Darker Than Black escrita por MsRachel22


Capítulo 4
Bad Blood




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4 - Sangue Ruim

[00:42] 10/7 — Setenta e dois dias antes, Distrito de Osaka

— Ele está morto?

— Não, apenas inconsciente. Não, não toque nele. Ele está doente, querida... Ele precisa dormir para ficar bom, sabe?

— Como quando eu fiquei doente? Ele só precisa dormir mãe?

— Ele só precisa dormir; nada mais do que isso querida. Não podemos fazer mais do que isso. Por que você também não vai dormir um pouco, hã? Pela manhã ele estará bom.

Houve uma longa pausa. A voz infantil não parava de ecoar em minha mente e abrir os olhos parecia ser algo extremamente difícil. Senti um toque suave contra minha testa e um aperto tão suave quanto em minha testa. Meus cabelos forma mexidos suavemente.

— Fica bom logo, tá? Minha mãe me disse que você só precisa dormir, mas eu sei que você quer acordar. Então vê se acorda logo, assim a gente pode brincar tá? — ela sussurrava contra meu ouvido. Outro afago macio e suave contra minha testa. — Se você for bonzinho, eu deixo você comer um biscoito. Boa noite.

Ela puxou uma coberta e me cobrira até os ombros. Passos suaves contra o chão logo em seguida. Tudo parecia parte de um sonho, eu tentava mover as pernas e os braços, mas eles simplesmente não se mexiam. O escuro me abraçava, de novo e de novo enquanto o barulho de sirenes explodia em meu cérebro repetidamente.

As palavras se misturavam, em volumes diferentes, em vozes diferentes. Logo eu sentia meu corpo arder e meus músculos queimando vagarosamente. Com dificuldade consegui abrir os olhos e olhar em volta, mas eu apenas enxergava borrões coloridos enquanto meus olhos doíam.

— Mamãe? Ele está morto?

E mais uma vez, minhas pálpebras pesaram e a escuridão e o silêncio me imobilizaram. A voz infantil serpenteava em minha mente, as informações do noticiário sufocavam qualquer som e parecia que meus membros eram retirados um a um e colocados em seus lugares de novo. Havia dor e agonia e uma pressão contra meu peito.

Subitamente abri os olhos e o ar entrou rápido demais em meus pulmões. Desta vez, eu conseguia mover as pernas e os braços. Eu sentia espasmos dolorosos roendo minha carne e meus batimentos cardíacos doíam contra o peito.

— Respire, respire seu canalha! — a voz de uma mulher invadiu meus tímpanos, era raivosa e desesperada. — Respire. Ei, ei, ei. Fique calmo, você quase teve uma parada cardíaca. Não se mova.

Eu não sabia ao certo quanto tempo se passou até que eu obtivesse certo controle sobre meu corpo. Olhei em volta e algumas pessoas estavam assustadas e outras estavam afastadas e encolhidas. Entretanto o som alto de grunhidos e batidas contra a porta chamou nossa atenção. O silêncio predominou o cômodo com uma camada de pânico enquanto as batidas ganhavam mais força e os grunhidos ficaram tão altos quanto qualquer outro som.

Respirei fundo enquanto a mesma mulher de cabelos róseos me amparava.

— O que aconteceu? — murmurei, pois era a questão mais óbvia e urgente a ser respondida enquanto um turbilhão de perguntas ziguezagueava em minha mente.

— Você precisa descansar inferno. E não faça tanto barulho, você pode chamar a atenção. — ela retrucou irritada, porém sua voz estava baixa e denunciava seu nervosismo.

Lentamente consegui me levantar, sentindo os músculos endurecendo a cada movimento. Aquilo doía profunda e continuamente.

— Não podemos ficar aqui. Não é seguro o suficiente... —anunciei tentando soar o mais calmo possível. Nitidamente, eu falhava. — As coisas lá fora... Elas não estão boas.

