The Surviver escrita por NDeggau


Capítulo 13
Capítulo 12 — Esclarecendo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/393331/chapter/13

Esclarecendo

ACABEI ADORMECENDO AO LADO DE LOLA. Acordei na manhã seguinte, com o rabo de Lola batendo na minha barriga. Estava tudo em silêncio, eu apenas ouvia a respiração de Jamie no colchão dele.

 —Está com fome, Lola?

 Lola abanou o rabo com mais força.

 —Deitada. —Ordenei. —Fica.

 Levantei-me e sai devagar do quarto, sem fazer barulho. Pelas frestas do quarto, as responsáveis pela iluminação, eu vi que ainda era escuro, mas as estrelas tinham desaparecido. Andei pelo corredor com as mãos na frente do corpo, para evitar esbarrar contra as paredes novamente.

 Cheguei à cozinha escura e vazia e comecei a procurar algo para dar de comer a Lola. Encontrei pães e outros alimentos duradouros e enlatados, mas nada para um cão. Encontrei por fim canja de galinha enlatada, coisa que eu não sabia que existia. Apenas encontrei uma faca sem serra e comecei a furar a lata para abri-la. Eu o fazia devagar para evitar qualquer barulho.

Quando meu progresso começou a fazer efeito, senti uma mão grande cobrir minha boca e segurar ambos meus braços na frente do corpo. Tentei cotovelar meu agressor, mas fui empurrada para o chão e presa, as mãos atrás do corpo e a boca coberta. Eu não conseguia me mexer, mas não desisti até sentir a ponta da faca que eu usara contra meu pescoço. Paralisei imediatamente, meu coração batia com uma força esmagadora.

Não consigo ver nada. Berrou Bruma, desesperada. Ash, ele vai nos matar?

 Não respondi, por medo da minha própria resposta. O agressor, seja lá quem fosse, tateou meu rosto e me virou de frente para ele. Eu não conseguia enxergar seus traços no escuro, mas me era familiar.

 —Ashley? —seu hálito agitou os fios da minha franja.

 Bruma deu um suspiro aliviado.

—Ian? O que está fazendo aqui?

 —Eu lhe pergunto o mesmo. —A voz dele estava distante.

 —Lola está com fome. —Respondi. Minha voz saiu num sussurro. —Vim procurar algo para dar a ela. E o que você faz aqui?

 —Você devia estar dormindo. Você me assustou. Nem sei o que pensei direito quando ouvi seu barulho. —Disse ele, me ignorando.

 —Eu sei. Você não respondeu a minha pergunta.

 Ele ficou em silêncio. Estávamos ambos de joelhos. Um dos braços de Ian ainda segurava minhas mãos atrás das costas e sua outra mão segurava meu rosto.

 —Não consegui dormir. —Ele admitiu.

 —Por quê?

 —Eu... Estou meio que em conflito interno. —Respondeu ele.

Agora seu rosto estava mais distinto na escuridão. Percebi que seus olhos continuavam tristes e caídos.

—Por causa de Peg? —Perguntei. —E Jared?

Ele concordou com a cabeça.

—Você não quer saber da história... —Começou ele.

—Quero. —Interrompi-o. Eu sentia algo por Ian, mas isso era por causa de Bruma. Não que eu gostasse disso. Mas eu me deixei levar e permiti senti-lo, agora arcava com as consequências.

 —Você sente o que Bruma sente, não é?

 —Sim. E vice-versa.

 Ian assentiu.

 —Com Mel e Peg era a mesma coisa, antes... Peg amava Jared assim como Mel...

 —Você tem medo de que isso não tenha mudado. —Concluí. —Tem medo de que Peg ainda goste dele.

 —Eu tenho medo de magoar Peg. —Ele respondeu. —Eu a amo, Ashley. Amo tanto Peg que, se ela se sentir mais feliz com Jared, eu a deixaria ir. Apenas para vê-la feliz. Mas Peg não faria isso. Ela nunca admitiria se preferisse Jared. Nunca faria nada que pudesse me magoar. Temo que ela não esteja feliz comigo, ah!... —Ian suspirou tristemente. —Eu tenho tanto medo de fazê-la infeliz, Ashley, que me mataria se descobrisse que estou fazendo.

 —Peg é feliz com você. —Afirmei. —Vi isso nos olhos dela. Mesmo com aquele reflexo...

 Ian deu uma risada desajeitada e deslocada com a minha piadinha.

