Silêncio escrita por KeykoSakura


Capítulo 11
Presente Amargo


Notas iniciais do capítulo

Obrigada por estarem comentando! Também queria agradecer à Nora pela recomendação!



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Tsunade odiava aquilo. Definitivamente. Olhava irritada a pilha crescente de papéis em sua mesa enquanto massageava as têmporas tentando prevenir uma dor de cabeça que ameaçava surgir. E onde raios estava sua garrafa de sake? Dez e meia da noite não era um bom horário para ainda estar no hospital. Tsunade adorava o que fazia. Ser médica era sua razão de vida, mas isso não incluía a parte chata de ser administradora de um hospital enorme como aquele. Não nascera pra ser gerente...

Estava prestes a se dar por vencida e desistir dos papéis por aquela noite, quando uma enfermeira de cabelos escuros e curtos de nome Shizune entrou correndo em sua sala.

-Tsunade-sama! Emergência no pronto socorro!

Mais do que imediatamente, Tsunade vestiu seu jaleco e correu junto com Shizune para os elevadores.

-O que houve?

-Jovem em torno de vinte anos, homem, baleado na cabeça.

-Condição?

-Grave.

Tsunade franziu as sobrancelhas. Embora quisesse se livrar da papelada, uma situação como aquela já era demais. As chances de alguém sobreviver a um tiro na cabeça eram mínimas.

"Vinte anos..." Ela pensou. "Muito jovem..."

A loira de seios impossivelmente grandes não imaginou, porém, o caos que estava o pronto socorro naquele momento. As portas do elevador se abriram pra logo revelar a gritaria que se passava ali. Quatro enfermeiros corriam com o que Tsunade supôs ser o tal rapaz. Só uma espiada no garoto e sua testa se franziu mais ainda, dava pra ver que ele havia perdido muito sangue. Mais à frente, vinha uma garota de cabelos estranhamente rosados, tentando acompanhar a maca enquanto discutia com dois policiais e com os outros enfermeiros que tentavam impedi-la de chegar mais perto.

-Por favor, moça, você não pode ir com ele. É um caso emergencial de UTI, acompanhantes não são permitidos!

-EU NÃO VOU SAIR DE PERTO DELE!

-Garota! Você não pode nem sequer sair da nossa vista! –um dos policiais gritou também. –Aquele garoto é nosso suspeito!

-O QUÊ?! Isso é ridículo! Vocês atiraram nele! –a garota chorava desesperadamente. Tsunade não conseguiu evitar sentir seu coração apertar com a cena. –Ele não fez nada e vocês atiraram nele!

-Tsunade-sama! –a loira virou sua cabeça na direção da enfermeira que a chamara. –Precisamos da senhora com urgência!

Tsunade anuiu e se virou pra ir pra sala de cirurgia quando sentiu seu braço ser puxado. Ao voltar-se, viu que era a garota de cabelos cor-de-rosa.

-Por favor... –ela fungou. –Você pode salvá-lo? Por favor...

Tsunade não sabia o que dizer. Hesitou por um momento.

-Você acredita em milagres, garota? É melhor começar a rezar...

E com isso a loira se virou impetuosamente e irrompeu na sala de cirurgia, fechando as portas atrás de si.

Sakura foi deixada no corredor, olhando as portas fechadas em desespero e dor. Caiu sentada no chão e chorou amargamente. Recusou a ajuda de Shizune, que tentou levá-la para a sala de espera. Ignorou os dois policiais fazendo seus contatos pelo rádio informando a situação. Ainda não conseguia entender. Por que tudo acontecia pra acabar com a felicidade deles? O que Sasuke tinha feito de errado? Por quê? Por quê?

[...]

Horas e horas de espera. A garota por fim se deixou carregar pra um dos pequenos sofás da sala de espera. Shizune se comoveu com o estado da garota e levou um chá pra ela, pra ver se a deixava um pouco mais calma. Sakura olhou várias vezes entre a enfermeira e a xícara, antes de aceitar sem nenhuma palavra. Estava praticamente se afogando em dor, na expectativa de saber se Sasuke viveria ou não. Esse pensamento a fez ter uma nova crise de choro, daquelas de soluçar. Como doía! A perspectiva de perder Sasuke, o garoto que ela tanto amava, doía tanto! E ainda por cima havia a raiva. Raiva daqueles policiais por terem atirado nele! Sakura queria gritar mais ainda, mas não iria adiantar de nada. Gritar não traria Sasuke de volta. Não o tiraria da sala de emergência, não o traria para o lado dela de novo.