— E não podemos simplesmente sair rapaz. Isso... O que quer que esteja acontecendo, o governo vai dar um jeito nisso. Só temos que esperar. — um homem de cabelos brancos retrucou calmamente; tão convicto de que suas palavras traziam algo de confiável e verídico nelas que chegava a ser impressionante e estúpido.

— Você viu o que está acontecendo lá fora? — desta vez, a mulher loira questionou com certo desgosto e cinismo na voz. — O governo se foi, ninguém virá nos salvar. — ela ditou cada palavra com temor e irritação.

— O mundo sempre enlouquece de tempos em tempos, senhora... É apenas mais um desses tempos. — um homem retrucou; ele estava agachado próximo à escada, segurando uma garrafa de vinho fechada e a rodopiando nas mãos.

Eles estavam insanos. Cegos demais para admitir que o mundo estivesse fora do eixo ou sem qualquer tipo de lógica que pudesse explicar claramente o que estava acontecendo. Entretanto, eles ainda continuavam convictos. Todos eles.

— Nós temos que sair da cidade. — insisti novamente.

— Eu soube que policiais estão escoltando as pessoas para fora da cidade. — o velhote disse com a mesma convicção na voz, como se estivesse comentando sobre algo banal e sem importância.

E eu quis, realmente, rir da maneira mais cínica e forçada que pudesse.

— Os policiais estão matando as pessoas! Eles não dão a mínima se você estiver doente ou não, velhote. — retruquei avançando tropegamente em sua direção. Seu olhar continha alarme e descrença. Mas não parecia o suficiente para convencê-lo. — Não vai levar muito tempo até eles encontrarem esse lugar.

— Mas... Os policiais são bonzinhos. — a inocência na voz daquela garotinha era palpável e desesperada por razão. — Eles salvam pessoas, certo?

Ela ainda é uma criança, uma parte de minha mente apontava com certo desgosto. Somente uma criança. Ninguém se pronunciou por uma quantidade de tempo que parecia eterna.

— Isso não tem mais importância, garota. A verdade é que nós temos que sair daqui. — a mulher loira interveio cruzando os braços. — Há uma saída de emergência por aqui?

— Sua saída está bem ali, dona. — o mesmo rapaz próximo à escada respondeu com um sorriso torto nos lábios. Ele apontou para a única porta no cômodo, soltando um riso curto logo em seguida.

— Eu não entendo por que vocês querem tanto sair se vocês mesmos disseram que as coisas não estão boas lá fora... — a mãe da garotinha falou com reprovação. Nítida e clara reprovação.

— Há quanto tempo vocês estão aqui? — a mulher de cabelos róseos questionou.

Eles entreolharam-se rapidamente, como se ponderassem o quanto iriam falar.

— Bem moça, estamos aqui desde... Talvez desde cinco dias ou pouco menos, não temos uma noção exata das horas... — o velhote disse com calma e gentileza. — O mundo não pode ter enlouquecido em cinco dias.

Mal sabia ele como foi infeliz aquele tipo de ironia.

— Socorro! Por favor, abra a porta! — alguém gritava desesperadamente enquanto esmurrava a porta. Os gritos aumentaram tal como as batidas. — Por favor, abram a porta!

— Ei, abram a porta! Nos ajudem! Por favor! — a voz de outra pessoa - talvez um garoto entre dez a doze anos - soava mais desesperada que a anterior. E foi o que bastou para aumentar a tensão no cômodo.

— Há uma criança lá fora. Temos que abrir. — o velhote ditou e dirigiu-se para a porta. Quase imediatamente entrei em seu caminho, ignorando a dor em meus músculos e os gritos. — É uma criança! — ele disse persuasivo, como se suas palavras pudessem justificar o que estava prestes a fazer.

— Também há uma criança aqui. — retruquei tentando conter o pânico que escalava minha espinha. — Vocês também têm vidas a manter por aqui. Olhe em volta. O mundo está insano demais, então não abra a maldita porta.

