–Ei gente ,vamos contar histórias de terror?-Michelle disse toda animada com um brilho estranho em seus olhos castanhos escuros .Sua mecha loira metálica no meio da sua cabeça que descia até a ponta ,misturada com seu cabelo castanho médio me fez lembrar de vampiros ,as criaturas que ela tanto amava e idolatrava e eu imaginei que se ela pudesse ,para se transformar em vampira ,até faria um pacto com o próprio Lúcifer.

Com os grilos cantando à minha volta e a temperatura caindo drasticamente ,aproximei o cobertor xadrez do meu rosto ,com a ilusão de que isso me aqueceria mais depressa e me protegeria. Como eu odeio o inverno...Não poderíamos estar numa noite de verão?! Vitor cutucou minha cintura o que me fez dar um pulo do tronco/banquinho. Foquei meus olhos assustados nos dele e eu vi em suas pupilas que ele adoraria abrir um sorriso com minha atitude covarde ,mas semi cerrei os olhos pra ele em desaprovação e ele ficou quieto.

–Está tudo bem?-Ele perguntou olhando o alto da minha cabeça ,e eu escondi o meu rosto envergonhado e assustado.

–Está só estou...-Deixei a frase morrer por alguns segundos no ar.

–Com medo?-Ele arriscou e mordeu o glóbulo da minha orelha esquerda que a pouco escutava a respiração tranquila dele.

–Que medo o que!-Balancei a cabeça em desdém.-Eu não sou uma criança pra ter medos de histórias bestas de terror que a Michelle conta...Já me acostumei. -Conclui me lembrando das histórias que ela contava quando criança quando ia dormir em minha casa a convite do Renato.

–Então por que...-Com o dedo indicador ele puxou meu queixo me fazendo encarar seus olhos que estavam tão tranquilos e se divertindo com a situação. -Você está tremendo igual a um motor de um carro dando a partida.

Levantei minha sobrancelha.

–Sério ?Depois fala que eu uso exemplos toscos. -Sorri com ironia pra ele.

–Deixa meus exemplos em paz e me responde .-Ele disse convicto.

–Eu...Só estou com frio!-Respondi na defensiva puxando ainda mais o cobertor que cobriu meu rosto corado .Logo senti a mão de Vitor tateando o dito cujo e deslizando a mão pela minha barriga .Tarado.

–Eu sei que você sofre de Hipotireoidismo ,mas isso não é desculpa...-Ele disse achando a borda do cobertor e retirando-o da minha face ,me deixando totalmente descoberta e tremendo de frio.

–Me dev-o-o-olve ,Vitor.-Disse batendo os dentes.

–Não antes de você confessar que está com medo.

–Me d-a-a-a-a!-Disse estendendo a mão e tentando puxar o dito cujo de sua mão ,mas ele o puxou e eu sentia que a raiva começava a subir pelo meu corpo .-Se você não me der agora eu vou entrar e não falo nunca mais com você.

–Você não aguenta.- Ele respondeu com um sorriso cheio de si. -Você me ama demais pra me deixar livre pra Jéssica.

Ele estava passando dos limites. Primeiro com o meu frio fora do comum e segundo por ter a ousadia de falar na minha frente dela. Respirei fundo três vezes e me levantei .Comecei a andar toda dura de frio e pensei quanto iria demorar pra mim chegar ao dormitório. Rezei pra que não muito.Com o meu corpo todo sacudindo com as “convulsões” de frio senti um cobertor sendo depositado em meus ombros e agradeci a Deus por isso ,mesmo sabendo que pode ser que ele não tinha nada a ver com isso ,já que temos livre arbítrio.

–Isa...Isa para. -Vitor me virou para si e esfregou os meus braços com o cobertor. -Desculpa ,as vezes não sei quando parar. -Disse encarando os meus olhos e a minha bochecha queimada do frio.

–Tudo bem.-Eu disse tentando convencer a meus lábios a não tremerem. -Mas é que...Histórias de terror nunca me lembram boas coisas.-Eu disse olhando para o CO2 que exalava da fogueira e se dissolvia no mais alto ponto do céu.

–Porque ?-Ele perguntou olhando os meus lábios ,que eu sabia que estavam roxos .Ai porque ele não me beija logo pra me esquenta?!Tá...mente da Isa pare de pensar besteira.

–Não sei...Eu não me lembro bem...Mas me dá calafrios só de pensar.

–Deve ser só impressão....Venha.-Ele estendeu a mão na minha direção para que eu pegasse .Fiquei encarando ela e pensei como ela devia estar quente ,mas me mantive firme no meu lugar.

