Já estava no quarto do Logan faz uns dez minutos e nada dele aparecer.

Certo que eu acabei com a carinha linda da Débora e pra fazer curativo naquilo tudo com certeza deve demorar, mas como minha mente é um pouco masoquista, eu comecei a pensar em um monte de besteiras. Besteiras meio inapropriadas, se assim posso dizer. Não que eu esteja com ciúmes dela, não, isso jamais. Mas é que eu não quero que ela pense que é melhor do que eu – mesmo que ela realmente não seja – e pense que pode seduzir o Logan de alguma forma.

Minha vontade de levantar daquela cama e ir atrás dele era enorme. Mas me segurei e passei a andar pelo quarto inteiro. Só faltava roer as unhas de tanto nervosismo.

– Mellany, ficar nervosa não vai adiantar nada. – Brian falou.

– Cala a boca Brian! – disse e voltei a andar de um lado pro outro.

Tava quase abrindo um buraco no chão de tanto ficar pra lá e pra cá.

– Você sabe que o Logan não quer mais nada com a Débora né? – Brian começou. – Sabe também que ela pode usar mil táticas de sedução e que mesmo assim ele vai dar um fora nela, não sabe?

– Tá, mas o que eu tenho haver com isso?

– Nada! Só to te falando pra ver se você da uma regulada nesses seus ciúmes.

– Brian, sai daqui antes que eu te bata! – ordenei.

– Você pode negar o quanto quiser, mas você sabe que é verdade.

Foi uma pena ele já estar fora do quarto quando disse isso, se não um belo travesseiro acertaria seu lindo corpo com uma enorme força e ele tomaria uma perfeita queda.

Bufei impaciente e fui até o banheiro. Encarei meu reflexo e cheguei a conclusão meio óbvia de que meu estado não eram um dos melhores. Mas se me compararem com a biscate da Débora, com certeza vai dar pra sacar que foi ela quem levou a pior.

Tinha um pouco de sangue escorrendo do canto da minha boca, uns hematomas no rosto e alguns arranhões no braço e no pescoço, mas nada que uma boa maquiagem não disfarçasse e que não melhorasse até segunda-feira. Passei um pouco de água pra tirar o pouco de sangue que ainda escorria e voltei ao quarto.

Joguei-me na cama e suspirei pesadamente.

“Vamos lá Mellany, mantenha o foco em algo que não seja o fato do Logan estar perto da Débora.” Eu repetia esse mantra milhares e milhares de vezes na tentativa falha de me controlar.

Mas quer saber? Foda-se o meu autocontrole! Eu vou lá imediatamente acabar com a festa daquela baranga insistente.

Levantei decidida, mas antes que eu pudesse cruzar a porta, dei de cara com o Logan adentrando o quarto.

– Já vai pra casa? – ele perguntou.

– Na verdade eu ia atrás de você, mas você já voltou, então... – voltei a me jogar em sua cama.

– Não acha que está muito folgada?

– Cala a boca. – ignorei totalmente o que ele disse. – Mas e então, aquela oferecida já foi embora?

Não fiz questão de disfarçar o nojo em minha voz.

– Ela saiu daqui surtada! – ele riu levemente. – Vem cá e Mellany, você pratica algum tipo de luta?

– Não, por quê? – perguntei confusa.

– Você acabou com a Débora!

– Ah, ela só teve o que mereceu! Aliás, já tava na hora de eu dar uns bons tapas na cara dela! – dei de ombros.

– Bons tapas? – ele foi sarcástico. – Mellany, você encheu a cara da garota de socos!

– E daí? Eu agi certo. – me justifiquei. – O que ela acha? Que pode vir aqui e dar em cima de você, mesmo sabendo do nosso suposto namoro, e sair ilesa? Não é assim que o show acontece. – dei de ombros novamente.

– Você só esqueceu de um pequeno detalhe... – antes que eu pudesse perguntar qual era, ele continuou. – A Débora é insistente pra caralho!

– Pois ela que vá com a insistência dela para o quinto dos infernos! A não ser que ela realmente queira que a vida dela se torne um verdadeiro inferno! – falei. – Porque, olha, eu vou logo avisando: se ela voltar a se meter com você, ela vai apanhar novamente. E pode ter certeza que vai ser muito pior do que hoje! – minha voz soou ameaçadora.

– Nossa, agora até eu tô com medo de você! – Logan exclamou.

– Você já deveria estar com medo de mim há muito tempo atrás.

– Há muito tempo atrás... – ele repetiu. – Eu ainda não tinha presenciado uma briga sua com outra garota.