Encarei-o fixamente, esperando que ele entendesse, mas ele apenas sorriu e me deu dois tapas camaradas sobre o ombro, balançando a cabeça negativamente.

— Eu não me arrependo de ter lhe ajudado, então isso significa que o mundo não está tão insano, rapaz... — ele permaneceu sorrindo e avançou para a escada.

Olhei em volta e todos vacilavam entre a compaixão e o temor. A garotinha estava agarrada aos braços da mãe e seus olhos brilharam de pânico e inocência. Não adiantou pedir que o velhote parasse ou que ele entendesse o que realmente estava acontecendo, afinal nenhum de nós sabia o que de fato acontecera.

Mas era óbvio - até mesmo para a garotinha - que o velhote estava nos condenando.

[04:57] 25/9 — Agora, Naniwacho

Minhas costas doíam intensamente pelas longas horas de vigia. O silêncio era quebrado apenas pelo próprio vento e pelos poucos insetos que ousavam emitir qualquer som. Ouvi o som de passos, mas permaneci na mesma posição.

— Vá dormir. Você tem estado assim há dois dias. — Karin disse entediada com qualquer coisa.

— Me diga algo que ainda não notei, Karin. Algo totalmente significante ou que realmente me interesse. — retruquei relaxando levemente as costas e logo depois continuei agachado.

Estávamos no terraço da loja. As grades altas evitavam uma queda não desejada de uma altura considerável. Algumas caixas estavam empilhadas em poucos cantos dali e papéis estavam amassados e manchados de sangue próximos às caixas e à escada que dava acesso ao segundo andar.

A visão obtida daquele ponto talvez fosse encantadora algum tempo antes. Por hora, havia corpos sobre os terraços vizinhos e abandono.

— Temos certas diferenças. — a voz de Karin chamou minha atenção novamente. — Talvez muito grandes para dois irmãos, não é seu pequeno bastardo? — ela disse como se aquilo a irritasse e a divertisse ao mesmo tempo.

— Algo interessante, Karin. — repeti. — Notável; inusitado. Ao menos conhece essas palavras?

Ela encostou o cano do seu rifle em meu pescoço, mas aquilo não me fez desviar o olhar dos terraços vizinhos e das ruas estreitas.

Pou! Acabei de matar você! Pou, pou, kaboom! Metralhei a sua cara esquisita e explodi seu corpo. — ela murmurou sem perder o humor na voz. — Se não tomar cuidado, vou explodir seus miolos com uma escopeta.

— É isso aí pirralha. Agora vai me contar o que está acontecendo ou vai continuar brincando? — perguntei levantando, mas ainda sem encará-la. Meus ossos e músculos reagiram rapidamente.

— Às vezes seria melhor se você tivesse nascido mudo, eu me divertiria mais... — ela retrucou afastando a arma da minha nuca e chutando alguma coisa em seguida. — Eu vou perguntar isso somente esta vez e gostaria mesmo que você me respondesse sinceramente.

Arqueei a sobrancelha levemente, pois havia seriedade demais na voz de Karin e aquilo me incomodara claramente. Ela respirou fundo duas vezes e depois mais outra; era fácil notar que ela estava nervosa.

— Você realmente trocaria a Haruno por alguns remédios?

Internamente, eu queria rir daquela pergunta. A resposta era óbvia. Mas por um minuto eu realmente quis rir.

— Sem hesitar. — respondi em seguida. Provavelmente Karin me encarou alarmada ou descrente. — Não me venha com lições de moral, Karin. Você já fez pior.

Ela ficou em silêncio logo e permaneceu assim por um bom tempo.

— Você faria isso comigo? Me trocaria por um punhado de remédios? Fácil assim, Naruto? — ela questionou fria e secamente; encarei-a e seu olhar era quase insuportável. Pedia uma clemência e um gesto de humanidade que não estavam acessíveis.

