Broken Flower escrita por Fleur dHiver


Capítulo 34
Falta


Notas iniciais do capítulo

Prometido e cumprido. Apareci na segunda. o/
Buenos dias. Agradeço a todos que comentaram no capitulo passado, por não terem me largado e a história e por terem compreendido toda a situação. Muito obrigada, você são lindos demais e logo estarei respondendo. Agradeço a Alê e a Lari pela betagem. sz
Espero que gostem e uma boa semana a todos;*



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A casa tinha um quarto, um banheiro e uma suíte no andar de cima. No andar de baixo tinha a sala mais um cômodo adjacente, a cozinha, um lavabo e um outro quarto, estando esse abarrotado de caixas. Também havia um quintal. A mobília era bem pouca e básica; um sofá na sala, uma mesa de quatro cadeiras na cozinha, um armário, fogão e geladeira. Nos dois quartos de cima apenas o de Sarada tinham mais coisas, o berço como Kakashi disse, uma cômoda, uma poltrona, a bancada para trocar fraldas e um umidificador de ar. No quarto ao lado só havia uma cama de casal.

Sem delongas, Sakura trocou Sarada, colocou uma manta que trouxe de Suna no berço e deixou-a no quarto dormindo. Decidiu fazer um pequeno tour pela residência. A casa, em geral, estava com a aparência de que havia sido limpa há pouco tempo. Tinha poeira, mas não o suficiente para um lugar que, como Kakashi disse, Sasuke tinha há tempos.

Um dos locais de sua averiguação foi a cômoda do quarto de sua filha. Nela encontrou algumas das peças de roupa que comprou para Sarada e deixou para trás quando foi para Suna, além de ter uma peça ou outra que não reconhecia. Quando foi para o térreo, fuçou as caixas largadas no quarto que tinha naquele andar. Ficou surpresa ao encontrar algumas das coisas que eles ganharam de casamento e os objetos dela também.

Havia alguns produtos de limpeza no móvel embaixo da pia e ela os usaria para fazer uma nova faxina pela casa, mas só depois. Agora estava cansada da viagem e já que Sarada estava tirando uma soneca, faria o mesmo. Pegou de uma das caixas um jogo de lençol seu e cobriu a cama no seu quarto, tomou uma ducha rápida e apagou.

Durante o sono teve um sonho que era mais uma recordação de uma conversa sussurrada em um corredor da mansão Uchiha. Sasuke estava perto, bem perto, tocava o rosto dela e falava com muita convicção sobre uma surpresa que a aguardava quando ele voltasse de sua missão. Ele dizia: as coisas serão diferentes a partir de então.

Acordou com o choro de Sarada e uma batida insistente na porta. Uma surpresa, não é? Observou o quarto vazio à sua volta. Kakashi dizia que fazia tempo que ele tinha comprado essa casa... Seria isso a surpresa? Pegou Sarada no quarto ao lado e desceu às pressas para ver quem estava chamando. Era Kakashi, com lamen do Ichiraku em uma das mãos.

— Ao menos para essa noite, para relembrar os velhos encontros — disse ao estender a comida para ela.

Sakura pegou a sacola e deu passagem para que ele entrasse. Dividiram o jantar e, enquanto apreciavam a refeição, Sakura o analisava. Kakashi continuava igual ao que sempre foi, aparentemente despreocupado e calmo.

Tinha pensado muito sobre o que fez a relação dele com Sasuke mudar tanto assim, da água para o vinho. Era estranho, antes de ela casar, e um pouco depois também, Kakashi mal olhava para Sasuke, mal ficava no mesmo recinto que o ele. Sabia que isso tinha mudado desde aquela visita misteriosa, mas agora, agora era algo a mais. Genuíno, verdadeiro; como antigamente, Kakashi sempre teve um apreço especial pelo Uchiha mais novo e isso parecia ter retornado.

— Kakashi, você sabe por que Sasuke não mora aqui? — Sakura questionou. O Hatake meneou a cabeça sem tirar os olhos da tigela em suas mãos.

— Não.

— Mas você nunca estranhou isso? Ele tem uma casa e prefere alugar um apartamento a vir para cá? — Indagou em um tom brando, casual, não queria transparecer sua curiosidade, muito menos seu ressentimento. Kakashi deu de ombros de forma despreocupada — Ou isso só ocorreu porque eu estava vindo? Ele estava aqui antes?

— Não, Sasuke nunca morou nessa casa. E, sobre as preferências dele, terá que falar com o próprio, e não comigo — Sakura jogou de um lado para o outro, com o hashi, um pedaço de carne em sua cumbuca.

