Destroyed escrita por Debby Valdez


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Gente! Vim cedo, o capítulo já estava pronto!
Os sets serão sempre postados aqui:
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A sensação que algo estava para acontecer não me deixava. Oh, Deus, e se... Não. Não pode. São quinze papeizinhos, mas tem muitas crianças no Distrito. É uma possibilidade muito remota. Aperto o passo, torcendo para que o vento soprasse essas ideias malditas para longe de mim. Não deu certo, pois ao chegar ao apartamento, já suava frio. Antes de entrar, me escoro na parede e acaricio meu pássaro. Pergunto-me qual seria.

Respiro e entro em casa.

Meu pai, Nathaniel, estava assoviando enquanto fritava ovos e pãezinhos na frigideira. Alexy batucava na mesa com seus lápis de desenho e com uma floresta meio desenhada na folha de papel amarelado. Eu não sei como ele consegue. Quando digo “uma floresta desenhada” não é como simples desenhos de giz de cera que qualquer um faz. Tampouco os diagramas recheados de retas e número, baseados em geometria e física que eu faço. Mas florestas com sombreamentos, luz, detalhes, como um retrato. Com apenas 11 anos, meu irmão era um belo artista. Pergunto-me onde ele viu a dita floresta. Não foi na janela dele.

Vendo tudo tão simples e alegre, chego a esquecer do sentimento que me afligia. Me junto à festa pegando um elástico do meu bolso, que eu usava para amarrar diagramas e ás vezes me cabelo, e estralando na mão. Ao notarem que eu começava a me juntar, começaram a aumentar a cantoria. Comecei a lançar umas notas perdidas, valendo do tempo que eu aprendi a cantar na escola. Alexy começa a se soltar também. Até Guy não escada e fica pulando de um lado para outro alegremente. Logo a cozinha se encheu de musica. Nunca vi aquela casa tão alegre desde o acidente.

Por fim, meu pai termina de fritar a comida e se senta. Sento-me junto e Alexy sorri com seus dentes faltando. Papai dá as mãos a mim e á Alexy. Ele sempre foi religioso. Ele murmura algumas palavras e agradecimento pela comida e Alexy o acompanha. Nunca pensei que Deus realmente existisse. Se ele existisse como papai fala, ele não seria meio cego e mamãe não estaria morta.

Começamos a comer ainda sorridentes. Queria que todo dia fosse assim. Mas amanhã, todos nós teremos que voltar para trabalhar. Papai trabalha o dia todo, Alexy estuda o dia todo. Eu estudo a manhã toda para trabalhar a tarde toda. Os bairros residenciais do Distrito 3 são vazios nos dias úteis, exceto pelos pacificadores que rondam para proteger nossas casas. E nos oprimir com aquele aspecto de inseto branco de guerra. Eles lutam mais contra nós do que por nós.

– Então filha. Peguei sua roupa de colheita. – Ele me olha com a cabeça meio virada.

– Aonde você pegou? – Falei enchendo minha boca com o sanduíche de ovos que meu pai fez. Meu pai é uma raridade. Até mesmo um simples sanduíche com ovo frito parece mais gostoso que qualquer uma das iguarias da Capital que eu os vejo comendo na apresentação dos Jogos.

– No... Armário da sua mãe. – Paro de comer. Ele sabe que eu não queria. Se eu pudesse, teria queimado o armário. Isso só me faz me lembrar dela. Eu posso ser uma lista de coisas, mas não sou nostálgica.

– Pai...

– Só hoje. Por favor... – E aí vem ele, com a cara pior que o Guy quando caiu do caminhão de mudança. Mas eu voltei pra pega-lo e Guy ficou bem feliz.

– Certo. Mas, por favor, não faz mais isso. – Suplico. Não quero parecer com aquela garotinha que vive com o trauma de não ter mamãe. Se dissesse que eu não sentia, estaria mentindo. Mas não quero deixar transparecer. Não quero ser alvo de pena dos outros.

– Combinado. – Ele promete piscando o olho bom.

Termino de comer e vou para o meu quarto, afagando a cabeça de Alexy.

