dava um passo em frente, se aproximando da criatura que odiava e com os ouvidos zunindo escutando o “plinplinplin”, o tintilar de mais uma capsula chocando-se repetidas vezes contra o chão. Era como um ritual que visava acabar com a vida da fada.

 

Gatilho, estouro, mira, passo, tintilar, ferimento.        

Gatilho, outro estouro, mais um mirar, outro passo á frente, tintilar passageiro, novo ferimento.                                

Gatilho, estouro, mira, passo, tintilar, ferimento.        

Gatilho, outro estouro, mais um mirar, outro passo á frente, tintilar passageiro, novo ferimento.                                                                     

Gatilho, estouro, mira, passo, tintilar, ferimento.        

Gatilho, outro estouro, mais um mirar, outro passo á frente, tintilar passageiro, novo ferimento.             

Pausa.                                                       


Quando seu ritual completou o sexto ciclo Owen já estava cara a cara com a criatura que, mesmo tendo resistido facilmente ao primeiro disparo, já não conseguia se sustentar e mantinha-se encostada na parede, ofegando e sangrando por sete buracos distintos em seu tórax. O caçador-cavaleiro baixou sua arma e ficou a observar aquele ser impotente que há pouco fora letal, saboreando a vida que se esvaia, a magia que se acabava e jurando para si mesmo que outras noites como essa se repetiriam. Fitou os olhos humanos do monstro e encarou suas pupilas negras dilatadas, ali se demorou, tentando concentrar todo o seu ódio e mágoa para o ultimo e derradeiro tiro. Não haveria misericórdia, apenas morte.

 

Um sorriso de prazer se formou nos lábios de Owen e então ele olhou para a garota que observava a cena.

 

Faye havia se encolhido a cada tiro, colocado as mãos sobre as orelhas e logo relacionou aquele som trovejante com um canhão tentando derrubar o seu prédio. Durante os disparos não mais olhou para o seu cavaleiro, observava o monstro e dava um pequeno pulo de susto a cada novo buraco que aparecia no tórax peludo e nojento da criatura. Quando o pistoleiro parou de atirar ela ainda estava com o coração disparado, esperando que mais um tiro viesse, mas ele não veio e a menina ficou a olhar atônita para os dois combatentes. Ela demorou um pouco, mas acabou por perceber o olhar de seu príncipe sobre si e assim que os olhos se encontraram, - após, sem reparar, ruborizar por ser momentaneamente o centro da atenção de sua não declarada e não percebida paixão - ela entendeu o que ele esperava.

 

Em um primeiro instante Faye ficou em duvida, não sabendo o que deveria responder, mas então olhou para a criatura que deveria ser bela e benigna, que deveria tira-la daquela casa e então as cenas de sua quase morte - que haviam sido jogados para um canto mais esquecido da mente devido à recentes e impressionantes acontecimentos – simplesmente preencheram sua visão e ela não teve nenhuma pena daquele ser moribundo. Voltou-se novamente para o caçador e, de cara fechada e um bico nos lábios, assentiu vigorosamente com a cabeça. O caçador aumentou o sorriso, agora demonstrando satisfação pela fibra da garota que também queria ver morte e olhou outra vez para seu inimigo.

 

A fada não implorou, não pediu misericórdia. Apenas ficou observando com aqueles olhos estranhamente humanos a morte que se aproximava. Jamais esperava que viesse morrer naquele lugar imundo e que não veria mais os seus semelhantes. Agora sabia que deveria ter fugido assim que identificou o intruso, não estava com seus companheiros e isso fazia com que suas faculdades mentais fossem diminuídas em muito, já que não tinha acesso à espécie de mente coletiva compartilhada pelos de sua espécie. No entanto, agora que estava às beiras da morte - já sendo tocada pelos frios e invisíveis dedos de seus ancestrais que tentavam levá-lo para o mundo além da vida - Ick-Renor acabou tendo um lampejo de genialidade, percebendo cada movimento e ação que poderia ter levando a luta para outro desfecho sem contar com todas as conseqüências que o fim de sua vida teria. Morreria nas terras falsas, por isso seria escravo no outro lado do ciclo da existência.