–Aonde?-Questionei .Meu Deus como eu era chata!

–Pra fogueira ,você está toda roxa Isa ,se não se aquecer vai ter uma hipotermia. -Considerei aquilo e realmente não gostei da ideia de um fogo me possuindo enquanto eu tremia de frio na cama.-Eu te protejo. -Vitor sorriu e suas covinhas invadiram seu rosto ,como ele jogava sujo.

–Você sabe como convencer uma garota ,hem?

–Não ,eu só sei usar minhas covinhas a meu favor. -Disse sorrindo e me abraçando de lado para que eu me aquecesse.

–Digo nada pra você viu.

–Eu sei que você me ama. E eu também te amo sua nervosinha. -Ele sussurrou em meu ouvido e o calor do seu hálito invadiu meu ouvido me aquecendo um pouco e fazendo cócegas.

–Tá ,sei. -Chegamos na fogueira e todos estavam conversando e pelo jeito ,nos aguardando.

–Há !Eu disse que ele ia convencer ela!-Nicolas gritou e pulou em cima do Samuel.- Passa a grana!

–Eu só dou porque mantenho minha palavra.- Samuel retirou do bolso sua carteira e entregou a Nick cerca de dez reais.

–Sério que vocês apostariam isso?!-Reclamei jogando as mãos para o céu e quase deixando o cobertor cair ,mas Vitor o pegou pra mim e o recolocou no lugar.

–Mals Isa ,mas eu preciso de grana pra levar a minha namorada no cinema .-Disse Nicolas olhando para o dinheiro com os olhos brilhando ,Será que ele olhava pra namorada daquele jeito?

–E pelo visto eu não vou no cinema com a minha. -Reclamou Samuel se sentando e colocando o rosto triste entre as mãos.

–E desde quando você tem namorada ,o Samuca? -Perguntou o Bruno.

–Bruno ,fica quieto pra eu gostar de você.

–Vish ,hoje a noite não vai ter em Bruno!-Gritou Roberto.

–Tá gente ,deixa a Isa em paz. -Disse Vitor me direcionando para o nosso antigo local. -Mi ,pode começar.

Michelle que estava quase dormindo em seu canto se levantou em um solavanco que eu me assustei e pulei no meu lugar ,fazendo Vitor dar um sorrisinho fraco e eu deu uma cotovelada na sua barriga.

–Ai !Doeu !Vai deixar roxo!-Ele reclamou.

–Devia ter pensado nisso antes de rir de mim –Respondi empinando o nariz.

–Sabe que eu amo quando você faz isso né?-Ele respondeu me puxando para si pela cintura.

–O que? Quando eu te odeio?-Perguntei cheia de ironia para dar e vender.

–Sabe que o ódio é o primeiro sintoma do amor ?-Ele respondeu mordendo minha bochecha.

–Se fosse assim eu amo muita gente. -Olhei para Felipe ,mesmo não o odiando e Vitor fechou a cara.

–Não tem graça. -Ele disse fazendo bico.

–Olha ,só estou entrando na brincadeira!-Disse levantando as mão em um sinal de que me rendia e sentia muito.

–Vou te mostrar a brincadeira. -Vitor tomou meu rosto em suas mãos firmes e olhou meus olhos como se pudesse ver minha alma. Logo ele beijou o canto da minha boca e o meio dela. Senti sua língua quente contornar meus lábios e logo a senti dentro da minha ,dançando em sincronia com a minha.

–Chego ,chego!-Gritou Michelle o que nos fez separarmos .-Vamos para a história!

~~ ♥ ~~

Quando todos finalmente ficaram quietos ,Michelle se ajoelhou no chão ao lada da fogueira e ficou encarando as labaredas do mesmo chicoteando por longos segundos ,quando sua voz grave se alastrou pelo ressinto eu me assustei novamente e Vitor estreitou seu braço na minha cintura.

