Coração Gelado escrita por Jane Viesseli


Capítulo 22
...Volta!




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Jane é a primeira a atravessar a porta que separava o corredor da sala dos três tronos, parando momentaneamente ao se separar com os três mestres e o restante da Guarda Volturi ali, a encarando. Maximilian e Alec ultrapassam o batente logo atrás dela, captando a tensão no ar.

Os gêmeos fazem uma reverência aos mestres simultaneamente e, após um leve aceno de mão de Aro, eles se dirigem ao seu costumeiro lugar ao lado dos tronos, deixando que Maximilian caminhasse sozinho para o meio do salão. Por fora o vampiro parecia calmo e confiante, como se não temesse a morte ou o que quer que fosse acontecer a ele, porém, por dentro, sentia-se amedrontado e triste.

— Aproxime-se, Maximilian! – pede Aro, com uma pontada de irritação na voz, fazendo o vampiro se lembrar do conselho de Jane no mesmo instante, de que ele tinha muitos segredos e deveria ter cuidado.

— Acho que é um pouco tarde para se ter cuidado – conclui em pensamento.

O vampiro se aproxima hesitante, percebendo que Caius também parecia irritado e até mesmo Marcus saíra de sua melancolia habitual para dar atenção àquele assunto. Ao lado deles, mas no sentido oposto ao dos gêmeos, Demetri sorria debochadamente em sua direção. Os cantos direito e esquerdo do salão foram ocupados por Heidi, Felix, Renata e alguns outros, que precisavam estar presentes caso o mestre ordenasse uma execução imediata.

Aro se aproxima de Alec e Jane, conversando com eles através de sussurros quase inaudíveis, ouvindo da boca de sua serva mais leal a mesma história que Alec havia lhe contado minutos antes: que ele estava investigando o camaleão, mas que pretendia juntar mais informações antes de denunciá-lo; que Jane sabia de sua espionagem e o apoiava, pelo bem de suas leis e do clã; que Demetri estragara uma investigação importante antes que eles pudessem descobrir o paradeiro de Andrômeda.

Maximilian ficou tenso quando viu Jane oferecer a mão direita ao seu mestre, para que ele pudesse conferir seus relatos através de suas lembranças, caso estivesse duvidando de suas palavras. Um gesto que foi feito tão naturalmente, que nem um resquício de medo ou tensão atravessou o corpo da pequena vampira, fazendo Aro erguer ambas as mãos em recusa, acreditando imediatamente na versão que ela lhe contava.

Era possível ver a frustração e a satisfação duelando nos olhos de Demetri, como se ambas as sensações competissem por sua atenção. A frustração vinha pelo favoritismo de seu mestre o cegar para a verdade, para o fato de que Jane e Alec não eram tão leais quanto ele imaginava, e pelos gêmeos continuarem tão intocáveis quanto antes. E a satisfação vinha do fato dele conseguir colocar ao menos um de seus desafetos na linha de tiro do clã.

— Quem é Andrômeda? – pergunta Aro sem rodeios.

— O quê? – questiona surpreso, percebendo que o mestre não sabia nada além de seu nome, o que significava que Demetri não sabia o suficiente para delatá-lo e que apenas jogara a informação vaga para Aro, para que o vampiro investigasse por conta própria.

Os olhos vermelhos de Maximilian voam para Demetri rapidamente, que agora já esboçava um grande e boçal sorriso, movendo os lábios de forma muda em uma palavra que ele entendera muito bem: “xeque!”. Ele era o delator e o estava colocando em xeque, como num jogo de xadrez, somente porque ficou ao lado de Jane.

— Não se faça de tolo!!! – grita Aro de repente, chamando a atenção do camaleão de volta para si e deixando que a voz soasse um pouco esganiçada. – Andrômeda, a sua criadora! Quem ela é? Ainda está viva?

— Eu não sei, mestre, me separei dela há muito tempo – responde de forma evasiva.

— Dei-me a mão! – ordena com impaciência, fazendo a vampiro recuar um passo e esconder os braços atrás de seu corpo.

