As Nem Um Pouco Felizes Histórias De Amor. escrita por Yang


Capítulo 28
Uma Lady, realmente.


Notas iniciais do capítulo

estou fazendo o possível para não demorar a postar. Essa ficou longa, acredito que a outra vai ser assim também!
bjbjbj



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#Narrado por Diana#

– Parabéns pra você, nessa data querida! Muitas felicidades, muitos anos de vida! – gritavam às oito horas da manhã, minha mãe e Lucas, na porta do quarto com um bolo de chocolate nas mãos coberto de confeites.

– Ai, eu não acredito que vocês estão fazendo isso! – exclamei cobrindo os olhos com o cobertor. A luz da lâmpada parecia me cegar aos poucos.

Lucas pulou em mim e me descobriu.

– Vamos sua velhona! Acorde! – dizia ele. – O dia tá lindo lá fora e eu quero ir à praia com a minha irmã de dezessete anos.

– Oh, minha pequena está crescendo! – disse minha mãe enquanto me abraçava apertado.

– Ok, essa história de praia, é verdade? – perguntei meio confusa.

– Sim! O Lucas quer conhecer as outras praias do Rio, e eu sei o quanto você adora olhar aquela paisagem! E depois nós vamos ao shopping comprar sapatos e roupas pra você. – respondeu ela enquanto puxava do bolso o cartão de crédito.

– e livro? Eu não ganho livro? – perguntei desapontada.

– Você ganha é uma boa ducha gelada pra despertar, mocinha. Cuida logo! – gritou Lucas me puxando a força da cama para o banheiro.

***

Eu realmente precisava ver a praia. Chegar lá e molhar os pés naquela água gelada. Não a via há um bom tempo e, volta e meia, é necessário apreciar algo bom na sua frente.

– Aqui é lindo, não é? – perguntei a Lucas enquanto caminhávamos na areia. De longe podia ver minha mãe deitada em uma toalha listrada ouvindo música em seu celular.

– Sim. Não é a toa que chamam o Rio de Janeiro de “cidade maravilhosa”. – afirmou ele.

Caminhamos por mais alguns minutos até as pedras que enfeitavam o resto da paisagem, quase no fim da praia.

– Acho melhor voltarmos, Daniela já deve estar preocupada. – alertou Lucas.

– Não, está cedo. E ela com certeza não irá se importar se ficarmos aqui mais um pouco. Ela tá bem lá, ouvindo Madonna no celular. – avisei a ele enquanto ríamos.

Lucas sentou-se perto das pedras e eu o acompanhei. O sol estava radiante e ao mesmo tempo humilde, pois o calor era quase imperceptível.

– Quais os planos para “dezessete anos”? – perguntou ele.

– Não sei. Poucos eu acho. – lembrei-me do livro que estava prestes a concluir para o projeto da escola.

– Poucos? Di, você precisa começar a curtir mais a sua vida. A adolescência pra você em breve acabará.

– Eu sei, mas não sou esse tipo de adolescente que sai por aí curtindo a vida adoidado e esquecendo das responsabilidades. Há coisas mais importantes do que virar um copo de vodka na boca e rir dos amigos idiotas que saem beijando todas por aí.

– Não precisa esquecer das responsabilidades.- replicou ele. – você já foi alguma vez na vida para alguma matinê ou show aqui no Rio?

Parei um tempo pra pensar e percebi que não. Era raro eu sair de casa para fazer algo diferente ou divertido. Geralmente, as minhas programações de finais de semana resumiam-se a filmes antigos e livros mofados. Às vezes surgia uma exceção, como uma ida ao cinema com Flávia e Maurício. Ou então à pizzaria com meus primos idiotas.

– Não. – respondi rindo logo em seguida.

– Ai meu Deus! – exclamou Lucas perplexo. – Você precisa fazer algo excitante urgentemente! Até eu já fiz isso e você não!

