Obrigado e Volte Sempre escrita por Loly Vieira


Capítulo 25
Viagem marcada para Chipre.


Notas iniciais do capítulo

Estou com tanta vergonha que praticamente não postei esse capítulo.
Falo com vocês lá em baixo, tudo bem?
Não me odeiem :(



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Estávamos sentados no chão do antigo quarto de Jeff, rodeados de pelo menos uma dúzia de livros amarelados com a idade e um gato com um sono conturbado.

–Arquimedes tem pesadelos. - Sam me confidenciou. - Eu li num livro de ciências que os animais não conseguem separar o imaginário do real.

–Talvez por seja por isso que todas as vezes que eu acordo ele, ganho uma patada. - Resmunguei.

Sam sorriu para mais um Atlas aberto em suas perninhas cruzadas como índio. Essa era sua nova paixão: conhecer cada pedacinho do mundo pelas folhas dos livros de seu avô. E aproveitando da sua tagarelice momentânea, eu estava junto a ele, aprendendo mais nas últimas 2 horas que meus anos de geografia no colégio.

Eu apontava um lugar e ele começava um roteiro turístico.

–Taiwan é considerada pela ONU como uma ilha rebelde, mas eles se consideram um país independente. Tudo começou quando Chang Kai-Chek, a favor do capitalismo na China, fugiu do socialista Mao Tsé Tung, para a ilha Formosa.

–Espera, eu sei dessa. Mao Tsé Tung aquele chinesinho sinistro que matou meio mundo de gente?

–Considerando que a China tinha, e tem, uma população volumosa... Quase isso.

–Nós podemos mandar o Arquimedes para lá? – E como se o bichano entendesse, ele soltou um miado contrariado de onde jazia praticamente morto.

Sam riu, a única coisa realmente infantil dele. Uma risada alta, contagiosa e infantil. Eu também sorri.

–OK, posso escolher outro lugar, agora?

Ele concordou com a cabeça e me deixou folhear o atlas até que eu apontasse as cegas, um lugar qualquer.

Sam gritou. Eu gritei. Arquimedes chiou.

–Tia Al, você acabou de encontrar Chipre! - Seu dedinho apontou para uma pequena figura verde contorcida no mapa, enquanto eu xingava até a décima quarta geração felina.

Em um segundo eu estava pronta para reclamar de sua ação, mas no seguinte, eu estava comemorando a descoberta de Chipre como se isso fosse a melhor coisa dos últimos tempos.

–Chipre é uma pequena ilha no mar Mediterrâneo, perto da Turquia. Faz parte da União Europeia.

–Jura que esse lugar minúsculo, faz parte da União Europeia?

–Tia Al, não fale assim de um dos lugares mais lindos de todo o mundo.

Ele abraçou o livro contra ele, com um olhar de quem tinha acabado de levar uma bofetada que me partiu o coração.

–Quer saber? Na próxima viagem, iremos a Chipre.

–Sério?

–Sério. Melhor do que conhecer todo pedacinho do mundo por um livro, é conhecê-lo na prática.

Os olhos castanhos tão iguais e tão diferentes do seu pai, brilharam de empolgação.

–Papai disse que as coisas vão melhorar no futuro.

Por algum motivo, aquilo fez meus olhos arderem e naquele momento eu quis ter seus curtos braços ao meu redor.

–Seu pai está certo.

Sam olhou dos seus tênis, Arquimedes, para mim. Ele queria me dizer alguma coisa, mas não o fizeram.

–Nós podemos mostrar Chipre à vovó?

–Claro que sim. Ela vai amar.

Quando sua mãozinha espalmou a minha, rumo ao corredor, eu soube que aquele era o máximo que Sam tinha a oferecer no momento, então eu fiquei feliz por recebê-lo.

Encontramos Maia, Marta e tia Lucy na cozinha. Marta estava ocupada demais preparando alguma coisa no fogão, Maia estava cortando em pedaços muito menores de cenoura do que parecia ser necessário e tia Lucy estava reclamando de dor nas costas.

Sam e eu fomos até sua vó e ela o recebeu com um sorriso de rasgar os lábios. Não era de admirar porque ele a adorava tanto. Seu dedo miúdo apontava para o livro enquanto seus cachos castanhos escorregavam pelo seu rosto.

Quase que inconscientemente, minha mão escorregou pelos seus cabelos e penteou seus cachos rebeldes para fora da sua visão.