 

Quando a fada teve consciência do próprio destino o seu olhar não mais estava apático e sim furioso. Abriu a boca a favor de xingar e proferir maldições para seu algoz, mas, assim que abriu a boca e começou a primeira silaba de sua língua alienígena, uma das pesadas botas de Owen acertou seu focinho, fazendo com que a fada se calasse.

 

- Não ouse dizer nada. Se eu ouvir uma maldita palavra de sua língua amaldiçoada juro por todos os deuses que irei matar todos do seu povo. – Owen desferiu mais um chute, dessa vez acertando um dos ferimentos da criatura – Pensando bem, eu vou matá-los de qualquer jeito. – sorriu.

 

O caçador estendeu novamente o braço para apontar sua Sword Cutlass para o monstro e por uma ultima vez observou aquele ser moribundo, passando os olhos rapidamente pelo tórax dilacerado, mas que derramara pouco sangue. Sabia que a criatura estava morrendo, sabia que mais um tiro bastaria porem queria dar uma ultima olhada no ser que sofria para conseguir aplacar a fúria em sua alma. Chutou-a mais uma vez, com o bico de sua bota, fazendo com que uma gota solitária escorresse de uma das feridas. O monstro estava acabado, Owen queria deixá-lo ali, sofrendo, ao invés de tirá-lo de sua miséria. No entanto ele sabia que se não terminasse o serviço a criatura poderia fugir para as terras-reais e curar suas feridas. O pistoleiro sorriu ao pensar que antes havia preferido matar a criatura enquanto não era visto, assim fazendo com que a magia do monstro não tivesse efeito e acabar com sua vida com apenas um tiro. Mas valerá a pena ter entrado no quarto e feito essa pequena batalha, o feito aplacará sua fúria e trouxe as delícias de ter uma vingança mais próxima de ser realizada.

 

Ele sabia que não era mais hora pra divagar. Iria acabar agora.

 

- Monstro, essa aqui é pela garota e... por Danny.

 

O ultimo estampido atravessou o quarto naturalmente, como se estivesse estado ali desde o inicio, nem mesmo Faye se assustou com ele, pois já o esperava. A ultima bala, não sendo barrada pela magia da criatura, atravessou seu crânio resistente e se alojou no meio do cérebro. Desta vez houve sangue, muito. Owen olhou apenas uns segundos para o cadáver sobrenatural e então cuspiu no corpo. Ficou calado por exatos um minuto, como sempre fazia ao matar um daqueles seres, lembrando de suas antigas feridas. Ao fim de sua lamuria silenciosa ainda estava taciturno, não havia recuperado seu humor insanamente estranho, portanto, ainda com sua expressão de assassino, virou-se para a garota, a olhou por dois segundos - observando rapidamente seu estado e avaliando sua personalidade - e então lhe falou.

 

- A luta de hoje terminou. Mas nossa participação na história esta longe de chegar ao fim. – sorriu – Acho que agora devemos conversar.

 

Owen havia encontrado uma companheira.

 


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Notas finais do capítulo

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Mais um capitulo que chega ao fim.
Espero que tenham gostado e que eu tenha conseguido deixar bom essa parte que é minha favorita.

Pensei em acabar a história por aqui. Seria um bom final para um conto. Mas ainda tenho coisas para contar sobre esses dois.
Então termina aqui a primeira parte desse conto. Well, recomendando uma fic que considerei otima. Vale a pena ler ela. Principalmente aqueles que gostam de piratas xDD E ouçam a banda que o escritor recomenda >—< http://fanfiction.nyah.com.br/historia/56872/Wolves_Of_The_Sea