As Quatro Estações - Romione escrita por Verônica Souza


Capítulo 1
Inverno 1


Notas iniciais do capítulo

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               Coloquei meu terno, calcei os meus sapatos, e coloquei a minha gravata. Tentei dar o nó uma vez, tentei duas, tentei três. Desisti. Eu era péssimo em dar nó em gravatas. Mas eu teria que conseguir. Teria que começar a fazer as coisas, sozinho. Tentei mais uma vez.

- MAS QUE MERDA! – Gritei jogando a gravata do outro lado. Fui pra janela e observei a neve caindo lá fora, quando Gina entrou no quarto.

- Precisa de ajuda com sua gravata?

               Olhei para ela, e vi que seus olhos estavam vermelhos. Raramente eu tinha visto Gina sem maquiagem, e quando a olhei, mais uma vez fiquei com vontade de chorar. Queria abraçá-la e chorar, chorar, chorar.

- Sim, preciso. – Respirei fundo e fui até o outro canto do quarto pegar a gravata. Coloquei-a em volta do meu pescoço e me aproximei de Gina. Ela começou a dar o nó em minha gravata, e seus olhos foram se enchendo de lágrimas. Eu sabia que ela queria chorar, mas estava tentando ser forte.

- Você pode chorar Gina, não precisa parecer forte. – Eu disse vendo que estava sendo impossível ela segurar suas lágrimas. No mesmo instante, Gina me abraçou e desabou em lágrimas.

- Eu queria poder fazer alguma coisa Rony! Eu queria poder trazê-la de volta. Queria poder voltar ao passado e impedi-la de entrar naquele carro.

               Eu quase não entendia o que ela falava por causa dos soluços. Apenas apertei o abraço e engoli o choro. Eu iria segurar até quando pudesse. Não poderia parecer fraco na frente de Rose, ela precisava de mim.

- Eu também Gina. – Beijei sua cabeça e a fiz olhar para mim. – Mas temos que seguir nossas vidas. Rose precisa da gente, e eu preciso de vocês.

- É claro. – Ela disse limpando as lágrimas com um lenço de papel. - Eu irei ajudar vocês. Vou vim aqui todos os dias, vou trazer Tiago e Alvo para brincarem com Rose para entretê-la e ela não pensar nisso. – Ela deu um sorriso triste. – Nós vamos conseguir Rony. – Ela segurou minhas mãos e as apertou.

- Eu sei que vamos Gina. – Eu beijei suas mãos, ela beijou o meu rosto e saiu me deixando sozinho no quarto.

               Mais uma vez fui até a janela e observei a neve caindo. Maldita hora que minha estação preferida foi chegar.

- Filho? – Mamãe entrou cuidadosamente no quarto. Respirei aliviado. Ficar sozinho me fazia pensar demais.

- Oi mamãe. – Virei para ela e ela correu para me abraçar. Respirei fundo. Isso já era demais. Um abraço de mãe faz a gente sentir que está protegido, faz a gente parar de esconder as coisas para nós mesmos. Assim, chorei. Ficamos durante mais ou menos cinco minutos chorando. Ninguém queria dizer nada. Mamãe sabia que eu precisava daquilo. Precisava soltar aquelas lágrimas que guardei durante dois dias inteiros.

- Eu sei como está se sentindo filho. Uma mãe sente a dor dos filhos. Tudo o que você está sentindo eu sinto também. – Ela dizia enquanto me abraçava e chorava.

- Eu não vou conseguir mãe. – Eu falava entre soluços. – Não posso cuidar de Rose sozinho. Não posso seguir minha vida sem ela mãe. Eu não consigo. – Quanto mais eu falava, mais eu chorava. – Eu a amo muito mãe.

- Eu sei filho. – Minha mãe apertava mais ainda o abraço. – Mas nós vamos te ajudar. Aos poucos você vai superando. Hermione era uma pessoa maravilhosa, só temos lembranças boas dela. – Ela se afastou para me olhar e segurou meu rosto, enxugando minhas lágrimas. – Ela vai sempre estar presente no seu coração Rony, te dando forças e te ajudando a cuidar de Rose.

- Mas eu a quero aqui mãe. Quero-a aqui comigo!

- Eu sei que quer Rony, mas infelizmente não podemos fazer nada. Eu queria muito poder fazer alguma coisa, mas não podemos... Só podemos seguir em frente.

               As palavras dela pareciam me acalmar. Aos poucos fui respirando fundo e me acalmando. Parecia ter tirado um peso das minhas costas. No momento em que limpei meu rosto, Rose entrou no quarto. Seus olhinhos estavam brilhantes e confusos. Seria difícil para uma criança de quatro anos, aceitar a morte da mãe.

- Papai? – Ela se aproximou. – Tio Harry pediu para chamar o senhor. Disse que temos que ir.

- Eu vou na frente. – Minha mãe disse beijando meu rosto e o de Rose, e depois saiu do quarto.

