Sasuke Vai a Toca dos Lobos

Não permaneceram por muito tempo na casa de Sasuke. Após tomar um pouco de café e beliscar uma torrada, Sakura pegou o celular dele e se trancou no quarto. Naruto se encontrava desmaiado no sofá de dois lugares, todo torto, o cansaço tinha vencido. A vontade de usufruir ao máximo da presença de Sakura não foi o suficiente para mantê-lo acordado.

O que Sasuke agradecia. A tranquilidade que reinava por não ter os dois azucrinando a sua volta não tinha preço. Podia tomar o seu café calmamente, deixando os pensamento positivos emanarem para que aquele dia não continuasse a ir ladeira abaixo. Sua mãe já dizia que pensamentos felizes tornam o dia feliz, que ela estivesse certa, era a última esperança dele.

Sakura saiu do quarto com um dos casacos dele, que nela ia até o começo das coxas. Deixando apenas uma pequena parte do vestido que usava por baixo a mostra. Como pegar apenas o casaco não era o suficiente ela também tinha surrupiado o seu antigo e quase esquecido chapéu de pesca. Não a imaginava usando aquela peça.

— Tem algum óculos escuro por aqui? — Caminhava em direção ao banheiro, para observar no reflexo do espelho se o coque que tinha feito no quarto estava bem escondido.

— Deve ter um em cima da minha cômoda — Sasuke parou com dois pratos e uma xícara em mãos, fitando-a dentro do banheiro. — O que está fazendo com essas roupas?

— Usando um disfarce, não é obvio? — Sakura revirou os olhos ao passar por ele. Sasuke respirou fundo levando o que carregava até a pia e voltando para pegar o resto das coisas sobre a mesa. Repetindo em sua cabeça o mantra sobre pensamentos felizes — Como estou? Devo admitir que consegui fazer um ótimo trabalho com suas roupas capengas. — Não se virou para fita-la, a paciência recém adquirida já estava se perdendo outra vez.

— Onde devo deixa-la?

— Em lugar algum, você vai comigo — Sasuke congelou no meio entre a poltrona e o batente da cozinha, deparando-se com o sorrisinho pretensioso que ela dava.

— Eu e você? — Sakura concordou com um aceno.

— É, eu e você. Nós. Por quê? Você bateu a cabeça no tempo em que eu fui fazer uma ligação e esqueceu de algumas coisinhas? — Sasuke bufou, tornando se sério de imediato e Sakura soltou uma risadinha baixa.

— Não. Não me esqueci de absolutamente nada.

— Ótimo. Agora você pode ir lá se arrumar, de forma decente, por favor. Para que possamos dar um passeiozinho, namorado — Sasuke fechou os olhos e massageou as têmporas. Ela se sentou sobre uma das cadeiras, as mãos cruzadas sobre a mesa observando a rua logo abaixo.

Por mais irritado e desgostoso que estivesse não ousou contraria-la, em menos de meia hora já estava de banho tomado e roupa trocada. Usava uma calça jeans preta, all star também preto e um casaco de lã marrom, por baixo uma blusa branca simples. Sakura torceu um pouco o nariz ao vê-lo, mas nada disse. Ela já havia pedido o táxi, que não demorou a chegar.

O trajeto foi bem mais longo do que ele esperava. Tendo em conta de que não fazia ideia de para onde estavam indo. Sasuke já estava quase enfartando dentro do veículo ao ver o taxímetro só subir. Sakura morava do lado oposto ao dele e se estavam indo para lá ele já imaginava que sairia uma fortuna. Mas isso era ideia dela, que se foda, que pagasse. Não era função dele arcar com as despesas dela. Na confusão da noite passada não tinha reparado se ela levava alguma bolsa ou carteira e nem agora por baixo daquele casaco ele conseguia dizer.

A última coisa que faltava era ela esperar que ele pagasse por aquela rodada. Quando o táxi atravessou direto o cruzamento que deveria fazer para chegar no Uper West Side o corpo dele gelou. O que poderia ter para lá? Seria perfeito se eles estivessem indo para o apart dela, casa de campo, mansão da família, qualquer coisa que pertencesse a ela. Assim a responsabilidade seria toda de Sakura. Tinha se agarrado a esperança de que ela estava a caminho de uma residência familiar sossegada.