— Eu não posso responder isso, porque eu não posso ser o cara legal, Karin. Eu não posso salvar todos. — murmurei soando o mais irônico possível.

— Não tente bancar o mártir comigo, seu canalha! Não comigo! — ela retrucou no mesmo instante, sem conter suas emoções ou palavreado. — Não quero que você salve o mundo, não mesmo. — ela murmurou retomando o controle sobre si. — Mas eu preciso confiar em você, seu grande pedaço de merda!

— E que se fodam os bons modos... — rebati.

— Se você não me conseguir ver como sua família e somente como uma moeda de troca, então eu não posso ficar e segui-lo. — aquelas palavras soavam e era um ultimato.

O nascer do sol, bem a nossa frente, irritava levemente meus olhos devido à claridade repentina. Minha mente dava voltas sobre qual seria a melhor contrarresposta, mas todas seriam hostis. E isso, de algum modo, importava.

Permanecemos em silêncio por mais alguns minutos, enquanto os raios solares pareciam ganhar pequenas doses de intensidade de tempos em tempos. Os céus deixavam de ser cinzentos e ganhavam tons azuis entre as nuvens passageiras. Suspirei levemente. Nada tinha traços de normalidade, não adiantava procurar por eles. Se foram tal como o mundo que conhecíamos.

— Definitivamente, não somos os melhores irmãos do mundo. — murmurei por fim. Karin me encarou com receio. — Não mesmo.

— Se eu não puder confiar em você, então vou testar minha sorte na estrada. — ela retrucou seriamente. — Porque você é o que me sobrou neste mundo, e se eu não puder contar com meu irmão, droga! Eu preciso saber se posso contar com você, Naruto.

Novamente um ultimato. Parte da minha mente me ordenava a ignorar Karin e seus dilemas, enquanto uma pequena e barulhenta parte impunha ações humanas demais, palavras que trouxessem conforto numa época desolada. Suspirei frustrado e franzi a testa.

— Inferno! Você fala como a mãe. — retruquei e balancei a cabeça negativamente. Massageei a nuca e a encarei. — Eu queria ter nascido surdo, assim não ia ouvir tanta merda saindo da sua boca, pirralha.

Ela riu e esbarrou sua arma contra meu braço.

— E você age como nosso pai, pivete. — ela retrucou e soltei uma risada cínica. Logo o silêncio se impôs mais uma vez. — Se eu não posso confiar em você, então tome a decisão correta sobre esse grupo.

Suspirei mais uma vez e encarei os terraços e os prédios que compunham parte da cidade. Tudo estava nitidamente morto e quebrado. Nada além do normal. De algum modo nenhuma palavra de Karin ou seus argumentos deveriam incomodar. O silêncio instalado entre nós era preocupante - até certo ponto somente.

Humanos sempre seriam piores que infectados. A grande diferença entre ambos é que matar infectados ainda era justificável e consentido. Simples assim.

— Vigie. — murmurei me afastando, mas a tempo de ver a descrença preencher o rosto de Karin imediatamente. — Você queria uma decisão; aí está.

Ela esboçou um meio sorriso e se aproximou com certa calma.

— Você sabe como estragar um momento bom. Eu realmente iria me divertir se você fosse mudo. — Karin retrucou cinicamente e chutou minha canela moderadamente, apenas como nos velhos tempos.

— Você sabe que eu só posso confiar em você, mas não vou impedi-la de tomar suas próprias decisões. — disse tentando ignorar a parte sensata do meu cérebro que gritava como aquilo era fraco e imbecil. Mas, insanamente, ainda havia lógica e isso importava. — Só posso fazer isso, Karin. Não peça mais.

Ela chutou minha canela mais uma vez e eu soube que, pelo menos por hora, tudo estaria bem.

— Você fala como uma garota dramática... — ela murmurou como se aquilo a incomodasse. — Isso é estranho.