– Ah, você fazia escondido ora. – declarei.

– É, mas pelo menos eu fazia. – ele então riu de mim novamente, mas dessa vez não vi graça no sarcasmo. – Olha, tenho certeza de que a Daniela me deixaria levar você a um show. Vai ter semana que vem. A censura é quinze anos, logo eu vou poder ir contigo. Pode chamar até a Flávia. – sugeriu ele.

– Tudo bem. Eu vou conversar com a “tiete” da Madonna. – afirmei enquanto levantava-me para voltar para onde minha mãe estava.

Chegamos até ela que balançava os pés enquanto ouvia e cantava silenciosamente “Like a virgin”. Não havia nem percebido nossa chegada.

– Mãe? – chamei. Ela ainda não havia escutado e Lucas apenas ria da cena. – Não acredito que ela tá delirando com essa música. – disse a Lucas. – Mãe! – gritei.

Ela parou. Retirou os fones dos ouvidos e sorriu.

– Eu nem vi vocês chegando. O som estava alto. – disse ela.

– A gente percebeu. – ironizei. – agora, faça o favor de arrumar as coisas, ok? Madonna... – avisei a ela.

– Agora, shopping? – perguntou Lucas segurando um sorriso que ia de orelha a orelha.

– Ir ao shopping, assim? – indaguei a ele se referindo ao meu estado degradante de aniversariante. Era um short jeans um tanto desbotado, uma blusa larga com a estampa de uma coruja onde caberia outra Diana com espaço de sobra e um chinelo colorido com desenhos de coruja. Eu gostava de corujas.

– Sim! Nós vamos comprar roupas. Qual o problema de ir assim? – questionou minha mãe recolhendo a toalha da areia.

– Sei lá, espero que não nos barrem na entrada do shopping. – continuei.

– Para com a nóia! Isso não tem absolutamente nada a ver. – disse Lucas. - Por sorte hoje está frio e eu não tive coragem de mergulhar no mar. Vou vir aqui nas férias novamente.

Seguimos rumo ao shopping onde eu estaria sujeita a trocar de roupa repetidas vezes até encontrar uma que estivesse de acordo com o padrão de moda da minha mãe. Aquilo sempre acontecia quando eu saia apenas com ela para comprar novas roupas. O acréscimo da vez era Lucas, um aspirante a estilista, gay e fashionista. Eu estava perdida, e sentia isso.

Mas eu deveria ter visto os sinais. Desde o dia em que ele soube do meu aniversário, xeretar meu guarda-roupa tornou-se hobbie para ele. Ainda mais por conta do novo curso de corte e costura dele. Duas saias minhas sumiram e voltaram dias depois com glitter, purpurina e umas pedrinhas brilhantes. Depois disso, um vestido meu foi encurtado e uma blusa que antes era branca tornou-se azul. Era uma revolução desnecessária em um guarda-roupa que eu mantinha a sete chaves. Tentei convencê-lo de que não usaria nenhuma daquelas roupas modificadas, mas ele sentiu-se mal, então prometi usar o vestido encurtado na pizzaria hoje à noite.

A primeira loja em vista foi uma de vestidos. Eu gostava de vestido, mas não aqueles decotados que tinham a função de deixar robusto o que já era robusto.

– Esse vermelho diz “não sou puta, mas também não sou inocente”. – disse Lucas ao ver um modelo na vitrine. Era vermelho sangue e chamativo. Com brilho, é claro. Curto o suficiente para ser acima no joelho e apertado no quadril. Sei disso porque eu o experimentei.

– Você está linda! – disse a minha mãe.

– Eu mal consigo respirar! – repliquei olhando para Lucas.

– Okey, então vamos para outro vestido. – concordou ele puxando um lindo e simples vestido azul para ser experimentado.

Eu fiquei minutos olhando para o vestido. Era lindo. Um azul que me acalmava apenas de olhar para ele. Então eu o vesti e me senti divina. Dentro do provador, admirei a forma como ele brilhava e balançava na medida em que eu me mexia. Era a sincronia perfeita.

