Caso Miranda escrita por Caroline Marinho


Capítulo 13
Indignada


Notas iniciais do capítulo

Sabem o que dizem: Filho de peixe, peixinho é...



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- Você se tornou uma moça muito bonita - ela disse séria e com uma postura ereta, me olhando vagamente de perto.

Rebeca usava um vestido vermelho longo e simples, mesmo sem maquiagem parecia ter um rosto impecável. Aparentava ser até mais jovem do que já era, e o corpo era perfeito. Não era de se admirar que fosse tão "valorizada".

Ela parecia uma mulher realizada e com uma vida perfeita, olhando tudo que a rodeava. Aquilo me doía como uma facada, era como ouvi-la dizer "eu fui feliz sem você". Eu só sabia que Rebeca me parecia não ter coração e nem mesmo alma. E ela ainda falava comigo de um modo como eu estar ali fosse algo inevitável.

Como se não fosse de sua boa vontade.

Eu rangia os dentes. Só a sua presença já me incomodava.

- O seu quarto fica na última porta no fim do corredor. Vai ver 3 roupas no closet que devem ser do seu tamanho. Tome um banho. Compraremos suas coisas amanhã.

Eu a fitei, indignada. Era isso que ela tinha pra me dizer depois de 13 anos? "Você se tornou uma moça bonita, agora vá tomar banho".

Que porra de mãe é essa?

Fui até o quarto. Era lilás. Porra, por que meu quarto era lilás?

Ao menos era espaçoso e parecia aconchegante.

- Eu imaginei - me assustei com a voz dela, não havia ouvido ela chegar ao quarto e ela percebeu o meu susto - Desculpe. Imaginei que não fosse gostar da cor. Então pensei que talvez depois pudéssemos mudar isso.

Ela usava muitos verbos na primeira pessoa do plural. Eu não gostava disso. Não era como se eu fosse família pra ela. Não parecia ser.

Eu a ignorei e fui até o banheiro. Tirei aquela roupa que não queria ver nunca mais e tomei uma ducha demorada. Podia me acostumar com aquela casa. Só não esperava me acostumar com aquela mulher.

Saí do banheiro e coloquei o vestido preto. Todas as roupas além da camisola me pareciam um pouco formais.

Saí do quarto. Ela estava na sala, sentada, e quando ouviu meus passos se levantou e pegou uma chave de carro na mesa de centro.

- Já está arrumada? - disse sem ao menos me olhar - Vamos, vou te levar pra almoçar em um lugar mais agradável.

Acho que eu não tinha escolha.

O carro era chique como tudo que ela tinha, e eu imaginei pra que tipo de gente ela oferecia seus... "serviços". Puta de luxo por acaso ganhava tanto assim? Tipo, tudo bem que ela era muito, muito bonita, mas de onde saía tanto dinheiro?

Chantagem, talvez?

Eu nem queria saber tanto assim...

- É uma cidade calma. Gosto desse clima tropical - ela comentou, tentando puxar assunto - Você voltará pra escola na semana que vem.

"Ha, ha, ela espera que eu vá para a escola. Pobrezinha."

Revirei os olhos.

Ela não disse mais nada até que chegamos ao local.

Parecia um restaurante refinado retrô.  A comida era agradável. Eu não quis dizer nenhuma palavra desde o elevador com Guill e não pretendia dizer tão cedo com ela. E ela se manteve calada quase todo o tempo, acho que percebia que não queria papo.

Ela parou no meio da refeição e ficou me encarando.

- Eu poderia te arrumar aulas de etiqueta.

Soltei os talheres e a encarei.

- A "senhorita" - respondi, em um tom irônico - poderia prestar mais atenção no que fala.

Ela suspirou.

- Uma distância de 13 anos não me faz deixar de ser sua mãe. Acho bom que me respeite.

Forcei uma risada rápida.

- Ter me arrancado de tua barriga não te faz minha mãe.

Voltei a comer, mais voraz, completamente irritada.

- Eu não tinha idade suficiente para lidar com uma criança.

- Eu fui um problema que você evitou - respondi, decepcionada.

Ela deu de ombros.

- Você foi um imprevisto inevitável. Se soubesse que seu pai... Que aquele homem miserável abusaria de você, teria tomado sua guarda muito antes.

- Comovente - respondi, ainda olhando para o meu prato - Ouvir você dizer isso não muda em nada. Continuarei sendo seu imprevisto inevitável.

Ela se manteve rígida e calada, imóvel, olhando para mim com um quê de intriga, como se eu estivesse errada.

- Achei que estivesse fazendo o certo por nós duas - ela disse, depois de um minuto.

- Fez o que parecia certo pra você. Eu não tive como opinar, não é mesmo?

Desde então foi silêncio até a hora de me deitar. Sabia que o clima seria o mesmo ali dentro por um bom tempo.

Até ali não tinha coragem alguma para voltar a fazer o que fazia antes.

Meu cérebro sempre associava as mortes à sala escura.


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