Inopino escrita por Roberta Matzenbacher


Capítulo 12
Capítulo doze


Notas iniciais do capítulo

Oi, pessoal! Tudo bem com todos vocês?
Então, sei que tenho muitas explicações para dar, mas tá difícil a minha situação aqui porque estou postando pelo meu celular devido a um milagre dos céus. O meu saldo estava completamente esgotado e eu não sabia se conseguiria postar até ano que vem, mas minha aflição acabou no momento em que recebi minhas notificações de volta, kkkkkk.
Também quero me desculpar pela demora. Essa crise chata de abstinência custou a me largar, mas eu finalmente acho que passou, pois terminei esse capítulo em tempo recorde, estou quase no fim do 13, terminei o 14 e o 15 também está a caminho. Ou seja, galera, vocês sabem o que isso significa? Pra mim é meio que um sonho, hahahaha. Vários capítulos em sequência é algo que eu nunca fiz e espero continuar, porque fiz uma meta para 2015, que é a de acabar essa história aqui. Espero que eu consiga.
Por fim, quero agradecer os reviews de todos os meus leitores lindos e também fazer uma dedicação especial a uma guria incrível, que surgiu do nada e passou a ser uma das leitoras que eu mais amo. Analumoraes, te dedico esse capítulo e quantos mais tu quiser, ok? Se não fosse tu me fazendo prometer postar logo essa porcaria eu não teria feito. E foi pensando no que tu me disse que eu mudei quase tudo nele. Deu que eu adorei o resultado. Claro, eu não podia te dedicar qualquer coisa, né? Muito obrigado por existir!
Mas enfim. Acho que é isso.
Boa leitura do maior capítulo da fanfic até agora! Sim, eu me empolguei, hahahaha.



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Capítulo doze

Assim que Rose deixou o ginásio para seu merecido descanso, minha mente começou a recapitular progressivamente o que ocorrera durante o dia.

Houveram tantas coisas ao mesmo tempo que eu não era capaz nem mesmo de decidir sobre o que pensar primeiro. Acordara pensando que resgataria a princesa Dragomir e sua amiga encrenqueira, passando a dedicar meu tempo para ser o seu guardião, mas encontrei algo completamente diferente. Pois, ao invés de uma garota Dhampir completamente inconsequente, deparei-me com Rose Hathaway – e explicações a mais eram completamente desnecessárias nesse caso. Meus planos mudaram de sentido de forma brusca e agora eu estava ali, sem saber ao certo o que fazer.

Eu também sabia que deveria contatar Alberta com urgência, pois as informações que consegui com Rose sobre os psi-hounds ainda me deixavam confuso, mas meu corpo não parecia acompanhar esses planos. Eu me sentia exausto enquanto mexia qualquer músculo ao arrumar os equipamentos arrastadamente pelo ginásio. Meu único desejo consistia em me jogar sobre os travesseiros da minha cama e dormir até que o mundo acabasse. No entanto, para minha infelicidade, eu teria apenas algumas horas antes de meu novo treino com Rose, o que estava fora de meu alcance recusar já que eu mesmo fora o responsável por isso – ainda que os guardiões da missão ganhassem o dia livre.

Realmente, eu não fazia ideia de como tudo pôde virar de cabeça para baixo tão rápido. Há alguns meses, por exemplo, eu mal podia imaginar outro destino que não fosse um caminho de declínio até a foça da auto penitência. Depois da morte de Ivan, passei a viver um dia de cada vez lentamente, encarando os dias passados como um lembrete de como eu fora incompetente. Cada lembrança vindo como se fosse uma dolorosa estaca em meu peito. Só que isso pareceu mudar de um instante para o outro – não melhorar, claro que não, mas sim, tornar-se sustentável. Eu ainda me sentia culpado e carregaria aquilo para sempre, mas com a frequência de compromissos e tarefas disciplinares, a carga que eu carregava já não tinha tanto espaço para ocupar minha mente e enchê-la com pensamentos negros. E agora então, eu não teria tempo para mais nada.