– eu adorei esse. – disse a eles que estavam perplexos, e eu esperava que aquela expressão no rosto dos dois significasse que o vestido havia ficado deslumbrante. Ou pelo menos bonito.

Eles se olharam e depois sorriram para mim. Falaram em uma sincronia perfeita:

– Está perfeito!

Levamos o vestido. E na seguinte loja paramos para comprar calças e camisas. E saias também. Dei um jeito de mantê-los de boca fechada enquanto eu escolhia as roupas que queria e Lucas avaliava apenas com três olhares. Um dizia: ”se você usar isso perto de mim, não me chame de irmão”. O outro: “Tá perfeito! Pra uma prostituta...” E o ultimo e mais sincero: “Use este! Está tão perfeito que nem consigo acreditar que você o escolheu sozinha!”.

– Ótimo! As roupas já foram. Você precisa de sapatos agora. De um bem bonito para combinar com aquele vestido. – sugeriu minha mãe.

– E um pra combinar com aquele vestido que você personalizou, não é mesmo Lucas? – perguntei relembrando ele da minha promessa.

– Ah, sim. Vai usá-lo hoje na pizzaria? – perguntou.

– Com certeza.

***

Encontrei a noite na pizzaria, Flávia, Maurício, Edgar, meus primos idiotas, mas que gostavam de mim, meus tios e meu avô que decidiu abrir uma exceção. Ele também queria ver Lucas. Algumas amigas da minha mãe e um amigo do meu pai.

– Seu pai me disse que iria ligar pra você daqui há pouco. – avisou Gustavo.

– Ótimo. Eu realmente espero que ele não tenha esquecido. – disse.

Minutos depois, enquanto todos serviam-se de pizza, meu telefone tocou. Era ele, meu pai. A ligação era internacional, então eu sabia que nossa conversa não seria longa.

– Querida, me desculpe não ter ligado mais cedo. Olha, eu estou em Nova Iorque hoje, e é uma cidade incrível. Comprei um presente pra você e vou pedir que um amigo meu te entregue. Com certeza sua mãe te encheu de roupas e sapatos, então eu decidi pensar no que a minha princesa iria preferir com dezessete anos, e percebi que a única coisa que poderia te agradar seria um livro completamente em inglês dos contos dos irmãos Grimm.

Meu sorriso pela notícia do presente foi imediato.

– Eu não acredito pai! – exclamei eufórica de felicidade.

– Olha, a capa é dura. É original e tem aquele cheiro horrível. E foi muito difícil convencer o senhor da livraria de vendê-lo. Sabe né? Original... – continuou ele. – Eu espero estar em breve aí pra dizer que te amo pessoalmente, mas por enquanto vai ter que ser assim.

– Eu te amo pai. – falei controlando as lágrimas e voz trêmula que estavam prestes a surgir.

– Eu também minha menina. Feliz aniversário.

Nos despedimos para que aquilo não durasse muito e o prejudicasse depois. Passei o resto da noite com um sorriso no rosto que parecia não ter fim.

– E Daniel? Ele não vem? – perguntei a Flávia que estava sentada ao meu lado na mesa.

– Eu acho que sim, mas até agora ele ainda não respondeu nenhuma mensagem minha. – respondeu ela.

Lembrei então que não falava com ele há dois dias. Ficamos sem aula na sexta-feira por conta do planejamento e eu tirei esse dia para concluir mais capítulos do meu livro.

Enquanto eu evitava preocupar-me com Daniel, vi um daqueles amigos dele passar pela frente da pizzaria. Não sei qual é o nome dele, mas o olhar que ele lançou sobre mim fez com que eu me sentisse mal.

– Eu vou ligar pra ele. – disse a Flávia.

