Broken Flower escrita por Fleur dHiver


Capítulo 33
Costumes


Notas iniciais do capítulo

Oi, sumidos /qq
Primeiramente desculpa, desculpa a todos pelo transtorno que eu causei com a minha demora e novamente um outro pedido de desculpa porque esse não é o último capítulo. Explicações sobre isso e sobre o meu sumiço no final porque não gosto de falar muito aqui em cima, então... Alê, Vanessa obrigada pela betagem.
Espero que todos tenham uma boa leitura;*



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Costumes

A hora que se seguiu, antes do parto começar, foi de pura agonia.

E, à medida que o tempo passava as contrações pioravam, o intervalo entre elas foi diminuindo gradativamente até não existir mais. Era uma contração em cima de outra, não tinha tempo de se recuperar antes de voltar a sentir uma pontada intensa em sua coluna, tão intensa que mal conseguia se lembrar de como respirar. A única vontade que tinha era de gritar e socar qualquer coisa a sua frente para extravasar.

Sakura não duvidava que, àquela altura, a mão de Sasuke estivesse toda esfolada de tanto que ela a apertava. Porém, ele não reclamou, não fez um muxoxo em protesto sequer. Mantinha-se firme ao seu lado, a ajudando como podia, passando uma toalha úmida no pescoço e testa dela, massageando seus ombros e costas sempre que ela trocava de posição. 

Quando a hora de irem para a sala de parto finalmente chegou, ele foi junto. Palavras não foram necessárias para sacramentar que esse era o desejo dela, apenas um olhar já deixava claro que continuava desejando tê-lo por perto. A resposta veio com um leve aperto em seus dedos que, pelo contexto geral, Sakura mal sentiu.

Estava cansada, saturada, acabada. Não sabia de onde ainda tirava energia para fazer força, mas fazia, se empenhava em todas as vezes que pediam — embora não conseguisse continuar olhando para a médica e as enfermeiras, que a encorajavam com frases acaloradas de incentivo. Não aguentava mais ouvir “só mais um”, “você está quase lá” ou qualquer frase genérica do tipo; queria morder a língua para não xingá-las, pois no fundo sabia que era só o seu estresse por toda a situação falando. Todos ali só queriam ajudar, queriam que acabasse logo, assim como ela.

No meio das vozes agudas e dos gritos de Sakura, um tom grave e sussurrante era pouco distinguível. Mas ela podia ouvi-lo quase sempre, não era certo conseguir entender o que estava sendo dito, mas o timbre de Sasuke era o mais presente em sua cabeça.

No começo tinha se fixado na obstetra como ponto de precisão, mantendo sua mira fixa nela todas as vezes em que precisava fazer força, mas agora, irritada com o mantra enérgico, não queria olhar para frente. A mão de Sasuke em seu ombro capturou sua atenção, fitou-o e ele deu um sorriso mínimo, desgrudando algumas mechas de cabelo de seu rosto suado.

— Vamos lá, Sakura! O bebê está coroando, só mais um pouco — informou a médica.

Podia sentir a pressão do aperto de Sasuke e o retribuiu com a mesma intensidade, fazendo dele o seu ponto de foco. Era estranho, ele parecia tenso, não calmo e incólume como sempre. Vincos se formavam em sua testa e os lábios estavam comprimidos em uma linha tênue de pura preocupação.

— Já está quase acabando! — ele exclamou.

Dessa vez não a estavam enganando. Realmente foram mais duas ou três empurradas antes do choro agudo invadir o ambiente e todo o resto perder a importância. Desabou na maca, esgotada, a respiração estava pesada e o corpo todo dolorido. Nem mesmo uma sessão de treinos tirou tanto de sua energia quanto aquele parto. Mas, apesar da exaustão, tinha uma ponta de felicidade, de satisfação e de alívio.

Um som tão alto quanto aquele choro nunca lhe foi tão agradável.

— Eu quero vê-la, quero segurá-la — Estendeu as mãos para o bebê que era embrulhado com cuidado em uma manta felpuda. 

A pequena foi posta em seus braços ainda agoniada. Ela se remexia toda e continuava chorando, mas agora era um choro mais fraco, não tão estridente. O susto já tinha passado. Sakura a aninhou em seus braços, tocando nos bracinhos que não paravam quietos. As mãozinhas dela se agitavam no ar, abrindo e fechando os dedinhos finos, com os polegares curvados para dentro.

— Ela é perfeita — ela sussurrou e se virou para Sasuke que estava bem ao seu lado, inclinado na direção do bebê. Os olhos negros estavam totalmente focados no pequeno e irrequieto embrulho, e havia um sorriso diminuto em seu rosto. Para Sasuke não havia adjetivo melhor para defini-la.

