“Então, Tsuruga-san é o Corn?”

O rosto surpreso de Kyoko o deixou sem qualquer reação, mas não poderia voltar atrás. Naquele momento ele deveria contar tudo que esteve guardado, tudo que segurou por tanto tempo. Desde a atuação como Setsuka ela havia mudado. Tornara-se mais fria, mais distante, parecia ter medo de alguma coisa, porém sempre se mantinha próxima a ele. Talvez isso o tenha salvado, arrancado toda a escuridão que ele mantinha.

Kyoko era seu ponto de paz, perde-la significa se perder. Todavia, nada mais pode ser feito, ele precisava contar a ela quem ele realmente era. Já tinha decidido contar tudo e dizer o quanto ela era importante para ele, o quanto a amava. Depois iria para a América encontrar com seus pais já que ele finalmente tinha superado seu pai e a escuridão do Kuon.

Quando tocou na palavra “amor” teve a reação que já esperava dela. Kyoko estava completamente petrificada. Ren sorriu ao perceber que ela não mudara tanto assim. Pensou que seria um erro jogar todas as coisas de uma vez em cima da garota, mas quem sabe fazer isso fizesse com que ela não o recusasse subitamente. E foi o que aconteceu, ela não esboçava nenhuma reação, estava como uma gazela acuada olhando incrédula para ele.

Ela só reagiu quando ele falou sobre voltar para América, sobre seu plano de encarar seus pais novamente, de tentar se redimir pelo pecado que ele cometeu.

- Eu não quero uma resposta sua agora, Mogami-san. – Ela finalmente o encarou, os olhos âmbares cheios de dor da garota quase o fizeram fraquejar. – Sei que você não está pronta para isso, sei que você não mantém os mesmo sentimentos que eu. – Ela corou. – Eu prometo que voltarei, então... Por favor, guarde a resposta para quando eu retornar, quando eu tiver resolvido meu passado, quando você tiver resolvido o seu passado.

Kyoko apenas assentiu com a cabeça. Ele estava certo, ela não estava pronta, ainda não tinha abandonado a ideia de se vingar do Sho, e já não conseguia mais esconder os sentimentos que tinha por Ren. Imaginou que afastar-se dele seria uma boa ideia. Talvez assim ela não sofresse tanto e conseguisse abandonar esse sentimento. Seus devaneios foram interrompidos quando Ren aproximou-se e, segurando o rosto dela com as mãos, deu um leve beijo em sua testa. Em seguida puxou-a para um abraço carinhoso, triste.

Kyoko retribuiu quase que imediatamente. Agora tinha certeza que era melhor se afastar, sentir o corpo do Ren junto ao seu causara reações que ela não desejava.

- Adeus, Kyoko. – A voz mais grave e rouca de Ren mostrava o quanto ele estava sofrendo, talvez chorando, mas Kyoko nunca saberá, antes que pudesse dizer alguma coisa ele saiu a passos largos pela porta deixando Kyoko completamente ruborizada.

Nesse dia Kyoko chorou, chorou de verdade, sentia como se uma parte dela fosse arrancada. A dor que ela sentiu foi muito maior do que ser abandonada por sua mãe, ou por Shoutarou. Quando finalmente as lágrimas pararam de cair ela conseguiu raciocinar.

“Realmente é melhor assim, não quero sofrer mais.”

Mal sabia Kyoko que se arrependeria dessa escolha durante os cinco anos que se passaram. Cinco longos anos que ela gostaria de apagar, voltar no tempo e mudar sua decisão, mas era tarde demais, ele não estava mais lá. Não estava mais lá para dar conselhos, para salvá-la das investidas do Reino, para salvá-la daquela melancolia. Kyoko já não tinha mais um coração. Foi abandonada pelas únicas pessoas que amou verdadeiramente, talvez não tivesse mais um coração. Kyoko era como uma casca vivendo unicamente para o trabalho, que fazia perfeitamente bem, e rendera o título de melhor atriz do Japão por três anos consecutivos. Mas não se sentia completamente feliz, não poderia.