POV Julie

            Uma semana tinha se passado desde a festa e faltava mais uma semana para a volta as aulas. O começo do segundo semestre. Eram mais 6 meses e aí acaba tudo mesmo. Iríamos nós formar, fazer mais alguns anos de faculdade... Enfim, começar uma vida adulta. Nem acredito que está tão próximo. Esses meses irão passar bem rápidos, em minha opinião.

            Eu estava em meu quarto lendo um pouco do livro que a amiga do meu pai, a Mirian, me emprestou. O livro era bem grande, mas a leitura não era cansativa, ao contrario, era prazerosa e bem esclarecedora.

            Pausei a leitura e resolvi tirar uma soneca rápida. O que eu não esperava era ter um sonho.

::: Sonho on :::

            “Eu sentia que estava em um lugar muito fofo e macio. Era prazeroso está repousada em um lugar assim. Olhei em volta pela primeira vez e percebi que o ambiente que eu estava era um pouco escuro, porém tinha uma tonalidade rosada ou meio avermelhada. Eu vestia uma roupa que me deixava um pouco “cheiinha”.

            Forcei minha visão a algo que vinha de uma parte bem mais escura, em minha direção. Logo notei que eram Martim, Daniel e Félix. Eles estavam engraçados, vestidos de uma maneira estranha e cada um tinha logo atrás uma espécie de cauda ou qualquer coisa parecida. Eles corriam em minha direção.

            Eu podia ouvi-los dizerem algo como “Eu vou chegar primeiro”. Por alguma razão eu me assustei e tentei sair do lugar onde eu estava, mas eu não consegui; estava totalmente imóvel ali. Olhei novamente para onde eu tinha visto os garotos e vi que eles estavam cada vez mais perto.”

::: Sonho off :::

            Acordei num susto, me levantando com tudo e sentando na cama. Fiquei pensando o quanto esse sonho foi estranho. Por uns segundos não entendi o significado daquele sonho.

            Um pouco depois comecei a entender o sonho. Eu estava dentro de um útero: eu era um óvulo e os meus amigos, os espermatozóides. Apesar de tenso, foi um sonho engraçado. Isso é que dá ficar lendo um livro sobre reprodução humana o tempo inteiro.

            Apesar de eu achar que foi estranho sonhar com isso. Eu devo estar perturbada demais ou com a cabeça cheia de caraminholas.

1 Semana depois...

            Estava no meu quarto arrumando todas as minhas coisas do colégio. Primeiro dia de aula depois das férias de meio de ano. Estava empolgada para encontrar minhas amigas e amigos.

            Vesti-me com o uniforme da escola, prendi os cabelos de lado, passei um lápis de olho e um gloss labial rosinha e desci para tomar meu café da manhã.

            Com a mochila sobre um ombro, cheguei à cozinha e me deparei com meu pai e meu irmão, que já estavam na mesa tomando seu desjejum.

            – Bom dia. – disse cordial.

            – Dia. – meu pai disse num tom serio, antes de dar uma golada do café.

            Meu irmão apenas acenou com a cabeça, retribuindo o cumprimento, pois estava com a boca cheia de pão. Passou alguns minutos de silêncio enquanto comíamos.

            – Ah, pai. Eu e algumas amigas da escola combinamos de ir à sorveteria perto da escola. Vai ser tipo um reencontro depois das férias, para colocar a conversa em dia e matar a saudade. Você não se importa, não é? – não, eu não estava pedindo permissão. Eu estava informando mesmo. Por que mesmo que ele não deixasse, eu iria de qualquer jeito.

            Ele bufou. – Vai ter só meninas? – perguntou e eu fechei a cara, entendendo onde ele queria chegar. Ele me olhou. – Certo. Contanto que não chegue muito tarde. Não sei suas amigas, mas você... Tem compromissos e obrigações. Fui inteiramente claro, Senhorita Julie? – ele me olhou com seu costumeiro olhar severo.

            – Cristalino... – pausei, dei uma última golada no leite e coloquei o copo na mesa com um pouco de força. – Como água. – finalizei saindo da cozinha e indo rapidamente ao banheiro escovar os dentes. Logo após sai.