— Sim, perfeita — Seus olhares se encontraram e, naquele momento, não havia necessidade de palavras entre eles.

— Não queria ter que dizer isso, mas está na hora de dar “tchau”, papai. Nós vamos precisar terminar os cuidados com as duas. — Disse a enfermeira. Sasuke assentiu, se afastando da maca. Mas, antes que ele saísse completamente de perto, Sakura o segurou pelo braço.

— Eu quero ficar no quarto com ela, você pode ver se isso é possível?

Ele concordou com um aceno de cabeça e saiu.

Não foi apenas Sasuke quem partiu, sua filha também foi retirada de seus braços para ser devidamente limpa, pesada e para que todos os cuidados médicos se iniciassem. De onde estava pôde ver apenas a parte da checagem de peso, pois logo a levaram para outra sala e ficou apenas com as enfermeiras na sala esterilizada. Sakura foi levada direto para o quarto quando elas terminaram; Sasuke não estava ali, nem por perto. Ansiava pelo retorno da bebê, mas estava tão exausta que acabou dormindo sem perceber.

Um ruído baixo a despertou muitas horas depois. Estava deitada de lado, a janela do quarto aberta permitia que tivesse um pequeno vislumbre do pôr do sol. Soltou um suspiro, sentindo sua garganta áspera, e levou a mão ao pescoço, lambendo os lábios secos. Fitou a cabeceira à sua frente. Não tinha água.

— Verifique com o seu dedo — sussurrou uma voz calma e paciente, aparentemente, ela não estava só no quarto — Dobre, aproxime da boca dela e note se ela suga. — Sakura virou a cabeça bem devagar, curiosa, e notou as costas de Sasuke. Ele estava parado na porta do quarto, e havia uma enfermeira bem a sua frente, atenta a algo em seus braços. Ela não precisou pensar muito para descobrir o que era.

— Não. Não fez nada.

— Então ela não está com fome, o chorinho foi só por ter despertado, mesmo que breve. — Ele pareceu ter concordado com a cabeça, mas não dava para ter cem por cento de certeza pelo ângulo. A enfermeira sorriu.

— Certo, obrigado. — Sasuke agradeceu. E, na mesma hora em que ele mexeu um dos braços, Sakura se virou para que ele não a visse acordada.

Por quê? Não tinha lógica... Sua respiração se agitou, mas era bobeira; não tinha razão alguma para não querer que ele soubesse que tinha acordado. Assim como não fazia sentido sentir esse comichão e palpitação...

Ouviu o click da porta sendo fechada às suas costas e o som suave dos passos dele, acompanhado de um choro baixo. Nem sabia se podia classificar assim, foi breve e curto, mais um muxoxo do que um choro, bem diferente da sala de parto. Sasuke surgiu em seu campo de visão, totalmente atento ao pequeno embrulho que embalava com cuidado; ele estava de perfil, o corpo voltado para a janela. Houve um pequeno movimento, tão mínimo que Sakura se pegou pensando se não tinha imaginado ver uma mãozinha esticada.

Um sorriso diminuto apareceu no rosto sereno dele, antes que inclinasse a cabeça em direção à criança em seus braços. Nunca tinha visto o rosto de Sasuke com aquela expressão, um ar pacífico diferente do habitual. Parecia que nada de ruim poderia alcançá-lo naquele momento. Calmo, ele a aninhava com a destreza de quem já tinha feito isso muitas vezes antes. Sakura quis chorar, de verdade. Quis voltar a dormir por sentir que estava participando de um momento que não era dela. Esfregou o rosto no travesseiro soltando um suspiro baixo.

— Acordamos você? 

Acordamos. O plural a fez sorrir contra a fronha fina. Negou com um aceno, voltando o rosto para eles.

— Não, eu acordei sozinha.  

Sasuke pressionou os lábios em uma linha fina, engolindo o: “desculpa, por tê-la acordado”.

Espreguiçou-se, sentando logo em seguida, seus braços estavam sedentos para segurá-la também, mas, ao mesmo tempo, não queria ter de pedir. Virou o rosto, procurou outra posição, tentou focar sua atenção em outras coisas e puxou em sua cabeça algo que quisesse falar... Mas não tinha nada mais. Só queria uma coisa e, aparentemente, não estava conseguindo esconder tão bem quanto achava. Sasuke a analisava com cuidado, e, antes que ela falasse qualquer coisa, ele perguntou:

— Quer segurá-la?

Sakura soltou o ar, que nem sabia que segurava, acenando com a cabeça. Sasuke se aproximou do leito dela e com cuidado passou a pequena para os braços da mãe. Ele puxou uma cadeira do fundo do quarto para perto da cama de Sakura, apreciando a cena à frente.