— Vigie. — repeti apontando para sua arma. Retomei meu caminho para a escada.

— Ei! Eu já salvei seu rabo, tenha mais respeito, pivete! — ela disse sem qualquer censura.

— Vigie.

[01:24] 10/7 — Setenta e dois dias antes, Distrito de Osaka

(Reign of Chaos)

Aquele sentimento que preenchia silenciosamente o lugar talvez fosse a essência mais pura da agonia e do pânico. Simplesmente carregava o ar e enrijecia os músculos; havia uma descarga absurda de adrenalina no ar, tão palpável quanto o medo.

Tudo acontecia lenta e rapidamente, os passos do velhote pareciam infinitos, os degraus pareciam encurtar a distância até a porta e lentamente todos recuavam. Os olhos da garotinha brilharam de medo - puro e intenso.

Não adiantou gritar quando a tranca fora aberta e as duas pessoas que batiam insistentemente na porta adentravam apressados, trazendo consigo um deles. Ele rosnava e se contorcia horrivelmente, como se estivesse tendo um ataque epilético. A garotinha gritava enquanto o infectado serpenteava entre os corpos dos dois recém-chegados e os derrubava. Ele montou no garoto. E simplesmente o rasgou.

O sangue fresco chocara a todos. O homem ao pé da escada levantou aos tropeços e tentou correr, entretanto mais um deles entrou, pulando e girando seu corpo, lançando-o para dentro. O velhote correu, tentando ajudar o garoto que fora estraçalhado, agonizando e gritando. Ninguém conseguia se mover diante da cena, ninguém podia desviar os olhos.

Os infectados estavam sujos de sangue, rosnavam como animais. Não havia rastros de humanidade neles. E num segundo um deles olhava fixamente para mim.

— MERDA! CORRAM! RÁPIDO! — alguma das mulheres mandou. A garotinha continuava gritando. Os mais bravos tentavam enfrentar uma daquelas criaturas, mas não sabiam o que fazer. — CORRAM!

O grito da garotinha chamou minha atenção e subitamente corri falhamente em sua direção. Olhei em volta rapidamente e os infectados continuavam entretidos com os corpos estirados no chão e com o sangue. Agarrei a garotinha com força, enquanto ela continuava chorando e gritando. Tremulamente sua mãe levantou e correu na frente.

Eu não sabia exatamente o que olhar: os corpos destroçados ou a mãe da menina sendo puxada e arranhada. Tudo era surreal e era sangrento. A violência estava em cada aspecto, a cada urro eu forçava minhas pernas a correr mais rápido e apertava mais a menina em meus braços.

Havia gritos de horror, pedidos de ajuda e grunhidos tão altos quanto. Eu não sabia mais quantos segundos ou minutos haviam se passado quando alcancei as escadas e corri até a porta o mais rápido que consegui.

E quando alcancei a saída, os focos de incêndio sobre os prédios e em vielas nas ruas eram chamativos. Uma tropa de policiais marchava mais a frente, todos estavam com máscaras anti gás e fortemente armados. Pessoas despencavam dos altos dos prédios, como pequenos flocos de neve e seus corpos aterrissavam brutalmente no concreto.

A cada passo, eu tentava encontrar alguma porta aberta ou algum lugar que pudesse ser completamente seguro. O caos simplesmente estava solto em cada aspecto ali. E então mais deles surgiram, correndo e grunhindo. Eles pulavam e destroçavam os policiais enquanto tiros eram disparados em grande quantidade e mesmo assim, poucos eram abatidos. Não havia para onde correr - nenhum lugar estava a salvo. Ninguém estava a salvo.

Pessoas e infectados gritavam, corriam e eram abatidos. Corri entre os becos dos prédios e os espaços estreitos entre as construções até a ponte da cidade. Entre corpos atravessando os céus e aterrissando no chão, novos focos de incêndio surgiam, barulhos de explosões ecoavam por todo o lugar e tiros eram realizados sem intervalos.