Gostaria imensamente se isso aumentasse. Eu estava um pouco cansado de reviver a tragédia e me enterrar vivo como forma de punição. E mesmo que eu não soubesse ao certo o que esperar do meu futuro, estava com boas expectativas. Afinal, ter um Moroi vivo para proteger – não mais uma sombra rondando minha mente – me proporcionava um compromisso real a ser cumprido e que eu lutaria para manter. Claro, haveria pressão – sempre houvera –, mas isso não era maior do que meu empenho. E assim como fora bem sucedido na missão de resgate que tanto trabalho me custara, venceria meus medos mais profundos para recuperar pelo menos uma pequena porcentagem da honra que eu perdera no segundo em que deixei meu antigo protegido morrer por uma negligência estúpida.

Porém, havia algo que se fazia presente com força em meus pensamentos e eu absolutamente não conseguia deixar para trás: a ligação psíquica.

A cada minuto, uma coisa nova e inesperada surgia para me atordoar, tornando os nós cada vez mais atrelados em minha mente, que ficava ainda mais confusa. Eu não sabia por onde começar, o que fazer ou como fazer. E da mesma forma que eu percebera anteriormente, tudo caiu em meu colo de forma repentina e com a exclusiva função de me deixar no limbo de um mistério sem um fim aparente.

É claro que eu não desistiria de nada disso. Eu era, antes de tudo, um homem de palavra, sendo que isso valia mais do que qualquer outra coisa para mim. No entanto, por mais irracional que fosse, eu não conseguia afastar aquela estranha e incômoda sensação de medo e insegurança. Eu não estava acostumado a isso, mas também não seria capaz de negar a mim mesmo a evidente incerteza sobre o que esperar de tudo no fim. Se eu falhasse em qualquer simples aspecto, eu não suportaria. Seria muito mais do que um fracasso pessoal, pois, antes de tudo, uma linhagem histórica inteira estaria arruinada.

E isso era o que eu mais temia.

– Ei, Belikov. – Alguém disse atrás de mim, o que me sobressaltou.

Virei-me para dar de cara com Laurence, que me encarava com o cenho franzido e um pouco de receio – claras evidências de sua curiosidade. Também estava clara a luta interna que travava para não me perguntar o motivo imperdoável da minha falta de atenção. Aquilo era compreensível. Eu tinha certeza de que Laurence jamais me vira com a guarda baixa, muito menos distraído, mas ele não fazia ideia do que se passava na minha mente para me deixar assim. E também não saberia, pois tentei disfarçar minha surpresa com um pouco de exasperação, o que não era de todo um exagero. Respirei fundo e contei mentalmente até dez, clamando por uma paciência que há muito estava esgotada – mais precisamente, assim que Rose entrou em minha vida.

Deus, eu estava perdido.

– O que você quer, Laurence? – Perguntei com o que esperava ser suavidade. Ele pareceu-me confuso com o questionamento em um primeiro momento, mas logo seus olhos se iluminaram e ele sorriu de lado.

– Vejo que esqueceu. Nós estávamos mesmo apostando para ver quem acertaria sobre a sua decisão, mas vejo que todos perderam. – Ele deu uma risadinha. – Você nem ao menos se lembrava da festa.

Mentalmente, dei-me um tapa na testa. Merda. Ele tinha razão.

Rapidamente, meus olhos escanearam seu corpo e percebi a mudança drástica que havia ali: as roupas simples e gastas que ele geralmente usava durante as horas de trabalho foram substituídas por uma calça jeans escura e um suéter azul com as mangas erguidas até seus cotovelos. Evidentemente, não era nada muito luxuoso, afinal, o salário de um guardião não era grande coisa, mas ainda assim eram elegantes.

Como se fosse uma deixa, meu corpo resolveu demonstrar todo o esgotamento e cansaço que mais de dois dias sem um bom tempo de sono o provocaram. Meus membros pesaram e minha cabeça começou a latejar como se alguém houvesse me acertado em cheio. Eu tinha certeza de que nem se eu enfrentasse uma dúzia de Strigoi estaria tão acabado como naquele momento.

– Ah, Laurence, sobre isso... Eu acho que não vou poder…

– Não, nem pense nisso, Belikov! – Ele me interrompeu, erguendo as mãos ao ar para evidenciar sua indignação. – Nós esperamos semanas para este resgate. Você foi o que mais trabalhou nele, deve saber mais do que ninguém o quão desgastante foi. Nada como um bom tempo para relaxar, não acha? Talvez tomar uma cerveja ou duas, pegar umas garotas humanas gostosas e ser feliz.