Sem o frenesi do parto, podia observar cada pequeno detalhe de sua bebê. As bochechas inchadas, os olhinhos grudadinhos, as mãozinhas enrugadas... Tudo tão pequeno. Ela tinha até bastante cabelo, não apenas um pequeno tufo escuro. Uma das mãozinhas estava fechada sobre o rosto dela, e ela ressonava bem baixinho. A visão mais maravilhosa que já teve em toda a sua vida. Como era linda a sua menininha, o bebê mais bonito de todos.

— Acho que ela vai ser parecida com você. — Sakura disse, suspirando, e Sasuke encolheu os ombros. Ele estava com o braço apoiado na proteção de ferro, fitando a bebê com atenção.

— Não sei, só consigo ver um traço claro nela, o seu nariz — Ele comentou apontando e deixando que seu dedo deslizasse pela testa dela até o começo do nariz — Pequeno e com a ponta arredondada, já é um ponto seu — A voz dele não era mais que um sussurro.

Sakura se virou para fitá-lo e disse:  

— Não escolhemos um nome ainda — Ele aquiesceu, focando sua atenção nela e arrumou a postura. Mesmo que a aparência dele fosse austera como sempre, Sakura podia perceber a ansiedade em seus movimentos.

— E você já pensou em algo? — Ele questionou e ela concordou, voltando a fitar carinhosamente a filha deles.

— Pensei em vários, na verdade.

Uma lista com várias opções foi dita, indo de, Akane a Kimiko, Sakura tinha divagado por muito tempo sobre qual escolher, e, cada vez que pensava no assunto, ao invés de tirar nomes da lista, mais eram incluídos — até mesmo o nome da falecida mãe de Sasuke e alguns que faziam alusão a ele, porém ele logo descartou essa ideia. Agradeceu pela clara homenagem que ela queria fazer, mas explicou que aquele nome teria um peso, para ele, muito maior que um simples tributo. Preferia deixar o passado onde estava, de modo que a filha deles não precisaria carregar o fardo dessa história em seu nome.

Sakura continuou a dizer os nomes que tinha apreço e seus significados e ele a ouviu com paciência; só tinha um único na cabeça e não sabia se era páreo para toda aquela concorrência. Sakura dizia todos os nomes olhando para a bebê, imaginando-a grande e sendo chamada por ele, e era estranho que nenhum se encaixava com harmonia, mesmo Akane que ela tinha certeza que seria um fortíssimo candidato, ou Saeko.

— Minha opção é Sarada. — Ele disse de supetão e Sakura virou o rosto para encará-lo, saboreando aquele nome.

— Sa-ra-da — ela repetiu. Meio incomum, foi a primeira coisa que veio à mente de dela.

— É só uma opção, gosto de Akane também — disse Sasuke, dando de ombros em seguida

— Sim.

À noite, quando ela enfim conseguiu dormir, sonhou com uma menininha que a acordava no meio da madrugada para deitar-se junto a ela na cama; os cabelos escuros desgrenhados, as bochechas rosadas e os olhos, mesmo sonolentos, tão cheios de ímpeto. No seu sonho o nome Akane surgiu em sua cabeça, mas não conseguia de forma alguma chamá-la assim. Só tinha um nome que encaixava, tão incomum e tão único.

            Sarada.

            Não poderia ser outro.

(...)

Teve alta dois dias após o parto. Apesar da longa duração, não houve nenhuma complicação. Tanto ela quanto Sarada estavam em perfeito estado e não tinham porquê permanecerem no hospital por mais tempo.

Durante o curto trajeto de volta para casa alguns transeuntes os acompanharam com o olhar, curiosos demais para disfarçar, e não era exatamente por ela e Sarada que eles olhavam. Tinha passado tempo demais em Suna para que sua presença fosse atrativa no momento, mesmo com a bebê no colo. Não, eles foram atraídos por Sasuke e sua postura séria e tensa ao lado dela.

Fitou-o caminhando um passo à frente, nem um pouco incomodado em ter tanta atenção, nem mesmo parecendo notá-la. Abaixou a cabeça, deixando que um breve sorriso surgisse. Algumas coisas nunca mudavam, e ela não fazia ideia do porquê de achar isso engraçado.

Assim que entraram em sua casa, Sasuke ligou o umidificador de ar. Ele achava que o ar e a temperatura de Suna não eram propícias para um recém-nascido. Não era propício para ninguém!