Ao longe a ponte era visível, abarrotada de gente e carros. Ninguém se movia apenas se amontoavam na saída que aparentemente estava bloqueada por tanques de guerra e helicópteros sobrevoavam a ponte. Parei de correr quando um corpo aterrissou bem a minha frente. Tropecei levemente e soltei a menina.

— Fique por perto. Entendeu? Não vou conseguir carregá-la por mais tempo. Então, fique perto de mim. — implorei tentando recuperar o fôlego enquanto minha mente dava voltas sobre o que fazer.

Infelizmente eu não havia sido rápido o bastante. Não fui eficiente e todo meu esforço para fugir pareceu inútil quando o corpo se contorceu e sobre-humanamente se pôs de pé e saltou contra a menina. Eu a puxei, mas ele conseguiu arranhá-la no braço. Voltamos a correr e a peguei no colo, ignorando os grunhidos e gritos.

— EI! POR AQUI, SEU IMBECIL ARROGANTE! — ouvi alguém dizer nervosamente a poucos metros de onde quer que eu esteja. Era a mesma mulher loira quem havia gritado, ela estava acompanhada por mais dois rapazes e a mulher de cabelos róseos.

Corri o mais rápido que eu pude e entramos numa loja velha. Os rapazes fecharam a porta e arrastaram caixas e um armário para bloqueá-la. Cedi à dor e ao cansaço. A menina continuava encolhida e chorando em meus braços. O arranhão em seu braço estava vermelho e inchado.

— O que aconteceu com ela? — a mulher loira perguntou claramente nervosa.

(I'm Listening)

— Ela... Ela foi arranhada. E-Eu não fui rápido, e ela... E-Ela é só uma garotinha. — murmurei sem conter o pânico que me consumira quando a mulher a encarou com pena. — Ela vai ficar bem? É só um arranhão. Ela não teve contato com o sangue.

— Nós podemos cuidar disso. — ela disse rasgando parte de sua camisa e enfaixando o braço da menina. — Ela vai ficar bem. — ela murmurou. — Tudo vai ficar bem.

Encarei a menina e ela continuava chorando, sem expressar nada além de confusão ela me encarou. Não havia mais inocência em seu olhar. Não havia nada além de desolação. Pouco a pouco a pele dela começava a ficar mais pálida, ela transpirava e tossia fortemente.

Segurei seu rosto, entretanto seus olhos continuavam distantes.

— O que está acontecendo? Ei, olhe para mim! EI! — pedi, mas ela continuava tossindo. Lentamente ela tremia e seus olhos desviaram-se para o chão. — EI! Olhe para mim! Você está me ouvindo?! EI!

O pânico do desconhecido me assombrou quando os olhos dela começaram a ficar vermelhos e ela continuava tossindo fortemente. Minhas mãos tremiam ao segurar o rosto dela. Ela me encarou após um tempo, com os olhos avermelhados e mais distantes.

— Não, não! Ei, olhe para mim! Olhe para mim! EI! Você tem que ficar acordada, ok?! Está me ouvindo?! — a chacoalhei, mas ela apenas encarava-me com um olhar doentio e frio. Eu sentia meus olhos ardendo, e de algum modo, eu sabia que não havia como ela ficar bem. — EI! EI!

— Pare com isso. E-Ela está infectada. — a mulher loira me disse com a voz embargada.

— MENTIROSA! EI! EI! Olhe para mim! Por favor! — implorei, mas a menina continuava distante e tossindo. A apertei com força e senti as lágrimas caindo. — Por favor.

— Não há nada que nós... Sinto muito. Ela não pode ficar aqui. — ela insistiu.

Eu sabia o que ela queria dizer. Afastei o cabelo loiro da menina da testa e apenas esperei que ela reagisse. Mas ela continuou tremendo suavemente e tossindo alto. Tentei sorrir para ela, mas não conseguia sabendo o que teria que fazer.