Quando já era mais de uma e meia da madrugada, Sakura sentiu seu celular tocar. O visor indicava que era Ino quem chamava. Claro, com tudo aquilo, Sakura nem se lembrara de ligar pra avisar o que havia acontecido e suas amigas deveriam estar preocupadas. Não que Sakura não pudesse passar a noite fora com Sasuke, mas ela sempre avisava pra onde iria (E nunca tinha passado a noite fora com ele. Os dois não haviam chegado nesse grau de intimidade. Ainda.). Com as mãos tremendo, ela atendeu.

-Alô?

-Sakura! Onde você está? Kiba acabou de me dizer que o Sasuke também não chegou; o que vocês estão fazendo?

-Ino... –A garota não aguentou e começou a chorar novamente.

-Sakura? Sakura o que foi? O que houve?!

-Eu tô no hospital... O Sasuke... Sasuke foi baleado, Ino... Faz três horas que ele está na cirurgia de emergência... –e mais choro era só o que poderia ser ouvido pelo telefone.

-... AI MEU DEUS! COMO ASSIM BALEADO, SAKURA?! Em que hospital vocês estão? Estamos indo pra aí agora!

Sakura fungou algumas vezes tentando se acalmar antes de responder.

-No Takatsuki.

-Fica calma Sakura. Vai dar tudo certo. Estamos indo, tchau!

-Tchau...

A garota desligou. Não teve coragem, nem condições de contar como o estado de Sasuke era grave. Sakura percebeu naquele momento que nunca, nem uma vez sequer, ela havia feito uma oração. A garota nem era muito certa se acreditava em Deus, aquele dos cristãos do ocidente. Porém seu desespero era tanto que ela não viu outra saída. Caída no sofá, sem vontade de se levantar, Sakura fechou os olhos, ainda com lágrimas escorrendo por suas bochechas, e iniciou uma tímida tentativa de uma oração.

Deus... Eu sei que nunca nos falamos... Eu sei que eu nunca acreditei muito em você. Mas se puder me ouvir agora, se puder me perdoar por minha falta de fé e me ouvir agora... Por favor, me ajuda! Se o Senhor realmente sabe de tudo como dizem, então também sabe o quanto eu amo Sasuke. Por favor, não o tire de mim! Por favor, não o leve embora! Eu preciso desse milagre, Deus... Não me deixa ficar sem ele, por favor... Por favor...

Em torno de quarenta minutos após a ligação, Ino, Kiba, Neji, Naruto e o professor Kakashi apareceram no hospital. A loira foi correndo abraçar Sakura, que nem tinha percebido a chegada dos amigos. A rosada chorou mais ainda, se é que era possível. Kiba, Neji e Kakashi se dirigiram a alguns funcionários do hospital pra pedir informações sobre o que estava acontecendo. Sakura parecia debilitada demais pra poder contar naquele momento. Naruto foi o primeiro dos meninos a procurar a rosada. Ele se abaixou e a envolveu em um terno abraço quando Ino a soltou. Naruto gostava muito de Sakura, assim como ela também gostava bastante do loirinho. Naruto conhecia Sasuke desde os tempos de escola, a garota imaginou o quanto ele também deveria estar sofrendo. Logo, ambos desfizeram o abraço, mas o loiro sentou-se ao lado dela e permaneceu com o braço em torno da rosada enquanto ela assoava o nariz e tentava ficar um pouco mais calma.

-Kiba? –ela chamou.

O garoto estava falando com uma funcionária no balcão de atendimento, mas se virou assim que ouviu Sakura chamar. Ele se voltou pra ela com os olhos cheios de preocupação. Se aproximou da garota e também se abaixou pra falar com ela.

-O que foi?

-Temos que preencher a ficha do Sasuke. Eu nem consegui fazer isso ainda... Me ajuda?

Kiba tentou dar um pequeno sorriso encorajador.

-Claro. Onde está a carteira dele?

Sakura revirou sua bolsa e tirou a carteira de Sasuke de lá e a entregou a Kiba. Os paramédicos haviam tirado a carteira e entregue à garota por causa dos documentos. Ao mesmo tempo em que Kiba voltava ao balcão os dois policiais se aproximaram dele. Sakura logo ficou tensa.

-Hey. –disse um dos policiais para o Inuzuka. –Você conhece o garoto?

Kiba nem ao menos havia reparado na presença da polícia ali. Lançou um olhar confuso pra Sakura e ao vê-la encarando os guardas furiosamente, o garoto logo entendeu o que havia acontecido.

-Sou o melhor amigo dele, por quê?

-Precisamos de algumas informações sobre o seu amigo, poderia convencer a garota ali a prestar...

-Eu já disse que ninguém vai dar depoimento aqui! –Sakura gritou irritada.

-Moça, -disse o outro policial, mais magro e alto em comparação com o primeiro. –Nós precisamos que você nos acompanhe até a delegacia pra prestar depoimento! Temos um suspeito aqui!

-EU NÃO VOU SAIR DE PERTO DO SASUKE!

