Seu último amor - Klaroline escrita por Jeniffer


Capítulo 1
Monstro de tristeza


Notas iniciais do capítulo

Espero que aproveitem a leitura tanto quanto eu aproveitei a escrita. Boa leitura!



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"A mágoa de amor pode transformar as pessoas em monstros de tristeza."

A mecânica do coração, por Mathias Malzieu. Citação da página 45, na edição de 2011, da editora Galera Record.

 

Branco. Vazio. Sem graça. Acho que nunca percebemos o quão chato é o teto de nosso quarto até que paramos para encará-lo durante uma hora inteira.

Por que é isso que eu tenho feito há sessenta minutos: estive preenchendo aquele espaço vazio com meus pensamentos, como se ele fosse uma tela de cinema e eu estivesse sentada comendo pipocas. Só que o filme não faz sentido, é conturbado, com cortes abruptos e longas pausas. Porque este filme é uma sequencia caótica formada por meus pensamentos, minhas perguntas não respondidas, meus medos se esgueirando pelos cantos, e isso nunca vêm com um roteiro lógico.

A cama balança suavemente. Ao meu lado, Tyler dorme como se não o fizesse há dias. Seu rosto está sereno e seu corpo está relaxado. E, por mais que eu o tenha observado nos últimos dias, ainda me surpreendo com a diferença. Lembro-me perfeitamente do dia em que ele voltou a Mystic Falls, quase dois meses atrás. Seu cabelo estava comprido e bagunçado, suas roupas estavam sujas e seus olhos estavam cansados. Ele parece estar melhor agora, mas não totalmente recuperado e isso sempre ficou visível com o passar dos dias. Quando saímos pelas ruas ele sempre está observando tudo, como se algo ou alguém pudesse se materializar de uma árvore e atacá-lo. Ele está sempre alerta, sempre tenso, sempre... esperando.

Levanto-me com cuidado para não acordá-lo e vou até a cozinha. Abro a geladeira e encontro uma caixa de suco. Não estou realmente com sede, apenas preciso de algo para ocupar minhas mãos, algo em que possa me agarrar quando sentir que estou entrando em desespero. Porque, neste exato momento, estou lutando bravamente para não enlouquecer.

Enquanto olho para as árvores através da janela da sala, ouço Tyler acordar, me procurar ao seu lado e levantar.

— Hey, Car. – diz ele, com uma voz sonolenta. Não respondo, mas me viro em sua direção, tomando outro gole. Não estou com sede, mas se você estiver com um copo em sua boca, não consegue sorrir, não é?

— Vou para casa antes que sua mãe volte. Não quero abusar da paciência dela... – ele sorri. – Janta comigo esta noite? Eu até posso tentar cozinhar...

—Claro. Mas eu cozinho.

— Fechado. – ele me dá um beijo de despedida e saí.

Claro que minha mãe estava feliz pela volta do Tyler, mas ela ainda não permite que ele passe a noite aqui. Então, ele passa o dia aqui, já que ela está trabalhando, e eu estou de férias, pois as aulas na faculdade começarão em algumas semanas. Observo Tyler se afastar, e quando não consigo mais o ver, sento-me pesadamente no sofá, escondendo o rosto com minhas mãos.

A verdade é que nada está como deveria estar.

Eu estava feliz com a volta dele. Realmente feliz. Eu tinha lutado tanto para que o Klaus o perdoasse, ou ao menos o deixasse voltar para perto de mim, e quando finalmente consegui, fiquei extasiada. E este sentimento continuou comigo por quase duas semanas, pois foi um período feliz e descontraído. Comemorávamos tudo e a qualquer momento. Comemorávamos sua volta, comemorávamos a viagem de Klaus, comemorávamos o fato de estarmos vivos. Ou quase isso.

Revemos amigos, ou pelo menos os que conseguimos rever. Matt está fora da cidade por tempo indefinido com a Rebekah. Um ato de loucura que não consegui impedir, e que se não fosse pela verbena que ele ingere todos os dias, eu juraria que ele havia sido hipnotizado por ela. Bonnie estava passando o verão com sua mãe, Stefan havia deixado a cidade e Damon e Elena estavam em um clima romântico demais para festas que incluíssem mais alguém além deles dois. Mas Jeremy havia voltado dos mortos e Tyler ainda queria manter contato com o antigo time de futebol.

Mas tudo começou a ficar estranho depois de um tempo. Eu me sentia diferente, mais distante até. Tyler e eu já não conversávamos como antes, alegres e descontraídos. Agora nossas conversas eram tão interessantes quanto as que temos com estranhos no elevador, normalmente limitadas por questões meteorológicas e cheias de longos silêncios constrangedores. Tyler também havia percebido, mas parecia disfarçar bem, tentado sempre encontrar assuntos ainda não discutidos, filmes ainda não assistidos ou lugares não visitados. Sempre tentando preencher um vazio que nenhum de nós sabia onde estava, onde começava ou se tinha um fim. E tudo isso começara de um jeito idiota.

Pedi ao Tyler que pegasse minha bolsa em meu armário. Depois de alguns minutos ele retornou, não com minha bolsa, mas uma pequena embalagem de veludo azul. Ele não precisava perguntar, nem ao menos abrir, para que eu soubesse exatamente do que se tratava: o desenho que Klaus fizera para mim. Um desenho muito bonito, uma memória que ele tinha do dia em que me viu observando um cavalo. No rodapé, a frase “thanks for your honesty”, escrita com sua letra simples e clara, agradecendo basicamente por tê-lo ofendido.

— Porque você guardou isso? – ele segurava apenas com dois dedos, como se aquilo fosse algum tipo de animal venenoso.

— Porque não quis jogar fora. – eu sabia que essa não era a resposta que ele esperava, mas era a verdade. Eu não queria me desfazer daquele desenho.

E como um déjà vu, ele ficou irritado novamente com aquele desenho. Mas desta vez eu não tentei “consertar” as coisas. Não tentei nem ao menos fazê-lo perceber a inocência daquele gesto. Primeiramente por que ele estava exagerando, e depois porque não senti a menor vontade de me desculpar, e talvez porque no fundo eu soubesse que aquilo não tinha nada de inocente.

A partir de então, nosso relacionamento balançou de modo tão severo que começou a rachar, e por mais que eu tentasse apoiar as paredes, pude senti-lo começar a ruir. Aquilo foi como um sinal sonoro em minha mente, e me fez acessar memórias que estavam começando a ficar velhas e empoeiradas. Pela primeira vez desde a volta de Tyler, me lembrei do Klaus, e a sensação que tive foi que, se um dia eu fosse atropelada por um trem em alta velocidade, era daquela maneira que eu me sentiria. Devastada, angustiada. Quebrada. Cheguei até a pôr a mão sobre a boca, sufocando um grito, uma mistura de tristeza e surpresa. Porque naquele momento eu percebi que sentia saudades do Klaus, de um jeito que fazia meu peito doer, meus olhos lacrimejarem e minhas mãos tremerem. Havia um monstro de tristeza consumindo minhas entranhas. E também percebi que estava assustada por me sentir assim. Como eu poderia sentir saudades do vilão da história? Mas eu sabia a resposta: ele não era um vilão. Inconsequente, sim, mas quem poderia julgá-lo? O que nos fazia melhores do que ele? E no fundo eu sabia, sempre soube, aliás, que eu não era melhor do que ele. Na verdade, nós éramos muito parecidos.


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