Sorria! escrita por UniversoInfinito


Capítulo 1
Sorriso com chá




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Desde cedo aprendi a viajar entre os mundos. Visitei inúmeros personagens que já conhecia das histórias, vivi grandes aventuras. Elas significaram muito para mim, mas sempre me lamentei em uma coisa, eu nunca me diverti em momento algum.

Tá certo que às vezes eu tentava dar um sorriso tímido querendo não parecer sem graça, mas nunca foi verdadeiro. Cansei de mentir sobre mim mesma para mim e para todos. Acho ridículo isto de rir sem ter graça, então por quê?

Decidi não rir mais, para ver em que situações eu realmente sentia necessidade de sorrir, mas estes momentos nunca chegaram. Nunca mais sorri como sorria com minha família, mas mesmo agora que ainda os tenho, vivo presa dentro de mim, e não enxergo mais o que fazia as coisas terem o brilho que tinham.

 

Hoje estou indo viajar entre mundos com outro objetivo. Já que nunca me diverti nas minhas aventuras, e sempre encarei tudo na seriedade, irei procurar pessoas que sabem sorrir para que eu aprenda com elas a encontrar o brilho das coisas novamente. E a minha primeira escolha foi ir até um lugar onde as pessoas riem sem se importar com nada. Livres, soltas, malucas.



Aqui, no mundo subterrâneo, fui me encontrar com um velho amigo, em algum lugar do escuro bosque onde ele vive.

 

— Perdeu algo? - disse a voz enquanto eu procurava alguma coisa nas árvores.

— Aí está você!

— Não. Eu estou aqui.

— Sim, entendo. - respondi como se aquele assunto fosse de extrema seriedade. - Estava justamente procurando por você. E agora que te encontrei...

— Eu que te encontrei, você foi achada. Huhu... - uma boca sorridente aparece em cima de um galho, como a lua surgindo por trás das nuvens. Dois enormes olhos verdes me saúdam com seu tom fantasmagórico.

— Gato, queria falar-lhe...

 

— Então fale.

 

— Oh, mas não é tão simples, precisamos nos sentar, e conversar. Quero saber algo muito importante, que você certamente saberá.

— Vou te levar até a mesa, lá poderemos conversar enquanto tomamos um chá.

Segui as pegadas do gato invisível pelo caminho até chegar a um lugar que eu não via há muito tempo. No final da mesa, o Chapeleiro estava tomando seu chá como se o tempo fosse eterno, a Lebre de Março estava quieta, embora fosse março ela estava bem diferente dos outros dias.

— O que ela tem?

— Olá Luz.- disse o Chapeleiro.

— Olá. - falei sem graça, percebendo que não me lembrei de cumprimentá-lo ao chegar.

— Parece até que foi ontem que você veio a última vez. Você nunca se esquece da gente não é?

Dei um sorriso sem graça e olhei novamente para a lebre.

— O que aconteceu para ela estar assim?

— Ah, não é nada de mais, é por que hoje é seu aniversário.

— Oh, meus parabéns Lebre.

— O quê? - ela respondeu.

— Parabéns pelo seu...

— Não! - o Chapeleiro gritou.

— ..aniver...

— Aniver o quê?

— Ixi...

— Hoje não é um bom dia. - disse o gato se dissolvendo no ar rapidamente.

Atrás dele a Lebre de Março apareceu furiosa.

— Está caçoando de mim? Eu não pedi isso! - ela começa a jogar xícaras, colheres e tudo mais que pudesse alcançar na mesa.

Esquivando-me, eu conseguia me livrar de tudo apenas pelo instinto de sobrevivência, qualquer coisa que me acertasse poderia ser muito perigosa, tamanha era a fúria da Lebre ao lançar aqueles objetos em mim.

Quando o ratinho saiu de um bule e cravou a espada na pata esquerda da Lebre gritando:

— Cale-se sua maluca!

A Lebre deu um grito e parou. Jogou o ratinho longe e gritou:

— Obrigada!

O Chapeleiro começou a rir como se toda aquela violência fosse a coisa mais normal do mundo e olhou para mim um pouco sério:

— Não vai tomar seu chá?

— Chá? Que chá?

— Se ainda não pegou uma xícara não pode tomar chá.

Olhei à minha volta e peguei uma xícara. O pratinho estava em cima da xícara, então o tirei para encher o copo, e de lá saíram várias borboletas com asas que se pareciam fatias de pão com manteiga.

— Opa, estava ocupada. - disse o chapeleiro - tente aquela.

Peguei a outra e enchi de chá. Depois de brigar um pouco com os cubos de açúcar, que tentaram fugir da colher, coloquei alguns no meu chá.

— Por que a Lebre está assim tão agitada? - olho para ela e a vejo quieta novamente - ou... quieta?

O Chapeleiro fez sinal para eu me aproximar. Fui até ele e coloquei a orelha virada para ele, e então ele cochichou no meu ouvido:

— Todos os dias comemoramos o nosso desaniversário juntos, porém hoje é o meu desaniversário, e o dela não, então ela não pode tomar chá.

Voltei-me um pouco para trás e olhei novamente para a lebre.

— Você pode tomar chá.

Ela olhou para mim com um olhar um pouco furioso e um pouco confuso.

— Não precisa ser o seu desaniversário para tomar chá. Comemore o desaniversário do Chapeleiro!

Ela sorriu de leve, o que me fez lembrar que eu estava ali para falar com o gato, mas antes que eu pudesse fazer algo ela começou a rir como louca. A louca que ela era. O Chapeleiro começou a rir também com todos os dentes. Seus olhos verdes fantasmagóricos brilhavam com uma energia sinistra, enquanto o ratinho voltava e entrar no bule falando:

— Vocês são todos uns pirados!

— Obrigado! - responderam os dois em sincronia.

Eles voltaram a rir, agora acompanhados das gargalhadas do ratinho, vindas de dentro do bule de onde eu tinha tirado o meu chá. Afastei a xícara sem ter bebido nada e saí sem me despedir.

— Tchau! - gritou a Lebre me atirando uma xícara enquanto os outros riam. Abaixei a cabeça como de costume e a xícara foi se espatifar numa árvore à minha frente.

— Malucos...

— Aqui todo mundo é.


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