— É engraçado estarmos aqui falando sobre o Sasuke, não? — Ela deu uma risada, falsamente descontraída ao comentar. Ele ergueu a cabeça para encará-la, soltando um longo suspiro. Sakura não o encarava. — Você o citando tão despreocupadamente quando uma vez, disse que ele não merecia nem mesmo um olhar de nosso.

— As coisas mudam. Nós sentamos para conversar e eu reavaliei meu ponto de vista.

— Só isso? Só uma conversa? — Sakura tentou não soar indignada, mas estava e sabia que, a essa altura, já tinha deixado claro. Observava o caldo em seu prato com uma mescla de ressentimento, descrença e irritação.

— Bem, tendo em vista que foi ele o interessado em abrir esse diálogo, acho muito relevante, ainda mais porque ele foi bastante insistente com relação a isso. — Sakura ficou quieta, deixando o resto de sua comida de lado — Nas primeiras vezes eu o deixei falando sozinho, mas acabava ouvindo uma coisa ou outra. A insistência e o teor do assunto me fizeram pensar se eu não estava sendo duro demais, se não calhava ao menos ouvi-lo até o final. Então eu ouvi e continuei a ouvir. Talvez eu tenha enxergado o que você enxergou, não sei, mas resolvi dar-lhe uma nova oportunidade.

Permaneceu quieta por alguns instantes, absorvendo aquelas palavras e tentando montar em sua cabeça os momentos que ele narrava. As mudanças começaram antes de ela partir, então Sasuke tinha algo muito importante para ser ouvido naquela época. Ergueu seu olhar para o antigo sensei, que continuava comendo sua refeição com tranquilidade.

— Alguma vez ele falou de mim? — Esse questionamento soou baixo, sussurrado, Sakura quase parecia não querer fazê-lo. Kakashi a fitou por um tempo e então se levantou, pegando sua louça e a dela.

— Falou.

— Pediu ajuda também? — Ele soltou um suspiro cansado, largando as coisas dentro da pia. Sakura nunca olhava Kakashi como uma pessoa muito mais velha que eles; o jeito, o porte, a conduta não permitia, mas pela primeira vez ela o viu assim.

— A primeira vez que ele tocou no seu nome eu o avisei para que não me pedisse nada, se fosse para apenas ouvir, ok. Mais que isso eu não faria, não estava e não estou interessado em me envolver na relação de vocês. O que eu disse na festa de Gaara ainda vale, são adultos, sabem o que fazem. Sempre souberam e não estavam dispostos a ouvir quando eu estava disposto a falar. — O som da água corrente não permitiu que o silêncio entre os dois fosse absoluto.

— O que ele queria com você? — Kakashi virou a cabeça para ela minimamente, Sakura passou a língua por entre os lábios, umedecendo-os enquanto se encostava no batente da porta, e cruzou os braços, totalmente na defensiva. — Por que te procurou? O que ele queria tanto te contar? Que palavras foram essas que fizeram você mudar da água para o vinho com ele e ficar com raiva de mim! — Kakashi parou o que fazia e a encarou ficando de frente para ela.

— Com raiva de você? Mas que absurdo...

— Você não foi me ver, não me escreveu, estamos aqui e você não quer me contar as coisas. — Ela apertou ambos os braços, rodeando-os com os dedos, enquanto despejava sem reservas o que vinha em sua cabeça — Não tem como você achar que tudo isso é como “os velhos encontros”, estamos os dois cheios de reservas, isso é palpável.

— A última vez em que nos falamos, os papéis que...

— Eu sei o que você foi fazer lá...

— Quando eu te entreguei a pasta — Kakashi aumentou ligeiramente o tom para ser ouvido —, assim que eu a coloquei em suas mãos a forma como você me olhou parecia que eu estava te traindo de alguma forma. Eu demorei muito para entender o seu olhar e porque ele piorava a cada palavra minha, porque você não tinha ficado feliz quando disse que tinha conversado com o Sasuke, porque você parecia tão ressentida por eu fazer algo que um dia tinha me pedido. — Sakura não o encarou enquanto ele falava, o tom casual de seu sensei já tinha retornado. — Eu não demorei para juntar alguns fatos assim que soube da sua partida. Deveria ter me procurado — Ela balançou a cabeça negativamente.

— Você tinha se entendido com o Sasuke, estava do lado dele. — Kakashi fechou a torneira e caminhou apressadamente até onde ela estava, segurando Sakura pelos cotovelos e inclinando o corpo para frente, para que seu rosto ficasse da mesma altura que o dela.