Aro estreita os olhos com fúria. Estava claro que Maximilian já estava ciente do potencial de seu dom, mas ele não se moveu e não demonstrou nada além de irritação com sua atitude. O mestre Volturi estava irritado consigo mesmo por ter deixado algo tão importante passar despercebido, afinal, ele colocara o camaleão dentro do clã e à frente de todos os vampiros da Guarda, trocando a sua preciosa serva por um rato traiçoeiro.

Ele sabia que Maximilian estava ali por Jane e que não era leal aos Volturis, entretanto, achava que já sabia o suficiente sobre ele para prever todos os seus movimentos e intenções, achava que poderia controlá-lo com facilidade. Aro não investigara toda a sua vida porque o camaleão era composto de anos e mais anos de lembranças, tornando a tarefa de estudá-lo uma coisa longa e enfadonha; mas, agora, ele se dava conta de que errara ao não fazê-lo.

Em seu lugar, Jane percebe a musculatura de Alec se retraindo, pois, se as memórias de Maximilian fossem vasculhadas, seu mestre descobriria que eles também burlaram as regras na Notte Rossa e isso resultaria em apenas uma coisa: tragédia. A vampira lança um olhar rápido e duro para o irmão, fazendo-o cair em si e mudar a direção de seus pensamentos, visto que estava agindo como alguém que tinha algo a esconder e isso serviria apenas para chamar a atenção de Aro.

Quando Jane voltou sua atenção para o meio do salão, viu Felix e Santiago agarrarem os braços de Maximilian com força, obrigando-o a cumprir a ordem que lhe era dada. Ninguém era leal a ele, no fim das contas, somente ao clã, e a vampira fechou as mãos instintivamente ao perceber que o camaleão estava sozinho, sem apoio algum.

— Não gosto que escondam coisas de mim! – sibila Aro, tomando a mão de Maximilian.

— Eu não escondi, mestre! Nunca fui questionado a respeito, não sabia que se tratava de uma informação importante – responde com sinceridade, porque o motivo de não falar de sua criadora era unicamente por não querê-la mais por perto.

— Está sendo questionado agora! – declara, fechando os olhos e se concentrando no nome "Andrômeda".

"Ele não vai descobrir o que fizemos, se não souber o que procurar" lembra ele no momento em que Aro fechou os olhos e invadiu suas lembranças em direção ao seu passado. Por um segundo, seus olhos ficaram tentados a encarar Jane e analisar suas reações diante da possibilidade de ser pega, mas ele se conteve, pois não queria dar a Aro nenhum indício de que os gêmeos sabiam de algo que ele desconhecia.

Sem ter como retirar sua mão do aperto de Aro, Maximilian teve o seu passado revistado, desde o momento em que viu Andrômeda na taverna pela primeira vez, até o seu despertar para a segunda vida; desde os seus primeiros aprendizados como vampiro até a criadora começar a usá-lo para satisfazer o seu fetiche por crianças; desde a sua ignorância quanto às leis do mundo vampiro até o seu conhecimento de que os Volturis existiam.

Aro solta a mão do camaleão, sobressaltado, arregalando os olhos e retornando para perto de Caius e Marcus com o semblante mais perplexo que os vampiros já o viram esboçar.

— Isso é um ultraje! – recomeça o mestre, em tom normal de voz, mas ainda demonstrando irritabilidade. – Como ela se atreve a viver de forma tão profana, ignorando nossas leis e afrontando nosso clã? Isso é um ultraje! – encerra aos berros, com os olhos injetados de fúria e os caninos à mostra.

Santiago e Felix se afastam de repente, retornando para os cantos do salão enquanto ouviam, da boca do mestre, todos os relatos que ele roubara da mente de Maximilian. Era assim que Aro jogava, no fim das contas, descobria as coisas através de seu dom e espalhava a informação para que houvessem testemunhas de seu “bom julgamento” ao decidir o destino do réu.

— Você consertará isso! Você irá caçá-la e destruí-la! – ordena ele ao terminar de contar para todos os presentes tudo o que Andrômeda fizera com a ajuda dele, apontando o dedo para o rosto de Maximilian e fazendo um semblante de completo terror surgir em seu rosto.