-Calma Sakura... –Ino tentou controlar a amiga. Discutir com policiais era perigoso. Sakura ignorou.

-Eu não tenho culpa se vocês pegaram a pessoa errada! Sasuke não fez nada de errado! E vocês atiraram nele!

Vários pares de olhos se arregalaram.

-Vamos prender você também por desacato a autoridade se não vigiar sua boca garota! –disse o policial mais gordo. –O garoto bate com a descrição do suspeito. E ainda desobedeceu a uma ordem da polícia! Isso o torna ainda mais suspeito.

-ELE É SURDO! –Sakura gritou a plenos pulmões. –É claro que ele não ia parar... –as lágrimas vieram acompanhadas por soluços. –Ele é surdo... Só isso... Surdo... –A garota não aguentou mais e desabou a chorar novamente.

Os policiais ficaram sem reação após essa nova informação. Obviamente, não estavam preparados para lidar com esse tipo de situação. O mais gordinho pigarreou incomodamente enquanto o mais magro olhava direto entre ele e Sakura.

-Se tentar encobrir pro seu namorado podemos te prender como cúmplice. –disse o policial gordo, sem qualquer emoção na voz.

Sakura ergueu a cabeça. Olhos vermelhos e inchados que ainda choravam olharam para o homem com descrédito. O silêncio no lugar era incômodo, até demais para um hospital.

-O quê? –Sakura perguntou. Sua voz saiu fraca e tremida.

-Dizer que o garoto é surdo... Você sabe... Tentar criar desculpas e álibis de última hora não vai salvá-lo. E você agora está encrencada por mentir para a polícia.

Sakura nem ao menos conseguiu responder. Olhou estarrecida para o policial sentindo ainda mais dor. Como se não bastasse o sofrimento de nem ao menos saber se Sasuke viveria após aquela cirurgia, ainda havia mais essa. O mundo era injusto demais. Era dor demais pra um momento só.

-Se o rapaz sobreviver... Vamos levá-lo preso imediatamente por assalto a mão armada a uma mercearia.

A visão da rosada foi ficando cada vez mais turva, até ela não ver mais nada. Naruto e Ino tiveram que segurar o corpo de Sakura antes que ela atingisse o chão. Rapidamente uma enfermeira correu até a garota. Deu seu parecer após a avaliar.

-Desmaiou. O choque de toda a situação chegou ao limite do que o corpo dela pode aguentar. Muita coisa num momento só.

Kiba estava ficando cada vez mais furioso com a situação. Teve seu melhor amigo baleado por engano e ainda por cima confundido com um criminoso... Que polícia era aquela? E como se não fosse suficiente, os policiais ainda duvidavam da deficiência de Sasuke. Ele estava prestes a explodir em cima dos dois guardas, assim como Sakura, quando Kakashi se adiantou pra tomar o controle da situação.

Mas o garoto não quis ouvir. Já sabia o que Kakashi diria. Tentando controlar a respiração, ele foi para o lado de fora do hospital. Tinha uma ligação muito importante a fazer. Procurou pelo contato em seu celular e pressionou o botão. Alguns toques depois e uma voz embargada pelo sono atendeu.

-Alô?

-Itachi? É o Kiba.

[...]

Mesmo após mais uma hora o clima continuava tenso na sala de espera do pronto socorro do hospital Takatsuki. Fazia alguns minutos que Sakura havia acordado de seu desmaio, pra ter o desgosto de se ver na mesma situação. A garota teve uma ponta de esperança de tudo aquilo ter sido apenas um pesadelo. Mas a luz do centro cirúrgico permanecia acesa. O desespero continuava lhe fazendo companhia consumindo-lhe todas as forças. Kiba se aproximou lentamente dela e sentou-se ao seu lado.

-Hey... –ele sussurrou. –Sei que agora não é a melhor hora, mas... Eu não sei se você já sabia disso...

O garoto mostrou à Sakura a carteira de Sasuke aberta. Havia uma foto da garota nela. Sakura pegou a carteira sem acreditar. Ela não fazia ideia que ele tinha uma foto dela, menos ainda na carteira dele. Novas lágrimas rolaram pelo rosto úmido da garota enquanto Kiba a abraçava. Ele esperava que seu amigo fosse forte e sobrevivesse mais essa.

Três e quarenta e quatro da manhã e a luz da emergência finalmente foi apagada. Sakura se sentou ereta no sofá, olhos arregalados e um medo gigantesco no coração. Lágrimas já brotavam novamente em seus olhos. E se Sasuke não tivesse resistido? O que ela iria fazer sem ele? Como ia continuar sem ele?