–A não muito tempo atrás .-Ela anunciou sem nenhum resquício de humanidade na face.-U homem ,que ninguém sabe de onde ele veio ,ou do que tinha ,vivia nessa floresta .Seu nome ,ninguém sabe ao certo ,cada um se refere a ele de uma forma ,e alguns até não ousam pronunciá-lo, mas como nós somos doidos em invocar uma maldição...Diremos o seu nome...Skil.–Senti um frio atingir minha coluna e cravei minhas unhas na mão de Vitor que segurava a minha e o vi fechar os olhos e morder os lábios. Será que foi muito forte ?Mas logo ele me apertou minha cintura e passou o dedo na extensão da minha coluna...Ele estava mais do que bem.-Ele morava na casa que anteriormente era dos caçadores da região e logo...Ele não deixou de ser um. -Ela pegou um graveto e começou a desenhar na areia alguma coisa que eu não consegui distinguir ,mas rezei para que não fosse um símbolo satânico. -Quando as famílias ,escolas ou jovens vinham passar as férias aqui, mortes inexplicáveis começaram a surgir e nem sempre os corpos eram encontrados...Os que era ,vinham mais pálidos que giz e os membros todos quebrados e deslocados .-Seus olhos agora estavam negros e eu tinha medo do que ela poderia estar pensando .-A polícia nunca achava algum resquício do assassino e assim ,mortes e mais mortes foram seguidas sem que o assassino fosse encontrado e aqui ficou conhecido como O Bosque do Grito.

–Por que Bosque do Grito?-Vitor perguntou e eu pedi pra que ele não tivesse dito isso. Um sorriso que me deu medo escapou dos lábios de Michelle e pela primeira vez desde que ela começara a história ,pude encarar seus olhos rubros.

–Isso eu não posso contar...-Ela disse jogando o graveto no jogo fazendo a chama vibrar .Vi no rosto de meus amigos o desaponto ,mas antes de que todos voltassem a seguir suas vidas ,Michelle se pronunciou de novo .-Isso eu vou mostrar.

~~ ♥ ~~

O barulho dos galhos se partindo nos meus pés me deixava nervosa enquanto eu me abraçava para me aquecer .Escutei os meninos brincando atrás de mim e jogando as folhas secas uns nos outros .Vitor estava brincando com Alice e eu só conseguia olhar para Michelle que estava muito quieta e o sentimento de que tudo aquilo me parecia um Dejá vùl não me abandonava.

Perdida em meu mundo particular ,não vi a hora que Vitor me puxou pela cintura quase me fazendo cair para atrás de uma árvore.

–Nossa que susto Vitor!-Coloquei a mão sobre meu peito sentindo o ritmo desacelerado do meu coração.

–Calma Isa...-Falou com um sorriso fraco. -Desculpa queria fazer uma surpresa.

–Surpresa ou me matar do coração?-Perguntei me encostando na árvore atrás de mim. Vitor apoiou a mão direita na mesma árvore me dando a sensação de que eu não poderia fugir dali ,não que eu quisesse...

–Não acredito que me descobriu!-Ele fez cara de susto .Dei um leve sorriso.

–O que você tem? Tá estranha.- Ele acariciou minha bochecha.

–É que...-Suspirei pesadamente. -Parece que tem alguma coisa errada. -Balancei a cabeça.

–Quer voltar? Você não precisa ouvir se não quiser.

–Não...Já estou melhor .-Vitor olhou fundo em meus olhos procurando a mentira que eu dissera ,mas consegui segura-la no fundo do meu ser e comecei a acariciar a mão que ele encostava no meu rosto .Logo não aguentei aquele ar pesado entre nós e rocei meus lábios nos seus. Ele fechou os olhos e eu soube que ele estava considerando se continuava a conversa ou se rendia ao desejo. Depois de um segundo ele agarrou minha cintura me espremendo entre seu corpo e a árvore .Seus lábios sediosos espremiam os meus e parecia que ele queria que eles não fossem duas fontes de matéria ,mas apenas uma. Sua língua dançava pela minha boca e toda vez que eu sentia sua língua acariciava o céu da minha boca ,eu sentia minhas pernas ficarem bambas .Agarrei seu pescoço brincando com os cabelos de sua nuca e senti seus braços me apertarem mais ainda ,como se fosse possível. Sua mão que subia e descia pelas minhas costas ,acabou invadindo minha camisa e recomeçou seu percurso por baixo do tecido fino .Passei minhas mãos pelo seu peitoral e me arrependi assim que o fiz ,pois ele começou a brincar com a barra da minha blusa e a subi-la , soltei seu pescoço e seus lábios e encarei o chão enquanto os olhos de Vitor pareciam perdidos.

–O que foi ?O que eu fiz?

–Você interpretou mal...Alguns sinais meus essa noite. -Disse começando a corar.

–Está falando do arranhão?

–Sim ,e o beijo e tudo mais...Vitor .-Levantei meus rosto encarando seus olhos castanhos ,aqueles que me faziam perder a direção.-Eu tenho 15 anos.

–E eu 16.-Ele riu e sinceramente ,eu não senti graça alguma.

–Eu não estou pronta...Não quero isso...Agora.