O táxi parou em frente a um galpão no Queens, em uma área bem estranha e vazia. Sakura pulou para fora do automóvel e correu até a recepção do lugar. Pelo retrovisor o taxista o fitou com cara de poucos amigos. Sasuke rapidamente enfiou a mão no bolso para puxar a carteira e ver como poderia remediar aquela situação, mas antes que contasse sequer um dólar, uma garota esguia e bem arruma surgiu ao lado de Sakura e pagou pela corrida.

Ver o táxi partir lhe causou um ligeiro mal-estar e um toque de inveja. Sasuke queria ter ido junto, pois nada naquele lugar lhe parecia verdadeiramente seguro.

— Sasuke, vem! — O chamado de Sakura o trouxe de volta e ele foi forçado a acompanha-la.

O que por fora lembrava um galpão industrial qualquer, por dentro tinha outro aspecto. Sasuke se viu cercado de tecidos, brilho e manequins com roupas extravagantes, roupas por todo lado. Além de maquinas de costura, instrumentos similares aos de um estúdio de fotografia, palanques improvisados. Uma penca de pessoas corria de um lado para o outro com araras, cafés, tecidos, fotografias. Um grupo cercava uma modelo, que estava em uma pose bem desconfortável, parecia estuda-la como quem analisa uma obra de arte.

Demorou para Sasuke descobrir que estava dentro de um atelier, apesar de já ter notado que tinha algo a ver com moda, não ligou o lugar e a bagunça a um espaço de criação. Como alguém poderia criar em meio a tanto burburinho e correria ele não sabia, mas quando avistou o estilista ninguém precisou lhe avisar que era ele o dono do local, estava na cara.

O homem usava um blazer lilás gritante, com uma calça preta tão colada ao corpo que poderia ser uma segunda pele dele e ninguém notaria a diferença. Era o único no local a usar cores tão gritantes, e um cachecol azul turquesa. Ele esbravejando com uma assistente por ter colocado acessórios que não combinavam com o vestido que a modelo usava.

Assim que ele colocou seus olhos em Sakura parou de vociferar com a pobre funcionária, fitando a Haruno estupefato, Mesmo de longe Sasuke podia ver que ele não tinha aprovado o novo modelito. Tinha certeza que o assunto deles seria a roupa, ela emendaria sobre sua casa, seu quarto, sua vida e ele não estava interessado em ouvir. Resolveu vaguear por ai, ao fundo do galpão tinha um fotografo batendo fotos de três modelos.

Fotografia era uma de suas paixões desde menino, até mesmo dizia que quando crescesse ia sair pelo mundo fotografando tudo que visse. Obviamente as coisas não tinham seguido esse caminho e hoje em dia tirar fotos tinha virado um hobby e fazia tempo que ele não fotografava nada. Parou atrás do homem, observando as garotas em suas poses imaculadas. Parecia que elas nem respiravam, não moviam um músculo sequer.

— Acabamos essa rodada, garotas. Podem relaxar — elas mudaram logo de posição e uma jovem acanhada entrou em cena, servindo saladas e chás gelados para as modelos. — Hey, você entrou com Sakura Haruno, não? — O fotografo tinha se voltado para ele.

— Sim, eu cheguei com ela — não sabia se deveria acrescentar que estavam juntos ou não e ficou ligeiramente encabulado por isso.

— Modelo?

Abriu a boca para dizer que “não”, mas ponderou. Sabia que Sakura estava arquitetando alguma coisa para introduzi-lo em seu mundinho artificial. A melhor coisa a fazer era não falar sobre o que de fato ele não sabia. Não se imaginava sendo modelo, mas como não tinha uma forma de se definir, era melhor trabalhar com o mistério e evitar mais perguntas.

— Bem, sou um segredo — o fotografo de uma risada, passando a mão pelo cavanhaque.

— Segredo de quem? — Sasuke deu de ombros, cruzando os braços em frente ao corpo.

— Posso ver sua câmera? — O fotografo concordou com o aceno e a entregou para o Uchiha que não demorou para bater algumas fotos. As modelos ainda estavam ocupadas devorando suas refeições light e nem perceberam que estavam sendo clicadas.

— Gosta de fotografia?