A cada palavra que ele proferia, menos interessado eu ficava.

– Laurence, eu já disse: estou muito cansado. Como você mesmo falou, eu fui o que mais trabalhou nessa missão e estou tempo demais acordado…

– Belikov, eu não sei se você entendeu, mas não há opções por aqui. Vai ser divertido e todos sairão felizes no fim do dia.

Eu queria argumentar que não estava nada feliz com aquilo, ou que não estávamos mais no horário humano, mas acabei deixando para lá. Eu não discutiria com Laurence.

– Laurence. Está decidido. Eu não vou a esta festa e ponto final.

x•x•x

Um campo florido se estendia bem diante de meus olhos. As cores eram vibrantes e contrastavam umas com as outras na medida certa. O azul límpido do céu se misturava com o amarelo das pétalas e o verde das folhas, fazendo-me lembrar uma obra de arte. A visão era tão parecida com as plantações da Sibéria na primavera que, por um momento, senti-me verdadeiramente em casa. Havia tanto tempo que não observava aquele cenário que a nostalgia me bateu de forma dolorida no peito.

Eu sentia muita falta dali. Não havia um só dia em que eu não lembrasse de meus tempos de infância ou da adolescência com uma vontade tremenda de voltar no tempo e reviver todas aquelas memórias, tentando aproveitar aqueles momentos ao máximo. E pensar que em várias ocasiões minha vontade foi a de abandonar tudo e seguir para bem longe dali, principalmente quando meu pai estava em casa e o terror se alastrava sobre minha família. Aquilo fora muito marcante, é claro, mas se fosse hoje eu ajoelharia e agradeceria aos céus apenas pelo privilégio de ter pisado naquela terra.

Com um susto, notei que havia mais alguém em meio às flores, e meus olhos observaram com curiosidade sua silhueta ao longe. Ela caminhava calmamente por entre as plantas, suas mãos estendidas de lado e sobrevoando as pétalas amarelas conforme os passos que dava. Seu vestido em tom azulado balançava com a brisa, assim como seus longos cabelos negros, que formavam uma linda cascata em suas costas. Eu não era capaz de ver seu rosto, pois a garota estava de costas para mim, mas minha ansiedade falou mais alto e acabei correndo atrás dela de forma apressada. Porém, quanto mais eu seguia adiante, mais distante ela parecia. Suor escorria de cada milímetro de minha pele e a fadiga me consumia inteiro, mas eu não desisti. Apenas quando meus pés já não suportavam mais o peso de meu corpo que encontrei minha voz para chamá-la:

– Ei, você! Espere! Eu apenas quero conversar!

Eu parecia um garotinho dizendo tais coisas estúpidas, mas, como não mandamos nos sonhos, apenas dei de ombros, curioso sobre o que se desenrolaria. Repentinamente, a garota parou de andar, como se estivesse confusa com minhas palavras, o vento mais intenso em seus cabelos fazendo com que circulassem de maneira selvagem. A mistura da pureza de suas roupas e os desenhos vis de seu corpo a deixavam extremamente desejável.

Porém, quando finalmente a alcancei e segurei em seu ombro para fazê-la parar, algo estranho aconteceu. Um grito grave e estridente saiu dela, mas não era um som comum. Lembrava-me a buzina de um carro ou qualquer outra coisa que produzisse algo semelhante. Franzi o cenho e encarei suas costas a procura do que poderia estar errado, mas ela continuava parada lá da mesma maneira. Foi só mais tarde que eu descobri que ela segurava uma corneta em suas mãos, e ela a levaria aos lábios mais uma vez se um solavanco particularmente doloroso não tivesse acometido meu corpo e eu não tivesse voado para frente, batendo a cabeça com tudo no banco que se encontrava a alguns centímetros de distância.

Espere aí… Banco? Mas o quê?

Acordei em um sobressalto com aquele mesmo som de antes latejando em meus ouvidos, porém, a pessoa ao volante não parecia notar que o barulho era muito irritante. Olhei para os lados rapidamente para me situar, suspirando profundamente quando percebi que o campo florido e a bela moça da corneta não passaram de um sonho.

