Olhos De Vidro escrita por Jane Viesseli


Capítulo 22
Venha Sozinho




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Houve silêncio no quarto por oito segundos exatos, e, depois disso, Embry sentiu o mundo tremer debaixo de seus pés. É claro que não era exatamente o mundo que estremecia e sim o próprio corpo do quileute, que já sentia a raiva de seu lobo preenchê-lo completamente. Se queriam vingança por causa de Gregory, se o assunto pendente era com ele, por que tinham de raptá-la? Por que a envolveram naquilo?

― Por que se dar ao trabalho de vingá-lo? Ele procurou por aquilo...

― Somos uma família, garoto lobo, podemos não ter terra fixa, mas, ainda assim, somos unidos. Três de nós são irmãos biológicos e dois são agregados. Gregory era o caçula dos irmãos e os mais velhos não gostaram nada do desaparecimento dele... Pobre menino, era o mais gentil de todos nós, não costumava brincar com a comida ou judiar dos humanos como Hector.

― E quem é Hector? – rosna impaciente, dando um passo à frente e fazendo a vampira se levantar de onde estava.

― Hector é o mais velho, o líder do clã e meu companheiro. Tão cruel quanto o resto de nós juntos, tenho sorte de tê-lo como meu parceiro, não acha? – Ri. – Só não posso garantir que a ruiva tenha a mesma sorte...

Isto foi o que bastou para Embry, que avançou contra a vampira e agarrou-lhe o pescoço, realmente disposto a despedaçá-lo com aquele aperto. E apesar de não se mover ou apresentar resistência, a expressão no rosto da mulher denunciava sua raiva e a vontade que tinha de socá-lo. Todavia, ela era apenas uma informante naquele momento e deveria agir conforme as ordens que lhe foram passadas.

― Se me matar, Hector matará a humana! – grita, fazendo o lobo se conter em sua fúria. – Ou acha que me matando, ele deixará sua companheira viva? Olho por olho, garoto lobo, essa é a filosofia de Hector... Minha vida pela dela, a sua pela de Gregory. – Silêncio.

― Vou encontrá-la e matar todos vocês! – ameaça o quileute.

― Nunca a achará. – Ri debochadamente. – Hector gosta de joguinhos... – Embry franze a testa em confusão. – três vampiros estiveram aqui para buscar a humana, um saiu com a menina nos braços e os outros dois com seus pertences, cada um seguiu para uma direção diferente e, até que você encontre a trilha certa de seu cheiro, será tarde demais!

― Maldita! – rosna.

― Eu disse, ele gosta de jogar. Agora me solte ou nunca lhe contarei como encontrá-la...

O lobo recua no mesmo instante, sentindo-se de mãos atadas.

Finalmente livre do aperto incandescente do quileute, a vampira começa a caminhar lentamente pelo quarto, observando os pertences de Andy e até mesmo furtando aquilo que achava combinar com sua personalidade.

― O que devo fazer para deixarem Andy livre? – pergunta Embry, já que a vampira não parecia disposta a dizer por vontade própria.

― Em primeiro lugar, me chamo Ana, e grave bem este nome, pois essa é a senha para que o clã o deixe entrar em sua casa de jogos...

Embry sente um estranho calafrio subir-lhe a espinha quando as palavras "casa de jogos" foram proferidas, porque algo em seu interior dizia que aquele não era um bom lugar.

― Ana, entendi, guardarei o nome.

― Em segundo lugar – continua ela, finalmente parando de caminhar e retirando um pedaço de papel do bolso da calça –, você deverá estar no lugar indicado pelo mapa amanhã de manhã, na forma humana, sozinho e sem truques. – Entrega o papel dobrado.

― Quem me garante que não irão machucá-la?

― Já lhe disse, garoto lobo, o assunto pendente é com você... A ruiva é apenas a garantia de que irá andar de acordo com as regras de nosso jogo, e, depois que acabarmos com você, a libertaremos, já que Gregory gostava tanto dela. – Houve um rosnado de desconfiança. – Porém, se ousar quebrar qualquer condição ela morrerá no mesmo segundo, entendeu? – Silêncio novamente. – Entendeu, garoto lobo?