— Eu faria qualquer coisa por você. — Sakura balançou a cabeça em uma negativa. — Pode pensar que seria muito difícil de me fazer conivente a uma fuga e isso eu não nego. Procuraria outros meios, mas estaria com você, não importa se no dia anterior eu estive com Sasuke. — Sakura se desvencilhou do agarre dele, apenas para abraçá-lo, afundar seu rosto no peito do antigo sensei. — Desculpe não ter falado nada nos últimos meses, o seu olhar severo ainda era algo em minha cabeça, aquela sentença de traidor. Imaginei que não quisesse saber de mim. — Ela sorriu com o rosto escorado nele. — Ainda acho que o casamento de vocês foi um erro, muito precipitado. Mas agora entendo o porquê de ter dado a ele uma chance. Se eu decidi ouvi-lo, foi muito por você.

(...)

No dia seguinte, Sakura saiu para comprar alguns itens indispensáveis, já com a sua agenda do dia toda mentalizada. Após as compras, limparia a casa e tentaria tirar o máximo possível do que estivesse encaixotado, queria ter uma noção do que, de primeira necessidade, ela ainda teria que comprar. Começaria por tudo que envolvia Sarada, pois obviamente era o mais importante, e em seguida viriam as coisas para si. Só estava trabalhando no necessário individualmente, e não para a casa em geral, porque ainda não tinha sua situação de moradia totalmente definida. Sasuke precisava voltar primeiro para essa parte ser resolvida de uma vez; a conversa com Kakashi tinha, sim, sido importante e esclarecedora, mas não completamente apaziguadora.

Em sua volta pelo comércio acabou não esbarrando com nenhum de seus velhos amigos. Apenas alguns conhecidos que a reconheceram do hospital, ou de suas próprias idas e vindas por ali ao longo dos anos. A maioria pediu para ver Sarada, que dormia tranquilamente aconchegada em seu peito.

O jovem do mercado quase tomou o caminho errado quando a ajudou a levar as compras, ele tinha se virado em direção ao Clã Uchiha e depois se desculpou, dizendo que tinha esquecido da obra. Sakura corou sozinha, perdida em seus próprios pensamentos. Era normal que todo mundo achasse que ela e Sasuke ainda estavam juntos, mas ela tinha pensado que sua ausência poderia ter causado qualquer história sobre isso. Chegou até mesmo a se sobressaltar quando ele logo deduziu que ela estava indo para lá, mas seria algo natural, não?

Era estranho isso, pensar como Konoha se portou com sua ausência, o que seus amigos falaram, e se falaram alguma coisa. Ela saiu sem dizer uma a palavra a eles; só Naruto, Hinata, Sasuke e Kakashi sabiam da história e o último mais por dedução do que por qualquer informação vinda de sua parte. Ino deveria estar com raiva dela até agora... Mas se Shikamaru ou Temari lhe contaram algo talvez sua ira tenha sido mitigada. Porém, sem dúvida alguma, ainda seria grande. Além de Tsunade, nessa preferia nem pensar no momento.

Bem próxima à entrada de casa, Sakura foi surpreendida com a presença de Naruto e Hinata. Aparentemente tinham acabado de chegar e falavam alguma coisa baixinho em frente à porta.

— Naruto! Hinata! O que fazem aqui? — Ela se adiantou para cumprimentá-los, e eles se viraram sobressaltados. Não esperavam uma recepção vinda da rua.

— O que parece que viemos fazer aqui, Sakura? Assim que o Kakashi nos disse que você tinha voltado e passou o endereço, nós corremos para cá — Com cuidado Naruto a abraçou, afundando o rosto em seu pescoço. — Senti tanto a sua falta! — Seu tom inicial tinha um leve toque de ressentimento e censura, mas esses sentimentos se dissolveram nas palavras finais. Abraçou-o de volta.

— Eu também senti. Muita! — Virou para uma Hinata sorridente ao lado do marido — Dos dois. Mas eu não tenho quase nada para oferecê-los, acabei de voltar de uma ida ao mercado. 

— Não se preocupe, viemos abastecidos — e, ao dizer isso, Hinata ergueu a cesta que carregava, enquanto Naruto pegava as compras que o ajudante da venda ainda segurava.

Assim que entraram Sakura tratou de levar Sarada para o berço, a acomodou e se juntou aos outros dois, que já pareciam em casa. Hinata tinha tirado os quitutes da cesta e o chá que trouxe e os arrumava na mesa da cozinha enquanto Naruto arrumava as sacolas em um canto sobre a pia da cozinha.