Entro e vejo no trinco da porta. Um vestido curto azul, com uma parte de tecido e por cima um tule fino. Embaixo, um par de sapatilhas azuis com laços de seda. Odeio aquele vestido que ainda carrega seu cheiro. Amaciante, chiclete de morango e algo mais dela. Algo que ainda não achei palavras para descrever o quão bom é. Ao contrário de muita coisa na casa, não fede a fumaça.

Tento me livrar do torpor que o vestido me causou. Pego meu colar e deslizo uma pequena chave rente ao pássaro. Chave essa que eu ainda não sei como fazer para me livrar dela. Explicando melhor.

Faz quase um ano. A colheita se aproximava, eu estava assustada. Fui para o único lugar que me acalmava. O quarto dos meus pais. Não porque tinha o cheiro dela ou me fazia lembrar. Já disse que não sou nostálgica. Mas porque tinha uma mesa grande com todo tipo de ferramentas, materiais e mais. O melhor eram os projetos.

Nesse dia, eu achei um que aparentemente estava escondido. Era um pequeno dispositivo, porém muito complexo. Resolvi construi-lo, talvez me acalmasse. Tinha peças bem legais lá por cima e uma caixa com todas as peças para montar o tal dispositivo. Não tinha um nome para “a coisa”, mas continuei. Sempre esperava meu pai sair de casa para montar. Queria mostrar depois de feito.

Uns cinco dias se passaram e estava pronto. Era pequeninho, muito pequeno, azul, e com os fios á mostra. Encarei o objeto em minha mão. De acordo com o projeto, teria uma fitinha que ligasse o dispositivo. Encontrei e puxei. A coisa começou a brilhar e esquentar. Grudou-se á minha mão e deu um comichão. Desesperei-me e, gritando, bati na mesa várias vezes. Ele parou de brilhar e se desgrudou.

Alexy entrou desesperado no quarto. Ele me encarou e perguntou o que ouve. Notei que eu ainda ofegava. Endireitei a postura e o abracei. “Nada, maninho, nada”.

Depois disso, guardei a pecinha numa caixa e tranquei. Tranquei com a chave cujo estou segurando agora. E não fiquei assustada por causa disso. No projeto tinha uma programação e um IP para colocar no sistema. Tenho medo de quem era esse IP, pra quem eu enviei seja lá o que fosse. Achei que deveria queimar, mas não conseguia. Apenas o guardei e tentei não pensar nisso.

Apenas vesti o vestido da minha mãe e tentei desembaraçar minha moita loira. Amarro o cabelo com a mesma liga que brinquei no café da manhã e, relutante, me olhei no espelho. Continuava a mesma. Corpo mediano e magro. Pele pálida e cabelo loiro acastanhado. Olhos cinzentos e azulados. Ridícula, apagada, magra. Sou uma garota fácil de esquecer. Suspiro e tento pensar em algo para melhorar o que vejo no espelho. Mas só vejo uma única solução: Livrar-me do espelho.

Nunca fui uma garota boa em parecer boa. Mari já tentou me convencer a mudar minha imagem, mas não vejo como. Também nunca tive tempo pra isso. Convenço-me que estou bonita, e mesmo não acreditando, vou. Meu pai estava já arrumado com uma blusa branca de manga e calças jeans bem lavadas. Alexy usava uma calça jeans e uma blusa gola polo.

– Os dois rapazes estão belos – Falei com uma mesura.

– E a dama está muito bela – Meu pai falou imitando o gesto.

– Hum, só vejo uma dama aqui. Não vejo de onde veio o bela. – Alexy brinca e dou um tapinha nele.

Sei que tentamos amenizar o clima, mas conforme eu chegava mais perto da praça, mas tensa eu ficava. Meu instinto dizia: “Fuja! Vá para o prédio da cerca, aqui você não vai sobreviver!”. Apenas contei comigo mesma “Um parafuso. Dois parafusos. Três parafusos. Quatro parafusos...”.

Cheguei á frente do prédio da justiça com cerca de cento e cinquenta e sete parafusos. Consegui relaxar um pouco, ocupando minha mente com números e parafusos. Encontrei com Mari na fila para a colheita. Marina e Nicholas Shada são irmãos que moram no fim da minha rua. Eles junto comigo e Jeremy sempre formamos um bom quarteto. Eles até conhecem nosso prédio da cerca. Mas nós temos nos visto muito pouco de uns tempos pra cá. Não sei por quê.