— Sim, eu...

Uma cutucada sutil no ombro esquerdo o interrompeu. Virou-se para ver quem era e se deparou com Sakura e o estranho de blazer de roxo. Ambos sorriam para ele e Sasuke não gostou nada disso.

— Diga, Oro. Ele não tem um belo porte? — Sakura tirou a câmera das mãos dele e a devolveu para o fotografo, pondo-se as costas de Sasuke e o forçando a arrumar a postura.

— Hummm — o tal do Oro, o circundou. Analisando-o como se fosse uma peça de roupa em uma vitrine de loja. Provavelmente era assim que aquela modelo que Sasuke tinha visto se sentia, desconcertante — Um belo porte, um belo físico — o estranho cabeludo parou bem ao lado dele, puxando seu rosto para analisa-lo de perfil —, um belo rosto também. Onde esse garoto estava perdido? Ai se meus olhos tivessem batido nele antes, eu pegava para mim — fitou Sakura, que tinha voltado para a frente, quase desesperado por conta daquela frase, mas ela apenas deu de ombros com um sorrisinho maroto na face delicada.

— Mas eu achei primeiro.

— Pois é, uma pena. — Oro voltou para perto de Sakura, dando uma risada estridente e a puxando para junto dele, mantendo seu braço entrelaçado ao dela.

— Então, Oro, ele é o meu plano — os olhos ambares de Orochimaru voltaram outra vez para Sasuke, mas dessa vez não era de forma analítica e sim cobiçosa com um sorrisinho pecaminoso que fez um tremor percorrer a espinha dele, despertando uma vontade louca de sair correndo.

— É um belo plano, sem dúvida. Mas no que eu entro nessa história toda, chère? – Questionou em um sotaque francês afetado.

— Bem, sabe aquele desfile restritíssimo que você fez? — Sakura apertou o braço dele, aproximando seu rosto do dele e Oro ergueu uma das sobrancelhas não gostando muito da aproximação e do sorriso dela. — Eu estava pensando se não poderia dizer que o convidou, que é o seu novo projeto e que ele estava lá para ver como as coisas funcionavam. E no seu próximo desfile você o coloca como destaque, seu novo protegido — a última frase foi dita para que apenas Orochimaru escutasse. Já que Sasuke ainda não sabia desse pequeno detalhe e ela imaginava que talvez ele precisasse de uma dose de persuasão para colaborar.

— Hum. O garoto quer ser modelo, que interessante. — Orochimaru sorriu dando mais uma conferida em Sasuke.

— Não é nada disso. — Sakura o puxou, para afasta-lo de Sasuke. — Ele não tem querer. Ele vai ser porque eu quero que seja. E preciso! — Soltou Orochimaru, retirando de uma vez por todas aquele casaco horrendo. — É por pouco tempo, a gente o ensina só a andar na passarela e depois quando a história murchar e ninguém pensar que Neji fez o que fez comigo, ele some — explicou uma Haruno muito agitada. Ele era sua última esperança de conseguir manter aquela história.

— Não sei se quero que ele suma, Sakura, querida. — Orochimaru se voltou para o rapaz outra vez. — Você pode até querer por um fim na sua brincadeira de casinha com ele, mas eu vou querê-lo aqui comigo. Já consigo prever o sucesso que ele pode ser, tenho olho para essas coisas, você sabe. — Sakura revirou os olhos, concordando com um aceno apenas para não ser descortês.

— Que seja! A questão é que eu preciso muito da sua ajuda ou o meu plano todo vai por água abaixo. Percebe isso? — Sakura não conseguia deixar de transparecer toda a sua ansiedade e apreensão com a resposta que Orochimaru poderia vir a dar.

— Tudo bem, mas a gente vai ter que dar uma repaginada nele. — Sakura parou de agarra-lo e aperta-lo para concordar com o que tinha ouvido. Realmente, uma geral em Sasuke era o que ela maquinava desde que tinham saído da festa de Sasori. — A pele é boa, os músculos por baixo dessa coisa que ele está vestindo parecem ser bons, muito bons diga-se de passagem, mas esse cabelo está muito grande e essa roupinha muito démodé. — Sakura concordava em letra, número e grau.

