Uma viagem para Europa é o sonho de quase todo o mundo. O sonho de todo pobre então, é quase que com certeza. E vejamos, gente eu sou e pobre também, sendo assim eu sempre quis conhecer a Europa. Cá estou eu agora, em Londres, onde o inverno reina quase por todo o ano e nos dias restantes, um solzinho ousa dar as caras. Acreditem em mim, a Europa fica ainda mais linda quando é vista debaixo de um cobertor abraçada com um ruivo gato. Bom, ao menos foi isso o que me disseram, já que o cobertor, o ruivo e a Europa eu até que tenho, o impossível seria eu conseguir ver alguma coisa através dessa janelinha coberta por cortinas e com a belíssima vista de frente para uns dois ou três edifícios enormes.

– Manu, você ta acordada? – Edward me chamou baixinho e eu me mexi um pouco dando a ele a ideia de estar viva. Não é como se eu estivesse mesmo acordada, ou mesmo dormindo. Era como estar no meio disso. Carregada de preguiça e consciente.

Se bem que eu faço isso quando estou muito bem acordada também.

– Humm...hasjhfe. – Eu tentei dizer algo e acho que o Ed não entendeu por que assim que eu levantei a cabeça, desgrudando meu rosto do peito dele, eu o vi com cara de bobão me encarando. – Eu to acordada cabeça de cenoura.

– Eu não queria te acordar, só estava entediado.

– E ai você queria alguém para ficar entediado com você, estou certa? – Perguntei e ele assentiu sorrindo.

– Eu nem sei mais até onde pode ir a nossa convivência. – Eu comecei a falar outra vez e ele se ajeitou para me ouvir e me encarar melhor. – Sabe Ed? Agente vive na mesma casa, divide a mesma comida, o mesmo banheiro e as vezes eu até visto as suas roupas. Agora estamos dividindo a mesma doença e a mesma cama. Assim como o edredom e o travesseiro, sem contar com os germes. E você ainda quer dividir o seu tédio comigo?

Edward riu gostosamente antes de me fazer o acompanhar na risada também.

– Eu sei Meinu, me desculpe por invadir seu espaço. – Ele disse e eu sorri para ele antes de responder.

– Não se preocupe. O meu espaço é o seu espaço. – Eu falei e ele riu outra vez. – Literalmente. E além do mais, hoje está tão frio que se você dissesse que ia levantar para fazer xixi eu ia mandar você fazer isso aqui mesmo, já que ia congelar no caminho e agente nem ia sentir.

– Eu às vezes queria saber mesmo de onde vem essas frases loucas que você fala. – Edward falou entre uma risada e outra e logo eu já estava rindo também.

– Você é um bom cobertor/aquecedor Edward. Só por isso eu não vou te expulsar daqui.

– Agente poderia estar se divertindo muito mais agora, caso não estivéssemos doente. – Ele disse com aquela cara porca que eu sabia que ele tinha e eu me encolhi mais no edredom. – Mas como trocar saliva já parece uma expressão estranha, compartilhar catarro então, acho melhor não. – Ele falou se referindo à nossa gripe infeliz eu ri de verdade. Com força. Afinal, que homem normal fala sobre catarro quando está deitado na cama com uma garota linda? Mas como eu sou feia, eu até entendo o lado dele.

Nós ficamos assim depois disso, embolados entre os edredons e apertados um contra o outro. Eu não estava com sono mais. Estive dormindo sem parar a quase dois dias, sem contar o restante da minha vida que eu passei quase que inteira dormindo.

– Meinu, me fale sobre você. – O Ed chamou e eu o encarei outra vez.

– O que te leva a pensar que exista ainda alguma coisa sobre mim que você não sabia ou não conheça?

– Sempre tem algo que agente não deixa ninguém ver.

– Isso se chama segredo meu bem, por isso não contamos eles para as pessoas. – Eu disse e ele revirou os olhos. Mas eu não sou assim tão ruim, eu já moro com ele, nada pode o deixar mais assustado. Eu conto se você fizer o mesmo depois.

– Feito. – Ele disse e eu assenti. Vamos lá então.

– Meu nome é Manuela Abrantes, mas meu nome do meio é Fontes. Um nome que você nunca vai conseguir falar sem seu sotaque engraçado fazer parecer ridículo. Na sua língua ficaria parecido com “Sources”, mas não faz exatamente o mesmo sentido. Eu tenho um irmão mais novo e uma irmã mais velha. Eu tenho um cachorro e mamãe nunca me deixou gostar de gatos. Eu não sei cozinhar e só descobri o que ia fazer na faculdade na hora de preencher a folha de cadastro de bolsa. Eu já assinei ocorrências na escola e nem sempre fui uma boa menina. Já bati em um garoto mais velho e já babei por caras comprometidos. (Por que usar a palavra “casado” é feio.) Sempre quis conhecer a outros países mas nunca sai do meu estado no Brasil. Sou fã de Boybands e odeio o funk brasileiro. As vezes eu tenho crises de ansiedade e já chorei por causa de um garoto estúpido. E eu posso chorar como um bebê se você pegar uma formiga na mão e apenas pensar em se aproximar de mim com ela. *

Edward mal respirou enquanto eu explicava tudo isso. Não era muita coisa além do que ele já sabia.

– Você ainda não disse tudo. Pode continuar vai. – Ele falou e eu quis matar o ruivo.

– Eu gosto de música e costumava querer ser cantora quando era mais nova. Já cantei algumas vezes e nunca experimentei sensação melhor. Sempre gostei de aprender inglês e não tenho muitos amigos. Minha faculdade era a última coisa que eu disse que faria na vida, mas meus pais gostam e agora eu também já me acostumei. E eu nunca tive um namorado realmente, mas não te falei isso antes por que eu achei que você me acharia estranha. E por último, eu já quase fiquei depressiva uma vez e as vezes eu tenho umas pequenas recaídas, além de eu ser uma chorona nata. **

– Eu não me lembro de ver você deprimida desde que chegou aqui. – Edward falou e eu senti uma vontade enorme de morde-lo.

– E eu realmente não tive nenhuma. Você me faz bem Ed, me deixa ser feliz como eu sou.

– Eu não poderia gostar mais de você caso fosse de outra forma. – Ele falou me encarando com um sorriso tão bobo que eu não me importei para os vírus de gripe que nós brigávamos no corpo. Eu o beijei. Com algo mais do que paixão. Era carinho, era gratidão e felicidade. Era algo que eu não conhecia e talvez esse tenha sido o motivo que me levou a pensar que aquilo pudesse se chamar Amor. O amor que eu nunca antes tinha conhecido na vida. Algo que eu nuca tinha experimento e por isso eu nem sabia como explicar. James Edward Shetfield era uma das poucas pessoas que me conhecia de verdade e gostava de mim. Mesmo eu sendo defeituosa e nada perfeita, e mesmo eu sabendo que ele era assim como eu. Apenas normal, com problemas normais, defeitos e tudo o mais, porém, dono de qualidades que diariamente me faziam ter a certeza de que ele era o meu propósito. O meu motivo de estar ali. Do outro lado do meu mundo, e agora, pela primeira vez, me sentindo do lado certo.

* e ** = E é ai que vocês descobrem que acabam de conhecer toda a vida dessa autora sem graça que escreve a tempos para vocês. Se sintam estranhos, eu contei meus segredos para vocês aqui. Guardem isso ok?!