Todos os outros na sala também ficaram tensos na espera do que poderia ser uma boa ou uma má notícia. Kiba e Naruto principalmente torciam pra que o pior não tivesse acontecido à Sasuke; eram amigos há tantos anos. Eram irmãos, não de sangue, mas de alma. Irmãos, sem dúvidas.

Tsunade saiu da sala retirando sua máscara branca. Expressão totalmente cansada, rosto suado. Sakura não se conteve e correu até a mulher. Queria perguntar logo como Sasuke estava, mas parou ao ver o rosto da loira. Os olhos cor de mel estavam tristes. O coração de Sakura não sabia mais como bater sem que doesse.

"Não..." Ela pensou. "Por favor, não..."

Tsunade suspirou pesadamente.

-Sasuke... É este o nome dele não é?

Sakura anuiu sem tirar os olhos da mulher.

-Sasuke foi atingido na cabeça pela bala. Ela se alojou em um ponto entre o crânio e o cérebro. Conseguimos removê-la sem mais danos ao órgão... –outro suspiro. –Felizmente, sua pressão está estabilizada, mas precisa de aparelhos pra ajudá-lo a respirar. Ainda há o risco de ele sofrer morte cerebral se o quadro se agravar. Ele está em coma agora. Só resta esperar pra saber se ele vai voltar. Não há mais nada que possamos fazer. Eu sinto muito.

Kiba interpretou a mensagem para Naruto, ambos sem acreditar no que havia acontecido. Kakashi soltou um suspiro pesado, assim como Neji. Ino continuava a derramar lágrimas silenciosas. E Sakura... Sakura não teve reação alguma. Fitou Tsunade por uns instantes em silêncio. Acompanhou com os olhos alguns enfermeiros retirarem Sasuke da sala de cirurgia em uma maca. Só então ela disse alguma coisa.

-Pra onde o estão levando? –a voz da garota saiu baixa, fraca e embargada.

-Pra um dos leitos da UTI.

Tsunade percebeu que Sakura estava transtornada. A loira não poderia afirmar se a garota tinha mesmo absorvido a mensagem ou se até mesmo estava pensando direito.

-Eu... –Sakura balbuciou. –Eu vou com ele... Eu... Vou com ele... –e deu um passo à frente pra seguir Sasuke, porém foi impedida por Tsunade.

-Não pode. UTI não aceita acompanhantes. Sakura, entenda que o caso dele é crítico.

-Não... –Sakura respondeu, ainda um tanto fora de si. –Você não entende... Ele vai acordar e precisa de mim do lado dele. Você não tem intérpretes aqui, não é? Eu... Eu preciso estar com ele... Quando ele acordar...

A garota tentou forçar o braço de Tsunade a largá-la, mas a loira não cedeu. A médica estava cansada da longa cirurgia e ainda por cima estava sofrendo ao ver aquela garota naquele estado, mas não poderia deixar que ela fosse junto. Tsunade não sabia dizer por que, mas sentia uma simpatia muito grande pela rosada.

-Sakura, por favor... –Ino disse se aproximando da amiga.

-Não! –Sakura respondeu mais firmemente. Lágrimas rolando em suas bochechas. –Sasuke vai acordar Ino. Eu tenho que estar com ele quando ele voltar... –começou a soluçar. –Ele vai voltar pra mim... Vai sim...

Ino correu e abraçou Sakura que havia entrado em colapso mais uma vez. Tsunade percebeu que só agora ela tinha mesmo registrado a informação. As amigas caíram no chão enquanto Sakura se agarrava à Ino chorando amargamente. Nem mesmo a loira se conteve e também partilhou as lágrimas com a amiga. Os dois policiais observaram a cena calados. O sofrimento da garota de cabelos cor-de-rosa era inegável. Doía a qualquer um que assistisse. Às vezes, eles detestavam seu trabalho. Kakashi saiu do canto onde estava e ajudou Ino a erguer Sakura novamente e colocá-la sentada no sofá. Gentilmente ele acariciou as costas da menina, tentando consolá-la de alguma forma.

-Sakura, vamos levar você de volta pro campus. Você precisa comer alguma coisa e tentar dormir um pouco. Amanhã você volta pra cá... –ele disse baixinho.

Sakura balançou a cabeça.

-Não.

-Sakura, você precisa descansar um pouco... –Ino tentou.

-Eu disse não! –a garota respondeu. –Eu não vou sair daqui sem o Sasuke. Não vou!

Ino suspirou. Já conhecia o temperamento teimoso da melhor amiga. Balançou a cabeça indicando à Kakashi que Sakura não iria mesmo a lugar algum.

Tsunade se impressionou novamente com a garota. Muita determinação naquele pequeno e frágil corpo. A loira sussurrou pra que Shizune se aproximasse.

-Arranje um cantinho pra ela, Shizune...

-Mas, Tsunade-sama... Onde eu vou colocá-la?