–Você precisa cortar o cabelo. – Dissemos em uníssono, Marta e eu.

Sam resmungou baixinho enquanto nós sorriamos.

Mas qualquer vestígio de sorriso sumiu quando ouvimos um xingamento alto do lado de fora e passos pesados se aproximaram.

–Ai porra, cara! – Joaquim me empurrou para chegar aos armários.

–O que foi? – Maia franziu o cenho.

–Jerry acaba de foder com a mão dele, isso que acabou de acontecer. – Fechou uma gaveta com mais força que o necessário.

–Olhe sua boca, Joaquim. Você ainda está na minha casa, na frente do meu neto. – Repreendeu a mais velha.

–Desculpa, tia Marta. Agora você pode me dar um maldito pano antes que ele morra de hemorragia?

Jeff. Ferido.

Meus instintos aguçaram. Puxei o pano limpo que Marta estava para entregar e tomei liderança, umedeci o pano e ignorei os resmungos de Joaquim para perguntá-lo onde Jeremy estava.

–Na garagem.

Disparei para lá como uma bala.

Jeff estava encostado no capô de seu carro com um curto rastro de sangue até ele. Seus olhos encontraram os meus.

–Joaquim sempre se torna uma garotinha assustada quando vê sangue. – Revirou os olhos.

Ignorei seu comentário e puxei sua mão até mim.

–Vamos ter que lavar isso. – Ele tinha conseguido um ferimento na palma da mão, longo, mas não tão profundo. O suficiente para sangrar um bocado, no entanto.

Jeff estava resmungando algo sobre como eu era “pequena, mas mandona”, quando eu mergulhei sua mão debaixo da torneira e ele xingou baixinho.

–Ou você me deixa limpar, ou nós vamos para um hospital mais próximo e eu não acho que tem um hospital perto o suficiente, Jeff. – Seus olhos se encheram de um misto de riso e chateação. – Como você conseguiu cortar a palma da mão, Jeff?

–Problemas com ferramentas.

–Pensei que você mexesse com esse tipo de coisa o tempo todo. – Foi uma rápida olhadela em seus olhos, vazios, para logo em seguida voltar ao meu trabalho de limpar, aplicar o pano, esperando que parasse de sangrar.

–Jerry, filho, tudo bem? – Marta estava na porta do banheiro acompanhada se sua pequena plateia logo atrás.

Tia Lucy ainda reclama de algo, enquanto Sam, Maia, Joaquim, Marta e um pouco mais ao fundo, Oliver, o tio carracundo de Jeff, esperavam uma resposta em silêncio.

–Não se preocupe, mãe. Foi só um pequeno corte.

Quando eu passei o sabão no contorno do corte, Jeremy abafou um gemido e lançou-me um olhar que teria feito um cachorro correr com o rabo entre as pernas.

–Parece que a Alma leva muito jeito com isso.

Eu só tive uma sogra na minha vida. A mãe de Brian era um tanto quanto protetora em relação ao filho, nós nunca tivemos um problema direto porque eu nunca tive coragem de enfrentá-la, mas se Deus me desse a oportunidade de escolher uma sogra, eu escolheria Marta.

Seus olhos pareciam tão... Familiares quando me olhava. Beirando a um acolhimento aquecedor.

–Ela cursou enfermagem durante um tempo. – Jeff acrescentou. – Mas teve que trancar a faculdade.

–Oh querida. – Eu a abraçaria nesse momento se não tivesse que enfaixar a mão de seu filho.

–Vocês tem alguma loção antibiótica? Seria bom colocar um pouco antes de cobrir o ferimento.

–Acho que temos no banheiro, vou buscar. – Maia se foi.

–Minha amiga, Pascácia, sempre falava que os enfermeiros são os médicos frouxos.

–Isso foi uma coisa terrível de se dizer, tia Lucy. – Jeff retrucou.

–Na verdade... – Dane-se, se eu não podia perder a oportunidade de cortar a amável tia Lucy. – Eu sempre quis enfermagem. Desde pequena.

–Não leve a mal a Lucy, meu bem, nosso irmão está aqui parar provar que essa é uma profissão importantíssima.

Sorri em sua direção.

–Obrigada, Marta.

Maia voltou com o frasco e gases. Nossa pequena plateia já tinha ido quando acabei o curativo.

–É a segunda vez que você faz isso. – Jeff estava tão calado que eu pisquei algumas vezes para focalizar sua presença firme no banheiro.