–Eu sei...Me desculpa .-Vitor depositou um beijo na minha clavícula .

–Tudo bem.

–Vitor!!!!!-Escutei Daniel gritar seu nome.- Para de agarramento e vem ajuda a gente a guarda as coisas lá na fogueira!-Daniel surgiu por trás da árvore e me olhou meio estranho.

–Precisam mesmo de mim?-Vitor reclamou.

–Sim ,tem muita coisa e pouca gente.

–Você vai ficar bem?-Vitor revirou os olhos enquanto Daniel reclamava .Concordei com a cabeça. -Volto logo ,okay?

–Okay.-Vitor deu um sorriso cheio de significados e após me dar um selinho sumiu com Daniel em seu encalço .Respirei fundo várias vezes antes de sair de meus esconderijo e ver que já estava bem para trás do grupo ,só dando para ver as silhuetas de meus amigos e as lanternas. Comecei a correr para não ter que ficar sozinha naquele lugar estranho. Quando estava no meio do caminho escutei alguém chamando meu nome .Rezei três vezes o Pai nosso antes de me virar e me deparar com um...Corvo? Antes que eu pudesse me perguntar o que aquilo estava fazendo ali ,ele abriu suas asas e saiu voando me deixando só novamente .A névoa começou a subir novamente .Comecei a sentir olhos me observando e vultos esbarrando em mim. Corri .Corri mais que meus pulmões podiam aguentar ,mas os vultos voavam ao meu redor me deixando desorientada .Acabei tropeçando em uma raiz e cai de cara no chão .Quando abri meus olhos senti um ardido subir pela minha perna e o cheiro de ferrugem invadi-o minhas narinas. Minha tontura piorou com a droga do sangue e quando abri meus olhos vi diante de mim um rosto. Um rosto parecido mumificado esboçando um grito .Senti no mesmo algo pegajoso e comecei a tentar me levantar .Gritei. Gritei rezando para que alguém me ouvisse e tropeçando e quase caindo corri de novo. Lembranças a tempos esquecidas começaram a invadir minha mente me deixando descontrolada e sem saber quais delas eram reais ou não.

–Isabella....Se abaixe! Ele vai achar você!-Minha avó me orientou desesperada. -Não saia dai ,se não...-Ela ficou muda e vi uma lágrima escorrer por seu rosto jovem de 53 anos.

–Vovó ,porque você está chorando?-Minha voz infantil invadiu meu espaço e eu senti lágrimas quentes escorrerem por meu rosto.

–Por nada querida...Lembrasse o que a vovó te ensinou...Não olhe para trás...Ele pode te pegar.

–Mas vovó e a senhora?

–Eu vou ficar bem ,eu vou tirá-lo daqui...Fique ai até de manhã ,sua mãe vai te achar.

–Mas vovó...-Era tarde ,seu rosto apavorado olhou para trás e se petrificou na minha frente. O pano da cocha da cama caiu quando sua mão também tombou ,me camuflando por não muito tempo .Pelo pano fino vi uma foice ser levantada e abaixada e o pano branco que me escondia ,tingido de sangue .Tentei gritar ,mas uma mão conhecida prendeu meu grito ,fazendo amis lágrimas serem derramadas e a pergunta do que ele estava fazendo ali ,morrer com o meu desmaio.

Embaquei enquanto me levantava. Aquele rosto...Aquela foice mal interpretada...Tudo aquilo não podia estar acontecendo novamente...Ele não podia ter voltado.

–Nos encontramos de novo Isabella...-Uma voz atrás de mim se pronunciou e eu congelei sem conseguir me virar para encará-lo.

–Não olhe pra trás...Se não ele pega.

–Só que desta vez ,nem ele muito menos ela estão aqui para te proteger...Você será minha. Senti algo duro acertar minha cabeça e a mesma tombou no chão.Tentei não desmaia e manter os sentidos .Um par de sapatos de gala caminharam em minha direção e minha visão bagunçada não deixou ver seu rosto ,mas eu sabia como era...Branco como o céu e frio como a morte.

–Desta vez ,seus piores pesadelos lhe voltaram...E a dor que quem quer que seja lhe escondeu...Eu lhe devolverei .-Disse a voz em meu ouvido. -Pois vocês seres humanos merecem a dor .-Senti lágrimas escorrerem por meu nariz prensado na terra. Uma mão agarrou meu cabelo elevando minha cabeça ,e a mesma com toda a força que possuía a jogou com tudo contra uma pedra.Com a escuridão me rondando eu só pude pensar :Ele voltou...E levará todos consigo.