— Ei, feche os olhos ok? Você... Você vai ficar bem. Vai passar. — murmurei e lentamente ela fechou os olhos. Ajeitei-a entre meus braços mais uma vez e a pus ao meu lado. Afaguei seu cabelo fracamente.

— Ma... Mamãe...

— Isso... Lembre-se da mamãe. Ok? Lembre-se dela por mim, certo?

Passei meus braços ao redor do pescoço dela. Ela continuava com os olhos fechados e respirava suavemente. Encarei o teto enquanto apertava meus braços contra seu pescoço com força e a sufocava. Ela se debateu sobre meus braços, as lágrimas queimavam em minha pele e seus pedidos de ajuda eram desgastados fio a fio.

Ela lutava bravamente, chamando pela mãe e eu sentia seu desespero e seu medo. Eles também me consumiram.

E logo, restou apenas o silêncio.

[05:24] 25/9 — Agora, Naniwacho

A cama improvisada com caixas de papelão, jornais velhos e um amontoado de panos criavam o melhor tipo de conforto disponível. Um suspiro de alívio escapou quando deitei sobre os jornais. Aquele conforto barato não durou muito.

Os passos leves na escada de metal em espiral denunciavam que alguém estava próximo e que em breve eu o mandaria para o inferno se me incomodasse. E incomodou.

— Pensei que ainda estivesse de vigia. — de algum modo a Haruno conseguiu ser facilmente insuportável.

— E eu pensei que não estivesse falando comigo, Haruno. — retruquei encarando o teto. — O que quer que seja, pode e vai esperar. Resolva. — adiantei rapidamente.

— O mundo não gira ao seu redor. A Terra já tem seu curso, Uzumaki. — ela disse ríspida e irônica, talvez com um meio sorriso nos lábios.

Lentamente meus músculos relaxavam sobre os jornais e panos.

— Vá logo ao ponto. — falei e passei a encará-la. Ela suspirou e sentou no chão, próxima de mim. Ela enrolou os dedos uns nos outros, como se tentasse esconder seu nervosismo e mostrar autocontrole.

— Eu não posso cuidar de todos sozinha, e mesmo que eu tenha todo o equipamento necessário... Eu ainda vou precisar de ajuda. — a Haruno tentava controlar seu desespero iminente. Em vão.

— E...? — murmurei gesticulando com as mãos.

— Preciso que mantenha Sasuke. Ele é útil. — ela respondeu pouco depois. — Ele realmente pode ser útil.

Arqueei a sobrancelha esquerda, tentando ao máximo conter minha vontade de mandá-la embora e continuar com seu voto de silêncio.

— Eu não sei de qual caso romântico você está falando, então se puder ser mais específica e sem o tom pervertido na voz... Isso seria útil. — rebati notando a irritação crescente no rosto da Haruno.

— O cara que está conosco desde o hospital e sua tentativa baixa de me trocar por remédios. — ela disse sem ocultar sua repugna. — Sasuke, é o nome dele. Ele fez medicina comigo e ele é útil.

— A única utilidade dele até agora foi carregar caixas. Isso qualquer um pode fazer, Haruno. — retruquei sem ocultar minha irritação sobre o assunto. — Se é o máximo que ele pôde fazer em três dias, bem, o garoto vai longe deste jeito...

— Eu não posso continuar assim, droga. Eu preciso de ajuda, não de pessoas que mal sabem como dar um ponto. Eu não sei por quanto tempo posso continuar cuidando dessas pessoas. — ela me interrompeu, com cada palavra explodindo um ponto diferente de nervosismo e cansaço. — E adivinhe? Tsunade se foi.

Voltei a encarar o teto, sentindo a hesitação surgir e de algum modo moldando hipóteses em minha mente. O silêncio se instaurou. Grande maioria daquelas hipóteses envolvia e questionava o que seria a definição de certo e errado naquele mundo.