Se pelo menos eu tivesse visto o rosto dela…

– Caralho! – Alguém que eu suspeitava ser Laurence exclamou.

– Dá pra acreditar nesse barbeiro? Acreditam que ele cortou a minha frente pela direita?! Se eu não tivesse freado teríamos batido em cheio! – A voz grave e irritada de Emil interrompeu meus devaneios e eu olhei para a frente com os olhos cerrados, fuzilando-o com raiva por atrapalhar meu sono.

Um segundo depois de compactuar a irritação, meus olhos se arregalaram em pavor. Eu não podia acreditar que dormira durante o percurso, assim, tão despreocupadamente. Se fôssemos atacados por Strigoi estaríamos em desvantagem e eu não gostaria nem ao menos de pensar no que teria acontecido.

No entanto, antes que eu pudesse me martirizar ainda mais, Yuri, que estava ao meu lado no banco de trás da SUV, começou a rir como se a situação fosse extremamente engraçada. E foi só depois de ver a calça molhada de Laurence logo mais para a esquerda que entendi o motivo da piada, não me aguentando muito mais depois disso. Não demorou para que todos no carro estivessem situados da situação e gargalhassem como loucos – menos, é claro, o próprio Laurence, que estava com o rosto vermelho de vergonha e parecia querer enterrar a cabeça no buraco mais próximo.

– Isso não tem a menor graça. – Ele disse.

– Pra você. – Rebateu Yuri, seu sotaque irlandês se acentuando conforme ria. – Devia ter visto a sua cara. Parecia uma bicha medrosa. Cara, quantos anos você tem? Já tem uma tatuagem na nuca, mas mija nas calças como um bebê por causa de uma freada um pouquinho brusca? Quer a chupeta?

– Eu não mijei nas calças! – Ele exclamou ofendido.

– Oh, não? E essa mancha aí veio sozinha, por acaso? – Yuri disse retoricamente. Eu já não me aguentava mais de tanto segurar a gargalhada histérica, não querendo que Laurence ficasse ainda mais sem graça, mas confesso que, quanto mais ele tentava se justificar, mais vontade de rir eu tinha.

Foi por isso que os deixei conversando e gozando da cara um do outro em paz, tentando me distrair com outras coisas até que a situação perdesse a graça – o que não ocorreu tão cedo. Apenas quando finalmente chegamos ao maldito lugar que todos falaram durante o dia inteiro que ele conseguiu se desvencilhar do nosso grupo e correr até o banheiro com uma das mãos na frente do jeans para disfarçar o ocorrido.

– Dá pra acreditar nesse cara? – Yuri exclamou. – Por Deus, eu juro que já vi de tudo, mas nunca me passou pela cabeça que assistiria de camarote um marmanjo guardião daqueles fazendo xixi como uma menina.

Todos concordaram com sorrisos cúmplices.

– Coitado. – Disse Emil. – Ele ainda é novo. Deve estar um pouco assustado com o recentes compromissos jogados em suas costas. Alberta foi drástica ao largá-lo no portão principal logo no começo de seu trabalho. Se a Academia for atacada, ele estará na comissão de frente.

Yuri bufou.

– E o que ele esperava além disso? Um emprego fácil? Esta é a vida que levamos, e se ele não se contentar de uma vez ou tentar melhorar pode dar adeus a Academia ou qualquer outro Moroi. Porque ninguém quer um guardião medroso.

– Talvez você precise ser mais paciente com ele. – Eu disse. – Nem todos começam tão bem. Você mesmo me disse que quase não conseguiu matar seu primeiro Strigoi.

– Sim, eu sei disso, mas isso foi diferente, quer dizer... Eu acabei não hesitando de fato naquela hora. Éramos eu e o Strigoi, eu tive que fazer aquilo. Mas eu tenho medo de que Laurence não seja capaz nem disso.

Balancei a cabeça, concordando.

– Quem sabe então demos uma chance a ele?

– Dimitri está certo, Yuri. – Emil interrompeu. – Nós não podemos culpá-lo por ainda ter alguns resquícios de medo. Mesmo que treinemos os jovens o máximo possível, ainda não é o suficiente, na maioria das vezes.