Sakura preferiu não comentar que a população da vila nascia e crescia ali sem problema algum e que aquilo era uma clara implicância da parte dele; era divertido observá-lo reclamar do ar, do tempo, da secura, do calor. Não havia nada de familiar em ouvi-lo reclamar de algo. Sasuke nunca foi de fazer reclamações ou comentários ácidos, costumava deixar claro seu incômodo ou desprazer pelo olhar, expressão ou postura. Mesmo assim, mesmo sendo um comportamento atípico, a sensação que despertava nela era de familiaridade. A mesma que a dominava enquanto o observava carregar as malas para o quarto, pegar utensílios no armário da cozinha e no banheiro. Era estranho e sua nuca formigava toda vez que ficava confortável com isso. Colocou Sarada no ninho para bebê* junto à sua cama, cobrindo-a com uma manta fina. Tocou o topo da cabeça dela com a parte de trás de seu dedo indicador, fazendo uma caricia bem leve nos fios negros.

— Você deveria dormir junto com ela. Não foi isso que uma das enfermeiras disse? — Sasuke indagou e ela aquiesceu, erguendo a cabeça e o encarando na porta de entrada. Levou uma das mãos ao pescoço, desviando o olhar.

— Só vou desfazer a mala antes de deitar. Você deveria também, não? Dormiu esse tempo todo no sofá no quarto de hospital. Não deve ter descansado o suficiente também — Sakura comentou. Com os braços cruzados em frente ao corpo, ele deu apenas uma leve mexida de cabeça.

— Estou bem.

Sakura pensou em falar o que estava passando por sua cabeça. Mas o que era mesmo?

Subitamente, ela se inclinou para frente e o beijou, foi um beijo curto, acompanhado de outro e mais outro com um toque intenso que nenhum dos dois esperava.

 — Fica aqui comigo?

Ela fechou os olhos, passando as mãos pelo cabelo nervosamente, ignorando completamente a presença dele, assim como fazia com aquele pensamento. Talvez eles devessem conversar sobre aquilo, mas ela preferia não tocar no assunto por agora.

Os dias foram passando e eles entraram em uma rotina.

Sakura desfez a mala ainda pensando se deveria ou não falar alguma coisa, mas por ora descartou a conversa. E com o tempo passando e a questão perdendo a importância, mais ela se certificava de que tinha sido apenas um rompante diante do frenesi, de seu estado e de tudo que os rodeava naquele momento. Essa ideia a convencia demais, fazia sentido na sua cabeça e, a seu ver, Sasuke tinha entendido o mesmo, que se tratava de algo de momento, afinal nunca havia tocado no assunto com ela.

Eles dividiam os cuidados com a bebê, que não se mostrou tão bichinho noturno quanto era durante a gestação. Para o alívio de Sakura, Sarada costumava acordar muito pouco durante a noite. Não tinha noites ininterruptas de sono, mas ao menos dormia a noite.

Sakura queria não ficar mais admirada ao ver Sasuke com Sarada, mas era impossível. Não tinha como explicar o sentimento que a tomava quando o via sentado em uma poltrona dando de mamar; sacudindo-a de leve para que arrotasse ou zanzando à noite pela casa com ela nos braços. Ele não cantava cantigas de ninar, mas emitia um som suave que era quase uma melodia, que sempre a silenciava, prendia a atenção das duas. Sakura só não se sentia “a obcecada” porque era comum pegá-lo fazendo exatamente a mesma coisa quando era a vez dela de cuidar da bebê.

Em uma tarde, após tomar banho, encontrou os dois dormindo em seu quarto. Sasuke estava bem na ponta, servindo de barreira de um lado, e do outro tinha um travesseiro. Sarada estava no meio, de barriga para cima, bem próxima do tronco do pai. Devagar, para não acordar nenhum dos dois, Sakura puxou o travesseiro para baixo e deitou ali, indo um pouco mais para o meio da cama. Ele estava dormindo com a cabeça apoiada no braço, e a mão estendida sobre o colchão chamou sua atenção, a aliança ainda estava ali no dedo anelar dele, assim como estava no dela. Passou o polegar pelo anel em seu dedo, já estava tão acostumada que nem ao menos tinha pensado em tirar durante todo esse tempo.

Sarada chiou baixinho, espreguiçando-se, mas logo parou. O ruído o acordou. Sasuke passou a mão pela barriga da filha, antes de voltar a atenção para Sakura deitada na outra extremidade.

— Não queria ter dormido aqui —Fez menção de se levantar, mas Sakura o segurou pelo braço, balançando a cabeça.

— Está tudo bem. Pode vir cochilar aqui na cama sempre que quiser, eu sei que só ficar naquele sofá vai acabar te fazendo mal.

Ele negou, voltando a descansar o corpo no colchão

— Está tudo bem.