Sasuke não tirou o olho da dupla desde que eles se afastaram ao cochichos, ainda mais quando Sakura pareceu implorar por algo. Isso estava começando a se tornar preocupante, tencionou se aproximar, mas tinha uma garota que se mantinha a frente dos dois, mantendo os demais afastados da conversa particular. Não duvidava que ela o afastasse também.

Quando a conversa pareceu terminar e eles se viraram e o fitaram. Sasuke soube, naquele momento, que a ideia de fugir deveria ser posta em pratica, estava obvio, claro e cristalino, ou fugia, ou não tinha volta. Porém não o fez, permaneceu, pondo em risco sua saúde física e mental.

— Vem Sasuke.

Sakura se precipitou, tomando a frente de Orochimaru e sua assistente e o puxando pelo braço com um carinho inédito desde que o raptou.

— Precisamos ver umas coisinhas para você

— Que coisinhas?

Caminharam para outra extremidade do galpão, onde tinham três tendas brancas e parte das modelos se trocavam, retocavam a maquiagem e o cabelo. Ele não estava gostando daquela parte, os sorrisinhos trocados pelas figuras a sua frente fazia os cabelinhos da sua nuca se arrepiarem. Deus, Sakura tinha ido de encontro a sua outra metade surtada, agora teria esse cara para enlouquecê-lo.

— Não precisa se preocupar querido, aqui ninguém morde. Arranha um pouquinho, mas tenho certeza que você pode acabar gostando. — Orochimaru falava todo malicioso e excitado com sua nova descoberta. Mesmo não sendo inteiramente dele iria adorar ver esse rostinho e corpinho lindo representando sua marca mundo a fora.

Sasuke foi levado – diga-se carregado – até a terceira tenda. Ele já estava se sentindo particularmente assustado, pessoas entravam e saiam, se trocavam ali na frente de todos sem se importar, enquanto ávidos maquiadores retocavam uma coisa ou outra. Tudo feito de forma tão rápida e afobada que o rapaz não sabia como dava certo, ele estava ficando tonto só de olhar.

Alguns modelos ainda estavam sendo preparadas e essa era sem a rapidez das trocas de roupas, os cabelos estavam sendo escovados, as unhas sendo feitas. Logo ele foi jogado em uma cadeira dessa área de preparação. O queixo foi segurado e erguido enquanto três pessoas, mais o esquisitão do amigo de Sakura, mexiam em seu cabelo, rosto e sobrancelhas. Discutindo qual o melhor caminho a seguir. Sua vontade não importava ali, tentou se levantar, mas então o demônio rosa surgiu a sua frente salientando com os lábios o maldito acordo que eles tinham feito.

Não demorou para que a discussão a sua volta acabasse. Orochimaru se afastou, os outros três se posicionaram e o puxa-puxa começou. Aparentemente tinha as sobrancelhas perfeitas, não precisava fazer muita coisa, só “limpar”. Ele não fazia ideia de que elas estavam sujas, mas descobriu tarde demais o que limpar significava.

As pinças malditas que o cutucavam quase o fizeram arrancar o braço do esteticista, enquanto sua cabeça era puxada para trás. Pessoas mexiam em suas mãos, seu rosto, jogavam roupas em cima dele e depois tiravam. Como aquilo tudo era incomodo, mesmo grunhindo loucamente e se debatendo, algumas vezes, não lhe davam muita atenção.

Sentada bem ao seu lado estava uma Sakura, bem à vontade enquanto uma mulher lhe tratava os cabelos e a outra as unhas das mãos, conversando como se a tortura medieval que ocorria logo ao lado dela nada importasse. E quando ela notou o seu olhar, piscou para ele como se fossem cúmplices. Até aquele maldito momento ele ainda não estava entendo porque teria que passar por tantas mudanças.

Sakura não tinha dito nada sobre isso durante o “trato” deles, só que ele se mudaria e que ela daria um jeito de inclui-lo no circuito da moda. Agora ele estava alarmado, deveria ter se preocupado com isso antes, com esse jeito que Sakura viria a dar. Por que tinha que ter mandado ela se virar? Por que não impôs limites? Por que confiou nas ideias que essa mente perturbada ao seu lado poderia ter?

E principalmente: o que fariam com ele?

Página: Fleur D'Hiver