― Entendi – rosna entredentes.

― Você obedece, ela vive; se desobedecer, ela morre. Não é tão difícil de entender, até mesmo para alguém como você... Enfim, venha sozinho, amanhã de manhã... E esteja preparado para brincar!

Num milésimo de segundo Ana desaparece, deixando apenas o som de sua risada e seu cheiro adocicado para trás. E Embry permanecera lá, inerte. Sua cabeça rodava com um turbilhão de pensamentos, mas nenhum deles lhe dava segurança quanto ao que poderia acontecer. A única chance de salvar Andy e de garantir sua segurança era dançar conforme a música, no ritmo e nos passos propostos pelo clã nômade.

― É tudo culpa minha – sussurra para si mesmo, sentido por tê-la envolvido naquele jogo que, com certeza, resultaria em morte.

Dando uma última olhada para o mapa em suas mãos, o quileute retorna para La Push, onde rapidamente toma um banho e se prepara para partir. Embry não sabia até que ponto os vampiros se importariam com a segurança de Andy, eles prometeram libertá-la, porém, nunca disseram que a levariam de volta para Seattle. O inverno ainda não havia acabado, e se a abandonasse em meio à floresta?

Foi pensando nesta hipótese que o lobo apanhou seu casaco mais quente, um pequeno cobertor algumas guloseimas confiscadas do armário da cozinha, um celular que comprara no caminho para casa e alguns telefones importantes registrados na discagem rápida do aparelho, enfiando tudo num grande saco plástico e depois em sua mochila de escola como uma espécie de "emergência". Pelo menos assim Andy teria como chamar ajuda e sobreviver até que a encontrassem.

O quileute sabia que não viveria, que o olho por olho se cumpriria e que seu sangue seria derramado em vingança a Gregory. Entretanto, a morte não seria tão ruim se tivesse a certeza de que seu imprinting estaria bem...

Durante todo aquele dia, o Call se recusou a sair de seu quarto, a atender qualquer telefonema e até mesmo jantar. Hora ou outra não aguentou a pressão e chorou em preocupação, no entanto na maioria do tempo sua mente estava fixa no plano que arquitetara para sair de La Push, porque nada poderia dar errado. E quando finalmente a noite caiu sobre a reserva, a casa caiu em silêncio, como se não houvesse mais ninguém acordado.

― Perfeito – comemora sem humor –, isso será melhor que a encomenda.

Pé ante pé, Embry deixou o seu quarto em direção à porta da frente. Não queria levantar suspeitas, nem sequer conversar com a mãe. Nada de despedidas, assim é que tinha que ser, mas Tiffany não era idiota e percebera o estranho comportamento do filho. O olhar vazio, as lágrimas preocupadas que derramara e os ombros caídos como se estivesse carregando o mundo em suas costas, ela notava tudo em seu pequeno garoto.

― Vai embora? – pergunta ela, revelando seu esconderijo no breu daquela sala.

Suas mãos seguravam fortemente seu quadro preferido, o que continha a foto de Embry ainda bebê, e seus olhos estavam fixos na mochila que o Call carregava em suas costas. Droga! A despedida era inevitável...

― Eu preciso – responde somente, comprimindo os lábios para evitar dizer algo mais.

― Por quê?

― Tem a ver com a Andy, mas não é algo necessariamente bom...

― E para onde vai? – questiona chorosa.

― Não posso lhe contar.

― Vai voltar para casa? Algum dia, talvez?

― Não – sussurra com voz embargada, já não conseguindo conter a tristeza de deixar a segunda pessoa mais importante de sua vida para trás. – Eu te amo, mãe! – diz ele antes de sair pela porta e desaparecer na escuridão da noite.

― Eu também te amo – responde ela depois de vê-lo partir, caindo em lágrimas em seguida.

A chuva logo rompeu as nuvens, condensando-se no processo e desabando por todo o estado em forma de neve, tornando ainda mais fácil a fuga do quileute. À noite o camuflaria, a neve destruiria suas pegadas e a brisa fria que soprava levaria para longe o seu cheiro, era apenas uma questão de tempo para chegar ao esconderijo dos nômades.