— E onde está o Boruto?

— Está com o meu pai e Hanabi tomando banho de sol — Hinata disse, sorrindo abertamente, como se só em mencionar esse fato seu dia tivesse melhorado completamente — Papai o leva todos os dias para fazer um passeio matinal.

— Que legal, Hina! Ele já deve estar enorme. Estou louca para conhecê-lo. É muito parecido com Naruto? — O sorriso de Hinata se tornou ainda maior, se é que era possível, e ela corou ligeiramente, virando-se para o marido.

— Sim, não só fisicamente. Boruto ainda não tem nem um ano e já é agitado e esfomeado como o pai. — Naruto estava às costas da esposa, com as mãos atrás da cabeça, e sorria também, meio orgulhoso, meio encabulado.

Pela primeira vez, Sakura o achou realmente maduro, com cara de adulto e não mais de menino. Mesmo que o sorriso bobo tão característico ainda estivesse ali, parecia diferente agora. Pensou em perguntar: nem parece, porém mudamos muito, não é? Mas não precisava verbalizar, essa mesma percepção estava estampada na forma como ele a olhava.

— Hina está exagerando, ele é bem parecido com ela também. — O casal trocou um olhar cúmplice antes de sentarem à mesa para se deliciar com tudo que Hinata havia feito para eles.

— Por que não avisou que estava voltando? E essa casa? Não sabia que já tinha uma residência fixa aqui. — Questionou, Naruto com avidez. Sakura balançou a cabeça ligeiramente tomando um gole de sua bebida, se voltando para o amigo.

— Porque eu estava esperando o Sasuke, ele disse que tinha uma missão e assim que terminasse nós voltaríamos juntos, mas ele estava demorando demais, então eu peguei as coisas e resolvi vir sozinha mesmo. Foi uma decisão de momento, por isso não avisei. E a casa — deu uma mordida no pequeno sanduíche em suas mãos, olhando em volta —, eu não sabia da existência dela. A existência dessa casa foi uma surpresa enorme para mim. E, o senhor, não ouse me cobrar as coisas quando me esconde informações — Naruto se empertigou ao lado dela, surpreso com a afirmação.

— Não escondo nada de você!

— Não me falou nada sobre a reforma do clã. — Naruto encolheu os ombros.

— Presumi que soubesse.

Não, não sabia. Não fazia ideia.

Era injusto descarregar sua frustração em Naruto, quando quem de fato escondeu, ou melhor, continuou escondendo as coisas foi Sasuke. No entanto o ressentimento também pingava em seu melhor amigo, mesmo que apenas umas pequenas gotinhas.

— Desculpa, realmente achei que Sasuke tinha te falado alguma coisa.

Sakura concordou com um aceno, sorrindo em seguida. Ela e Sasuke vinham se dando bem e não entendia o porquê de ele ter mantido isso em sigilo, talvez não quisesse realmente envolvê-la nos assuntos da vida dele. Não poderia julgá-lo totalmente por isso; estavam separados, não estavam? Talvez fosse ela quem estivesse entendendo as coisas errado, não podia culpá-lo pelo clã, mas pela casa, podia sim!

Kakashi também apareceu mais tarde com outra refeição para os dois. Foi bom, depois da partida de Naruto e Hinata, Sakura comeu apenas uma besteira ou outra e passou o dia arrumando a casa. Ela não pensou em fazer algo para o jantar e terminou ficando exausta quando encerrou suas tarefas. Eles comeram juntos mais uma vez e Kakashi mexeu um pouco com Sarada, porém continuou resoluto em sua convicção de não querer segurá-la no colo.

Os dias que se seguiram foram recheados de visitas. A notícia de sua volta se espalhou depois que Naruto ficou sabendo, um a um eles foram aparecendo para dar as “boas-voltas” e conhecer Sarada, que ganhou muitos presentes e foi pega no colo por tantos braços diferentes que às vezes ficava enjoada e chorosa quando elas eram visitadas mais do que duas vezes ao dia.

Ino foi a última a aparecer, ou melhor, a “surgir”. Todas as manhãs Sakura caminhava com Sarada até umas 09h. Passava pelo centro quando precisava de alguma coisa e três vezes foi lá apenas para ver se encontrava a amiga na floricultura, porém apenas a senhora Yamanaka estava por lá. Encontrou-a no dia em que estava fazendo o percurso para ir ver Sai, que, por alguma razão, também não tinha dado as caras. Aparentemente tinha sido vista por Ino da porta da casa dele, mas ela se deu ao trabalho de dar a volta apenas para chegar pelas costas de Sakura.

