Ele E Ela escrita por Maitê


Capítulo 27
Verdade que constrói




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Depois de passar um tempo com Jack, Maria ficou um tempo com Berta no quarto. Nunca pensou que seria tão fácil conversar com o pai, e o quanto era horrível ver Berta chorar. A governanta chorava, dava bronca e dizia que amava Maria. Tudo ao mesmo tempo. Ninguém fez perguntas sobre como ela havia ido para ali. Todos sabiam uma parte, uma pequena parte. A parte mais assustadora ainda era um segredo.
Brooke também veio vê-la, e surpreendendo a todos Rachel entrou com ela no quarto. Não disse nada, somente ficou parada num canto do quarto encarando o chão sem dizer uma única palavra. Pareciaum animal acoado pelo caçador, o caçador de Rachel se chamava culpa. Brooke estava radiante de felicidade, sentou-se na cama e segurou a mão da amiga. Conversaram sobre como Maria estava se sentindo, sobre o que fariam quando ela saisse do hospital. Nem por um segundo o clima naquele quarto ficou triste. Tudo por causa da menina de cabelos rosa.
Quando a noite chegou, Miguel veio ficar um pouco com Maria. Ele também não fez perguntas, mas algumas vezes Maria o pegou encarando seus pulsos enfaixados. Mas Maria sabia que Miguel não fazia perguntas pois sabia que ela tinha seu próprio tempo para falar, e não por ter medo das respostas. Depois de ter visto Maria quase morta em sua frente, medo era uma palavra insignificante para Miguel. Pois ele tinha passado pelo ápice daquela emoção e sobrevivera, assim como ela.
Ela passou a maior parte da noite acordada, Jack dormia no pequeno sofá ali ao lado. Sentia vontade de sorrir ao olhar para ele, estava tão cansado que não foi problema dormir em um sofá tão pequeno.
Maria não encarou o teto naquela noite, antes que Jack caísse no sono, Maria pediu que ele deixasse as cortinas brancas da janela abertas. Encarou as estrelas que brilhavam no céu, quase tinha morrido. Por um tempo, ela quis morrer. Mas ainda estava aqui, viva. Tinha muito o que fazer para poder viver de verdade. Já tinha perdoado o pai, não guardava rancor ou raiva por Rachel, agora ela tinha que falar a verdade para Miguel. As verdades assustadoras.
De manhã, Berta veio ajudá-la a tomar banho no pequeno banheiro do quarto e logo depois uma enfermeira veio trocar seus curativos. Nem Maria, nem Berta olharam para eles. Olharam uma para a outra e conversaram enquanto a enfermeira fazia seu trabalho. Quando ela saiu, Maria vestiu um dos seus pijamas que Berta tinha trazido. Teria de ficar mais um dia no hospital. Berta penteou seu cabelo, e não deixou que ela visse a quantidade absurda de fios que caiam. Depois fez uma trança folgada que caia em cima de seu ombro direito, do jeito que ela gostava.
Depois Maria se recostou nos travesseiros e esperou com Berta a visita do médico, que também era pai do seu namorado. Quando Robert entrou no quarto, Jack entrou junto com ele e tomou lugar ao lado da filha. Segurou sua mão com firmeza enquanto ouviam o médico.
O corpo de Maria estava fraco, pobre em nutrientes. Por isso a enorme queda de cabelo, unhas amareladas e quebradiças entre outras coisas. O coração dela estava trabalhando além do que deveria, e por isso as chances de problemas cardíacos era muito maior, entre outras coisas. Fora que Maria teria de ser acompanhado por um psicólogo agora. Era tudo muito assustador.
Quando Robert saiu, Jack sentou-se ao lado da filha e conversaram sobre o tratamento psicológico e os demais acompanhamentos médicos que Maria teria daqui para frente, fora os rémedios que ela teria de tomar. Seria um processo de recuperação longo, pra vida inteira. Porque a cada dia ela teria uma luta diferente.
Maria estava nervosa por ter aquela conversa com o pai, mas o bom, na verdade muito bom foi que em nenhum momento Maria viu um olhar estranho da parte de Jack. Ele não a julgava, só queria cuidar dela. Ela decidiu acreditar profundamente nisso.
Às dez da manhã, Miguel chegou. Estava com os cabelos arrumados, roupa limpa e não estava mais com aparência cansada. Mas o olhar preocupado ainda estava ali. O que era totalmente compreensível.
Jack sorriu para os dois e saiu do quarto os deixando sozinhos, Miguel deu um beijo na testa de Maria e sentou-se a sua frente, segurando sua mão.
– Como você está minha Flor?
– Bem. Como você pode ver, estou bem mais bonita do que ontem.- sorriu, ele sorriu de volta - Seu pai veio aqui agora a pouco.
– E então?
– Vai ser bem difícil. - respondeu com um suspiro.