Sakura engoliu em seco ao ter os olhos de Sasuke sobre si; tentou não encara-lo, focando sua atenção no bordado do lençol, em Sarada, no abajur em cima do criado-mudo atrás da cabeça dele. Mas quanto mais fugia, mais sentia vontade de olhar para ele e principalmente mais consciente se tornava de estar sendo encarada. Por fim, não teve jeito. O olhar de Sasuke queimava, uma devastação pronta a acontecer. Parecia que tanta coisa passava por sua cabeça, mesmo que só o olhar dissesse, pois ele continuava em sua postura austera, incólume. Por um breve instante ele ergueu o braço, e ela chegou a pensar que ele o esticaria em sua direção. Porém, se essa foi mesmo a intenção, ele desistiu antes mesmo de começá-la. Descendo-o sobre a própria cabeça.

— Sasuke...

— Hum...

— Nós não falamos sobre aquele momento no hospital, durante o trabalho de parto... O beijo e todo o resto — Sasuke desviou o olhar, virando e ficando de barriga para cima, focando-se no teto do quarto. Sakura engoliu em seco. — Eu, eu... não sei bem como começar... Naquele momento eu me sentia tão confusa, desamparada, desesperada. Estava tudo misturado dentro de mim, sentimentos bons, sentimentos ruins, tudo a mil por hora... — ela sussurrou, encolhendo os ombros. Nenhuma alteração surgiu no rosto dele — Eu estava muito feliz por tê-lo ali, pelo apoio e...

— Eu sei. Não se preocupe, não precisa se justificar. Foi uma coisa de momento, não foi? Eu já estava ciente disso. — Sakura balançou a cabeça em resposta, mas ele não a encarava, tinha se sentado na cama de costas para ela e puxava o travesseiro que ela tinha empurrado para baixo.

— Sim, eu... — quase disse que sentia muito, mas não queria pedir desculpas, não queria mesmo.

— Eu já imaginava que tinha sido isso, mas o que eu falei para você — ele ficou de perfil, olhando-a por um momento antes de desviar novamente — não foi algo de momento. Foi bem sério. — A respiração dela se agitou ao ouvir aquilo. Ele se levantou e ela ergueu o tronco na mesma hora, seguindo-o com o olhar.

— E como eu poderia acreditar nisso? — Sasuke parou seu caminhar, encarando-a de lado. — Como eu poderia, depois de tudo, acreditar que sempre estaria do meu lado? Isso é uma novidade, não? — Ansiosa, lambeu o lábio inferior, desviando sua atenção à Sarada, certificando-se de que a conversa deles não estava perturbando o sono dela.

— Sakura.

— Não! Eu sou muito grata pelo apoio nas últimas semanas, por estar aqui, mas isso não apaga nada, isso não muda o fato de como eu me sentia dentro daquela casa, de como eu me sentia vivendo com você! Não apaga a Karin, muito menos a garota, a garota... — Cruzou os braços em frente ao corpo, soltando um longo suspiro. — Eu acho que lembro daquela noite. O cheiro estranho... Você me jurou que não havia outra pessoa.

— E não havia... — Ele disse sério, seu tom levemente alterado. Sakura deu uma risada nasalada. — Falo sério, minha justificativa sempre vai ser imprecisa com relação a isso e dizer que ela não tinha significado algum parece uma desculpa previsível, mas é a verdade. Eu estava bêbado, eu não a enxerguei, não foi ela que eu desejei... — As palavras dele se desvaneceram, desaparecendo no ar, e Sakura juntou as pernas em frente ao corpo, passando ambos os braços ao redor delas.

— Mas foi ela que você teve. — O tom de Sakura foi dolorido, amargo e ele engoliu em seco. — Isso não justifica, na verdade, torna tudo ainda pior; se me desejava então por que me deixava de lado? Por que me tratava com tanta indiferença? Por que me repelia? Nunca me senti tão só ou abandonada quanto vivendo com você naquela casa.

— Porque eu não me entendia. — Sasuke disse, soturno, o tom pesado, não a encava. Ela ergueu o olhar para fitá-lo, mas logo desviou. — Culpa e vontade se misturavam dentro de mim, na maior parte do tempo eu não sabia quando uma começava e a outra terminava, mas eu fechava os meus olhos para a segunda parte e focava apenas na culpa. Eu não merecia você, mas eu a queria e por isso me punia e punia você junto.

Ouvir essas palavras não trazia o consolo que Sakura esperava; ela entendia o sentimento, mas não mudava nada dentro dela.

— Sakura, eu não te pedi perdão pessoalmente, mas peço agora. — Ela ergueu o olhar. Sasuke parecia ansioso de novo, agitado; ele a olhava fixamente e sacudia as mãos como em um tique — Não peço para que volte, nem que esqueça, apenas que me desculpe e, se possível, que me perdoe.