– O que não significa que eu não tenha brigado! – expliquei.

– Mellany, por favor! Seu medo de quebrar as unhas é maior do que sua coragem. – ele me zoou.

Apenas revirei os olhos e ignorei. Sabe, eu já gastei energia o suficiente batendo na Débora. Talvez espancar o Logan até que ele sangre a ponto de morrer seja muito cansativo. E bom, nesse momento meu lado preguiçoso está falando mais alto.

Levantei a contragosto da cama macia e andei pelo quarto afim de – bisbilhotar tudo – achar meus pertences.

– Aí Logan! Cadê minhas coisas? – perguntei gritando, já que ele estava no banheiro.

Provavelmente estaria tomando banho, e eu realmente fiquei tentada a entrar lá. Mas sem segundas intenções, é claro.

– Estão no quarto de hóspedes! – ele gritou de volta.

– Em qual deles seu tapado? – perguntei novamente revirando os olhos.

A casa é enorme e tem vários quartos. Como ele espera que eu vá saber em qual deles estão as minhas coisas? Ou ele espera que eu saia por aí abrindo todas as portas da casa? Garoto lerdo.

– Terceiro quarto do lado esquerdo do corredor.

Não disse mais nada e fui até lá. Nem precisei procurar muito – eu não iria fazer isso mesmo -, apenas passei os olhos pelo local e logo avistei minha roupa, bolsa e sapatos. Primeiramente me troquei, e depois peguei meu celular. E bom, quando vi, só faltei ter um colapso: 33 chamadas perdidas da Tiff.

Bom, se fossem da minha mãe é claro que a situação seria muito pior. Muito pior mesmo! E eu provavelmente já teria comprado uma passagem só de ida para o Nepal.

Aliás, onde fica o Nepal mesmo?

Bom, mas voltando ao assunto, das 33 chamadas, 21 foram de ontem a noite – madrugada, pra ser mais exata – e 12 foram de hoje de manhã.

Coitada, deve estar achando que eu morri. Ou que eu fui sequestrada. Ou que eu sofri um acidente...

Mas enfim... antes que a ideia de retornar suas ligações passasse por minha cabeça, ouvi gritos vindos de lá de baixo.

Só não me diga que foi a biscate da Débora que voltou. Sério, to começando a achar que essa garota é masoquista e que gosta mesmo de apanhar.

– Logan, Brian! Pelo amor de Deus, digam que a Mellany tá aqui. – era a voz da Tiff.

Desci as escadas quase – quase porque estava de salto e não estava nem um pouco afim de cair e ganhar uma bela fratura na perna de brinde – correndo, mas quando cheguei lá em baixo, meu esforço não valeu a pena.

Não entendeu? Simples.

Tiffany veio com tudo pra cima de mim, tentando me abraçar – ou me estrangular, eu não sei -, mas só conseguiu nos derrubar.

É, hoje definitivamente não era o meu dia de sorte.

– Sai de cima de mim sua gorda! – reclamei rindo.

– Sua vaca! – nossa, quanto carinho. – Eu te liguei várias vezes e você não atendeu. – ela disse se levantando.

Notei que, assim como eu, ela também estava com a roupa da festa.

– É, eu não vi. – dei uma desculpa qualquer. – Mas e você, tava aonde que ainda tá com a roupa de ontem?

– Ah, é que eu dormi na casa do David. – ela disse simples.

Juro, eu juro que tentei, mas foi inevitável não pensar besteira.

– Hummmm, rolou diversão a noite toda, não foi safada? – perguntei com o sorriso malicioso brotando no rosto.

Ela apenas me olhou com a sobrancelha erguida.

– Rolou, rolou muita diversão! – a ironia quase pingava de sua voz. – Se pra você ficar vomitando a noite inteira é algum tipo de diversão, claro! Eu me diverti muito!

Confesso que me surpreendi um pouco. Tipo assim, eu pensei que rolaria algo muito bom – ou muito ruim – pra ela ter me deixado lá sozinha, se bem que beber ao ponto de ficar a noite toda vomitando não é a coisa mais legal do mundo e era um bom motivo. Mas enfim...

– A noite foi tão ruim assim? – eu só queria ter certeza.

– Eu não diria ruim... Eu diria catastrófica! – ela frisou a última parte.

Fiz uma careta em reprovação.

– Caramba! Você tava mal mesmo hein?! – constatei um fato que já estava mais do que claro.

– Mal? Mellany, ela saiu da festa praticamente em coma alcoólico! – só então eu percebi que David também estava ali.