— Posso saber o que faz por aqui? Esse não é o percurso da sua antiga casa e nem da nova, senhora Uchiha, Haruno... Sabu... não sei exatamente como devo chamá-la. Hum — respondeu, ácida, a Yamanaka.

— Sakura, porque, até onde eu sei, esse ainda é o meu nome, Porca. Você anda fazendo alguma coisa que ‘tá afetando o seu cérebro? Ou isso é só alguma doença que surgiu precocemente? — Sakura balançou a cabeça ligeiramente com falso ar de pena, enquanto o pescoço de Ino ia ficando vermelho e a sua expressão se fechando. — Coitadinha, de você...

— Tenha dó, Testuda! Eu passo muito bem! Não que você se importe, afinal, quem some sem dizer nada só liga para si próprio, não é mesmo? — O tom agudo despertou a atenção de Sarada que começou a soltar sonzinhos estridentes com a cabeça virada para Ino. Está se aquietou e, ao fitar o bebê nos braços da amiga, pareceu relaxar um pouquinho. Sakura meneou a cabeça, com um sorriso relaxado.

— Acho que mereço isso, só queria pedir desculpas pelo sumiço, por ter causado qualquer preocupação. É complicado, mas um dia a gente vai sentar para conversar sobre tudo isso. Eu prometo.

— Preocupação? Que piada! — A Yamanaka respondeu, cruzando os braços com um sorrisinho petulante no rosto. — Não quero suas desculpas, devolvo na mesma moeda. Sei de coisas que você adoraria saber, mas não vou contar também. Afinal, acredito que o Sasuke não é mais do seu interesse. Nem as casas que ele invade no meio da noite.

— Casas? Que casas? O Sasuke nem está na vila.

— É verdade, é verdade, que gafe a minha. Vou até ir embora depois dessa. Tchauzinho, Testuda.

— Ino, volta aqui! Espera! — Mas ela já estava praticamente do outro lado da calçada balançando suas longas madeixas loiras, totalmente triunfante.

Sasuke voltou uma semana depois dela; assim que colocou os pés em Konoha foi direto à casa onde elas estavam, sem nem mesmo levar o relatório de sua missão ao escritório da Hokage. As batidas nervosas na porta, deixavam evidente que a pessoa do outro lado estava, no mínimo, apressada. No momento em que abriu a porta, Sakura se deparou com ele ainda de mochila, a capa ligeiramente opaca pela poeira da estrada, a roupa amarrotada e marcada com vincos em alguns pontos, e o olhar claramente irritado.

— Você sabe os riscos que correu fazendo essa viagem assim, não é? — Foram as primeiras palavras dele para ela, a expressão totalmente fechada.

O mau humor dele só piorou o dela que já não estava nem um pouco bom. Sakura não estava contente com Sasuke e nada receptiva à reprimendas. Como se não bastasse tudo que já vinha remoendo nos últimos dias, o encontro com Ino tinha posto ainda mais lenha naquela fogueira.

— Eu sei muito bem cuidar de mim e de Sarada sozinha, obrigada — a rispidez o sobressaltou e ele piscou duas vezes antes de retomar a palavra.

— Não duvido disso e não é essa a questão. De Suna à Konoha é uma viagem longa para se fazer só você e um bebê, eu fiquei preocupado — Sakura desviou o olhar do dele.

— Não precisava, estamos ótimas! Chegamos muito bem a Konoha e Gaara nos deu cobertura até o limite do país do Fogo. — Ele assentiu, a postura endurecendo outra vez, e ela o fitou de esguelha, escorando as costas na porta — Acho que você tem algumas coisas para me contar, não?

— Sim, eu posso entrar? — ele perguntou. Sakura o encarou, pensando por alguns instantes, e, com um suspiro, deu espaço para que ele passasse. Sasuke foi logo tirando a mochila e a capa, deixando-as no hall de entrada. Ao vê-lo agitar os ombros pronto para começar a falar, Sakura se adiantou, cruzando os braços na frente do corpo e dando um passo à frente:

— Ver o clã em obra foi uma surpresa e tanto, mas, sabe, isso meio que não é da minha conta, são suas propriedades e você faz o que bem entender lá. Mas como assim essa casa é minha? Nunca falamos sobre ela, você nunca mencionou uma residência bem no meio de Konoha. O que isso significa? Eu não deveria ser consultada antes de você tomar uma decisão tão drástica? O que está tentando dizer com isso, Sasuke? — Capturou o olhar dele por um momento, mas não estava focado exatamente no rosto dela. Assim que notou o que tinha atraído a atenção dele, Sakura escondeu as mãos.

