The Surviver escrita por NDeggau


Capítulo 14
Capítulo 13 — Abordando




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Abordando

 OS CAMPOS LESTES LEVARAM O DOBRO DO TEMPO PARA FICAREM prontos. Eu cavei mais terra do que achei ser possível em apenas algumas semanas. Melanie, Jared, Ian, Peg, Paige, Andy, Kyle e Sunny saíram em uma incursão havia duas semanas. Eles voltariam logo, segundo Jamie. Bruma choramingava o tempo todo. Ela sentia falta de Ian. Ou, especificamente, dos olhos dele. Eu não a reprendia mais, pois cada vez que visualizava aqueles olhos, aquele tom de azul, na minha mente, meu coração acelerava, e não sabia de quem era aqueles batimentos cardíacos. Eu já me arrependera de me apoderar daquele sentimento de Bruma. De repente, a harmonia entre a noite e a neve se tornou algo essencial para o coração que pertencia a ambas. A sensação era agoniante, quase desesperadora. Como se eu dependesse do ar e ele me faltasse. Era difícil de aceitar, principalmente. Ashley Mayfleet não é garota de choramingar por falta de um par de olhos azuis. Principalmente quando o dono daqueles olhos pertencia à outra pessoa – que nem era uma pessoa.

Esse pensamento me machuca um pouco. Dizia Bruma. Afaste-o da sua mente.

Machuca-me também. Mas talvez assim aprendamos – ambas – a tirar os olhos do homem das outras.

Nenhum de nós duas quer Ian. Pelo menos, eu sei que ele ama Peg, e não quero fazer mal a nenhum deles.

Nem eu. Mas, por sua culpa, me sinto vazia.

Eu me sinto pior. Seca. Sim, me sinto seca. É como se tivessem tirado toda e qualquer coisa que me deixasse viva e minha garganta arde. Não consegui seguir a linha de pensamento dela.

Desculpe Bruma, mas você não tem garganta. Ri.

Engraçadinha.

Lola já conseguia andar mancando. Ela sempre ficava sentada no fundo das cavernas, próxima a parede, me observando lidar com a terra dos campos, semear, ou preparando pão de sementes ou até mesmo lustrando os espelhos.

Na realidade, eu só lustrei os espelhos uma vez e minha pele ficou tão queimada da iluminação e do calor refletido, que Jamie não me permitiu voltar a fazê-lo. Jamie não era uma pessoa de se mostrar irritada, e só o fez cinco vezes em três semanas: Duas delas foram quando insisti em voltar e ajudar o restante dos homens a limpar os espelhos. Certo, admito, minha pele ardia como se estivesse pegando fogo, e aposto que não estava nada bonito, mas não era algo que eu realmente me importava. Sabia lidar com esse tipo de dor. Bruma dizia que a raiva de Jamie era apenas preocupação disfarçada.

Ele gosta de você. Disse Bruma.

Bem, isso me atrapalha, às vezes. Não posso nem ajudar. Resmunguei.

Ele está certo. Sua pele é muito pálida para ficar tão exposta ao sol.

Tudo bem. Desculpe mamãe.

 Bruma levou um segundo até entender minha ironia, que ela considerou feia.

 As outras três vezes que Jamie realmente se irritou foi com as abordagens de Cam. Ele tinha alguma raiva incalculável contra Cam, e cada vez que o garoto de cabelos vermelhos chegava perto de mim, Jamie assumia a postura de um pit bull.

 Na primeira, Cam me ajudou a carregar os sacos de farinha e grãos para a cozinha.

 —Muito mais forte do que aparenta. —Disse-me ele, sorrindo. —Stryder estava certo – acho que pela primeira vez – quando disse que não se deve subestimar uma garota como você. Você é realmente uma lutadora, Ashley.

 Eu tentava não sorrir demais perto dele, mas Cam enchia meu ego demasiadamente. Era quase irresistível.

 Sua segunda abordagem aconteceu enquanto eu e Jamie voltávamos para o quarto, Jamie carregava Lola no colo por puro hábito, e ela gostava disso. Cam estava parado encostado á parede. Ele sorriu quando me aproximei e ignorou Jamie totalmente.

—Está cansada, Ashley? —a voz dele soava melodiosa.

—Não. —respondi.

—Então por que deixa Jamie carregar sua cachorra? Achei que se virasse sozinha.

—E posso fazê-lo. —Respondi.

—Eu estou sendo educado. —Disse Jamie, sua voz soou dura. —Desculpe-me se você não souber o que isso significa.

Cam levantou as mãos junto ao peito.

Apenas acredito em mulheres independentes, como no caso, ela. —Ele apontou para mim sorridente.

Franzi o cenho com o pensamento, pensando em responder algo, mas passamos por Cam em silêncio.

A pior de todas – e última – foi durante a semeadura dos campos. Eu carregava um saco de dez quilos de sementes de milho, pendurado nos ombros. Cam apareceu do nada sorrindo.

 —Ora, ora, veja quanto peso essa garota carrega sem nem se importar.

 Abri a boca para responder, mas uma voz áspera o fez antes.

 —Cale a boca, Cam.

 Jamie surgiu detrás das minhas costas, também carregando um saco semelhante ao meu, um dos punhos cerrados. Cam apenas deu risada.

 —Você não precisa protege-la de nada, Stryder, por dois bons motivos. —Cam ergueu o indicador, contando. —Primeiro: Eu não conseguiria machuca-la, nem se quisesse. —Ele ergueu outro dedo. —Segundo: Ela pode muito bem se defender sozinha.

 Cam piscou para mim e saiu sorrindo.