Yuri sorriu de lado, irônico.

– Isso pode até ser verdade, mas não vai me impedir de pegar no pé dele.

Sua resposta me fez gargalhar. Emil apenas soltou um bufo e balançou a cabeça, consternado.

– Você não tem jeito mesmo.

Depois daquilo, voltamos parcialmente ao normal, nossos antigos hábitos não deixando que descuidássemos dos arredores por um segundo sequer. Eu passei os olhos calmamente por cada canto do ambiente, assim como os outros que estavam comigo. Alguns minutos depois, mais um grupo pequeno de guardiões entrou, totalizando os doze finais, e nos separamos em trios ou quartetos em pequenas mesas ou mesmo no balcão de bebidas. Yuri alegou que, como estaria de folga, cederia um pouco ao ingerir uma cerveja ou duas, mas eu e Emil recusamos. Já fora ruim o suficiente eu dormir no banco do carro, mesmo que estivesse cansado. Se eu me aventurasse com álcool as coisas ficariam ainda piores.

Além do mais, eu não ficava bêbado desde os dezessete anos.

Um longo tempo se passou com conversas e descontração entre os guardiões. Meus ombros estavam relaxados e uma sensação boa tomava o meu corpo, como há muito tempo eu não sentia. Laurence finalmente resolveu dar o ar de sua graça, as calças agora em completa ordem, mas não capazes de conter a impiedade de Yuri, que, encorajado pelas doses que tomara, não o perdoou. As piadas deixaram-no constrangido, mas um olhar despreocupado de minha parte o fez relaxar e entrar na brincadeira, até que o incidente fosse completamente esquecido – ao menos, por hora.

– Ai, acho que eu nunca ri tanto na minha vida. – Yuri meio grunhiu meio tossiu ao meu lado, devido à recente crise de risadas. Sua mão direita estava sobre o abdômen como se tentasse afastar a dor concentrada. – Esse Laurence me mata.

– Ei, eu estou bem aqui.

– Por isso mesmo! – Ele rebateu, sorridente. – Mas agora, mudando de assunto... Belikov, fiquei sabendo que você virou mentor. Isso é verdade?

– Sim. De Rose Hathaway. – Assim que disse isso, recebi olhares compreensivos de todos que estavam ao meu redor, como se não quisessem estar na minha pele. Eu suspirei, rendido. Sabia que ser o mentor de Rose seria complicado e esperava que esse tipo de atitude se esvaísse com o tempo.

– Uau. – Disse Yuri. Ele tinha a mesma expressão de compaixão que os outros, como se me desejasse seus pêsames. – Isso é o que eu chamo de azar, hein? Você não esteve aqui quando elas fugiram, mas eu me lembro bem. Essa garota costumava arrumar muita confusão. Fiquei impressionado quando soube que Kirova não a expulsou de imediato.

Isso acendeu uma centelha de ira em meu interior, mas a controlei bem.

– Não havia motivos para expulsá-la. – Defendi. – A princesa Vasilisa também ficaria na Academia e teve igual papel na fuga. Além do mais, consegui convencer Kirova de que temos poucas guardiãs e alguém como Rose não se encontra todos os dias.

– Você quer dizer uma garota teimosa e encrenqueira? – Ele perguntou com um tom debochado na voz. Não gostei muito daquilo.

– Sim, ela tem esses defeitos, mas vocês estiveram lá em Portland, viram como ela se arriscou pela princesa. Não é possível que não vejam que uma atitude como essa é valiosa.

Alguns deram de ombros, como se aquilo não importasse, mas Yuri ainda me encarou por um tempo, parecendo considerar minhas palavras. Porém, isso não impediu que um silêncio constrangedor se iniciasse. Eu não tinha ideia se plantara alguma semente de dúvida em suas mentes ou se eles continuavam acreditando nas histórias antigas de Rose. E também não me importava. Estava a cargo dela provar o contrário agora.