-Na pequena sala adjacente ao meu escritório. Ela pode ficar no divã que tem lá.

-Tsunade-sama? Vai mesmo fazer isso por essa garota? Você nem a conhece...

-Eu sei, Shizune. Mas eu tenho noção da dor que ela está passando. Eu perdi alguém que amava. É muito duro...

E com isso Tsunade se retirou do local, não sem antes avaliar os rostos de todos na sala, parando um momento mais longo nos dois policiais que causaram tudo aquilo. Soltou um suspiro pesado e saiu. Shizune a seguiu logo após.

Kiba sentou-se no sofá e levou as mãos ao rosto. O mundo era tudo, menos justo.

[...]

Sakura acordou com um pequeno raio de sol atingindo-lhe o rosto saído de uma fresta da persiana branca de uma enorme janela. Por um momento ela demorou pra entender onde estava, nem se lembrava muito bem do que havia acontecido. Se viu deitada em um divã não muito grande, um jaleco branco a cobrindo. Então sua mente se recordou. Ela estava no hospital porque... Sasuke estava na UTI. Pouco a pouco seu cérebro foi juntando as imagens recortadas da noite anterior e logo seu estômago já amargava com a dor da situação. Fora bem difícil convencê-la a sair de perto da entrada da UTI, mas no fim das contas ela acabou aceitando ser levada para a sala anexa ao escritório de Tsunade, a administradora do hospital, como ela veio a saber antes de desmaiar de cansaço naquele divã. Pelo menos ainda estaria no hospital. Nunca se atreveria a ficar sequer um minuto longe demais de Sasuke, ainda mais agora.

Sasuke...

Ele iria sair do coma? E se o quadro piorasse? E se o dano tiver sido grande demais pra ele resistir?

Ela iria resistir?

Involuntariamente, seu estômago roncou. Porém Sakura mais queria vomitar do que comer. Entretanto, de nada adiantaria se afogar naquela depressão. Ela precisava ser forte. Ela disse que suportaria tudo pra ficar com Sasuke, então ela precisava ser mais forte... Por ele. Assim como ela esperava que ele fosse forte o suficiente, pra voltar pra ela.

Hesitantemente, ela abriu a porta da pequena sala, se deparando com o escritório da chefe do hospital. Estava vazio. A garota se arrastou pelo local, todo o seu corpo doía e seus olhos ardiam, indo de encontro à outra porta. O corredor também estava vazio. Sakura suspirou. Novamente o cheiro típico de hospital era inalado a fazendo se lembrar de quando era enfermeira júnior. No fundo, ela havia aprendido a gostar de todos os aspectos de um hospital, até mesmo o cheiro que tantos odeiam. O ambiente tranquilo a irritou um pouco. Não fazia jus ao coração dela que estava ainda numa turbulência de tristeza e desespero por Sasuke; não parecia justo que o mundo pudesse permanecer tranquilo enquanto havia um garoto, que ela amava tanto, entre a vida e a morte naquele lugar.

Sakura tentou se lembrar como chegar à UTI, mas não conseguiu. Começou a vagar pelos corredores em busca de algum mapa, ou de algum lugar pra pedir informações. Algum tempo depois foi encontrada por Shizune. A morena arregalou os olhos ao ver Sakura vagando pelo hospital naquele estado. De fato, a garota estava um trapo. Pálida, com os olhos vermelhos e inchados e olheiras. Cabelo uma bagunça total. Dava pra ver o quanto a garota estava abatida.

-Sakura! –Shizune se aproximou e pegou Sakura pela mão, puxando-a de leve consigo. –O que faz andando perdida por aqui? Já comeu alguma coisa?

Sakura não se lembrava do nome daquela enfermeira. Tentou não demonstrar.

-Ah... Eu estava indo pra UTI, eu preciso ver o Sasuke. Preciso saber como ele está. –mesmo falando, a garota se deixou carregar por Shizune.

-Ele está estável. Não houve nenhuma alteração durante a madrugada.

-Desculpe... Que horas são?

-Sete e dez da manhã. Já comeu alguma coisa?

-Já...

Se tivesse sido combinado, não daria certo. No mesmo instante o estômago de Sakura roncou novamente, deixando a mentira evidente. Shizune ergueu uma sobrancelha.

-Definitivamente, você é muito teimosa. Deixa eu arrumar um café pra você. Não vai ajudar em nada você ficar doente agora.

Sakura não resistiu e acompanhou Shizune sem protestos. Ela sabia que realmente não faria bem a ninguém ela ficar sem comer. No meio do caminho, a garota não aguentou o silêncio de Shizune.

-Você acha... Que ele vai ficar bem?

Shizune demorou um pouco pra responder.

-Por enquanto o quadro está estável, como eu disse. Mas é difícil dizer.

