Olhos De Vidro escrita por Jane Viesseli


Capítulo 13
Olhos de Vidro




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Embry torce a boca em confusão, não entendendo o que Andy queria dizer com àquelas palavras. Ela era perfeita, então que tipo de brincadeira era aquela? Ele olha ao redor, esperando que alguém saísse dentre as árvores e risse de sua cara de bobo, mas ninguém saiu...

― Ow, isso é algum tipo de piada? – pergunta confuso, um sorriso brincando em seus lábios.

― Não. – Ela ri, e seu nervosismo era evidente em sua voz. – Eu sou realmente cega, Embry.

― Que tipo de brincadeira é essa? – pergunta rindo.

Andy sente seu sorriso murchar e a confiança escorrer por entre seus dedos. Por que ele ria? Por que não acreditava? Talvez estivesse fingindo há tanto tempo, e tão bem, que esteja sendo difícil para ele entender e enxergar a verdade... Talvez devesse insistir!

― Não é brincadeira – explica –, minha mãe adquiriu rubéola durante a gravidez e isso me afetou ainda no ventre. Minha cegueira é congênita!

― Pare com isso, Andy, está perdendo a graça – pede em sua incredulidade, não rindo mais.

― Isso acontece, Embry, algumas doenças durante a gestação podem afetar o feto e causar a perda de visão. Foi o que aconteceu comigo, mas...

― E os livros? – pergunta ele, lembrando-se do dia em que a encontrara. – Você estava lendo o livro dos sonetos quando nos vimos pela primeira vez!

― Não estava. – Suspira. – Minha avó o lia para mim desde os doze anos, eu apenas decorei alguns sonetos e os recito de cor, eu finjo ler.

― Não faz sentido, Andy, por que você fingiria estar lendo?

― Ser uma criança cega não é fácil, Embry – tenta esclarecer, mantendo-se o mais paciente possível. – As pessoas te olham como se fosse um defeito da natureza, uma pessoa inútil e dependente. Minha avó sempre tentou manter-me longe do lado mal das pessoas e desde cedo trabalhamos para que eu conseguisse caminhar em meio aos videntes sem levantar suspeitas, sem que soubessem de minha deficiência... Não é como se tivesse vergonha de ser assim, mas algumas pessoas não estão preparadas para saber.

― Por que continua insistindo nessa brincadeira? Você leu Romeu e Julieta para mim, como explica isso? – questiona com uma pitada de ressentimento na voz, se aquilo era uma prenda, não estava mais tendo graça.

― Conhecia a história de cabeça. Eu sabia que não gostava de Shakespeare e por isso nunca iria conferir o livro em minhas mãos, então contei o que me lembrava da história e as partes que esquecia, eu inventava.

― Isso é ridículo! – grita, fazendo-a se calar. – Seus olhos são perfeitos... Lindos, azuis e perfeitos. Por que insisti em dizer isso? Você não é cega – frisa, dizendo as últimas palavras altas e pausadamente.

― Olhos de Vidro – sussurra ela, fazendo-o franzir a testa. – Você sabe o que são?

― Não – resmunga.

― Olhos de Vidro são implantes oculares, são perfeitos, parecem reais, mas não passam de bolas de vidro. – Uma lágrima cai de seus olhos ao dizer tais palavras, ele não estava gostando de sua revelação e isso lhe doía o peito. – Apesar de meus olhos serem humanos, são como os olhos de vidro: perfeitos e parecem reais. A formação deles foi completada e qualquer um que me ver acreditará que são bons, mas são bons apenas em sua aparência, pois na realidade não funcionam... Eu não posso ver.

Um silêncio incômodo se instalou entre eles. Andy permanecia quieta, com o rosto mirado em direção a ele, somente esperando... Embry esfrega os cabelos, a nuca, o rosto, ponderando cada palavra ali falada. Nada fazia sentido, ela não podia ser cega, como pudera estar ao seu lado e nunca perceber tal coisa? Os olhos azuis voltados em sua direção naquele momento... Seria mesmo que não podiam vê-lo?