Haviam dois lobos fazendo a ronda naquela noite, mas Embry não se interessou em saber quem eram. Ele apenas correu e correu em sua forma humana, escondendo-se entre as árvores cada vez que avistava um dos lobos, entretanto, no fim, os lupinos perceberam sua presença e começaram a segui-lo.

― Parem de me seguir – pede o Call, tentando fazer sua voz soar normal.

O quileute assiste aos corpos dos lobos contorcerem-se e diminuírem, até que seus amigos Paul e Quill estivessem novamente em suas formas humanas. Tinha como ficar pior? Primeiro a mãe, agora os amigos? A vida realmente sabia como ferrar com um momento de fuga...

― Aonde vai com essa mochila? – pergunta Paul franzindo a testa.

― Está indo embora? – questiona Quill.

― Sim.

― Por quê? – Paul novamente.

― Não posso dizer.

― Para onde vai? Aconteceu alguma coisa? Por que está partindo? – Agora era Quill.

― Não posso dizer, não posso contar nada...

E foi neste momento que eles perceberam o semblante caído do amigo, escondido por detrás de sua voz aparentemente normal. Aquela certamente não era uma mera escapada e ele não era apenas um adolescente rebelde que resolveu fugir de casa.

― Está com problemas, não está? – desvenda Quill. – Sérios problemas...

― Nós vamos com você! – relata Paul de forma autoritária, mesmo sem saber do que se tratava.

― Não vão não – rosna o lobo cinzento em resposta, surpreendendo os amigos.

― Somos seus amigos, Embry, queremos nos redimir por nossa participação naquela emboscada, de verdade. Nós podemos e queremos te ajudar.

― Já disse que não – rebate, já dando as costas para seguir seu caminho.

― Tudo bem então, siga em frente... Iremos te seguir de qualquer forma! – Agora era Quill.

― Será que vocês não entendem? – grita furioso, voltando-se para os amigos e já deixando o medo extravasar em suas palavras. – Eu preciso ir sozinho!

― Não, você não precisa – insiste Quill.

― Preciso sim! – Pausa, pensando em suas próximas palavras com cuidado para não revelar coisas demais. – Se forem comigo ou me seguirem, Andy morre!

Os pares de olhos se arregalam com a ameaça, então era de Andy que se tratava? Quem ameaçava a vida da humana? Quem eram os inimigos dos lobos desta vez?

― São vampiros – revela o Call, como se lesse seus pensamentos. – Eles levaram a Andy.

Seus rostos se tornam pesarosos em compreensão, mas então, o que poderiam fazer para ajudar se tinham de permanecer na reserva?

― Fiquem aqui... Se eu não voltar em três dias, aí sim comecem a me procurar.

― Boa sorte, irmão! – deseja Paul, dando um leve soco no ombro do amigo.

― Boa sorte, Embry.

― Se demorar... Por favor, venham me buscar! – Os lobos concordam com a cabeça. – Adeus, amigos.

Embry joga a mochila no chão, transforma-se diante dos olhos atentos de Quill e Paul, apanha a bolsa com a boca e, dando-lhes um último aceno de cabeça, foge de La Push conforme os vampiros haviam mandado. O lobo cinzento sentia seus pelos se eriçarem com a situação em que estava se metendo, sabia que não sairia vivo daquele encontro e por isso dissera aos amigos para buscá-lo, pois planejava retirar Andy de seus inimigos tendo a certeza de que a menina seria encontrada por sua matilha... Só não tinha certeza se ele seria encontrado.


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Notas finais do capítulo

Estou tendo apenas palestras esta semana, por isso consegui concluir mais um capitulo. Espero que gostem, eu particularmente gostei, rsrs, apesar de ser suspeita para falar...
.
No próximo capitulo veremos Embry chegar ao esconderijo nômade. As cartas serão postas a mesa e as regras anunciadas... O jogo da vingança finalmente irá começar!
Próximo capitulo: Uma Semana para a Morte!