-A pressão dele está normal?

-Sim.

-Isso não é muito bom, não é?

Shizune achou a pergunta um tanto estranha vinda de uma garota como aquela.

-Seria melhor se houvesse uma pequena alteração pra cima, mas nada por enquanto.

-Houve alguma formação de coágulo? Há inchaço no cérebro?

Neste ponto Shizune parou no meio do corredor.

-Você faz perguntas muito específicas... Tem algum conhecimento médico?

-Sim... Eu... Eu já fui enfermeira. Trabalhava na obstetrícia e pediatria, na verdade. Mas o geral é sempre o mesmo não é?

Shizune balançou a cabeça concordando.

-Entendo. Sim, uma enfermeira sabe lidar com tudo, independente da área. Então posso ser mais técnica com você. Isso é bom. Enfim... –a morena abriu uma enorme porta revelando um refeitório para os funcionários do hospital. –Por enquanto nada de inchaço, mas mantivemos uma parte do osso do crânio aberto por precaução. Não dá pra prever como ele vai reagir daqui em diante, ainda mais porque ele já chegou em coma. Esperávamos um mínimo de reação após a cirurgia, mas a falta até mesmo de uma alta de pressão é preocupante.

Sakura suspirou pesadamente já sentindo o estômago embrulhar de novo. Sentou-se a uma das mesas, meio a contragosto e se forçou a comer o prato que Shizune lhe dera. Após isso a enfermeira topou levar a garota até a UTI. Mesmo não podendo entrar no quarto, Sakura pôde vê-lo através da enorme janela da seção.

Lá estava ele. Vários tubos injetados, respirando com ajuda de aparelhos. Em coma. Impossível não cair no choro novamente vendo-o daquele jeito.

-Sakura?

Ambas Shizune e Sakura se viraram ao ouvir aquela voz. A garota de cabelos róseos se deparou com um rapaz que aparentava ser uns poucos anos mais velho que ela. Olhos escuros e cabelos também escuros em um rabo de cavalo. Parecia a versão mais velha de Sasuke. Sakura o reconheceu de algumas fotos que ela já tinha visto da família dele.

-Itachi? –sua voz saiu baixa e embargada.

Sim. Itachi estava lá. Parecia tão abatido quanto a garota e vê-la chorando enquanto assistia seu irmão, namorado dela, em coma em uma cama de hospital, ajudou a quebrar o que restava de força no espírito dele. Itachi se aproximou mesmo hesitante. Era a primeira vez que ele via a namorada de seu irmãozinho pessoalmente, mas a dor não se importava com formalidades.

Ele a abraçou.

Sakura não pensou muito no quanto isso seria um pouco estranho normalmente e chorou mais ainda, devolvendo o abraço e sentindo Itachi apoiar a cabeça dela em seu ombro, o máximo que o pequeno corpo dela permitia. Ambos precisavam ser confortados. Ambos tinham uma pessoa muito importante quase morrendo. Ambos amavam muito o rapaz inconsciente naquela cama de hospital.

Shizune observou a cena calada. Era de partir o coração. Embora cenas como essa fossem até corriqueiras na rotina de uma UTI, nunca deixava de ser triste. Nunca deixava de doer.

Algum momento depois, Itachi e Sakura desfizeram o abraço. A garota tentou em vão, enxugar as lágrimas dos olhos. O irmão mais velho de Sasuke a observou por um instante. Mesmo naquele estado quase deplorável que ela se encontrava, não restavam dúvidas de como Sakura era bonita. Seu irmãozinho tinha mesmo bom gosto. O mais velho dos irmãos suspirou pesadamente.

-Sakura... Venha. Tem mais duas pessoas que querem te conhecer.

A garota já sabia quem elas deveriam ser. Por um momento pensou que aquele era um péssimo estado pra ser apresentada à família do namorado, mas devido às circunstâncias, não havia muito o que se fazer. De repente se sentiu nervosa, além de arrasada. Itachi a conduziu para a recepção do pronto socorro onde estavam duas figuras sentadas, de mãos dadas. Ambos encaravam o chão. Itachi pigarreou para chamar a atenção deles.

-Pai, mãe. Esta é a Sakura.

A garota sentiu o coração entalado em sua garganta ao vê-los erguerem os olhos em sua direção.

-Sakura, este é meu pai, Fugaku. Esta é minha mãe, Mikoto.

Fugaku não esboçou a menor reação, algo que não surpreendeu Sakura. Conhecendo o jeito de Sasuke e naquela situação, não dava pra esperar uma recepção calorosa. Mikoto ofereceu um pequeno sorriso triste à garota. De repente, Sakura agiu de uma forma que ninguém esperava. A garota se posicionou na frente dos senhores Uchiha e se ajoelhou, rosto no chão e recomeçou a chorar.

