A Caçadora escrita por jduarte


Capítulo 49
Quem Era Ela? - £




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– Sabemos que tem várias criaturas aqui dentro, e não nos preocupamos, afinal, já fomos uma delas, e contanto que não nos causem problemas maiores do que os Finnik, estaremos dispostos a lhes propor fazer um acordo.

Merda, ouvi Edward xingar e percebi que ele ainda estava conectado à mim. Eu podia sentir tudo o que sentia. Medo, apreensão, raiva, e mais um pouco de medo.

– Nos ajudem a acabar com os irmãos de uma vez por todas e deixaremos todas as criaturas que estão nesta sala saírem ilesos de qualquer coisa que possa acontecer no futuro. - Susan disse. A voz não tão amigável quanto antes.

Ouvi grunhidos baixos demais para reconhecer de quem havia sido, e Felícia estalou a língua.

– Se os dois estão humanos, então é mais fácil para mata-los. – uma caçadora da divisão de Ohio disse. Em sua mesa havia pelo menos cinco pessoas, todas elas homens e de aparência assustadora.

– Sim. – Felícia se pronunciou pela primeira vez, a voz era baixa e delicada, muito diferente do que suas feições acusavam. – Mas não é o bastante. Nosso código de conduta não permite que matemos humanos.

Ouvi a caçadora de Ohio bufar e a vi cruzar os braços em cima do peito, como se achasse toda aquela conversa uma pura perda de tempo. E eu também achava.

– Teremos ainda que arranjar uma maneira de a caçadora que o está “enfeitiçando” ser recompensada. Afinal, ela é a pessoa que tornará a morte deles possível. – Ela acrescentou com uma mudança no tom de voz considerável.

Engoli seco quando seus olhos pousaram em cima de mim, e por alguns segundos eles desviaram, me deixando com uma incerteza enorme dentro de mim:

Felícia sabia ou não de meu segredo?

– Vocês disseram que também já foram criaturas místicas, – me ouvi falando, procurando tirar o foco um pouco do assunto “a morte dos Finnik será por minha culpa”. – o que eram?

Mais uma vez eu era posta no centro das atenções. A cadeira de Edward se arrastou sem ruído até meu lado, e ele estendeu a mão para mim, como se estivesse me dando apoio. Mesmo depois de saber que eu era a pessoa culpada por tudo. Peguei-a e pressionei seus dedos, gentilmente, agradecendo em silêncio por um simples gesto que havia tirado parte de um grande peso de minhas costas.

– George e Alex eram demônios, assim como eu e Susan, - Amélia disse, e lançou um olhar simpático para Felícia. – e Felícia um espérer.

Por isso ela era tão magra e muito menos graciosa do que os outros. Ela não tinha aquele ar de superioridade que todos eles possuíam. Felícia havia sido tratada, por Deus sabe quantos anos, como o lixo da sociedade de criaturas místicas, e por isso eu sentia um aperto no coração ao pensar em quem poderia amar um monstro.

George, que ainda estava do lado de Amélia, entrelaçou seus dedos nos dela, e Alex fez o mesmo com Susan e Felícia ficou ali, parecendo uma criança perdida. Seu olhar encontrou o meu e sorri, mas não foi retribuído, uma vez que ela levantou o queixo, tentando ser tão prepotente quanto os outros, fingindo ser uma coisa que eu tinha certeza não ser.

Ela havia se tornado humana novamente, ou mortal, mas por quem ela teria se apaixonado tão ferozmente a ponto de fazer seu coração voltar a bater? Eram tantas perguntas, que eu nem ao menos sabia como formular em minha cabeça.

E o que mais me incomodava era: o que diabos eles faziam aqui? E porque tinham uma hierarquia tão grande?

Meu celular vibrou no bolso, e uma mensagem de Jason apareceu na tela: “Estou quase chegando a casa de Max. Não me contive em te esperar. – Jazy.”

Praguejei várias vezes, e mandei uma mensagem para a única pessoa que havia vindo em minha cabeça. Polux. Ele não deveria estar fazendo nada, certo? Poderia muito bem seguir meu irmão e ver se ele não arranjaria nenhuma encrenca.

“Está ocupado?” mandei.

Em menos de um minuto a resposta chegou:

“O que precisa?”

“Fique de olho em Jason por mim? Ele vai para casa de Max Ploug e não quero que arrume nenhuma encrenca.” coloquei. Cruzei os dedos para que Polux fizesse este fazer este favor a mim, e sorri quando vi a resposta:

“Qualquer coisa por você, meu anjo.”

Tive sorrir com a ironia. Ele era meu anjo, e não ao contrário.

Não respondi a mensagem e procurei me concentrar na reunião.

