Secret Garden escrita por Bilirrubina


Capítulo 4
Before it gets any better




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Assim que Anya deixou a cozinha, Dimitry entrou. Com as mãos nos bolsos da calça, com passos lentos e um sorriso nos lábios, ele se aproximou da esposa, apoiando a cabeça em seus ombros.

– Acho que educamos uma pequena tirana. – comentou.

– Não diga isso, meu amor... Ela... – Maria deu de ombros – Apenas se parece comigo. – riu.

– Essa parte da história... – ergueu o rosto – Vai ser tranquila para você?

– Acho que sim, - deu de ombros – já se passou muito tempo. Não penso mais como naquela época.

– E você pretende contar “tudo” a ela?

– Não sei, Dimitry. – colocou as mãos nos ombros do marido – Não sei se Anya vai estar preparada, não sei se ao contar “tudo”, a imagem que ela tem de mim vai se desfazer.

– Marie, - segurou sua mão – ninguém é perfeito e Anya tem que aprender isso, cedo ou tarde.

– Eu sei... – desviou os olhos dos dele – Só que eu não queria que ela pensasse que eu ainda sou assim, como eu era daquela época.

– Mas não é e você mudou bastante, é óbvio que sim... Sem contar que mesmo que não tivesse mudado, ainda assim eu te amaria, afinal, nos apaixonamos naquela época.

Maria Clara sorriu de maneira doce.

– Dimitry... – falou seu nome como num sussurro.

– Eu simplesmente amo a expressão que você faz quando fica sem graça.

Ela continuou sorrindo e o abraçou, repousando a cabeça em seu peito.

– Não sei o que faria sem você. Ou melhor... Só você mesmo para me aturar. – riu.

– Não diga bobagens, Marie Claire. E ande logo, vamos dormir. Amanhã será um dia cheio.

– Eu sei... Eu sei.

E como se Dimitry fosse um profeta, ou algo do tipo, ele acertou sua “profecia”. Tanto ele quanto a esposa chegaram em casa esgotados e ainda era meio dia. Por sorte era o dia que Maria Clara trabalhava meio período.

– Muito injusto isso! – disse Dimitry ao sair de casa.

Ele também queria ficar, porém era preciso que ele voltasse para o Instituto. Assim que Bernardo dormiu e Maria foi para o jardim, Anya apareceu, com sua expressão curiosa.

– E então, mãe, vai me contar o resto da história, né? E hoje você conhece meu pai, né?

– Está bem... Sente-se. – indicou a cadeira ao seu lado.

Olhava pela janela e parecia que o mundo caía lá fora. As gotas pesadas de chuva castigavam o vidro e a qualquer momento ele poderia se quebrar, ao menos era o que eu pensava. Observei meu reflexo e vi minhas antigas cicatrizes. Fazia de tudo para a franja cobri-las, mas não dava para esconder tudo. Quem me dera se eu pudesse esquecer tudo o que aconteceu, se eu pudesse evitar a catástrofe...

Meu desejo era até simples, porém eu sabia que era impossível. Eu queria ser capaz de mudar um dia no meu passado. O dia que eu conheci aquele garoto! Essa seria minha resposta se me perguntassem há mais ou menos vinte anos. Hoje eu sei que conhecê-lo ou deixar de conhecê-lo não era o ponto chave, hoje eu tenho maturidade o suficiente para reconhecer que ele não teve nada a ver com o acidente.

No entanto naquela época... Era bem diferente. Culpava-o por tudo. Pela morte do meu pai no acidente de carro e por minha mãe nunca mais ter sido a mesma a partir daquilo. Era como se sua alma tivesse morrido e seu corpo continuava a viver por alguma razão. Ela tentou superar, todavia não foi capaz, a culpa a consumia. Fechei meus olhos e lembrei-me do momento da colisão. Foi tudo muito rápido. Faróis altos iluminaram todo o interior do veículo e foi então que Elena, minha mãe, viu o outro carro vindo em sua direção. Com um reflexo virou o volante o máximo que pode, só que não o suficiente para evitar a batida. Perdi a consciência e depois disso, acordei já no hospital e com muito cuidado os médicos me contaram sobre meu pai. Foi muito difícil, ainda mais porque eu era apegada a ele. Só que eu não sabia que o por vir seria tão complicado quanto.

Tão difícil quanto isso foi ouvir aquelas quatro palavras que Ana Carolina falou ao telefone: “Mamãe tentou se matar”. Aquela frase ainda ecoava em minha mente e se Ivan não tivesse me trazido, eu não sei se eu seria capaz de chegar até o hospital, de tão atordoada que estava.