-Eu sinto muito! –ela chorou. –Ele estava comigo quando aconteceu, estávamos comemorando meu aniversário. Eu deveria tê-lo convencido que não era necessário. Eu sinto muito! –incapaz de continuar, Sakura chorou mais ainda.

Ainda assim Fugaku nada disse. Porém Mikoto foi de encontro à garota e se ajoelhou em frente a ela. Pôs uma mão no ombro da garota para fazê-la olhar para cima.

-Não foi culpa sua. Foi um acidente. A culpa é daqueles que atiraram nele, não tinha como você prever o que ia acontecer. Não se culpe por isso.

Sakura se sentiu melhor com o que sua sogra lhe havia dito. Ela parecia ser bondosa e amável. Itachi também pareceu bem dócil, já o senhor Fugaku assustava a garota, mesmo sem nem ter se movido. Talvez fosse só uma impressão.

Sakura passou algum tempo com a família de Sasuke. Itachi e Mikoto conversaram com ela, tanto sobre o que tinha acontecido a Sasuke, quanto sobre ela e o relacionamento dos dois. Ela ainda passou mais um tempo observando Sasuke antes de Itachi convencê-la a almoçar. Foi durante o almoço que Tsunade apareceu. Ela localizou a garota e se aproximou.

-Como está hoje? –ela perguntou.

Sakura lhe ofereceu um pequeno sorriso.

-Um pouco melhor. Mas Sasuke não teve qualquer melhora...

-A família dele estava aí não é?

-Sim. Eles foram almoçar e descansar um pouco. Mais tarde eles vão voltar. Acho que Kiba e Naruto devem vir daqui a pouco.

-Shizune me contou que você já trabalhou como enfermeira, não é?

-Sim... Faz alguns anos. Não fazia muita coisa, já que eu era júnior, mas...

-Por que você não trabalha mais no hospital?

Sakura suspirou.

-Quase no fim da escola eu conheci a minha melhor amiga, Ino, aquela loira que estava comigo ontem. Então nós decidimos fazer faculdade juntas. Eu gostava do hospital, mas não sabia se era o que eu queria pra mim pra sempre. Como sempre gostei de design, resolvemos nos matricular no curso de Desenho Industrial.

-Entendo. E foi na faculdade que você conheceu Sasuke?

Tsunade observou os olhos esverdeados da garota ficarem mareados.

-Foi. –uma pequena risadinha entre lágrimas. –Me apaixonei à primeira vista.

-Então você não sabia sobre a surdez?

-Não. Eu fiquei sabendo depois. Mas acho que foi justamente aí que eu me apaixonei mais ainda. –o desespero bateu mais uma vez. O choro reapareceu. –Eu não quero perdê-lo...

Tsunade se comoveu e abraçou a garota deixando-a chorar livremente.

[...]

Já fazia uma semana.

E nada.

Sasuke não havia acordado. Seu quadro clínico permanecia o mesmo. E a dor continuava.

Os amigos vinham sempre que podiam. Kiba e Naruto apareciam todos os dias, mas voltavam para a faculdade. Tenten e Neji haviam vindo visitá-lo no dia anterior. Hinata também já tinha vindo, assim como os professores Iruka e Kurenai, além de Kakashi. Até mesmo algumas fãs incômodas haviam aparecido para deixar flores e cartões com desejos do tipo "fique bom logo".

Sakura, porém, não havia saído do hospital desde então. Não houve ninguém capaz de convencê-la a voltar para o campus da universidade. A garota não havia voltado para suas aulas, elas não eram mais importantes. Nada importava mais, só ele... E Sasuke não voltava.

Droga! Por que ele não abria os olhos? Por que não respondia? Tudo o que ela queria era vê-lo olhando pra ela. Vê-lo sorrir tão minimamente como de costume. Queria ler as palavras nas mãos dele. Senti-lo novamente perto dela, bem, são e salvo, reclamando de todos os garotos que chegavam perto dela. Ela nem se importaria se ele quisesse bater em alguém de novo, ela só o queria de volta.

Itachi também não havia saído do hospital. Passava bastante tempo ao lado de sua recém-adquirida "irmãzinha", como ele começara a chamá-la. Sakura encontrou um certo alívio em Itachi, ela se sentiu aceita por ele e também querida. Seu cunhado era um amor de pessoa e ele parecia tão abatido quanto ela. Ambos estavam carregando o fardo de ver Sasuke em coma no hospital, sem qualquer previsão de melhora. Konan também havia aparecido por lá e Sakura tinha gostado de conhecê-la, ela só desejava que pudesse tê-la conhecido em outra ocasião.

Enquanto isso, Sasuke permanecia ali. Tão perto, mas longe demais para que Sakura pudesse alcançá-lo. Ela só queria que ele acordasse, a abraçasse e dissesse que tudo ficaria bem.