Poucos minutos depois, outro guardião desviou a atenção dos demais com uma dança engraçada no meio da pista. Ele já estava bastante alto, uma atitude que eu não aprovava, mas era um dos únicos. A maioria tinha copos de suco ou mesmo água a sua frente, mesmo em uma noite de folga. O compromisso e nossos costumes de permanecer no controle nunca nos deixando por completo. Só que a conversa acabou perdendo o foco do assunto Rose, que foi substituído por outros, o que me encheu de alívio.

Finalmente, permiti que meu cérebro parasse um pouco de prestar atenção neles. Eu estava tão cansado do dia longo que pensava em uma única coisa: minha cama. Interessei-me apenas por ouvir, sem argumentar, o que era fácil. Os guardiões de fora da Academia, geralmente vindos de outros estados ou mesmo da corte, tinham histórias fantásticas para contar, deixando-me ávido por mais informações.

Um deles, no entanto, veio com uma história nada agradável.

– Vocês conhecem Damis Thorin? Aquele guardião da família Badica? – Disse Rory ao meu lado. Ele era ruivo e tinha algumas sardas espalhadas pelo rosto, o que o deixava com cara de menino. Porém, seu porte duro e forte quebrava aquela aparência suave. Todos concordaram com a cabeça, curiosos. Eu conhecera Damis na corte quando ainda guardava Ivan. – Ele largou os Moroi dele. Abby e Xander estão quase desesperados.

– O quê?! – Exclamou Yuri, em choque. Na verdade, eu também estava. – E por que ele faria isso?

– Parece que ele pediu demissão porque queria um trabalho no meio dos humanos. Ele vai se casar com outra guardiã, não sei o nome dela, apenas que ela também vai largar o seu Moroi. Eles estão pensando em fugir juntos.

A informação pareceu rondar ao redor lentamente, transformando drasticamente a animação de todos em desgosto. Eu ficara absurdamente abismado com aquilo. Realmente, era algo quase inaceitável para se admitir. Fôramos ensinados durante toda a vida que os Moroi deveriam vir antes de qualquer coisa, que precisávamos treinar e lutar bravamente para impedir tragédias injustas provocadas por seres não naturais e completamente errados. E aquilo sempre me representou muito mais do que o verdadeiro motivo.

Há muito tempo, os Moroi e humanos viviam em conjunto e pacificamente, sua união provocando uma nova e completamente desconhecida espécie, os Dhampir. Nós herdáramos características de ambas as espécies que nos faziam fortes e resistentes, ótimos lutadores contra os Strigoi. Tínhamos visão e audição aguçadas, assim como mais anticorpos contra doenças por parte dos Moroi, e adaptação aos raios de sol e alimentação regular ao invés do uso de sangue vindos dos humanos. Porém, como carga genética, nossa espécie não poderia procriar entre si. Foi aí que o contrato mudo se estabeleceu. Nós protegeríamos os Moroi dos Strigoi em troca da sobrevivência.

Claro que as coisas se tornaram mais complexas com o passar do tempo. Os vampiros começaram a ser perseguidos pelos humanos, surgiram os Alquimistas, houveram problemas na relação com os guardiões e tabus inestimáveis rondando outros cantos da sociedade. Porém, eu não levava nada daquilo em conta ao proteger os Moroi. Não via problema algum em sacrificar a minha própria vida se isso salvasse a de tantos outros. Afinal, a cada Strigoi que eu matasse, centenas de pessoas sobreviveriam, tanto de Moroi, como de Dhampir ou mesmo de humanos. Era um dever que eu mantinha desde pequeno e tinha certeza de que jamais abriria mão.

No entanto, saber que dois guardiões treinados simplesmente abandonariam seus Moroi por um motivo tão fútil e mesquinho era demais para mim. Mesmo que eles não tivessem como continuar a espécie – o que eu não me importava tanto assim –, sua escolha fora equivocada e revoltante. Eles quebraram bruscamente com um protocolo ou mesmo um objetivo de vida que eu e todos os outros guardiões estabelecêramos com empenho. Era como se desdenhassem o que fazíamos.

E aquilo me deixou muito irritado.

– Mas isso é uma enorme idiotice! – Vociferou Laurence de repente, o único capaz de expressar algo em meio ao silêncio que se instalou depois da notícia. Todos pareciam petrificados e pensativos. – Como eles puderam sequer pensar numa coisa dessas?