— Não vi uma oportunidade de conversar sobre isso antes. — Sakura balançou a cabeça em negativa ao ouvir aquela resposta.

— Que tal enquanto eu perguntava como estavam as coisas na vila? Quando me dizia o que tinha de diferente e as novidades por aqui? Achei duas oportunidades de conversa e nem precisei ir muito longe. Além do óbvio, eu deveria saber.

— Se eu tocasse nesse assunto com você puxaria outros, ou não puxaria e eles ficariam no ar, minando qualquer outra possibilidade que nós dois tínhamos de ter uma conversa normal que fosse. Não, meu comportamento não foi certo. Mas eu mal sabia como deveria me comportar perto de você quando retomamos o contato e depois eu não queria... — O olhar de Sakura estava totalmente voltado ao rompante que o tomou; ao fitá-la um sentimento se tornava óbvio e não era culpa, era temor — ...perder, perder o que fosse que estávamos construindo. A casa, essa casa não é de agora, você ainda estava na vila quando eu a comprei e quando eu tentei falar sobre isso foi na época que você mal falava comigo. Você rechaçou completamente qualquer chance que tínhamos de conversar. E já em Suna é como eu falei no início, o assunto só traria lembranças que eu não queria que voltassem. Tampouco queria parecer estar buscando uma brecha, uma aprovação, pensei em falar sobre isso quando nós dois estivéssemos voltando para cá, mas enfim, isso não aconteceu. — Ele a encarou intensamente e virou o rosto, bagunçando os cabelos. Parecia cansado.

— Talvez a gente precise visitar alguns fantasmas para acabar com eles de uma vez. Porque não dá para acreditar quando toda hora parece que você está me escondendo algo que precisa sempre de justificativa. — Sakura disse.

Sasuke parecia estar tomando fôlego.

— Quando eu decidi comprar essa casa foi para que recomeçássemos. — Ele a fitou de esguelha e logo desviou, focando na sala da residência — Por muito tempo ficou na minha cabeça aquela vez em que você disse que a mansão Uchiha parecia um mausoléu. E era verdade, eu só não queria ver. Depois quando eu falei sobre meus fantasmas, essa certeza se tornou mais concreta, mais óbvia. Um lugar novo para uma vida nova. — O tom dele ficou ligeiramente distante. Ela apertou com força os próprios braços, enquanto o ouvia, Sasuke não a encarava, estava de lado, fitando as paredes à sua volta — Essa era a minha surpresa, você lembra? — Sakura engoliu em seco, evitando a todo custo buscar o rosto dele.

— Sim.

Uma respiração pesada se fez audível, assim como o som dele pegando a capa e a mochila de volta.

— Eu gostaria que ficasse com a casa, mas se preferir ir para outro lugar, tudo bem. — E ao dizer isso ele abriu a porta e partiu, deixando-a ainda meio atordoada na entrada.

Sasuke apareceu no dia seguinte para ver Sarada, ficou com ela a maior parte da tarde, e entre ele e Sakura não houve muita conversa. Ela não se incomodou com isso; não sabia bem o que dizer, evitava inclusive ficar no mesmo cômodo que Sasuke para não o encarar demais. Houve um tempo em que ela pensou igual, pensou que eles poderiam tentar, que cabia ainda alguma coisa para eles, mas tudo que já foi feito até agora só provava o contrário.

Esticou as mãos sobre o tampo da mesa, observando a aliança dourada em seu dedo anelar esquerdo. Por que ainda usava? Tirou a do dedo e a pôs no bolso esquerdo de sua calça, depois subiria para guardar. Não fazia sentido continuar usando aquilo.

— Sarada está dormindo, eu vou indo — A aparição de Sasuke no batente da cozinha a fez levar um sustou; puxou as mãos com pressa, pondo-as sobre o colo.

— Quer comer alguma coisa antes?

— Não, obrigado. — Com um aceno de cabeça, ele começou a se virar para a saída.

— Sasuke — ele voltou um passo, se virando para ela —, tem alguma notícia da Karin? — a pergunta o surpreendeu e ela pôde sentir o olhar dele a escrutinando, buscando a razão para aquele questionamento.