– As divisões vão receber dentro de alguns dias instruções para prosseguir com a missão que lhes será dada. Espero não ficar desapontado com ninguém. – Alex disse, soando mais sério do que eu esperava, olhando pela sala por diversas vezes, mas não parando para encarar ninguém.

Felícia se levantou, e sem ao menos dizer nada saiu pela porta por onde havia entrado. Alex e George se entreolharam, e Amélia deu de ombros.

– Não nos desapontem. A Ordem não dá segundas chances. – Susan avisou, afiada.

Engoli seco e me levantei quando eles todos saíram pela porta, sentindo o coração acelerado de uma maneira anormal. A mão de Edward veio sobre a minha e ele me puxou para fora.

– Vamos para casa de Max.

Estanquei no meio do caminho.

– Como...

– Sua mente não é nem um pouco protegida.

Enrubesci deixando-a rodeada por vários muros imaginários que circundavam meus pensamentos e os trancavam com um cadeado daqueles gigantes, e Edward assentiu.

– Bem melhor. – ele disse mais para si mesmo.

Apesar de ainda estar bravo comigo, ele parecia bem menos “babaca” do que antes. Pelo menos estava falando de uma maneira menos grosseira.

Alcançamos um dos carros em que viemos e Edward entrou no carro, ligando-o, sem ao menos esperar pelos outros.

– E os outros? – perguntei.

– Eles podem ir com os outros carros. Este é para emergências.

Levantei uma das sobrancelhas, abrindo a porta do passageiro e entrando.

– Emergências?

– Chega de perguntas, Helena. Quando chegarmos em casa teremos a chance de conversar. Agora não estamos em um lugar seguro.

E com isso, coloquei o cinto e Edward avançou pelas ruas. Não me importei em lhe dar o endereço, eu já sabia que ele tinha todas as coordenadas de cabeça, e por minha causa.

Eu tinha que aprender a como manter minhas ideias trancadas e secretas permanentemente. A sensação de ter alguém o tempo inteiro vasculhando minha cabeça, descobrindo todos os meus segredos, não me era muito atrativa.

Poucos minutos depois de estarmos trafegando pelas ruas agitadas e barulhentas de Manhattan, chegamos na frente de uma townhouse de tijolos escuros e cercas pretas, parecendo pacata, mas ao mesmo tempo misteriosa. Identifiquei os números 240 em preto presos em cima da larga porta de madeira branca, e saí do carro indo em direção as escadas. De longe pude ver uma placa com o nome: Max Ploug – Jornalista com o número 12 com um botão, e antes que eu fizesse a menção de apertar ouvi uma voz rouca dizer pelo interfone:

– Podem subir.

Os pelos de meu corpo se arrepiaram e me virei para Edward, que insistia em olhar para o telhado.

– O que foi? – perguntei baixo.

– Tem alguma coisa lá em cima. – ele disse cheirando o ar, e depois franzindo o nariz.

Uma sombra se jogou – literalmente – do telhado e pousou com um ruído baixo na minha frente, arrumando o cabelo louro que caía nos olhos e ofuscava minha visão pelo sol refletindo nele.

– Polux Finnik. – ouvi Edward dizer com desprezo.

A risada sarcástica de Polux invadiu meus ouvidos, proporcionando-me um prazer inenarrável.

– Também não sinto um afeto por você, mas não há necessidade de me chamar pelo nome completo, Edward Holt.

Revirei os olhos e cruzei os braços. Eu não via Polux desde a noite passada, e já sentia como se precisasse tocá-lo novamente.

– O que está fazendo aqui, Finnik? – meu companheiro perguntou, com os punhos fechados.

– Helena me pediu para ficar de babá. – Polux deu de ombros.

A confusão que eu esperava passar pelo rosto de Edward, não apareceu.

– Nate pode não ter lhe matado na igreja, mas pode ter certeza de que matarei agora. – ele sussurrou, pegando na arma que estava pendurada na cintura, ameaçadoramente.

– Não vai não. – me intrometi. – Chega de mortes, por enquanto. – acrescentei enquanto Edward me olhava torto.

Andei em direção à porta, e a forcei, somente para encontrá-la aberta. Ouvi a voz de meu irmão e a segui. A townhouse não tinha nenhum elevador, mas por sorte elas não tinham muitos andares, e o tal Max morava no primeiro andar.

Percebi que a voz vinha de uma porta aberta, de madeira escura e envelhecida.

– ... E por que escreveu aquilo? – meu irmão perguntou.

Parei na frente da porta, e encarei as costas largas de meu irmão. Seu cabelo parecia desgrenhado e ele estava vestido com uma calça jeans preta, rasgada e puída e uma camiseta branca larguinha com um moletom por cima. Sem contar que estava calçando chinelos.