– Oi Mari. – Falei dando a um abraço.

– Hey, Audrey... – Ela falou analisando meu vestido.

– Oi, Nicholas – falei acenando.

– Oi, Audrey – Ele falou ruborizando. Ele é muito na dele e fala mais com a irmã e com uns poucos amigos, dentre eles Jeremy.

– E o Jeremy, cadê? – Mari perguntou.

– Está vindo com o Jake. – Respondo.

Nós três sabemos por que eles sempre se atrasam com tudo em que Jake está incluído. Ele é autista. Ele vive no próprio mundo, bem diferente do nosso. Nunca nos olha nos olhos, conversa coisas sem sentido e nunca conversa com a gente. Ás vezes fica assustado quando alguém quer toca-lo. Por isso Jeremy insiste tanto em estar sempre lá pelo garoto.

Depois de um tempo jogando conversa fora enquanto Lizz Angie, o Prefeito Hovsepian, e os mentores, Wiress e Beetee, se ajeitam nas cadeiras em cima do palco. Jeremy chega segurando a mãe de Jake. Dizemos oi, mas, como era de se esperar, ele não se importou. Depois olhou para algum lugar acima do topo da cabeça de Jeremy e falou:

– Passamos por dezoito casas azuis e só onze amarelas. Hum... – E voltou para seu mundinho.

– Bem... Vamos – Jeremy falou. Nós demos nossos nomes na bancada e fomos cada qual para nossa seção.

A colheita era organizada por idades. Mais velhos á frente e mais novos pra trás, separados por uma divisória com a idade. Jeremy achou alguém que ficasse de olho no Jake na área de 12 anos. Trocamos olhares e ele foi com Mari para a área de 16 anos. Ficou com Nicholas na área de 15 anos. Lizz subiu no palco alegre como sempre.

– Bem vindos á Septuagésima Segunda edição dos Jogos Vorazes, e que a sorte esteja sempre a seu favor. Agora, o Senhor Prefeito Hovsepian vai ler para vocês.

Nós – Jeremy e eu – rimos muito dela. Ela tem a voz extremamente fina e acentuando os “is” e “s”. Será que ela é casada? Como o marido dela aguenta?

Encontro Jeremy na fileira da frente e encaro suas costas. Bom me apegar a alguém que eu conheço bem. Ficamos já muito tempo sozinhos montando gerigonças para dividirmos os lucros. Ás vezes ele é bem mais engenhoso que eu. Seus cabelos negros encaracolados continuam desarrumados e a blusa social azul que ele usa fica estranha para um cara que só uma jeans e camisetas. Ele se vira e encontra meus olhos. Diferente de Jake, ele me olha parecendo enxergar até minha alma. Até um certo dispositivo varrido para debaixo do tapete.

Ele murmura um “Tudo bem?”. Tento me forçar a falar, mas nego. Estou respirando rápido demais, o que me deixa sufocada. Ele percebe e fala “Calma. Estamos bem, certo?”. Não, não estamos. O prefeito termina a leitura chata do Tratado da Traição, falando o quanto somos gratos pelo que a Capital rouba de nós. Lizz assume e fala casualmente:

– Agora vamos ao sorteio dos tributos! Damas primeiro! – Expiro, Inspiro. Expiro, Inspiro. – Audrey Hill!

Aconteceu. Como eu disse, minha intuição nunca falha. Estou apenas vagamente consciente do que acontece. Vou andando e pessoas abrem espaço. O que me resgata é um grito vindo do lado de fora da colheita. Alexy chama por mim. Viro-me e falou em alto e bom som:

– Está tudo bem... – Subo no palco e me ponho ao lado de Lizz sufocando o choro. Nunca fui de chorar, não será agora.

– E agora os cavalheiros. – Ela puxa o papelzinho e lê – Jake Richmond!

Antes de ele perceber, alguém grita á plenos pulmões:

– Eu me ofereço!

Me assusto, porque sei que quem gritou foi Jeremy.


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Notas finais do capítulo

=O Não pensem que será como Jogos Vorazes. Muita coisa pode acontecer e garanto que eles não serão os Amantes Desafortunados do Distrito 3. Bem, até a próxima!