– Eu não tenho a menor ideia. – Sussurrou Rory. – Mas gostaria de me encontrar com Damis qualquer dia desses. Eu diria poucas e boas para essa atitude. Onde já se viu? Abandonar duas famílias Moroi?

– Só espero que isso não influencie mais guardiões de alguma forma. – Disse Emil. – Seria uma lástima para nós se todos resolvessem faltar com suas obrigações.

– Eu duvido que isso aconteça. – Yuri exclamou, bebericando sua cerveja tranquilamente. Ele fora o único a mascarar bem sua irritação. – Esses dois idiotas, felizmente, são os únicos guardiões que não conhecem o seu dever. Mas para a maioria centrada como nós isso está claro como água. Sempre existe uma maneira de conciliar algum relacionamento caso for, mesmo que isso quase não aconteça. Afinal, quem nunca teve um casinho por aí? Agora, tornar isso prioridade? Já é outra história.

Sinceramente, eu não me imaginava tendo “casinhos” por aí, mas não pude deixar de concordar com Yuri.

– Espero que você esteja mesmo certo. – Sussurrei.

Apesar do momento fatídico, o restante da noite fora tranquilo. Pouco a pouco, o cansaço venceu a maioria e acabamos nos organizando para ir embora. Os poucos que decidiram ficar teriam de pegar um táxi. Assim como na ida, Emil tomou o volante do nosso carro, o que me tranquilizou. Eu me sentia exausto e não tinha certeza se seria capaz de me manter tão focado na estrada, mas também não me deixei levar. Permaneci atento durante todo o percurso, recusando-me a dormir como fizera antes.

O caminho pareceu levar horas, mas chegamos com tranquilidade. O céu estava claro demais para o meu gosto, o que significava que todos já dormiam há muito tempo, mas tentei ignorar isso. Distraí-me com a visão da arquitetura gótica e fantástica da Academia, ao invés, que eu raramente tinha a oportunidade de ver sob a luz do sol, e aproveitei o momento para me despedir de todos quando pulei para fora do carro.

Caminhei quase que me arrastando até meu quarto e sem cerimônia arranquei as roupas que usava, ligando o chuveiro e me atirando ali. Recebi a descarga de água quente com uma prece, sentindo meus músculos relaxarem aos poucos. Não demorou muito para que colocasse a calça dos pijamas e me atirasse contra o colchão macio, aconchegando-me ali com alívio. Um pequeno sorriso brotou em meus lábios pela sensação calorosa, afinal, parecia que eu não dormia há muito tempo.

Então, deixei que o sono me levasse.


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Notas finais do capítulo

Eu não acredito que terminei de escrever!! Nossa, pensa na minha felicidade! Eu estou desde à meia noite passando um arquivo do meu note para o celular e só parei agora, às cinco da manhã. Mais de quatro mil palavras, imaginem o estado dos meus dedos? Pois é, estão doloridos.
Espero que isso sirva como uma compensação pela minha demora e que venha como um presente de Natal atrasado, hahahah. Ah, e de ano novo também, porque nem a pau que eu faço uma aventura dessas de novo. É muita emoção pra uma noite (só que não).
Só não se esqueçam que agora vocês não tem a desculpa de estar pelo celular e que é muito ruim e mimimi. EU ESCREVI MAIS DE QUATRO MIL PALAVRAS PELO CELULAR. Morri? Não. Hahahaha, como é bom usar isso a meu favor. Seus preguiçosos de plantão, entrem no clima natalino e pratiquem uma boa ação. Faz bem pra alma, sabiam? Haushsuhsushs.
Só me digam o que acharam, tá certo? Tadinho do Laurence, hein? Fui muito má com ele? Eu ri demais escrevendo, alguém mais se mijou nas calças também ou fui só eu a idiota? E o nome de Damis Thorin? Fãs de Lord of the Rings se juntem à força e louvem o rei anão, hahahaha. Ah, e também teve o momento de descontração em geral. O que acharam? Dimitri, mesmo cansado e em um bar de humanos não perde a linha, típico. Hahahaha. Me digam!
Mas agora chega de matracar. Meus dedos pedem alívio.
Beijos, meus lindos! E até o próximo.



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