Ele se aproxima silenciosamente, passando a mão diante de seu rosto e observando com atenção as retinas imóveis no fundo de seus olhos. Elas não se moviam, não contraíam e nem dilatavam... Era real, sua deficiência era real. Os orbes perfeitos que aprendera a amar não funcionavam de verdade, nunca o enxergaram e não podiam ver sua alma como sempre imaginara. Andy era realmente cega!

Naquele momento, certas coisas começaram a fazer sentido, o porquê dela sempre olhar para baixo, se esconder nos livros ou atrás de seus cabelos, de sempre olhar para o vazio como se estivesse pensando e o porquê dela sempre deixá-lo guiar os passeios, sempre tropeçando enquanto caminhava e se agarrando em seu braço.

Andy nunca sabia para onde estava indo. Ela não vira a praia, não vira a reserva, não vira as fotos, não vira sua mãe, não vira sua forma de lobo, e nem sequer conhecia o seu rosto. Nada, ela nunca viu nada...

― Você olhou para mim – fala em meio aos seus devaneios. – Durante vários momentos você olhou para mim, para o meu rosto... Diretamente para os meus olhos.

― Não olhei – explica num sussurro –, apenas ouvi sua voz e me virei em direção a ela...

― Como pode amar aquilo que não vê? – Se exaspera, realmente achando que seu amor por ele não fosse real.

― Eu enxergo o mundo de uma maneira diferente, só isso – continua a sussurrar, a insegurança com o rumo daquela conversa era nítido. – Para um humano "normal" a visão é indispensável para amar alguém, mas não é preciso realmente ver para se gostar. Para mim, a sedução ocorre através do diálogo, do toque das mãos, do cheiro, do timbre de voz, da textura da pele... Posso me apaixonar como qualquer outra pessoa e sou fiel aos meus sentimentos quando digo que te amo, Embry!

Outro entendimento borbulha na mente do quileute: era por aquele motivo que ela se prendia tanto a "segunda vista", pelo simples fato de não conseguir enxergar e precisar usar seus outros sentidos para captar o mundo ao seu redor. Era por isso que ela nunca se sentiu atraída pelo seu físico como as outras garotas, sem vê-lo era impossível se atrair, e talvez fosse pelo mesmo motivo que ele demorou tanto a conquistá-la.

Droga de imprinting que vendou seus olhos para o óbvio. Seu coração envolvido por Andy, seu corpo desejando sua presença e seu nariz embriagando-se com seu perfume, tudo isso tampou seus olhos para o que agora lhe era tão nítido.

Embry sente a respiração tornar-se ofegante quando a raiva e os maus pensamentos inundaram seu coração e mente. Por que ela era assim? Por que seu imprinting era assim, defeituoso? Por quê? Por quê? Por quê? Por que havia esperado tanto para isso?

― Não é justo! – diz finalmente, dando voz aos pensamentos ruins em sua cabeça. – Fui o último dentre os meus amigos a encontrar uma garota, o único a levar deboches e ser vítima de piadas, esperei por anos pela garota ideal e, quando ela finalmente, aparece é defeituosa? – termina rispidamente, fazendo a menina arregalar os olhos com tais palavras. – Não é justo, passei mais tempo sozinho do que todos do bando, esperava que minha companheira fosse, no mínimo, perfeita!

Andy não conseguia acreditar no que seus ouvidos captavam. Sempre ouvira piadinhas dos garotos em seu trabalho, mas nunca se sentiu tão atingida como naquele momento. Justo o homem a quem entregara seu amor, era quem estava a agredi-la e a chamá-la de imperfeita.

E foi neste momento que a ruiva vestiu sua armadura e assumiu uma posição defensiva.

― Não sou defeituosa! – grita em sua defesa. – Sou deficiente, é bem diferente!

― Pra mim é a mesma coisa e eu merecia algo melhor! – rebate no mesmo tom.

― Se não está satisfeito, por que não vai embora então?

― Boa pergunta, obrigado por me sugerir isso.

Embry marcha sobre a neve, passando pela menina ruidosamente. Contudo, antes que pudesse se afastar muito, Andy continua:

― E quer saber mais? – Ele para ao ouvi-la. – Sabe por que eu canto enquanto caminho? – Silêncio. – Por que essa é a única forma que eu tenho de decorar o percurso para determinados lugares... Eu conto meus passos, crio músicas ridículas, faço um mapa cantado, apenas para conseguir caminhar normalmente pela cidade, para não ser tratada como uma inválida e conseguir sair de casa sozinha...