Ele não poderia se vestir um pouquinho melhor para conhecer Max pela primeira vez? E se ele achasse que meu irmão era um mendigo e decidisse não contar nada?

– Porque na época eu não aceitava o fato de que um pirado ganhava muito mais do que eu, contando lorotas. – outra voz soou calma.

Bati com os dedos na porta, e ambos tomaram um susto. Principalmente o homem na cadeira de rodas. Algo dentro de meu estômago pareceu se contorcer quando vi que ele tinha uma aparência bem doente e deplorável.

– Max Ploug? – perguntei. O homem veio até mim e esticou as mãos finas e cheias de veias. Ele não era tão velho assim, mas a aparência de estar doente o deixava mais magro e aparentando ser bem mais velho do que deveria realmente ser, isso eu tinha certeza.

– Seu irmão me falou sobre você querer achar Janice. Você é Helena, - ele chacoalhou minha mão, enquanto eu tinha medo de tocar em sua pele fina e delicada demais. – e você deve ser Edward. – Max se virou para Edward e esticou a mão para ele.

Pude ver na expressão de meu companheiro que ele estava com tanto medo de tocar nas mãos de Max quanto eu.

– Estava esperando todos se juntarem para poder contar onde Janice está, só não esperava que trouxessem visita, se não teria feito mais chá. – ele se virou para dar uma boa olhada em Polux, que colocara as mãos atrás e inflara o peito, fazendo com que ele parecesse ter o dobro do tamanho que realmente tinha.

Antes de eu poder impedi-lo de ir buscar o chá, ele já havia desaparecido de vista. Olhei para Jason que deu de ombros e apontou para as duas xícaras vazias que se encontravam ao seu lado na mesa de canto.

Dei uma boa olhada no apartamento, e me surpreendi ao ver que era extremamente organizado para alguém que vivia nas condições que Max se encontrava. Tão debilitado.

Ele tinha várias prateleiras de livros ao invés de uma televisão e um sofá bege que fazia conjunto com os outros dois de uma cor mais escura, e ficava colado a uma janela enorme. No canto esquerdo da sala havia uma mesa de madeira rústica e escura, com cadeiras aparentemente pesadas e duras. A casa não tinha cortinas, mas era escura por si só, já que as cores claras das paredes eram escondidas pelas várias prateleiras e pelos quadros de flores. A cozinha era aberta para a sala e eu podia ver a silhueta fina de Max zanzar por lá e ocasionalmente enfiar as mãos em armários pegando xícaras para colocar o chá.

Quando ele pareceu parar de remexer nas coisas e arrumar tudo, tentei esconder meu espanto pela quantidade de coisas antigas que ele tinha em cima da mesa de centro, e sentei-me ao lado de meu irmão no sofá longe da janela. Polux veio logo atrás e limitou-se a ficar atrás de mim, com a mão perto de meu pescoço. Enquanto Edward não fez a menção de se mover em nenhum momento, e rosnou para Polux por vários segundos até que Max surgiu na soleira da porta.

Ele colocou as xícaras no centro de mesa e fez um sinal com os dedos para nos incentivar a beber.

– Então, o que querem saber de Janice? – ele perguntou quando viu que eu peguei uma xícara e beberiquei. O chá tinha gosto de meia suja e apesar de cair que nem pedra em meu estômago, sorri agradecendo.

Agora eu entendia a cara de desespero que Jason havia feito. Meu irmão se concentrava até demais no pobre homem que lutava para manter o corpo ereto na cadeira de rodas.

Suas feições eram desprovidas de beleza por conta de uma doença, seus cabelos eram de uma cor cinza e ele não tinha nenhum pelo no rosto além das sobrancelhas ralas. O nariz pequeno e fino, o queixo pequeno demais, e olhos puxados, denunciando sua origem oriental.

– Quem ela era? – perguntei deixando o chá de lado.

Ele me incentivou a continuar a beber, e eu tive vontade de chorar.

Meus dedos queimaram por conta do líquido que respingou neles quando fiz mau-gosto de pegar, e praguejei baixo.

– Janice era a pessoa mais querida que já pisou na Terra. Era doce, feliz, mas amargurada por ter um marido louco.

Tive vontade de jogar o líquido em seu rosto.

– Ele não era louco.

Max riu de uma maneira esganiçada.

– Quem “vê” monstros – ele riscou aspas no ar com os dedos finos e raquíticos. – certamente se encaixa na categoria de malucos.

Sorri forçadamente, tentando manter o controle.

– Voltemos à Janice, você a conheceu?

O olhar de Max parecia perdido no tempo.

– Se eu a conhecia? Ela fora meu primeiro e único amor.


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Notas finais do capítulo

Continua?



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