(...)

Com todo cuidado do mundo, Sakura prendeu Sarada no canguru de pano, bem amarrado ao seu tronco. Ela dormia tranquilamente sem se importar com a movimentação da mãe. Ela pegou sua mochila de viagem, colocou nas costas e soltou um longo suspiro ao observar o interior da casa onde tinha morado nos últimos meses. Finalmente estava voltando a Konoha.

Sasuke partiu três semanas após o nascimento de Sarada, e os primeiros dias sem ele foram tumultuosos. Sakura tinha se acostumado com a rotina de turnos e principalmente em ter a sua presença constante, mesmo que isso fosse sinônimo da sua própria perturbação.

Antes de ele partir, combinaram de voltar a trocar mensagens sempre que necessário e que a volta dela ocorreria depois de dois meses. Sasuke não estava muito contente, não que ele quisesse que elas continuassem em Suna, mas ele achava que Sarada ainda seria pequena demais para essa empreitada.

Foi preciso insistir muito para que ele concordasse com apenas dois meses; ficou acordado que ele viria para levá-las. Sasuke achava arriscado demais uma pessoa só viajar com um bebê tão pequeno, e ela preferiu não protestar, afinal voltaria para Konoha. Porém, o problema agora era que o período definido já tinha estourado. Ele estava preso em uma missão e atrasado quase um mês.

Não tinha como continuar esperando.

— Tem certeza que vocês duas vão ficar bem? — questionou o Kazekage, agitado, enquanto observava Sakura fechar a porta da modesta residência. — Eu não sei o porquê da pressa, você e Sarada são muito bem-vindas em Suna — ele disse num tom moderado, não querendo parecer insistente, apesar de desejar que elas ficassem ali. 

Sakura sorriu. O que ele dizia não era uma mentira, Suna a havia acolhido com muito carinho.

— Eu sei que nós somos, mas eu estou sentindo muita saudade da minha vila e dos meus amigos. Chegou minha hora de voltar. — Apesar de não estar cem por cento de acordo, Gaara aquiesceu. — Eu só tenho a agradecer a você por tudo. Você foi um amigo imprescindível, eu acho que não sou nem capaz de expressar a minha gratidão direito, mas tenha certeza de que ela é enorme — Ele abaixou a cabeça, um meio sorriso atravessado.

— Não quero sua gratidão, Sakura, nunca quis. — Sakura desviou o olhar, dando uma leve enrubescida — Tenha certeza que eu sempre estarei aqui para o que precisar.

Como não iria com Sasuke, Gaara fez questão que ela fosse acompanhada por dois ninjas de Suna, ao menos até a fronteira do País do Fogo e, mesmo contrariada, aceitou a oferta não querer ter que adiar ainda mais sua partida. Era aguardada nos portões de Suna e cada passo dado naquela direção era acompanhado de uma agitação sem tamanho. Seu coração estava aos saltos, sentia-se tão ansiosa que até acompanhar a conversa tranquila do Kazekage, o qual caminhava ao seu lado, ficava difícil. Sua mente estava a mil e com um foco só: Konoha.

A volta para a vila foi relativamente tranquila, não houve nenhuma tempestade, nem adversidade. Sakura teve que fazer mais paradas que o usual por conta de Sarada, mas isso era o de menos e a pequena quase não deu trabalho durante o percurso.  Quando enfim os portões de Konoha surgiram à sua frente, seu coração palpitou e os olhos se encheram de lágrimas. Nem dava para acreditar que estava outra vez em casa, com o seu povo. Sentiu falta da vila todos os dias. Falta de seu cheiro, de seu tempero, de sua cor, de sua gente... Mas ali, a passos de estar em seu lar outra vez é que essa saudade se fez muito mais acentuada. Dolorosa.

Mal podia esperar para ver todos os seus amigos, o hospital, Tsunade, apresentar Sarada para todos eles. Cruzou os portões e toda a avenida principal com um sorriso enorme no rosto, um sorriso de puro contentamento. Queria abraçar a todos os transeuntes que cortavam seu caminho, saudando seus conterrâneos. Olhava tudo, o comércio, a fachada das lojas e prédios, chegou a reconhecer um funcionário ou outro do hospital, mas não foi vista por eles.

Tudo igual, tudo exatamente como ela tinha deixado antes de partir, menos o clã Uchiha. Parou em frente ao portão de entrada do bairro meio descrente do que estava vendo. Homens iam e vinham, carregando todo o tipo de material de construção. O que estava acontecendo ali? Por que Sasuke não disse, nenhuma vez sequer, que uma obra estava acontecendo onde ele morava?