Tsunade havia mantido Sakura na sala ao lado de seu escritório. A loira queria que a garota descansasse mais e logo estava providenciando um banho para ela, já que Sakura se recusava a sair do hospital. A garota respondeu que estava grata por tudo e que tomaria seu banho assim que sua amiga Ino chegasse com uma muda de roupas pra ela se trocar.

Durante o dia, Tsunade teve alguns pacientes pra visitar, uma cirurgia que estava agendada e depois foi apenas sua velha conhecida papelada. A loira observou Sakura entrar e sair de seu escritório e a salinha adjacente algumas vezes naquele dia. A tal Ino havia voltado ao hospital com uma mochila lotada de coisas pertencentes à Sakura logo no dia seguinte à entrada de Sasuke. A garota havia tomado seu banho, almoçara e voltara a ficar na UTI o máximo que conseguiu. Sasuke permanecia do mesmo modo, sem qualquer melhora ou piora. Isso a deixava mais preocupada ainda em sua visão de médica. Tsunade observou a rosada tentar se animar, porém sem conseguir. Viu a persistência dela em ficar o mais perto do garoto quanto era permitido e viu também a família dele a observar do mesmo modo. Sakura estava provando ser forte e também provando o quanto amava Sasuke. Mesmo sem perceber. Tsunade sabia que não era essa a intenção da garota, mas estava servindo de qualquer forma. À loira só restava esperar que aquele garoto conseguisse sobreviver.

A noite chegou e a médica chefe do hospital pediu a uma enfermeira para que trouxesse Sakura até ela. Algum tempo depois e a garota apareceu, um tanto confusa, e Tsunade pediu para que ela se assentasse à frente de sua mesa.

-Você precisa se cuidar um pouco mais, Sakura. Estou ficando um pouco preocupada com você.

Sakura olhou nervosa ao redor. Seus dedos remexiam a barra de sua saia.

-Tsunade-sama, eu agradeço muito sua preocupação. Não me entenda mal, mas por que está fazendo tudo isso por mim?

Tsunade suspirou e se reclinou em sua cadeira erguendo os olhos para o teto. Os olhos verdes da jovem à sua frente permaneceram focados nela.

-Eu já estive no seu lugar. –a loira disse simplesmente.

Os mesmos olhos verdes se arregalaram. Tsunade baixou os seus próprios para a sua mesa.

-Eu perdi o homem que amava. O nome dele era Dan.

Sakura sentiu o coração apertar e logo novas lágrimas ameaçaram os cantos de seus olhos.

-Eu sei como é. –Tsunade continuou. –Sei como dói. Sei exatamente onde dói. Me lembro bem como é se sentir desesperada, sem poder fazer nada. Pra tudo na vida a gente encontra uma saída, menos pra morte. Ela simplesmente chega e leva embora, deixando a dor e a saudade pra trás. Eventualmente você aprende a viver com isso. Aprende a lidar com a dor até que ela se acalme, mas, mais cedo ou mais tarde, ela sempre volta. Um dia do nada, você se lembra como se tivesse acabado de acontecer. E a dor volta com tudo novamente. Mas algum tempo depois ela cessa. E então você consegue voltar a viver quase normalmente, mais uma vez.

A loira voltou seu olhar para Sakura que a olhava de volta com os orbes marejados. Sorriu de leve.

-Me vejo em você, Sakura. A primeira coisa que a gente faz nessa situação é lutar contra os fatos. Lutamos contra tudo e todos, só pra podermos voltar ao que era antes, sem dor, sem despedida. Amar profundamente alguém nos dá coragem, nos torna mais corajosos pra enfrentar o que vier. E ser profundamente amado por alguém nos torna mais fortes pra resistir. Sasuke é profundamente amado por você e eu realmente espero que isso o torne forte o suficiente pra reagir e sobreviver. Eu não quero que você passe pelo que eu passei, nem que viva como eu vivo. Seja corajosa.

Tsunade havia pego as mãos de Sakura nas suas e a garota chorava mais uma vez.

-Obrigada, Tsunade-sama. Eu não sei o que seria de mim se não fosse por você aqui...

A loira nada respondeu. Apenas permaneceu com as mãos de Sakura nas suas tentando confortar a garota. Não muito tempo depois, uma gritaria no corredor trouxe as duas de volta àquela situação no hospital. Alguns enfermeiros corriam enquanto gritavam uns para os outros. Parecia que um paciente estava em uma situação de emergência.

Os olhos verdes de Sakura se arregalaram ao ouvir quem era o paciente em questão. Finalmente algo havia mudado no quadro de Sasuke, mas Sakura duvidava que fosse pra melhor.

Fim do cap.11


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Notas finais do capítulo

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