– Nossa! Que diabos você bebeu pra ficar assim? – perguntei chocada.

– Ah, sei lá o que foi que eu bebi! – ela deu de ombros simplesmente. – Só sei que, seja lá o que tenha sido, tinha muito álcool.

– Ah, é mesmo? – perguntei sarcástica. – Agora conte-me uma novidade.

– Cala essa boca! – ela mandou. – Mas e você? Que marcas são essas? – ela me olhou de um jeito suspeito e apontou pro meu corpo.

Antes mesmo que eu pudesse dizer algo, notei um sorriso malicioso quase rasgando seu rosto.

– Hummm, safada! Fala de mim e do David, mas na primeira oportunidade você vai lá e se joga nos braços do Logan, né? – a malicia em sua voz era quase palpável.

Queria muito ter dado uma resposta digna a ela, mas fui interrompida por um ser meio anormal – mais conhecido como Logan – que, do nada, começou a rir. Mas não foi uma risada discreta, tipo de gente normal. Foi uma risada super alta e escandalosa, digna de gente que precisa ser internada num hospício as pressas.

Nós olhamos pra ele como se ele fosse um mendigo de cabelo verde fluorescente vestindo uma tanguinha rosa choque.

Visão do inferno, eu sei. Mas é assustador tanto quanto o Logan rindo.

– Que foi Logan? – Tiffany perguntou sem entender nada.

Bom, mas eu entendi. Entendi que o Logan é um completo doente mental.

– Não foi nada! É que do jeito que você falou, ate parece que rolou alguma coisa entre mim e a Mellany! – ele falou tentando contar o riso.

– Vai dizer que não? – ela estreitou os olhos em sua direção.

– Tiffany, ontem a Mellany tava tão bêbada quanto você! – ele voltou a rir.

Que ótimo. Bom saber que ao invés de me apoiar e esquecer de vez essa historia constrangedora, ele está se divertindo as minhas custas.

Quanto caráter!

– Pra você ter uma ideia, eu encontrei ela na festa chorando! – ele exclamou como se aquilo fosse algo mágico. – Ela falou de unicórnios com sangue roxo e de vacas skatistas, no sentido literal. Também conversou com o controle remoto da TV, tentou entrar no meu guarda-roupa, quis ir pra Nárnia... – e a cada coisa que ele falava, Tiffany ia ficando mais chocada ainda.

Não só ela como os outros dois seres humanos – se é que Brian e David podem ser chamados assim – que estavam gargalhando feito duas hienas drogadas.

– Já chega né Logan? – perguntei lhe lançando um olhar ameaçador.

Mas ao que parece, não foi tão ameaçador assim. Afinal, o garoto apenas me ignorou e continuou falando.

– Sem falar que eu acho que o efeito do álcool ainda não passou.... – ele disse sugestivamente.

– E por quê? – David perguntou tentando conter suas risadas histéricas.

– Sabe, é que hoje de manhã a Débora teve aqui, só pra me encher o saco como sempre faz. – ele revirou os olhos.

Fiz o mesmo ao lembrar o quanto aquela vadia me tirava do sério. Parece que ela fez cursinho pra aperfeiçoar a capacidade que ela tem de irritar os outros.

– Sim, e o que aquela gostosa... – David parou de falar imediatamente assim que eu e Tiffany lhe lançamos um olhar mortal.

Ah, pelo amor de Deus né? Que ele é tapado e idiota eu já sabia. Mas que ele é cego, bom, isso eu acabei de descobrir. Porque tipo, pra chamar aquela baranga mal comida de gostosa a pessoa tem que ter problemas mentais, problemas de vista, ou muito mau gosto. Ou então ser simplesmente o David.

E não, isso não é raiva dela. É apenas a verdade.

– Quer dizer, e o que a Débora tem haver com a Mellany? – ele se corrigiu e perguntou confuso.

Puta que pariu! Além de anormal, idiota, cego, e de ter mau gosto, ainda é burro.

Viu só a qualidade do povo que frequenta meu circulo de amizades?

– Acontece que a Mellany acabou com ela! – vendo que o David continuava com sua cara de tapado, Logan continuou. – Mellany praticamente espancou a Débora!

Nem preciso dizer que Tiffany e David ficaram chocados. Brian nem tanto, porque ele viu o final da briga.

– Aquela vadia te bateu? – Tiff perguntou.

– Ela tentou me bater, mas só conseguiu fazer isso. – apontei para os arranhões no meu corpo e o hematoma no meu rosto. – E modéstia a parte, ela saiu daqui com a cara toda bagunçada. – dei de ombros.

