Os Dezoito Andares escrita por AAJ


Capítulo 10
Nono andar




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Enquanto toda essa teoria Alfa e Omega era construída, no nono andar uma família almoçava pacientemente. Um silencio que só era cortado pelo encostar dos talheres no prato de vidro. Não se engane, eles não são perfeitos só por estarem quietos. Ou por não fazerem bagunça, ou por seus problemas serem pouco conhecidos pela sociedade. Era exatamente dessa forma que eles eram a pior família do mundo. Uma família que sofria calada, que se martirizava, que não resolvia seus problemas. Nessa família "exemplar" (?) tínhamos uma mãe, um pai, um filho mais velho, uma menina filha do meio e o caçula que tinha oito anos. Destes cinco, quem você acha que tem mais chance de se salvar?

A mãe não teve uma vida feliz, mesmo que afirme isso para suas vizinhas e "amigas" (?). Nada seu foi especial, nada foi único, nada teve o seu momento, o seu cheiro, o seu jeito. O seu primeiro beijo foi roubado pelo vizinho que só queria se aproveitar dela, ele praticamente a agarrou e foi mais nojento do que ver sua vó desentupindo um vazo sanitário. E ela não gostava dele, não estava nem um pouco iludida nem amando nem nada. Só cedeu ao machismo do pai, em todos os seus relacionamentos. Uma boneca de vidro que não se importa em ser quebrada, não há mais sentimentos nela. Uma verdadeira babaquice (queria dizer outra coisa, mas vou passar horas e horas falando de como isso é ridículo, e não quero falar somente disso).

O pai até que poderia ter tido algo melhor, mas se meteu no lugar errado. Foi orgulhoso quando adolescente, um prodígio. Mas somente isso, sem nada mais. Se casou com uma mulher de vidro e nunca percebeu isso. Ele era de barro, nada saía de dentro dele. Nunca. Ele se quebrava e nada saia de dentro, ele derretia, mas nada saia de dentro. Ele nem notava o que acontecia ao redor dele. Não notou que sua esposa estava consideravelmente mais magra, que o seu filho mais velho era gay, e sua filha estava grávida, e o seu caçula era o mais perfeito da família. 

O filho mais velho, como eu disse, é gay. Ele faz o possível para que os pais não descubram, e até ficou chateado quando descobriu. Achou que era um defeito da natureza ele ser gay, que ele era ridículo e iria sujar a imagem dos gays. Uma verdadeira baixa autoestima. Ele até iria começar a se cortar, ou mais pra frente se matar. Mas não. Antes de ele começar a planejar sua morte, um garoto apareceu em sua vida. Um que era muito carinhoso com ele e o tirou da depressão. Infelizmente, ele não era gay e isso magoava o querido filho mais velho. Foi mais pra frente, quando o filho mais velho fez o seu "amigo" (?) ver o que eram as suas namoradas. Naquela escola, especificamente, as mulheres eram muito atiradas e nojentas, umas mulheres de vidro. Eles estavam juntos a cinco anos e sentiam-se felizes. O mundo estava em paz para ambos, a mãe até suspeitaria o motivo de tanta alegria mas iria querer a felicidade de seu filho em primeiro lugar.

A filha não era lá uma garota exemplar, é completamente o contrário. Ficara grávida aos quinze anos, teve sua primeira vez aos treze, beijou aos nove. Uma mulher de vidro? Não, de plástico. Uma mulher que vive sendo utilizada e reutilizada, suja e previsível. Seguiu o exemplo da mãe. Se quer saber, ela ficou desempregada no futuro, o marido gastou todo o dinheiro dela em jogos e ela virou aquelas mulheres de rua que vivem com cigarros na boca.

E o filho caçula, o único que se salva de toda a família, é um verdadeiro prodígio. Não um prodígio como o pai, que era totalmente orgulhoso e ignorante em relação as pessoas ao redor. Mas um prodígio da vida, ele gostava de coisas que ninguém ao menso prestava atenção. Adorava acordar as seis horas da manhã e ouvir os passarinhos acordando e o galo da casa da próxima rua cantando, gostava de lavar comida, de ver o céu em todas as suas cores, de respirar o ar da praia, do ronronar de um gato de rua, de ver um cachorro de rua se alimentando. Ele gostava do simples. Do feliz. Do pacífico. E é por isso que ele socou o pai quando este descobriu que o seu irmão era gay e começou a ofendê-lo. É por isso que ele dava dinheiro todo mês de Setembro para a irmã, e uma boa quantia. É por isso que ele pagou a quimioterapia da mãe e ficou com ela até ela já ter se acomodado na outra vida. É por isso que ele preferiu colocar o pai em um asilo (um muito bom). Ele e o irmão tiveram vidas felizes, a mãe ficou feliz por ver seus filhos felizes. E tudo estava bem para esses três que haviam se salvado de uma vida vazia. Se bem que vidas não podem ser vazias.


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