 —Isso é verdade. —Emendei, resmungando. —Eu posso me defender sozinha.

 As sobrancelhas de Jamie se juntaram levemente, mas logo estavam normais. Ele continuou semeando os campos sem dizer uma única palavra. Amaldiçoei-me por tê-lo feito se calar.

O que será isso? Indagou Bruma. Ele está zangado? Ou triste?

Não tem motivo. Para nenhum dos dois. Não sou algo que ele precisa proteger.

Talvez ele não pense assim, suspirou Bruma. Talvez ele goste de proteger você, Ash.

Então talvez ele devesse parar. Pensei, e achei meu próprio pensamento áspero e amargo.

 Estávamos em silêncio naquela noite. Eu acariciava as costas de Lola, que dormia com a cabeça no meu colo. Jamie estava sentado em seu colchão, encarando o nada. Eu estava morta de cansaço, todos os meus músculos doíam do esforço diário. Ajeitei a cabeça de Lola no colchão ao meu lado e deitei a cabeça no travesseiro.

 —Acho que você está trabalhando demais. —sussurrou Jamie, para não assustar Lola.

 —Estou bem. —respondi sussurrando. —Eu gosto de trabalhar.

 —Amanhã podemos tirar o dia de folga. Aposto que Lola gostaria de ser mimada o dia inteiro.

 Afaguei a orelha dourada de Lola.

 —É. Aposto que sim.

—O que você acha de Cam? —Jamie mudou de assunto, mas percebi que ele mesmo não gostou da sua pergunta.

 —Enxerido. —Falei. —Mas parece ser legal.

 —Parece.

 —Ele me entende. —Disse eu. —Ele entende meu jeito, meu modo briguento de ser.

 —Acha que eu não entendo você?

Ai. Gemeu Bruma.

 —Não. —Respondi firmemente. —Você tenta me proteger o tempo todo. Eu não preciso disso.

 Jamie suspirou.

 —Ashley, eu não faço nada além do que devo. Protegemos... Amigos protegem uns aos outros aqui.

 —Bem, mas não é necessário. —Minha voz soou áspera novamente.

 —O que não é necessário? Eu não sou necessário? —A voz dele soou alta e zangada.

 —Não. —Respondi. —Não é necessário ficar “protegendo-me” de qualquer coisa a todo segundo. Eu não sou fraca. Eu não preciso de você.

 Não era necessariamente assim que eu me sentia, mas não sabia expressa-lo muito bem. Jamie entendeu errado e se levantou. Ele me olhou. Seus olhos de chocolate estavam escuros e opacos, como uma mancha escura e sem vida. Devolvi o olhar o melhor que pude. Jamie saiu do quarto e bateu a porta com força, fazendo Lola dar um salto de susto. Acariciei-a para que se acalmasse.

 Eu ainda estava afagando Lola quando ouvi os ruídos. Eram semelhantes a rasgar de uma folha de papel, porém mais grave e mais alto. Como pedras se chocando. Jamie havia saído há poucos minutos. O ruído continuou seco e arranhado. Causava arrepios nos meus braços. Aumentava e diminuía, sempre parecendo se aproximar de mim. Fiquei em silêncio, com medo de respirar, para conseguir ouvir algo mais claramente.

 O som se propagou. Um tombo abafado, uma bordoada contra o próprio chão. Algo caiu pesadamente acima da minha cabeça. O teto se silenciou. Por estarmos no subterrâneo, temi que o teto desabasse e esmagasse todos nós. Mas nada aconteceu. Então ouvi o grito da terra, alto e cortante, quando ela caiu.

Fiquei de pé imediatamente, saindo para o corredor. Chamei Lola para perto de mim. O teto do corredor estava levemente rachado, mas nada preocupante. Comecei a avançar rumo ao túnel que levava aos pátios principais e a cozinha quando o chão tremeu levemente, me derrubando de joelhos. Ouvi passos atrás de mim e empurrei Lola para o lado e arrastei ambas para longe daquele túnel. Pedras desprenderam do teto e caíram pesadamente no chão, onde estávamos antes.

Quase viramos panquecas. Gemi.

Estão todas bem?

 Assenti mentalmente, e puxei Lola para mais longe. Caímos ambas no chão. Pedras prenderam meus pés, e Lola estava sobre minhas mãos, me impedindo de tira-las.

Estava desabando. Gritei para que as pessoas saíssem de dentro dos quartos e ficassem no corredor. Os quartos tinham mais chances de desbarrancar do que o corredor, firmemente segurado por pilares. As poucas pessoas que estavam nos quartos saíram. Lily, Aaron, Sharon, Cam, Candy, Bill, Trudy, Darcy, Joe e Maggie, um por um. Alguns preocupados, alguns apavorados, e poucas exceções sem nenhuma expressão no rosto. Candy, Bill, Darcy e Joe estavam apavorados, todos de olhos arregalados de pavor. Eles eram Almas antes, e não se acostumaram a todos os perigos que o mundo humano apresenta. Cam também era uma Alma há um ano, segundo Jamie, mas ele era uma das exceções que não apresentava nenhuma expressão no rosto. Mas Trudy e Maggie logo correram até mim e me ajudaram a levantar. Sharon tomou Lola no colo e a levou para longe da área desbarrancada. Cam apenas se se encostou à parede e ficou observando com seus olhos verdes familiares.

 —Estão esperando o quê? —berrei. Caminhei até as pedras e a terra entulhada e comecei a tira-las do caminho. —Vão me ajudar ou só ficar olhando? Eu não quero morrer soterrada aqui.


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