Sarada começou a chorar, irritada pelo barulho constante do local, e Sakura a aninhou em seus braços e se afastou da entrada do Bairro Uchiha. Decidiu ir em direção aos fundos, onde ficava o lago, e caminhou pela orla dele, que não tinha nenhuma movimentação. Apesar de ouvir um ruído aqui e outro ali, eles eram bem menos frequentes naquela parte.

Não tinha a intenção de ficar na casa de Sasuke, mas como tinha vendido seu apartamento antes de casar e estava fora de cogitação ir perturbar Naruto, que já tinha um bebê em casa para cuidar, ela pensou que ao menos a primeira noite passaria ali. Porém não tinha como, aparentemente nem a residência principal fugiu das obras. Queria não se sentir incomodada por Sasuke não ter falado nada sobre toda essa zona no clã, mas se sentia. Onde ele estava vivendo?

Voltou para o centro pensando na melhor pousada para passar aquela noite. Não lembrava quanto dinheiro tinha restado do seu tempo em Suna, provavelmente não muita coisa. Teria que pegar mais no banco, parou no meio da avenida, olhando para a rua às suas costas e cogitando se iria primeiro resolver a questão do dinheiro ou da pousada. Precisava de um banho desesperadamente.

— Sakura? O que faz aqui? Sasuke não ia buscar vocês? — Kakashi surgiu na sua frente, quase como uma aparição divina.

— Kakashi! — Precipitou-se em direção ao antigo sensei, abraçando-o da melhor maneira que podia. — Senti muito a sua falta, apesar de você não ter se dado ao trabalho de me escrever nem um mísero bilhetinho — O copy-ninja deu uma risada breve, parecendo ligeiramente constrangido pelo comentário.

— Eu tinha notícias sobre você constantemente pelo Sasuke, e às vezes pelo Naruto. Perdão por não ter falado nada. — Ela chegou a pensar que não se importava com a reaproximação deles, mas tinha uma pontinha de ressentimento.

Não entendia o que tinha acontecido ali, o que os aproximou, mas, de uma certa forma, parecia ter surgido um abismo entre ela e Kakashi. Coisa que antes havia entre ele e Sasuke.

— E cadê ele afinal? — Kakashi indagou, e Sakura deu de ombros. 

— Ainda deve estar na missão. Ele estava demorando demais e eu resolvi vir na frente — ela respondeu. Kakashi fitou a criança bem amarrada ao tronco dela, puxando a borda do tecido que cobria o rosto da pequena.

— Aqui está a famosa Sarada. — Ele tocou a cabeça dela, fazendo uma leve carícia — Parece com você.

— Um pouco, mas parece mais com o Sasuke. — Ele concordou com um breve aceno, ainda fitando a bebê. — Quer segurar?

— Não! — Ele deu um passo para trás, sacudindo ambas as mãos à frente do corpo. — Não gosto de segurar crianças tão pequenas. Naruto já me obrigou a pegar em Boruto e não quero repetir a dose, quando ela estiver maior eu me aventuro.

— Certo. Kakashi, eu fui no bairro Uchiha... — Ele a fitou com atenção. Era difícil ler alguém que só tinha um olho à mostra e apesar de já ter se habituado a isso, Kakashi assumiu a sua melhor “máscara” de neutralidade ao ouvir as palavras iniciais dela — ... e não entendi o que estava acontecendo lá. O que é toda aquela obra? Você sabe? 

— Sim, ele está sendo reconstruído para tornar as antigas residências habitáveis. Sasuke planeja abrir o bairro, alugar as casas, fazer aquela parte da vila ganhar vida outra vez.

Uma lembrança muito antiga surgiu na cabeça dela, algo que Sasuke queria dizer a ela, mas que não ouviu na época. Foi logo após a carta de Gaara, a briga, tudo desandando na vida deles.

Será que era sobre isso que ele queria falar?

— Ele vai alugar até a residência principal? — Estava surpresa, sabia bem o apego que ele tinha por aquela casa.

— Não, essa não. Vocês não conversaram sobre isso? — O olhar dele parecia sondá-la e Sakura desviou, voltando sua atenção a Sarada que continuava a dormir, com a bochecha esquerda apoiada em seu colo — Lembra dos papéis que eu deixei com você? — Ela aquiesceu.

— Sim, eu me lembro, mas não chegamos a conversar sobre isso na época. Ele até comentou alguma coisa por alto, mas não passou disso — Deu de ombros, não queria se aprofundar naquele assunto, relembrar o quão conturbada estava a sua vida naquele período. Já tinha passado, mas novamente sentiu um incômodo ao imaginar que ainda existiam segredos entre eles.

