Lado A Lado - A História ao Contrário escrita por Filipa


Capítulo 24
"A Vida Privada de Constância Assunção"




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Se a primeira década do século XX procurasse a figura feminina que melhor ilustrasse o decoro e a defesa da moral e dos bons costumes, decerto elegeria Constância Assunção, outrora baronesa da Boavista. Altiva e imperial, D. Constância era o mais agradável exemplo de mulher, esposa e mãe dedicada que a sociedade carioca de 1905 desejava seguir. Porém, por trás da farsa de senhora irrepreensível, a baronesa, como gostava de ser tratada, sentia muito a perda do prestígio que sua família possuía nos tempos da Monarquia. Com a abolição da escravatura e a implantação da República, o título perdeu o brilho e a fortuna escasseava. Sem olhar a meios, tudo fazia em prol dos filhos e da família. Pedir favores a quem vivia o processo inverso graças ao novo regime era, portanto, bastante normal.

Naquele fim de manhã, Constância cumpria com o pagamento da primeira parcela da dívida que contraíra com o senador Bonifácio Vieira. Sórdido, o senador indicara dias antes o nome do Dr. Alberto Assunção para delegado de saúde pública, pensando já no pagamento que receberia em troca. Embora almejasse muito mais para o marido, Constância satisfez-se inicialmente com a retomada da carreira política do bom médico, crendo que aquele pequeno passo o catapultaria até ao topo.

Fazia algumas semanas que todos os passos da baronesa eram meticulosamente vigiados por sua mais recente inimiga. Depois de receber a visita inesperada de D. Constância, Catarina jurara a si mesma que não descansaria até destruir mãe e filha. Ciente do prestígio da rival, achou por bem segui-la sempre que possível e assim se apercebera dias antes das constantes visitas à tecelagem dos Vieira.

Escondida por entre a capota do coche alugado que mandara parar junto à fábrica, viu com clareza a entrada discreta de Constância. Sorrateira, Catarina desce do coche e disfarça seu vulto entre as árvores que rodeiam a tecelagem, enquanto procura avidamente pela janela do escritório. Não tarda a encontrá-la e logo se regozija com o que seus olhos vêem. Pese embora o escuro tecido que cobre os vidros e as poucas velas que iluminam o interior da sala, a cantora decifra com detalhada precisão os corpos em movimentos intercalados que ocupam o sofá.

Satisfeita com o que vira, agacha-se um pouco e esgueira-se calmamente de volta ao coche. Catarina não partiu de imediato. Para se certificar que esmiuçara tudo o que queria, aguardou a saída da baronesa e continuou a segui-la. Vendo já os muros e as grades que rodeavam a casa amarela dos Assunção, ordenou ao cocheiro que parasse e indicou-lhe o caminho de sua casa. Agora que conhecia os detalhes da vida íntima de D. Constância, cabia-lhe aguardar pacientemente pela melhor hora de usá-los a seu favor.


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