POV Daniel

            Estava terminando de me arrumar para ir para a aula. Ainda bem que era o último ano. Já repeti de serie umas duas vezes e estava louco para finalmente terminar os estudos. Sou o mais velho dos meus colegas de sala. Não que isso seja ruim, eu até gosto. Alguns pirralhos da 6ª serie tem medo de mim e eu adoro assustá-los de vez em quando. Apesar de ser errado, acho um pouco engraçado.

            Enquanto me arrumava fiquei pensando nos meus amigos, Félix e Martim. Já tem uns dois dias que não nos falamos. Acho que encontrarei os dois na escola hoje.

            Sai de casa e fui andando mesmo para a escola. Eu iria com o meu carro, para o pessoal ficar babando de inveja. Mas como meu carro é novo e minha habilitação, recente, achei melhor deixá-lo em casa e ir a pé. Bom, pelo menos uma vez na vida, eu tenho que ter bom senso.

            Chegando a escola, encontrei Félix e Martim encostado ao muro da escola, do lado de fora. Eles me viram e acenei rapidamente e eles também. Aproximei-me.

            – E ai? – eu disse.

            – Fala ai, Daniel? Como é que ‘ta? – Martim disse dando tapinhas no meu ombro.

            – Indo. – pausei. – E vocês?

            – ‘Tô de boa.

            – Eu também. – Félix disse.

            – De boa, mesmo? – perguntei. – É que esses dias vocês meio que sumiram.

            – Que nada. Eu falei com você ontem. – Martim disse com uma expressão zombeteira.

            – “Falar” não é bem a palavra certa. Você entrou no facebook por um minuto só para perguntar se as aulas começavam hoje mesmo.

            – Mas de qualquer jeito eu falei. – dei de ombros.

            Ficamos por um tempo em silêncio. Esse silêncio estava bem tenso e constrangedor.

            – Ah, estou louco para ver a Julie. Esse semestre ela não me escapa. Vou conseguir ficar com ela. – disse ao léu, fingindo que meus dois amigos não estavam ali.

            – HaHa. Você que pensa. – Martim disse irônico. – Você só vai conseguir isso se eu deixar, né.

            – Eu é que não vou deixar vocês dois ficarem com ela. – Félix se intrometeu na conversa.

            – Vocês são... – parei de falar, incapaz de arranjar algo para falar.

            Ficamos discutindo por um tempo. Nunca havíamos discutido assim antes.

            – Não... Quer saber, não importa o que vocês digam. Eu vou ficar com ela. – pausei. – Vocês são uns grandes idiotas.

            – ‘Tá... E daí. Tem mais? – Martim disse dando de ombros.

            – Sim... Ãhn... Fi-fiquem l-longe de m-mim. – disse hesitante, dando as costas. Eu estava extremamente triste. Nunca briguei com meus melhores amigos e eu me senti muito mal.

            Entrei no colégio e vi que cada um de nós três estávamos em um canto. O sinal tocou e fui para a sala. Felizmente, ou infelizmente, eu e meus amigos éramos da mesma sala.

            – Dani! Dani! – ouvi a voz de Julie e virei para trás, sorrindo. Ela me alcançou e me abraçou. – Como você está? – dei de ombros como que respondendo que estava tudo bem. – O que aconteceu? Vi o Martim e o Félix logo atrás. Vocês sempre andam juntos.

            – Nós brigamos. – disse apenas.

            Vi Julie arregalando os olhos, totalmente surpresa. Entramos na sala(sim, Julie também era da mesma sala). Julie ficou olhando de mim, para o Félix e para o Martim, com certeza estranhando a distancia que nós sentamos um do outro. Ela, que estava numa carteira na minha frente, virou para trás e disse:

            – Não sei o que aconteceu, mas vocês precisam parar com essa bobeira. Vocês sempre foram tão amigos. Não podem ficar brigados assim.

            Dei de ombros outra vez e virei o rosto pro lado. “Se soubesse o motivo da briga, não estaria interferindo.” Pensei. O professor do primeiro horário entrou na sala e deu as boas vindas e começou a aula.