— Estou contente em vê-la, você parece muito bem. — Sakura sorriu junto com o Hatake, ele balançou a cabeça em direção ao centro. — A vila não é a mesma sem você. — Ela enrubesceu pelo comentário, encolhendo os ombros, feliz por ele não ter insistido em pressioná-la com o outro assunto.

— Obrigada, eu me sinto muito bem. Renovada — Ajeitou a mochila em seus ombros e com a outra mão, segurou o canguru de Sarada pela parte de baixo. — Eu preciso ir. Ainda tenho que procurar algum lugar para passar ao menos essa noite. Nos vemos por aí, Kakashi.

— Espera! Como assim um lugar para passar a noite?

— Ué, a casa principal está sendo reformada, não tem condição... — Kakashi balançou a cabeça, estendendo uma das mãos para interrompê-la.

— Mas e a casa no centro? A surpresa? Sasuke mandou entregar um berço lá, uma cama e mais algumas coisas. Achei que você fosse para lá. — Sakura o fitou completamente atordoada, Kakashi estava falando sobre coisas que ela não fazia ideia. Até onde ela sabia, eles só tinham uma casa, nunca ouviu falar em uma segunda residência, ainda mais fora do clã.

— Sasuke alugou uma casa durante a reforma no bairro? Eu não tenho a chave dela. — Kakashi meneou a cabeça em negação, soltando um longo suspiro em seguida.

— Não, ele não alugou uma casa. Comprou uma, mas não foi agora tampouco e ele não está morando nela. Mora em um apartamento no meu prédio. — O ex-sensei se aproximou tirando a bolsa pesada dos ombros dela. — Vem comigo que eu te levo até lá.

— Não sei se ele iria querer...

— Eu fiquei com uma chave para receber alguns móveis, é para vocês ficarem lá, eu tenho certeza. — Ainda atordoada com as informações, ela o acompanhou sem protestos. 

Kakashi a guiou pelas ruas da vila. Eles foram em direção a um bairro familiar que ela conhecia, próximo ao centro, a academia, duas quadras antes do hospital e a uns 15 minutos da residência de Naruto. Uma ótima localização, com uma boa vizinhança também. Pararam em frente a uma residência de dois andares e que tinha um jardim modesto na frente.

— Seja bem-vinda à sua nova casa.

— Minha casa? — Ela o fitou surpresa, e ele aquiesceu. Parado em frente à porta, Kakashi soltou a chave de seu molho e estendeu na direção dela, junto com a mochila que vinha carregando. Sakura pegou as duas coisas no automático, ainda aérea, meio descrente e sem entender o que estava acontecendo. — Obrigada.

— Disponha. Quer que eu traga algo para você comer? Acho que a despensa está fazia — Ele ofereceu e ela negou com um aceno.

— Pode deixar que eu me viro — Sakura respondeu, e com um sorriso e um tapinha no ombro, ele seguiu em direção ao centro e ela ficou parada em frente à porta da sua casa.


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Notas finais do capítulo

Eu imagino que todos queiram me matar e com razão. Não sei como começar a me explicar porque tudo que eu tenho para falar pode não ser o suficiente para aplacar o ressentimento de você e eu entendo. Não acredito que seja uma novidade para muitos aqui porque eu costumava falar na minha página e com quem me perguntava que eu estava/estou tendo muita dificuldade com esse final. Não sei quantas vezes ele foi reescrito para chega onde está e isso me frustava demais e eu fui desanimando, desanimando... Larguei ele uns meses, eu precisava me forçar a escrever e ainda assim não dava liga. Ai vinha a faculdade, trabalhos, bicos, lol - que eu comecei a jogar ano passado e está destruindo a minha vida.
Eu acho que só fui "aceitar" ele no final do ano passado e mesmo assim já mexi um bocado e tomei a decisão de não terminar aqui.
Lá atrás quando eu idealizei essa fanfic, após a carta do Sasuke teriam poucos capítulos e eu encerraria. E eu vim tentando fazer isso, mas não importa o que eu fizesse a finalização só fracassava, não importa para onde eu olhasse eu sempre sentia que ainda tava faltando alguma coisa. E reescrevendo um pedaço do final esse ano, eu tive a ideia de enfiar mais coisa, que eu precisava explicar mais coisas então provavelmente deve ter mais uns quatro capítulos depois desse. E ai é o fim definitivo, dois ou um (depende de como vai ser o corte) já está pronto, posto segunda que vem e o resto vou escrevendo. Mas agora eu realmente to de boa com isso, sem achar que faltam coisas, então a escrita vai fluir.
Eu sinto muito, espero que ainda tenha alguém acompanhando e que vocês tenham gostado.