— Não, Juugo me escreveu uma vez falando que eles estavam pensando em ficar num lugar próximo da antiga Oto, já que nenhum dos três tem um lar para voltar. Mas eu não tenho notícias de Karin, especificadamente e acredito ter deixado claro para ela que não me procurasse nunca mais.

(...)

O clima entre eles ficou estremecido a princípio, mas, com o passar dos dias, eles entraram em uma rotina similar a que tinham em Suna, e a estranheza foi logo esmorecendo.

Sakura decidiu ficar com a casa mesmo, e, todas as vezes em que saía para fazer qualquer coisa que fosse preciso, Sarada ficava com Sasuke. O apartamento em que ele vivia tinha um quarto para ela, mas, às vezes, quando ela estava muito enjoada, os dois ficavam na casa até que Sakura voltasse. E a sensação de Suna ficava ainda mais forte. Chegar em casa e encontrar com ele dando banho, ou ninando Sarada era algo que não pensava que voltaria a ver e que tinha sentido falta, mesmo que não admitisse.

Observou a marca esbranquiçada em seu dedo anelar esquerdo, o anel estava guardado em uma caixa de jóias em seu armário. Apesar de Sasuke não ter dito uma palavra sequer acerca disso, Sakura sabia que ele tinha notado em algum momento nos últimos dias, pois também tinha parado de usar a sua. Assim como as mãos dela, as dele também estavam vazias agora. Era um pouco estranho pensar nisso, mas não deveria ser afinal, ela já tinha pedido o divórcio, ele já tinha assinado os papéis, estavam “separados” há meses. A aliança era só um hábito que enfim foi deixado pelos dois.

— Terminou? — Ele questionou. Sakura fitou o rosto indagativo de Sasuke, que estava em pé do outro lado da mesa apontando para o prato dela. Tinha deixado metade da comida, mas estava sem fome, acenou com a cabeça e ele o pegou, levando para a pia junto ao dele.

— Não precisa lavar, só deixa aí. — Ele continuou tirando os restos de comida dos pratos.

— É o mínimo, você já preparou comida para nós dois, sem precisar. — Permaneceu sentada, observando as costas largas movendo-se através da camisa enquanto ele lavava a louça. Soltou um longo suspiro, deitando a cabeça no tampo da mesa.

— Você não disse se quer que eu traga algo do mercado amanhã — Ele disse casualmente. Sakura fechou os olhos.

Sarada era a prioridade dos dois. Tanto Sakura conhecia a rotina de Sasuke, quanto Sasuke conhecia a rotina de Sakura. Eles compravam coisas um para o outro, ficavam um na casa do outro se Sarada estivesse muito enjoada, irritadiça, com cólica ou adoentada. Essa nova rotina que surgiu era boa e ruim ao mesmo tempo.

— Não, eu não quero. Mas vou precisar que fique com ela, vou ao hospital ver quando volto a trabalhar e encarar a Hokage.

Os dias, as semanas, os meses foram passando sem nenhuma mudança brusca.

Sakura abriu a segunda porta do armário sobre a pia e pegou a garrafa de saquê — que já sabia que ele guardava para as noites de quinta com Kakashi —; encheu um copo e bebeu um pouco. Sasuke a fitava em silêncio da sala, tinha uma visão perfeita. Seu apartamento possuía apenas os quartos e o banheiro em ambientes separados o resto era uma grande sala. Quando ela começou a encher o segundo copo, ele soltou um suspiro levantando do sofá.

— Noite difícil no hospital? — Sasuke perguntou. Sakura o fitou de esguelha; ele havia se aproximado lentamente, escorando-se na bancada da cozinha a poucos metros de onde ela estava.

— Sim, chegou um grande grupo de uma missão ranking S, nenhum em um bom estado. Estou exausta e um pouco saturada. Acho que ainda não consegui voltar totalmente para à rotina.

— Tudo tem seu tempo, isso que está sentindo é a fadiga de ficar tanto tempo longe — Ela meneou a cabeça, olhando o copo semicheio em suas mãos. Sakura deu uma risada fraca, escorando-se na bancada com os ombros caídos.

— É que eu não sei se é isso que eu quero continuar fazendo. — A frase foi baixa, incerta. Sasuke desencostou de onde estava e caminhou até a cozinha, abrindo a geladeira e tirando um potinho com um pedaço de torta dentro, Sakura o fitou com uma sobrancelha erguida em questionamento.

— Naruto esteve aqui mais cedo. Então não quer mais ser médica? — Ele achava tão difícil ouvir isso que quase não dava para acreditar.