– Não tem problema minha Flor, agora você sabe que tem pessoas que te amam ao seu lado não é? - perguntou levando uma mãos ao rosto dela, e acarinhando sua pele.
– Sei sim..
Ficaram em silêncio por um tempo, Maria se preparando para falar e Miguel se preparando para ouvir.
– Ninguém me fez perguntas, mas eu sei que querem. E agora que toda a cidade com certeza já sabe do que aconteceu e eu estou taxada como louca. Eu preciso que pelo menos uma pessoa saiba de tudo desde o inico. Que me apoie, e que entenda. Porque se antes era ruim, agora vai ficar muito pior.
– Maria eu não preciso saber pra estar do seu lado...
– Mas eu preciso que mais alguém saiba. Eu preciso que você saiba.
– Tudo bem.
Dizer a verdade nunca é fácil. Verdades tem poder, o poder de destruir ou reconstruir. A verdade tinha destruido Maria por muito tempo, mas agora era hora de usá-la do modo correto. Para reconstruir os muitos pedaços quebrados em sua vida.
– A dor que eu senti quando perdi meu irmão, foi infinita e depois quando perdi minha mãe.. Meu Deus... Eu mal conseguia respirar Miguel. Eu precisava jogar a culpa em alguém, pra poder sentir raiva e deixar tudo um pouco mais fácil. Meu pai foi o alvo mais fácil. Eu tinha dor, muita tristeza e uma raiva gigantesca dentro de mim. A dor era algo sem explicação, ainda é... Eu acordava de manhã e por um segundo eu esquecia que eles estavam mortos,mas quando eu lembrava era muito pior. Eu não tinha mais vontade de levantar da cama e não aguentava mais viver com aquela dor o tempo todo. Então comecei a me cortar, queria uma dor que fosse maior do que aquela que eu sentia por dentro. E por um tempo, a dor dos cortes era maior e eu me sentia aliviada. Mas depois vinha tudo de novo, e eu tinha que fazer novos cortes. Até que se tornou um vício.
Eram palavras duras de se ouvir, e mais duras ainda de serem ditas.
– E os distúrbios alimentares?
– Quando eu entrei pro colegial, ficava observando o time da torcida e queria ser como elas. Eu comecei a fazer testes, e nos primeiros eu não consegui. Comecei a observar aquelas garotas por mais tempo e buscar coisas que haviam nelas e não em mim. Elas eram tão perfeitas e felizes. Eu queria tanto ser como elas Miguel. Mas eu não conseguia ser feliz, então decidi ser perfeita. Me dedicava a ser perfeita, cabelo, maquiagem e roupas. Tudo tinha que ser maravilhoso. Quando não tinham mais defeitos eu passei a procurá-los no meu corpo. E obviamente encontrei. Eu queria ser magra, muito magra para que pudesse ser perfeita. Só que eu não conseguia pararde comer no início, foi ai que a bulimia começou. Eu comia tudo que queria e depois eu só precisava forçar o vômito para que todas aquelas calorias fossem embora. Tudo resolvido.
– Mas não o bastante não é?
– Não. Depois de um tempo, eu passei a me olhar no espelho e sentir uma raiva tão grande de mim mesma. Nunca era o bastante entende? Foi então que eu deixei de comer... Olhando agora, eu realmente não sei como consegui chegar até aqui.E mesmo fazendo tudo aquilo, não era o bastante. Eu continuava sentindo dor e continuava achando imperfeições. Todo dia é uma luta diferente, e parece que a cada dia vai ficando pior...
Todos os dias para ela eram um sacrificio, sempre lutando contra si mesma, contra os vícios que tinha adquirido. E sempre perdia. Se sentia uma perdedora, sem nenhuma vitória. Nada que a completasse. Nada que fizesse com que ela se sentisse viva.
– Mas ai você apareceu. O que era errado virou certo e o que era certo, virou errado. Você mudou tudo, me mudou de um jeito que eu acreditei nunca ser possível. Você me enche de esperança todo dia, me dá forças pra tentar ser melhor. Agora eu quero viver, porque quero viver com você. Mas se não tover você, tudo vai perder o sentindo novamente. Você me eleva, me leva a lugares que nunca estive antes e faz meu coração disparar. Eu acredito em cada palavra que sai da sua boca, acredito na pessoa que você é e quero viver pra poder ver o seu sorriso. Eu quero fazer por você, tudo aquilo que você faz por mim. Eu quero ficar com você, eu quero namorar você, quero casar. Não importa. Eu quero me sentir aquecida desse jeito por toda a vida. Sei que você não é perfeito, eu reconheço seus defeitos mas não importo. Eu quero ser sua, e quero que você seja sempre meu.... Tudo isso porque eu amo você.
É meus caros leitores, a verdade constrói.


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Notas finais do capítulo

Se você chegou até aqui, deixe sem comentário.
Beijo meus amores, que Deus abençoe e FELIZ PÁSCOA *----*