– Ta aí... Você bem que podia sair da torcida e entrar no clube de luta de lá da escola. – Brian falou.

– Vai ver se eu to na esquina Brian! – eu disse abanando minha mão como se ele não fosse nada importante.

E ele realmente não é. Mas isso nãovem ao caso agora.

– Nossa amiga, não sabia que você trabalhava aos sábados. – Tiffany falou simples.

No começo eu não entendi e fiquei totalmente confusa – é o preço que se paga por só ter amigos retardados -, mas depois fui juntando os fatos e cheguei a conclusão de que ela estava querendo me ofender.

– Vadia! Você tá me chamando de prostituta? – só queria me certificar.

Ela apenas deu de ombros e sorriu sugestivamente.

– Se a carapuça serviu...

Estreitei os olhos em sua direção e sorri cinicamente.

– Mas fica tranquila! Eu jamais invadiria o seu espaço... – provoquei.

Ela apenas me devolveu o sorriso cínico e voltamos a conversar amenidades.

E eu poderia ficar ali até amanhã – quer dizer, eu não sei, porque Brian e David estavam falando mais merda que o normal -, mas eu lembrei que ainda tinha uma vida e que precisava ir pra casa.

– Bom povo, o pão tá muito bom... – só que não. - ...mas eu preciso ir pra casa. – anunciei.

– Ok, pode ir então. – David falou como se não se importasse.

Mas eu sei que ele se importa. Ele me ama. Todo mundo me ama. É quase impossível não me amar.

Tá, eu sei que a humildade passou longe da minha ultima reflexão, mas ok.

– É. Só que eu não sei se você sabe, mas os donos da casa são o Logan e o Brian. E pelo o que eu sei, eles não me mandaram ir embora. – olhei pra ele vitoriosamente.

É, mas como diz o ditado, tudo o que é bom dura pouco. E os irmãos do mal acabaram rapidamente com a minha alegria.

– Por mim você pode ir embora. – Brian deu de ombros.

– Por mim também. – Logan concordou.

Eu ate ficaria ofendida. Mas como eu sei que aqui a zoeira não tem limites, eu nem me importei, e como eu sou uma pessoa muito solidária e caridosa, nada melhor do que responder a linda – ou seria ridícula? – provocação dos meus lindos e maravilhosos amigos.

Na verdade, o único que ia se dar mal era o Logan, mas isso não tem importância.

– Ah, pra você também né? – me dirigi a ele. – Seria uma pena se eu te obrigasse a me dar uma carona. – um sorriso cínico surgiu em meus lábios.

– Como é?!

– É isso ai que você ouviu. – confirmei. – Você vai me levar em casa, depois vai me trazer aqui de novo. E quando a gente voltar, você vai fazer um almoço delicioso pra mim, já que não fez meu café da manha. – sorri docemente.

Eu sou um ajo, não é gente?

– Ah, então quer dizer que além de ter sido sua baba, eu ainda vou ter que ser seu motorista e seu cozinheiro também? – ele perguntou com a sobrancelha erguida.

Apenas assenti e dei um sorriso angelical.

E daí que eu estava – escravizando – obrigando ele a me fazer uns favores? Ele não liga.

Ou liga. Mas isso também não tem importância.

– Sua sorte é que hoje eu to de bom humor. – ele disse e se levantou. – Vamos?

Nossa, eu pensei que seria mais difícil de convencer ele. Já tava ate pensando em umas ameaças de morte convincentes, mas acho que não vou precisar mais.

– Ok então. Vamos!

Levantei e peguei sua mão. O arrastei até seu carro e ele deu partida.

– Logan! Pelo amor de Deus! Você parece a minha avó dirigindo... – eu já estava pronta pra ofendê-lo até cansar, quando ele me interrompeu.

– Espera aí. Sua avó dirige?

– A questão não é essa. – falei revirando os olhos. – A questão é que você tá dirigindo mais devagar do que uma tartaruga míope.

– Tartarugas têm miopia? – ele fez mais uma pergunta desnecessária.

Desnecessária e idiota.

– Cala a boca! – revirei os olhos novamente. – E dirige mais rápido, porque se não eu só vou chegar lá em casa amanhã. – reclamei mais uma vez.

– Eu não sei se você sabe, mas os testes para o elenco de Velozes e Furiosos já acabaram. Não é necessário correr. – o sorriso debochado já brincava em seus lábios.

Revirei os olhos pela milésima vez em menos de 5 minutos e ignorei.

É, talvez agredir o motorista possa causar um grave acidente e isso não seria nada legal...