– Maria Clara? – sua voz me despertou de meus pensamentos.

– Sim, mãe. – aproximei-me dela.

– Por que está aqui? Não era para estar no Instituto? Eu não queria te atrapalhar, eu não queria...

– Mãe... Por favor... – suspirei.

– Você acordou! – Carol chegou e trazia com ela um vaso com um girassol, a flor favorita das duas.

Sem precisar dizer nada, eu soube que era a minha deixa para sair. Eu amava minha mãe, mas certos comportamentos que ela tinha me irritavam. Tomar toda a culpa do mundo era um desses comportamentos. E o que me deixava mais triste era o fato de não ser capaz de fazer com que ela se sentisse melhor, que fosse feliz outra vez e a prova disso era o motivo que estávamos lá no hospital.

Passei pelos corredores e pude sentir aqueles olhares carregados de pena sobre mim. Até podia imaginar o que diziam: “coitadinha, uma garota tão jovem e tendo que passar por isso”. Não que eu ligasse, porém eu estava intensamente frustrada. Eu não esperava que ela fosse fazer aquilo, porém fez. Minha mãe havia tentado o suicídio e toda vez que olhava para as ataduras em seus pulsos, o sentimento ruim em meu peito crescia ainda mais.

Um sentimento tão mau e amargo que contorcia minhas feições. Quem me encontrasse na rua poderia ver o sofrimento estampado em meu rosto e não era só por causa da minha mãe. Era por causa daquele garoto. A culpa era dele por minha vida estar daquela forma, se não fosse por ele, Elena estaria feliz e saudável e meu pai... Não pude mais conter minhas lágrimas. Fui até o banheiro e lavei o rosto. Não gostava de chorar, pois achava que me fazia parecer fraca e vulnerável. Repreendia-me mentalmente por estar com aquela expressão e depois de recomposta, comecei a andar até a cantina do hospital.

Pelas grandes janelas vi que não chovia mais, porém continuava a ventar. Mudei meus planos, passei pela porta de entrada e caminhei sem rumo pela calçada. A brisa gélida tocava minha face e bagunçava meus cabelos, podia sentir a ponta de meu nariz ficar fria, provavelmente estava um pouco vermelha, juntando com os olhos inchados... Meu estado deveria estar lastimável. Mesmo com tudo isso, sentia-me um pouco mais revigorada.

Quando dei por mim, estava em frente a um parque. Olhei ao redor e não havia ninguém ali, o que me deixou um pouco mais confortável. Ao andar mais um pouco, fui vendo que o temporal quebrou alguns galhos, revirou latas de lixo, entre outras coisas. Logo percebi que todos os lugares disponíveis para sentar estavam molhados. O que tinha dado em minha cabeça? Uma tempestade havia acabado há pouco tempo, era óbvio que estaria assim... Era tanta preocupação que sequer raciocinava direito.

Decidi voltar pelo caminho que fizera, no entanto, antes que eu pudesse virar a primeira esquina, ouvi alguém chamando meu nome. Virei-me e vi o diretor. Com passos rápidos veio até mim, parecia preocupado.

– O que você está fazendo aqui? Não era para estar no hospital?

Ele sempre tão direto... Foi então que vi que ele não estava só. Um rapaz de cabelos longos e castanhos escuros estava com ele. Devia ser o famigerado sobrinho. Olhei de relance para ele e voltei meu olhar para Ivan.

– Apenas saí para espairecer, mas já estou de volta, ok?

– E Elena, como está?

– Vai sobreviver. – dei de ombros – Foi mais o susto mesmo... Creio que amanhã ela vai receber alta.

– Entendo. Você pode ficar em casa o tempo que quiser, Maria Clara.

Sorri de uma forma travessa e ele logo se corrigiu.

– O tempo que sua mãe precisar para ficar melhor.

– Está bem, talvez eu apareça mais cedo do que você espera, Ivan. Até mais. – acenei e voltei a caminhar.

– E com isso atendo sua solicitação e agora você sabe como conheci seu pai, Anya.

– M-mas... Não está certo! Onde está o amor? Vocês não se apaixonaram à primeira vista?

– Não. – Maria respondeu.

– E como vou fazer minha tarefa se não sei como vocês...

– Espere. – interrompeu a filha – Até onde sei você apenas queria saber como nos conhecemos. Você já sabe.

– Não tem graça, mãe!

– Está bem... Eu vou contar mais, só que amanhã, está bem?

– Fazer o quê, né? – Anya deu de ombros.


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