— Não, mestre, eu não consigo. Ela é muito poderosa sobre mim, por favor... – balbucia rapidamente, já não sabendo definir qual destino lhe era pior, se a morte ou encontrar Andrômeda novamente.

— Você vai matá-la! – grita Aro novamente, calando-o no mesmo instante e deixando claro que, se ele não obedece, morreria ali mesmo. – Essa nômade tem afrontado os Volturis há anos, não permitirei que continue dessa forma agora que tomei ciência de sua existência e comportamento! Cace-a e mate-a! – ordena novamente.

Maximilian se ajoelha subitamente, demonstrando servidão ao mestre Volturi, mas com o medo estampado em seu rosto. Sua mente rapidamente viaja para os momentos em que a influenciadora exercera seu poder sobre ele, manipulando-o como uma marionete para que fizesse tudo o que queria, impedindo-o de ter vontade e até pensamentos próprios, confundindo-o sobre o que era realmente real e o que era influência de seu poder. Tal acontecimento não ocorreu uma ou duas vezes, mas várias, distribuídas ao longo sua segunda vida.

Andrômeda era poderosa e tinha total controle sobre a mente do camaleão. Com apenas um segundo de seu poder ela poderia convencê-lo a segui-la novamente, deixando Jane para trás, afastando-o de seu amor para uma vida que odiava. Ele não poderia e não queria se aproximar dela novamente, nunca mais.

— Mestre – chama Jane, quase como num sussurro, fazendo o rosto enfurecido de Aro mudar instantaneamente, da água para o vinho.

— Sim, Jane, querida! – diz com a voz pastosa, assumindo um semblante empático como uma pessoa que acaba de encontrar o seu bichinho de estimação depois de um longo período fora de casa.

— Permita-me liderar essa missão, mestre! – Pausa, apenas para saber se poderia continuar ou se Aro tinha algo a dizer. Porém, como ele nada disse, ela continuou: – Ele é fraco! Está mais do que claro que o camaleão teme a sua criadora. Deixe-me liderar essa caçada e eu mesma me encarregarei de matá-la.

— E como pretende fazer isso se ele bloqueia os seus dons? – pergunta Caius, achando a proposta de Jane bastante interessante, apesar dessa limitação.

— O matarei, se for preciso – responde de modo cortante. – Ele não é mais tão importante, de todo modo. Se, quando a encontrar, ele não me liberar de sua influência, eu o matarei para ter meu poder de volta e completarei a missão que o senhor me incumbir, mestre!

Aro sorri satisfeito, enxergando a ferocidade no olhar e nas palavras de Jane. Ele sabia que ela tinha muito o que provar, que Maximilian havia tomado o lugar dela e que, agora, ela queria mostrar o seu valor e recuperar o seu favoritismo.

Contudo, o fato era que os Volturis eram confiantes demais de seu poder e superioridade, o que os tornava realmente cegos. Sendo o líder do clã mais poderoso do mundo e o controlador das leis vampíricas, Aro enxergava em seus servos apenas o que ele queria ver, principalmente com relação a Jane, que sempre julgou ter o coração congelado de forma irreversível. Ele a transformara em uma vampira, ele a ensinara sobre seu potencial no clã e a ajudara a desenvolver seu precioso dom, ele a transformara em sua arma de ataque mais leal, e acreditaria em qualquer coisa que saísse de sua boca.

— Certamente que sim, Jane. Ninguém faria melhor este trabalho do que você. Monte sua equipe e prepare-se para a jornada...

— Permita-me ir também, mestre! – começa Alec, querendo dar apoio.

— Não! – corta Jane, não querendo envolver o irmão no que seria a despedida de Maximilian do clã, pois sua mente parecia estar em sintonia com a mente maligna de Aro, e ela sabia exatamente o que aconteceria quando a caçada de Andrômeda terminasse. – Você já teve a sua chance. Essa missão é minha e eu quero completá-la sozinha!