 —Você a faz feliz, Ian, isso eu posso afirmar. Mesmo que ela ainda ame Jared, ela adora você. Eu vejo o brilho nos olhos dela quando está com você. Não tema por isso, Ian.

 —E quem está falando isso? —Ian deu um suspiro que atingiu meu rosto.

—Ashley ou Bruma?

 —Acho que ambas. —respondi.

 Ian soltou minhas mãos, mas seu braço não abandonou minhas costas. Ele me abraçou novamente, e todos os meus pensamentos se embaralharam, deixando-me tonta e perturbada, mas feliz do modo como só um abraço podia fazê-lo. Eu não era frequentemente abraçada. Mesmo quando meus pais eram vivos, abraçar não era um ato frequente. Era algo meio novo para mim, e Ian parecia gostar de fazê-lo, não importa com quem fosse. Mel, Trudy, Peg principalmente... E comigo. Ele tinha algum afeto, mas eu tinha certeza de que era por Bruma. Eu era inconsequente demais para gostarem de mim. Imprevisível. Irresponsável. Arrogante e mal-humorada. As pessoas tendiam a se afastar em vez de se aproximar de alguém como eu.

Não é bem assim. Interrompeu Bruma. Eu gosto de você, e não é porque estou presa com você. Teria gostado na certa. Você é nobre, corajosa, e luta pelo que quer. É esperta e habilidosa, sabe o que fazer nas horas certas. Toma decisões precisas e não se deixa levar por instintos bobos. Quer dizer, às vezes deixa, mas é isso que eu gosto em você.

Obrigada, Bruma.

 —Obrigado Ashley. —resmungou Ian no meu ouvido. —Jamie tem muita sorte.

 Afastei meu rosto numa guinada, mas Ian não me soltou.

 —Jamie?

 Ian me olhou com surpresa, mas então seu rosto se suavizou e ele voltou a apertar meu rosto contra seu ombro.

 —Por ser seu amigo. —Ele disse suavemente. —Eu vejo que vocês dois são grandes amigos.

 —Nunca pensei em Jamie como meu amigo. —admiti. —É apenas alguém que não me quer morta.

 Ian riu.

 —Ashley, ninguém aqui a quer morta. —O modo como ele pronunciara parecia dizer não seja ridícula.

 —Nem mesmo Aaron ou Heidi, ou qualquer outro desses humanos inflexíveis?

 —Ninguém. Todos aprenderam a parar de julgar pelo reflexo nos olhos. —Ele riu. —Por causa de Peg. E de Sunny também.

 —A namorada de Kyle é uma Alma?

 Eu nunca tinha visto Sunny de perto, apenas sempre no fundo, encolhida ao lado de Kyle. A imagem lembrava um passarinho empoleirado no chifre de um touro.

 —Pois é. —Disse Ian. Minhas mãos se empalmaram no ombro dele, mas Ian não permitiu que me afastasse. —Veja só, Ashley, agora vou dizer em nome de todos aqui presentes. Você é uma de nós, está bem? Não importa o que os outros digam, Jeb atirariam em quem lhe fizesse mal. São as regras. Assim como aconteceria com você. Machucou alguém propositalmente, está fora. Certo?

 Assenti com a cabeça o melhor que pude. Ian finalmente me soltou e sorriu.

 —Agora, quer ajuda com a comida de Lola?

 —Por favor. —respondi, como uma mocinha.

Ian riu divertido. Ficou de pé e esticou a mão para mim, que aceitei em sinal de agradecimento.

—Obrigada Ian. —Sussurrei.

Por quê? Sussurrou Bruma.

Por tudo. Principalmente por ter feito que eu me sentisse aceita pela primeira vez na minha vida.

 Voltei para o quarto e encontrei Jamie acordado, e Peg debruçada sobre Lola. Minha cachorra gania baixinho. Corri até ela, deixando Ian e a tigela de comida para trás.

 —O que houve?

 —Nada. —Sussurrou Peg, gentilmente. —Ela só estava sentindo sua falta. Eu dei a ela outro Corta Dor agora pouco. Está se sentindo melhor, Lola?