— Não! Como médica eu definitivamente continuarei, não me vejo fazendo qualquer outra coisa além disso. — Ela abriu o pote e pegou um garfo no escorredor, deixando a bebida de lado e dando uma boa garfada no quitute — Mas não sei se continuarei como cirurgiã. Eu salvo pessoas, mas eu também as perco e isso anda me desgastando demais. Obviamente, se precisarem de mim estarei lá sem pestanejar. Só que... — o tom dela se tornou mais baixo, encolheu os ombros — eu não sei, pode ser bobeira minha, mas quero trabalhar com crianças. — O olhar de Sakura estava ansioso quando encontrou o de Sasuke, havia uma pontinha luminosa nele que Sasuke não vinha vendo com muita constância. — Em Suna, quando eu estava quase tendo alta, eles me deixavam ficar na ala infantil, era maravilhoso. E agora eu só consigo pensar nisso, em começar algo totalmente voltado para assistência infantil. — Sorriu e em seguida o fitou; Sasuke também sorria, sereno, os braços cruzados em frente ao corpo. Ele estava escorado na geladeira, com os olhos fixos no rosto dela. Sakura sentiu um arrepio subir a espinha e fechou o pote em suas mãos, largando-o na pia — Desculpa, eu não quero te encher. — Agitou-se, empurrando o copo de saquê, nunca era bom beber de estômago vazio.

— Não encheu, tenho certeza que o que começar vai ser incrível. — Ele tocou ligeiramente seu ombro esquerdo, antes de passar por ela e o local formigou com o contato breve.

— Por que não passa? — ela sussurrou, passando a mão pela franja rosada.

— O que não passa? — Sakura se espantou ao ser questionado e o fitou atônita e levando as mãos para a frente do corpo, balançando a cabeça em negação.

— Nada, não é nada. É besteira. — Sasuke a avaliou por uns segundos, ela sabia que ele tinha notado algo em seu tom, porém não fez nenhuma pergunta e continuou a caminhar em direção ao corredor, até que parou, junto com a respiração dela.

— Sakura... — Sempre gostou de ouvir seu nome sendo pronunciado por ele, uma forma, um jeito de pronunciar que parecia se distinguir de todas as outras pessoas e mexia com ela como nenhuma outra coisa poderia.

— Sim?

Sasuke voltou a se virar, os olhos negros cravados nos dela, intensos, profundos, mas não diziam nada, absolutamente nada. Estava às escuras sobre as intenções dele e isso a agitava. Como um gatuno ele retomou sua caminhada, em direção a ela, Sakura sentiu suas costas se chocando contra o batente da pequena cozinha, engolindo em seco.

Todos os pelos de seu corpo se eriçaram assim que a mão dele fechou em seu braço, e está não ficou ali por muito tempo, logo ele a soltou, percorrendo os dedos até seu cotovelo e voltando a descer enquanto seu rosto ia se aproximando lentamente do dela. O silêncio era absoluto e ela tinha certeza que ele podia ouvir sua respiração agitada, sentir, seu peito subir e descer e o ar que escapava por sua boca entreaberta. Ele estava tão perto que Sakura podia sentir a inspiração dele.

— Para mim também não passe. — Os olhos dela se esbugalharam, com aquela a devolução da frase. Abriu um pouco mais a sua boca, parecia querer dizer algo, mas lhe faltavam palavras, lhe faltava vontade de dizer qualquer coisa.

Ah, ela não queria falar, não, não queria mesmo. Quando a boca dele tocou de leve a dela, todo o seu corpo pareceu relaxar, quase em alívio, em deleite. Suas mãos largaram o batente e foram direto para os braços dele, segurando-o logo abaixo do cotovelo, as mãos dele tinham ido direto para a sua cintura e aquilo que mal começava a ganhar a forma de um beijo foi interrompido por um choro estridente.

Sasuke e Sakura se entreolharam e demoraram meio segundo para se situarem. Sakura logo se desvencilhou dos braços dele tomando o caminho do quarto de Sarada, o coração aos saltos, meio tropeça e não por conta da bebida.

O que estava prestes a fazer naquela cozinha?


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Notas finais do capítulo

Gosto muito de escrever cenas da Sakura com a Ino, acho a amizade delas sempre provocante e divertida. Em qualquer lugar eu curto. Enfim, mais algumas arestas arrumadas, coisas explicadas e colocada-as em seus devidos lugares. Vamos ver onde isso chega.
Não prometo segunda que vem, mas tentarei :c
Não deixem de me dizer o que acharam;*