Aro aplaude a atitude da vampira com três rápidas palmas, sentindo orgulho por toda a lealdade que ela ainda mostrava ao clã. A cada atitude tentando agradá-lo, a cada palavra ríspida que ela pronunciava, o mestre Volturi enxergava o fracasso do camaleão e a extensa veneração que ela sentia pelos Volturis.

Jane era a sua serva mais leal, era como um cãozinho que obedecia a todas as suas ordens, sem pestanejar ou questionar. Ela também era a vampira mais poderosa da Guarda e Aro orgulhava-se de tê-la em sua coleção de vampiros valiosos.

Maximilian, porém, já o estava enfadando. O dom do camaleão era maravilhoso, é claro, e o serviu em muitas missões; mas o vampiro em si estava abusando de sua paciência, primeiro por querer retirar Jane do clã, depois por incitar os membros de sua guarda uns contra os outros, e agora por esconder as barbáries que sua criadora vinha cometendo durante anos. Neste último caso, Aro não tardou a acreditar Maximilian estava tentando proteger Andrômeda, guardando segredos do clã que ele mentirosamente dizia ser leal, o que o irritou profundamente.

Os vampiros se retiram da sala dos três tronos assim que foram dispensados. Contudo, Aro detém Jane por um minuto a mais, esperando que todos os outros estivessem longe o suficiente para dizer:

— Maximilian é um traidor e está tentando protegê-la! – alega com confiança, fazendo Jane conter o impulso de corrigi-lo, pois havia visto de perto o quanto ele temia de Andrômeda. – Apesar de jurar lealdade a nós, a criação está tentando proteger a criadora, mesmo que ela tenha todas as atitudes que os Volturis condenam.

— Então ele é um traidor – diz Caius, concluindo o pensamento de Aro por acreditar que fora aquilo que ele vira nas lembranças de Maximilian.

— Se ele é mesmo um traidor, pode tentar frustrar a missão – lança Marcus, atento a cada reação da vampira, enxergando mais nela do que Aro realmente conseguia ver, percebendo que a ideia de ele tentar atrapalhá-la nunca se passou pela cabeça dela.

— E se o fizer, tem a minha permissão para matá-lo, Jane! – complementa Aro por fim, fazendo a vampira esboçar um sorriso sarcástico e mau. – Suas capacidades são valiosas e muito me agradam, mas seu comportamento ofende ao clã. Não o quero mais por perto. Se surgir a oportunidade, livre-se dele, senão, o mataremos assim que voltarem!

— E por que não matá-lo agora? – questiona Marcus, curioso com os planos de Aro e a linha de raciocínio que ele estava seguindo.

— Porque sua criadora é uma nômade – diz Jane, reproduzindo as palavras exatas de Aro, como se pudesse ler a sua mente. – Demetri não pode rastreá-la, pois não conhece a sua essência. Precisaremos dele para localizá-la, já que ele conhece sua forma de se mover e compreende seu estilo de vida.

— Exatamente, Jane! Agora vá, e se prepare para a sua missão…

— Não os desapontarei, mestres! – Curva-se levemente, fazendo o sorriso de Aro se manter aberto por mais um minuto inteiro.

— Certamente que não, minha querida.

Jane se retira da sala dos tronos lentamente, com passos firmes, cabeça erguida e um sorriso triunfante nos lábios. Porém, quando a escuridão e o silêncio do corredor a engoliu, o sorriso de seus lábios se desfez e a seriedade tomou conta de seu semblante, ela tinha uma missão a cumprir: matar Andrômeda e livrar-se do camaleão, mas não fazia ideia do porquê tinha aceitado aquilo ou se realmente queria cumprir a segunda parte da tarefa.


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Notas finais do capítulo

Eis aqui a continuação do título do capítulo anterior, que fala basicamente sobre a lei do retorno. Toda ação gera uma reação, e a de Maximilian não foi das melhores... Porém, Jane também anda executando algumas ações, e que tipo reação isso acarretará?
O próximo capítulo será uma ponte que nós levará para um novo arco da história. A primeira fase ocorreu, em sua maioria, dentro de Volterra, e a nova fase acontecerá fora dela...
Aguardem ;)



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