― Por mim, não deveria ter saído nunca – murmura ele, antes de continuar sua caminhada e deixá-la sozinha na floresta.

A frase do quileute fora curta, porém cortante. Um golpe certeiro no coração da humana que já começava a amaldiçoar o dia em que se encontraram, e a se arrepender de ter aberto seu coração para ele. Como fora burra ao confiar nele, ao confiar no amor que lhe declarava. Andy sentia-se uma completa ingênua por acreditar que existia, naquele vasto mundo, um homem que prestasse a ponto de amá-la sem importar-se com sua deficiência.

O quileute a deixara ali, sozinha, sem se importar se ficaria bem, segura ou em como voltaria para a praia. Embry nem sequer se lembrara do vampiro que a perseguia e com ela não era diferente.

Andy pensa em respirar profundamente, mas quando tenta puxar ar, os soluços rompem sua garganta num pranto desesperado. Seu coração doía de maneira sem igual e, por um momento, ela pensou se aquela era a dor que os cardíacos sentiam antes de um ataque. Contudo, talvez a dor dela fosse pior, pois não passaria com uma simples massagem cardíaca. Muito pelo contrário, ficaria ali doendo, doendo, doendo e doendo.

Alguns segundos de choro e sua voz logo rompe as lágrimas de maneira estridente, ecoando de suas cordas vocais num grito desesperado e desiludido. As árvores pareciam tremer com seu berro e um ou outro animal parecia fugir assustado, mas ela não ligava para mais nada, não queria captar mais nada ao seu redor. Dor, muita dor, era tudo o que sentia.

― Andy? – chama uma voz masculina atrás da humana. – Você está bem?

O garoto toca o ombro da ruiva, deixando que sua alta temperatura atravessasse seu casaco e a fizesse se afastar. A voz não era parecida, mas o calor de seu toque muito a lembrava de Embry e tudo o que ela queria era esquecê-lo completamente.

― Sou amigo do Embry, o Quill, creio que ele nunca falou de mim, mas... Eu o vi retornando a praia e estava furioso. – Pausa, analisando o semblante desolado da humana e se compadecendo dela. – Aconteceu algo?

― Eu quero ir pra casa – responde dentre os soluços, reconhecendo o nome do garoto que ajudara na armadilha contra o Call. – Me leve de volta à praia, por favor, eu quero ir para minha casa!

Quill contorce o rosto em pena, enquanto a guiava por entre as árvores e a levava de volta às areias de La Push. Talvez ela não percebesse o quão lastimável parecia naquele momento, porém, ele via a aflição estampada em seu rosto e se movia em compaixão.

― Como pôde, Embry? – pensa ele. – Se fosse eu, preferia morrer a ver meu imprinting derramar uma lágrima sequer...

Andy partiu e, naquela noite, chorou como nunca havia chorado em sua vida. O inverno nunca tinha lhe parecido tão frio, o coração que havia aberto para Embry estava em pedaços e o amor que o havia oferecido, devolvido com reprovação e preconceito. E por que ele não ficaria com ela? Porque a considerava defeituosa...


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Notas finais do capítulo

Aí estão as explicações (pelo menos todas as que lembrei de dar). Apesar de bastante gente ter acertado o segredo da Andy, ainda tiveram os leitores que não notaram e ficaram espantados com a revelação. Fiquei feliz é claro, é sinal que não sou tão ruim para esconder coisas na história (kkkk).
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Agora que sabem de toda a verdade, poderão notar com facilidade as "esquisitices" que Andy fazia nos capítulos anteriores... Outro detalhe que não mencionei no capitulo - porque não era viável - é o fato de eu nunca ter mencionado que ela "olhava" para Embry e sim, "tombava a cabeça" em direção a ele, hahaha, mensagem nas entrelinhas...
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Espero que tenham gostado ^^
No próximo capitulo teremos um pequeno avanço no espaço/tempo da história (apenas alguns dias de avanço). E como Andy ficou depois da discussão...