- Filha, senta aqui. – Eu a coloquei sentada na cama e me agachei na sua frente. – Você consegue entender tudo o que está acontecendo?

- Sim papai. Tia Gina e Tio Harry já me explicaram que agora a mamãe ta no céu. – Meus olhos se encherem de lágrimas. – Mas eu sei que ela vai ta aqui com a gente papai. – Ela me deu um de seus sorrisos mais lindos. – Não precisa chorar. – Ela limpou as lágrimas que insistiam em cair no meu rosto. – Eu vou cuidar de você papai. – Ela me abraçou.

               Aquilo era demais pra mim. Minha filha de quatro anos sendo mais forte do que eu. Eu era mesmo um fraco. Não tinha capacidade de acalmar minha própria filha. Enquanto eu me xingava de todos os nomes possíveis em pensamento, Harry entrou no quarto, nos chamando para irmos. Mais uma vez meu coração doeu, e então peguei Rose no colo. O pior ainda estaria por vir.

               Além da neve caindo, o céu estava nublado. Nem o sol havia se atrevido a sair naquele dia. Era mesmo um dia muito triste. Aproximei-me da multidão de pessoas, e tentei parecer calmo e tranqüilo. Havia muitas pessoas presente, ex colegas de classe, colegas de trabalho, amigos de infância, familiares. Eu estava agradecido por todos terem ido, mas preferia que fosse algo mais privado.

               Segurei a mão de Rose e fomos nos sentar. Sentamos na primeira fileira de cadeiras. Ao meu lado, Harry e Gina. Ao lado de Rose, meus pais. Meus outros irmãos estavam na fileira de trás. Ninguém disse uma palavra desde que chegamos. Era constrangedor aquele silêncio. Apenas o padre falava, mas eu não entendia uma palavra. Outra coisa havia chamado a minha atenção. Logo atrás do padre, estava o caixão. Branco com detalhes dourados. Gina havia escolhido. Na verdade, ela e Harry prepararam tudo. Eu não tinha cabeça para fazer nada. Mais uma vez me senti inútil. Meu coração foi se apertando, e minhas pernas começaram a tremer. Não queria acreditar que dentro daquele caixão estava a mulher da minha vida.

               Muitas vezes fui a velórios e enterros, e nunca acreditei que colocavam realmente o corpo das pessoas dentro dele. Sempre pensei que alguém guardava os corpos para no futuro fazer experiências. Mais uma vez meu coração doeu. Hermione teria rido de tanta asneira. Mas eu tinha que encarar a realidade. Ela estava trancada dentro daquele caixão, e eu teria que lidar com essa realidade. Um sussurro me acordou de meus devaneios, era Rose.

- Papai, você acha que a mamãe consegue respirar dentro daquela caixa? – Ela perguntou com inocência. Meu Deus. Eu não sabia que meu coração poderia suportar tanta dor.

- Não filhinha. Ela não precisa respirar. Ela está no céu agora.

- Então porque a vovó me disse que ela está ali dentro?

- É porque quando as pessoas morrem, um anjo vem buscar a alma delas e levar para o céu. Aquilo ali dentro é apenas o corpo dela.

- Então ela não vai voltar nunca mais papai? Ela não ta aqui com a gente mais? – Sua voz foi ficando rouca. Ela ia chorar.

- Ela... Bem... – Como explicar isso? – Ela ta filha... Mas é que.

- Então abrem aquela caixa pra ela respirar papai! Ela não vai conseguir respirar! – A voz dela foi aumentando e Harry e Gina se levantaram para ajudar. O padre parou de falar e as pessoas se viraram para olhá-la.

- Abre papai! Abre a caixa! – Ela chorava e meu coração se cortava. Eu segurei sua mão tentando acalmá-la, mas eu não tinha condições... Ia começar a chorar.

- Rose meu bem, vem com a tia. – Gina a pegou no colo com os olhos cheios de lagrimas e saiu com ela, seguida por Harry.

               Aquilo era demais pra mim. Abaixei minha cabeça e desabei a chorar. Meu pai se levantou e me abraçou. Raramente meu pai nos abraçava. Era reconfortante sentir o abraço dele. O padre se aproximou e perguntou se queríamos que ele encerrasse. Minha mãe achou melhor. Ele disse suas ultimas palavras e as pessoas se levantaram. Todos os meus irmãos se aproximaram e me abraçaram juntos. Foi aí que eu me emocionei mais ainda. Deve ser estranho seis marmanjos altos e fortes desabando em lágrimas.

               Cheguei em casa atordoado. Rose estava dormindo e eu a coloquei em sua cama. Foi um dia difícil. O mais difícil da minha vida. Ficava lembrando o momento do enterro. O coração doía. Agora era certeza. Ela estava morta. Mas não para mim.

               Entrei no nosso quarto e olhei nossa foto em cima da escrivaninha. Aquele sorriso lindo e encantador. Deitei na cama olhando nossa foto e fiz uma promessa a mim mesmo: Eu nunca irei me apaixonar por outra pessoa.

              


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