 Lola ganiu. Pedi a tigela de comida para Ian e coloquei na frente de Lola, ajudando-a a se levantar o suficiente para conseguir comer. Peg segurava as patas de Lola imóveis enquanto eu erguia seu tronco e seu pescoço. Jamie apareceu ao meu lado para erguer a tigela para facilitar a contorção que Lola fazia para conseguir alcançar a comida com tantas mãos sob ela. Quando ela acabou, Ian já havia providenciado outra tigela cheia de água. Lola bebeu rapidamente e caiu deitada, fechando os olhos. A dor, mesmo que em falta, lhe deixava exausta. Ela precisava dormir para se curar. Acariciei sua cabeça até Lola pegar no sono. Peg havia recolhido as tigelas e agora estava sentada ao lado de Ian, no colchão do outro lado do quarto. Jamie estava meio esparramado no meu colchão, e ajeitou a cabeça de Lola que antes estava sobre seu braço. Ele deitou a cabeça nos braços. Caí também esparramada ao lado dele, sem deixar de acariciar minha cachorra dourada. Dei um beijo em sua testa peluda e a deixei dormir tranquilamente.

 —Obrigada. —Sussurrei para todos os presentes. —Por ajudar a cuidar de Lola.

 —Ela é uma boa garota. —Disse Ian.

 —É nosso dever ajuda-la. —Complementou Jamie. —Ela é da família agora.

 —Assim como você, Ashley. —Concluiu Ian.

 Dei um sorriso para o teto, mas sabia que ambos o tinham visto.

 —Espero que Lola se cure rapidamente. —Disse Peg. —Não gosto de vê-la sofrer assim. Principalmente sabendo que foi Mel quem causou sua dor.

 —Está tudo bem. —Respondi. —Melanie e Lola não devem ser tão diferentes, apesar de tudo. É o instinto de proteger aqueles que amam.

 Minha cabeça tombou para o lado, para observar Lola adormecida.

 —Parece que essa menina gosta mesmo de mim.

 —Não é algo tão difícil de acontecer. —Sussurrou Jamie. —Gostar de você.

Hum. Bruma se acanhou na minha mente, e junto com minha própria timidez, minhas faces queimaram.

 —Não acho tão provável assim. —Disse eu, tentando disfarçar meu rosto corado. —Realmente gostar de alguém como eu. Acho que é Bruma.

 Ergui minha cabeça e não encontrei Ian e Peg. Eles haviam saído silenciosamente.

 —Não acho que seja. —Disse Jamie. —Mas posso estar enganado, claro. Corrija-me se estiver, por favor.

 Assenti, sem olhar para ele.

 —Gosto de você porque é corajosa. —Ele começou. —E astuta, sem contar que é prática. É forte, mais do que muitas mulheres que já vi. Luta como ninguém. E mesmo que não demonstre, se importa com as pessoas. Ou, pelos menos, com algumas. As que você gosta. Como Bruma e Lola.

 —Teoricamente, elas não são pessoas. —corrigi. —Mas, sim, está tudo certo. Tirando aqueles elogios todos.

 Jamie riu e se aproximou de mim, a lateral do seu corpo bateu no meu braço.

 —Eu gosto muito de você, Ashley.

 —Obrigada. —respondi. —Apesar de eu desconhecer os motivos.

 Jamie riu e suspirou ao mesmo tempo, e ficou em silêncio. Virei-me de lado e minha mão tocou o peito macio de Lola. Fechei meus olhos também, sem dormir. Não estava cansada. Havia dormido mais do que o necessário. Mas Jamie parecia exausto, e logo pegou no sono.

 A cabeça de Jamie tombou e escorregou pelo colchão até sua testa esbarrar na minha cabeça. Estremeci e me encolhi. Esperei pela pancada, como sempre fazia quando alguém me tocava. O soco não veio, e me dei conta de que Jamie estava inconsciente de seus atos. Virei de barriga para cima e olhei-o. Ele ressonava suavemente, de olhos fechados, dormindo. Ele ajeitou a cabeça na curva do meu ombro, sua testa tocava minha bochecha. 

 Com cuidado, desencaixei a cabeça de Jamie do meu ombro e o deixei no meu colchão. Puxei a cama dele para mais perto, encostando ao lado da minha. Devagar, para não acorda-lo, rolei Jamie para o lado e ajeitei sua cabeça em seu travesseiro. Debrucei-me na minha cama e puxei Lola para meu lado. Ela apenas abriu os olhos o suficiente para me reconhecer e voltou a dormir. Fiquei deitada naquele colchão até o céu ficar alaranjado e o sol despontar pelas aberturas do teto.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The Surviver" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.