–Isso o quê?

–Você se preocupando com meus fodidos machucados.

–Não me agrada ver alguém que gosto ferido. – Falei sem pensar.

Jesus Cristo.

Eu tinha dito.

Já era. Agora foi. Será que dá tempo de sair correndo do banheiro e voltar para casa a pé?

Com o rosto em chamas, levantei o olhar até o seu.

Seus olhos verdes acastanhados nunca estiveram tão sem expressão.

Talvez ele nem tenha notado. Talvez ele estivesse absorto e nem prestou atenção. É. Exatamente isso.

Limpei a garganta antes de comunicá-lo que ele iria sobreviver e ainda teria duas mãos.

–Vida. – Essa simples palavra e eu soube que ele estava totalmente consciente. Sua mão boa procurou a minha, seus dedos longos brincaram com o anel da sua avó, nosso símbolo do falso noivado.

–Sua tia notou o anel essa manhã e eu acho que ela estava disposta a arrancar meu dedo.

Ele rodou levemente o anel meio folgado. Brincou com ele, consequentemente brincou com cada fibra do meu corpo.

–Talvez seja melhor devolver o anel a família, Jeff. – Sussurrei com medo que alguém escutasse.

–Ele está onde deveria estar, Vida.

Se ele não tinha conseguido me fazer tonta antes, agora ele tinha o feito.

Meu quadril teve que se apoiar na pia do banheiro para não cair.

–Você precisava ter visto o olhar do meu tio Oliver. Acho que nós conseguimos, Vida.

Foi como um pequeno clique no meu cérebro. Olhei de sua mão, para seus olhos e novamente fiz esse percurso.

–O que você fez, Jeff? – Ele não me respondeu. Minha mão apertou a sua rapidamente antes de me afastar dele, o máximo que o pequeno espaço do banheiro permitia.

–Fale baixo.

–Você fez essa droga de propósito?

–Foi só um pequeno corte. Ele viu você em atuação e acredite em mim... Você é fantástica nisso.

Fechei os olhos, massageei as têmporas.

–Foi para seu bem. – Sussurrou por fim. Sua voz mandona mesclada com algo doloroso de se ouvir.

Deixei minhas mãos caírem impotentes ao lado do corpo.

–Nunca nunca nunca mais faça algo assim de novo, Jeff.

–Mas você foi ótima, Vida. – Não me afastei quando sua mão boa me puxou para perto. – Isso com certeza irá lhe ajudar com...

–Eu não quero isso se você precisar se machucar novamente.

–Ok. Não irá se repetir.

–Prometa-me. – Seus lábios se repuxaram. Ele teve força o suficiente para me puxar totalmente contra ele, quadril contra quadril.

–Isso importa para você?

–Sim.

–Então eu prometo.

Fitei seu rosto, seus cabelos castanhos escuros bagunçados, cenho levemente franzido, em seguida minha análise caiu para seus lábios e quão convidativos eles pareciam. Mas foi em sua barba por fazer que eu decidi focar.

–Você deixa sua barba crescer muitas vezes? – Seus olhos derretidos encontraram os meus.

–Não muito.

–Você deveria. Ficaria ainda mais bonito com uma.

Ele sorria quando seus lábios encostaram-se aos meus, mas como todas as vezes que isso acontecia (ok, não eram tantas, mas...), o ambiente ficou rapidamente mais fervente.

O beijo ultrapassou do limite de um simples beijo quando suas mãos apertaram minha cintura tão forte que teria marcas delas futuramente.

–Eu quero isso, Vida. – Rosnou antes de se afastar de mim. – Mas não aqui. Não dentro de um banheiro com minha família do outro lado.

Ok. Nada de sexo no banheiro da casa da mãe dele. Acho que isso seria a primeira coisa que eu aconselharia a minha filha, se eu tivesse uma.

Ajeitei minhas roupas e então ele abriu a porta.

Estava, literalmente, na minha cara que estávamos fazendo algo ilícito quando entramos na sala.

Meu rosto estava num tom vermelho que deveria ser novo na tabela de cores. E por alguma razão do Capeta, Jeff ainda estava ao meu lado, envolvendo minha cintura territorialmente.

Descobri o motivo logo, quando ouvi a risada inconfundível de Marco.

–Maldito seja, ele deve ter treinado essa risada no mínimo 3 meses na frente do espelho.

