Point Of View Scarlet Vaughn
Quatro Anos Atrás...

A escola estava toda agitada e ninguém parava de falar do baile que seria em algumas semanas.
Eu, como a garota mais sortuda e popular da escola, havia sido convidada por Hector, o garoto mais lindo e sarado da cidade para o baile, e nós seríamos coroados e pétalas de rosa cairiam sobre nossa cabeça e então na semana seguinte todos seriam convidados para nosso casamento e...
Não. Claro que não. Com minha cara de caju azedo eu não consigo nem uma bala fora da validade com a tia da cantina.
Eu era a ''coisa'' da escola, e eu era possivelmente a única que ainda não tinha sido convidada para a droga do baile.
''O quê tem de errado comigo? Por que ninguém vai me convidar para o baile?'' Eu me questionava, e sempre acabava na mesma resposta: Eu sou Scarlet.
Ninguém gosta de mim.
Quer dizer, tem o Hans, o garoto do sexto ano que tem sardas se depender até na bunda, óculos estilo Harry Potter, e tem o melhor amigo que alguém poderia ter: Um sapo.
Sim, um sapo. E ele ainda tem nome: Hans Jr.
Nem preciso falar que eu nem ao menos me dirijo á esse... estereótipo de animal com funções humanas, certo? Certo, certíssimo.
Ouvi o sinal tocar e saí de meus devaneios, levantando do meu esconderijo super secreto - o banheiro interditado e com cheiro de vômito e bom ar no quarto andar
da escola - batendo com as mãos na minha bunda para tirar a poeira do chão sujo e empoeirado onde eu estava sentada.
Destranquei a porta bege com várias escritas de canetas coloridas e variadas, meninas brigando, outras escrevendo nomes de garotos considerados ''bonitos'' e os separando em Pegável, Não Pegável e Eca.
Nem preciso falar que o Hans está na categoria 'Eca' e ainda tem comentários maldosos do tipo ''eu prefiro beijar aquele sapo dele do que esse nojento, ECA'' que eu tenho quase certeza de que quem escreveu aquilo foi a Célinn, a sobrinha do professor de Educação Física que recebia cartinhas de amor do Hans desde quando ela nasceu.
Ou quase isso.
Comecei a andar no corredor que me levaria para a próxima aula e então percebi - eu nunca fui muito boa com percepção, ok? - que algumas sextanistas e quintanistas que haviam acabado de sair de suas respectivas salas estavam apontando para meu humilde ser.
Passei as mãos em meus cabelos, para abaixá-los e depois no rosto, olhando então para as mãos e vendo que não tinha nada de errado ou sujo em meu rosto/cabelo.
Dei de ombros e continuei a andar em direção àquela sala que tem cheiro de meia suja e meleca.
Sim, eu exagerei, mas eu sou a rainha do exagero, isso é normal, certo? Certo.

***
A aula não foi muito diferente das outras, as burras e oxigenadas puxando o saco do professor - que tinha uma carranca que me dava arrepios, nerds levantando os dedinhos melequentos quando eram questionados - até mesmo quando era uma pergunta retórica.
Recolhi minha mochila lilás com chaveiros de bichinhos e outras coisinhas e peguei os livros em mãos, andando na direção da porta da sala.
Ouvi passos atrás de minha pessoa e então uma garota ruiva, com algumas sardas espalhadas pelo rosto e olhos castanhos colocou a mão direita no meu ombro, sorrindo e falou:
''Você é a Scarlet, certo?'' a encarei sem nenhuma expressão, não podia dar tanta bandeira assim.
''Depende'' respondi.
''De quê?'' perguntou e parecia confusa.
''Você não é uma agente da CIA que está atrás de experimentos não-tão-bem sucedidos no quesito beleza e cajus mancos, ou é?'' Arqueei uma sobrancelha, desconfiada.
''Não, eu sou Dorothy'' soltou uma risada baixa e se apresentou.
''Então... Dorothy, tenho que ir almoçar agora, te vejo mais tarde'' falei e saí apressada da sala.
Quando passei por um grupinho de populares descerebrados, ouvi um comentário muito ridículo, se me permite dizer:
''Nossa, parece que a bebê Scarlet sujou a blusa com molho em um de seus lanchinhos particulares'' e então todos do grupinho começaram a rir.
Olhei para minha blusa branca e não vi nada, então puxei a parte de trás da blusa e vi uma mancha gigante e vermelha.
Então eu me vi correndo - igual a um canguru com uma perna amputada e toda a grande família de cangurus da África em seus peitos ou sei lá qual é o nome daquela ''bolsa'' onde a pobre mamãe canguru carrega os filhotes - enquanto pessoas apontavam para mim e riam, minhas bochechas pareciam pegar fogo e meus olhos estavam cheios de lágrimas.
Entrei dentro do primeiro banheiro que eu vi e então percebi que aquele banheiro era meio diferente dos outros. Esse tinha alguns mictórios e tinha um cheiro meio
ruim...
CÉUS, EU ESTAVA NO BANHEIRO MASCULINO!
***
A vida realmente é uma conspiração contra a pobre Scarlet. Assim que eu entrei no banheiro masculino e percebi que eu estava no banheiro masculino, eu comecei a gritar e só então tampei meus olhos.
''INVASÃO, INVASÃO!'' um garoto que - visivelmente - não era mentalmente estável começou a gritar, e então vários garotos - também conhecidos como bruta montes, elefantes, animais, etc - pularam em cima de mim.
Eu estava achando - só achando - que aquilo nunca iria acabar, até que...
''Scar, você está bem?'' alguém perguntou e eu tive vontade de perguntar ''Ah, claro, por que não estaria? Estou ótima!''.
Abri os olhos devagar e endireitei meus óculos quadrados, pretos e sem graças, dando de cara com o melequento com o sapo no ombro direito: Hans.
Ele estendeu a mão para me ajudar a levantar, então eu ignorei a mesma e levantei sozinha, ele coloca as mãos em um sapo.
S-A-P-O!
''Então... Scarlet...'' ele começou, parando a cada palavra e gesticulava nervoso. O olhei intrigada, o que mais ele poderia querer de mim?!
''Fala logo, moleque'' bufei irritada e então vi o sardento se ajoelhando no chão. ''Não, não, não, tudo menos ISSO!'' pensei, entrando em conflito interno.
''E-então, você... Você g-gostar-ria de ir a-ao b-baile c-comigo?'' olhei em volta e vi que meninas e meninos se espremiam na porta e todos tinham a expressão
risonha no rosto.
''Claro!'' falei animada ''...que não!'' gritei com bastante ênfase a última palavra e me dirigi - mesmo que o resto da minha já pouca dignidade tivesse ficado no
chão - até a saída do banheiro, andando rapidamente para o portão da saída.

Alguém poderia me explicar o porquê dessa conspiração contra mim?!