A resposta era simples: não havia certo ou errado quando a questão era como sobreviver.

— Merdas acontecem. — murmurei ignorando o turbilhão em minha mente.

— Eu preciso de ajuda, Naruto. — claramente ela estava séria e desnorteada sobre o que fazer. — Se você realmente quiser chegar à Muralha, precisa de ajuda. E eu não sei até onde é possível te ajudar.

Uma risada cínica acabou escapando e encarei a Haruno. Massageei a testa enquanto tentava me recordar onde havia pedido por ajuda e como ela havia chegado àquela conclusão.

— Se isso é para me convencer a deixar o rapaz dos seus sonhos ficar, admito que você está fazendo um belo discurso. — falei tentando controlar a vontade de mandá-la ao inferno com o tal rapaz. Mas eu sabia que não seria tão sensato. Não agora. — Ele pode ficar desde que você cale a boca e me deixe descansar.

— Obrigada. — ela disse aliviada, aparentemente.

— Não se esqueça de que se ele errar, você vai por uma bala na testa dele. Caso você queira bancar a salvadora da pátria e acobertar qualquer merda dele, eu faço pior com os dois.

Não havia qualquer resquício de insegurança ou mentiras em cada palavra minha. E ela sabia disso.

— Temos um acordo então. — ela murmurou levantando, e andando com suavidade até a escada.

— Avise às Hyuuga o mesmo. E não ousem esperar mais bondade do que esta. — avisei e logo em seguida, a Haruno se foi, deixando-me completamente à mercê do silêncio.

Irritantemente as palavras de Karin circulavam em minha mente. Chegava a ser impressionante como todos queriam gentileza, bondade e melhoras de caráter, além de consolo infinito e um senso cego de justiça - todos meus. Eram pequenas partes que não podiam mais existir, eram pequenas bombas relógio que somente trariam mais desastre quando fossem acionadas.

Ninguém queria a crueldade. Mas a abraçavam quando um infectado estava no caminho; altamente irônico.

Fechei os olhos e o olhar de medo e morte daquela garotinha ainda me assombrava. E enfim restaram os fantasmas da minha mente e o silêncio. Eles sempre estariam ali, em qualquer canto da minha mente.

Ninguém pôde ser salvo. Nenhum deles merecia tanto.


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Notas finais do capítulo

Yo!
Mais um capítulo. Espero mesmo que tenham gostado e qualquer erro ortográfico, favor me avisem.
Hã... Bem, espero que tenham gostado das músicas também. Por enquanto talvez instrumentais sejam mais usadas do que outras (com direito a vocalista). Eu fiz uma postagem sobre o vírus, infectados e alguns detalhes sobre o mesmo aqui.
Link: http://asmsrachel.blogspot.com.br/2014/04/about-darker-than-black-logo-e.html
Hã... Bem, algumas explicações adicionais:
— Sasuke e Sakura cursaram medicina juntos, então, sim ele pode ser útil.
— Naruto age deste modo radicalista como modo de testar as reações alheias e saber quem fará o necessário, incluindo tomar decisões difíceis.
— Karin e Naruto são irmãos (para mim tem um pouco de lógica), mas sabem que um pode confiar no outro plenamente, ou como deveria ser.
— Tsunade acabou entendendo que o arranhão infectou a menina pois ela trabalhava no hospital, então ela sabia o modo de contaminação (tanto é que ela diz para Naruto e Sakura não entrarem em contato com o sangue do infectado).
É mais isso por hora. Espero que tenham gostado. ^^
No próximo capítulo, algumas explicações sobre a Muralha e a inserção de uma nova personagem na estória (ou não).
Obrigada pelos comentários, aos leitores novos - sejam bem vindos. o/
Àqueles que estão acompanhando, muito obrigada pelo incentivo.
E até o próximo!
o/



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