Jeff não gostou do meu comentário, mas Maia, que descobri, de repente, que estava bem atrás da gente, achou cômico e sua tentativa de abafar uma risada foi totalmente por água a baixo.

E acabei ficando feliz por ouvir sua risada também. O sorriso em seu rosto a deixava mais bonita. Infelizmente, ele não estava lá com muita frequência.

Eu estava sorrindo também quando cheguei à sala com um ciumento e possessivo Jeff. Sua mão não deixou meu corpo nem por um segundo, nem quando Sam veio sentar perto de nós e falar um pouco mais de alguns países. Pequeno Newton estava super animado com isso e, aparentemente, seu pai absorvia qualquer animação dele.

Se eu tinha julgado Jeff como um péssimo e irresponsável pai antes, agora eu tinha um conceito um tanto quanto diferente dele. Jeff era um pai jovem, mas ele se esforçava ao máximo pelo filho. Ainda másculo demais para assumir o papel completo de mãe, mas definitivamente ele estaria usando prendedores no cabelo e avental cor de rosa se isso fosse por Sam.

Aconcheguei-me ao lado de seu corpo tenso e isso o fez relaxar um pouco. Estávamos espremidos um sofá de dois lugares com Sam e Arquimedes. E mais uma vez aquele sentimento de ‘estar no caminho certo’ infiltrou por meus poros. Eu adorava me sentir numa família. Eu tinha sonhado por isso desde pequena e agora eu tinha isso...

E não o tinha, de certo modo.

Só de pensar que tudo isso seria uma mera lembrança daqui a algumas semanas... Quando meus serviços não fossem mais úteis para Jeff. Eu nem mesmo sei se ainda veria Sam e... Eu tinha que parar de pensar nisso.

–Vida, está tudo bem? – Os braços de Jeff me rodearam por completo.

–Está. – Eu não diria algo diferente enquanto sua mãe estava na cozinha ao lado. - Como há muito tempo não esteve antes.

Jeff sorriu para mim, eu amava aquele sorriso despreocupado dele. Nós não notamos quando uma figura se aproximou de nós e só viramos as cabeças quando limpou a garganta.

Tio Oliver estava parado na nossa frente com um olhar de ‘eu fazia isso na idade de vocês’ que me fez corar por completo.

–Eu vim me despedir. – Comunicou formalmente.

Eu pude ver minha esperança em formato de faculdade evaporar. Engoli em seco e me levantei para ao menos cumprimentá-lo.

Jeff me firmou ao seu lado. Perguntei-me se ele sabia que eu ameaçava uma queda.

–Mas antes... – Os óclinhos meia lua do idoso viraram-se para mim. – Eu tenho uma proposta para lhe fazer, senhorita.

E foi assim. As coisas começaram a dar certo em algum momento, mas definitivamente elas estavam dando. Meia hora depois, eu estava na frente da casa, acenando para um carro que se distanciava, um sorriso que mal cabia nos lábios e com a esperança presa em meus braços.

Feliz. Eu estava estupidamente tão feliz. Pulei nos braços de Jeff assim que o carro sumiu de vista.

–Eu posso voltar a estudar, Jeff. – Grasnei baixinho em seu ouvido. Seus braços prenderam-se na minha cintura.

Ele sorria também. Tão grande quanto eu.

Seus lábios pousaram na minha testa e eu fechei os olhos, desfrutando da corrente elétrica que aquilo produzia em mim. E quando eu os abri de novo, alguém estava me observando com uma sobrancelha arqueada.

Marco não sorriu quando eu o fiz para ele.

Seus olhos foram de mim para Jeff, que estava de costas para ele.

Marco balançou a cabeça e então subiu as escadas pisando duro.

Procurei na mente algo de errado que havia feito a ele, mas não achei.

Eu não deveria estragar minha felicidade por isso. Eu tinha acabado de ganhar uma oportunidade e eu nunca iria soltá-la novamente, eu poderia até sufocar a esperança em meus braços, mas eu jamais a soltaria.

E naquele momento, eu só conseguia pensar no quanto eu queria ir para Chipre, para comemorar tudo aquilo.


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Notas finais do capítulo

Meu santo, eu estava com mais saudades de vocês que vocês da história, aposto.
Irei responder a todos os adoráveis comentários em breve. Prometo de dedinho mindinho.
Espero que tenham gostado desse capítulo. Achei meio nhocnhoc ^^
Prometo que irei tentar não demorar tanto da próxima vez.
Beijos e queijos.



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