Fui para um local afastado da diversão dos meus familiares e amigos. Disquei o número dele. Apenas chamava e depois caia na caixa de mensagem. Tentei sete vezes seguidas e comecei a surtar.

– Está tudo bem? – perguntou Lucas enquanto tocava no meu ombro.

– eu espero que sim. Não consigo falar com o Daniel. – avisei a ele com um ar de preocupação perceptível.

– Ele deve estar ocupado. Tenha paciência. Ele vai chegar. – disse Lucas tentando me acalmar.

Voltei à mesa onde todos comentavam o vestido que eu estava usando.

– Muito bonito! – disse a minha tia.

Olhei para Lucas esperando um sinal que me indicasse não haver problemas para contar que fora ele quem fizera o vestido. Mas ele apenas a baixou a cabeça e eu entendi aquilo como um não.

Após o rodízio, todos seguiram para casa. Ainda tentei telefonar novamente para Daniel, mas todas as tentativas eram tolas e em vão. Nem mesmo as mensagens. Já era tarde, não existia hipótese alguma de ir à casa dele saber o que aconteceu, então achei melhor procurá-lo no dia seguinte.

Ao chegar em casa, Lucas e minha mãe ajudaram-me a abrir os presentes: ganhei bolsas, roupas, uma caixa enorme de maquiagem, DVD’s de filme em preto e branco (que com certeza havia sido dado pelo meu avô), pulseiras e outros acessórios, um vale da morte (um vale de um parque de diversões que meus primos costumavam ir), dentre outras coisas.

– Pelo menos eu ganhei um livro do meu pai. – afirmei feliz para os dois.

***

Eu já estava me preparando para dormir. Organizei os presentes nos devidos lugares e fui pra cama. Lucas já estava dormindo há tempos. O dia havia sido longo: praia, shopping, compras, pizzaria, histórias ridículas sobre mim. Mesmo assim, a preocupação com o casmurro andava atordoando o sono.

Quando meus olhos finalmente iriam se entregar para o cansaço, meu celular tocou. Era uma mensagem. Uma mensagem de Daniel.

Eu sinto muito não ter ido à comemoração do seu aniversário. Tive uns problemas... Sei lá. Eu não deveria te incomodar com eles. Não te faria nada bem. Então, como a noite é uma criança (é como dizem), estou te esperando no beco com uma garrafa de vodka e sprays. Como eu sei que você nunca saiu de casa escondida, sinta-se desafiada.”

Eu mal conseguia acreditar no que estava lendo. Olhei para o relógio: era meia noite em ponto. Lembrei então de Lucas e suas declarações a respeito de curtir a vida.

Com responsabilidade ou não, eu saí de casa de forma silenciosa, e mesmo com a rua deserta assustando, ainda havia pessoas na outra rua. A Rua principal parecia não dormir. Pessoas lanchando em estabelecimentos precários e nojentos.

Andava com o máximo de atenção, e ao chegar ao destino final, eu o vi. Apoiado ao muro segurando uma sacola nas mãos. Daniel era iluminado apenas pela luz de um poste com defeito, e mesmo assim parecia incrível.

– Não consigo acreditar que você veio. – disse ele surpreso, sorrindo de forma descontrolada.

– Que fique bem claro, eu só vim por causa da vodka. – repliquei enquanto ria.

– E essa roupa? Um pijama tá perdendo pra isso... Uma lady, realmente.

Eu me aproximei e então subimos naquele muro imundo. Lá de cima vimos as luzes das ruas que cortavam aquela esquina, e os postes de luzes quebradas enfeitavam o cenário em meio aos faróis dos carros.

– Feliz aniversário. – disse ele me entregando uma bebida em minhas mãos.

– Já passou da meia-noite, espertinho. – eu peguei e a bebi.

Observei o rosto dele e percebi um machucado.

– O que aconteceu, Daniel? – perguntei preocupada.

– É uma longa história... – respondeu ele.

– Eu gosto de histórias. Pode começar.


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