Lado A Lado - A História ao Contrário escrita por Filipa


Capítulo 20
"Um Passo em Falso"




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Laura sente o coração prestes a rebentar. O seu maior pesadelo se realizava ali, na sua frente. Temendo uma atitude drástica da rival, Laura pensa no filho e sente-se impotente. Esforçando-se por conter o temor angustiante que se apodera do seu corpo, vai em direção à cantora e, firmando a voz, ordena:

Laura: Me devolva o meu filho.

Catarina: Bom dia p´ra você também querida. Você não imagina como eu fiquei feliz quando entrei e vi esse anjinho dormindo. Como ele é pequenininho… tão frágil…

Laura: Não me faça repetir, me dê o meu filho.

Catarina: Nossa, quanta agressividade e é impressão minha ou você está tremendo? Pois claro que está! Isso é p´ra você ter uma pequena ideia do que eu passei quando você tirou Melissa de mim. Não é boa a sensação?

Catarina força o tom irónico à medida que sacode o menino fazendo-o chorar cada vez mais. Matilde, que assistia chocada sem ser vista, corre em silêncio até à cozinha e chama um menino de recados. Aterrorizada, Laura perde a calma e tenta alcançar Francisco mas Catarina se adianta e recua violentamente tropeçando na beira do tapete que cobre o chão da sala. Fingindo um desequilíbrio maior, a cantora solta um pouco as mãos e observa o horror no semblante de Laura perante a queda iminente do pequeno. Catarina volta a apertar Francisco nos braços e continua provocando a jovem.

Catarina: Ups! Quase que você faz seu filho cair Laura. Mas que mãe desnaturada. Você não sabe que uma queda nessa idade tão tenra pode ter um desfecho trágico? Ainda bem que eu tenho ótimos reflexos e o segurei a tempo. E Melissa, coitadinha! Que trauma ela teria vendo o irmãozinho mor…

Laura: Cala a boca ordinária – grita. – Se você não me devolver o meu filho agora mesmo, te juro que você não sai viva dessa casa.

Catarina: Olha! A princesinha herdou o tom ameaçador da mamãe baronesa. Mas que tola que você é Laura. Esqueceu que sou em quem tem, literalmente, o trunfo nas mãos? Agora sente-se aí ao lado de Melissa, eu vim p´ra conversar com você. Não vai me oferecer um café, um chá? – prossegue cínica.

Sem outra opção, Laura faz o que a cantora diz e senta-se na beira do sofá olhando Melissa de soslaio. Alheia à gravidade da situação, a menina ri e bate palmas como que se divertindo. A raiva e o medo tomam proporções desmesuradas em Laura. Pensa em revidar usando Melissa mas sabe que não terá o mesmo efeito na rival. Recorda-se então de Matilde e, interiormente, implora que, ouvindo a confusão, a empregada tenha alertado Edgar ou qualquer outra pessoa. Calada, prende o olhar em Catarina que se mantém de pé com Francisco no colo e corta o silêncio.

Laura: Diga logo o que quer de mim.

Catarina: Você sabe muito bem o que eu quero de você.

Laura: Julguei que a quantia que Edgar te deu em Portugal seria suficiente mas, se é dinheiro que quer, faça seu preço.

Catarina: Dinheiro? – ri. – Não seja ingénua! Dinheiro é muito bom mas, de você, eu quero algo muito melhor… o Edgar! – fala pausadamente sem disfarçar a cobiça.

Laura: Você é louca, completamente louca.

Catarina: Sou louca sim, por ele. Confesso que não tínhamos uma relação convencional mas Edgar sempre foi o meu predileto. Aquele corpo dele, o olhar penetrante, as mãos firmes, … você sabe a que me refiro. Ao contrário de você, eu pude comparar e te garanto que é difícil encontrar um homem tão… como hei-de dizer… viril como ele.

A cada palavra de Catarina, o rosto de Laura alterna entre a descrença, o nojo, o medo e o ódio. A vontade de esganar o pescoço da cantora e vê-la sufocar é cada vez maior mas, pelo filho, faz um esforço por se controlar apertando a mão esquerda no estofo do sofá.

Laura: Uma pena que ele tenha te deixado p´ra se casar comigo.

Catarina: Foi isso que ele te disse? Ah, mas que safado. Já que estamos só nós duas aqui, de mulher p´ra mulher, vou contar o que realmente aconteceu. Me prometa apenas que não vai brigar com o Edgar por causa disso. Afinal, já faz tanto tempo, não é mesmo? Nós éramos amantes, estávamos muito apaixonados. Edgar me visitava todos os dias e nós vivíamos tórridos momentos de amor até que um dia ele me contou que estava noivo de uma moça no Brasil. Ele não queria voltar, fazia planos de se casar comigo mas a imposição da família era forte e, você sabe, Edgar nunca foi um homem muito corajoso… foi ficando deprimido e… bom eu… fiquei com pena dele e terminei tudo. Ah, mas você tinha que ver o quanto ele sofreu com a nossa separação. Insistia em me procurar e não me largou até ao dia da partida.

Catarina prossegue o relato falso da sua versão e Laura, embora se mordendo de ódio, finge prestar atenção ao ver no devaneio da cantora uma oportunidade para se colocar em vantagem. De tão perdidas que estavam em seus pensamentos, nenhuma das duas se apercebeu que Edgar chegara momentos antes e se aproximava sorrateiramente de Catarina que, de costas, segurava Francisco apenas com um braço, usando o outro para gesticular. De súbito, a cantora nota o olhar de súplica no rosto de Laura e se vira. Aproveitando a surpresa, Edgar alcança Francisco e consegue tirá-lo de Catarina. Ainda alterada pelo alvoroço mas aliviada com a chegada do marido, a jovem se levanta e lança-se sobre ele tomando o filho nos braços. Com o sangue fervendo, Edgar fuzila a cantora e chama Matilde que não tarda a surgir. O menino de recados tinha sido bem sucedido e encontrara o advogado no fórum. Sem dizer nada, a empregada pega Melissa e sobe as escadas. Apanhada desprevenida, Catarina perde a pose e ensaia o papel de vítima.

Catarina: Edgar? Que bom que você chegou, eu…

Edgar: Cale-se! – grita ao mesmo tempo que aperta os braços da cantora com toda a força. – Não se atreva a dizer mais uma palavra. Você passou todos os limites, pisou todos os riscos, mexeu com as duas pessoas por quem eu daria a vida… chega. Agora você vai ouvir bem calada o que tenho p´ra dizer. A Laura é a única mulher que eu amei, a única. Você não passou de uma diversão barata. Nunca mais ouse dirigir-lhe a palavra, nunca mais ouse sequer cogitar a ideia de tocar no meu filho e, garantidamente, essa foi a última vez que você pôs os pés nessa casa.

Gemendo de dor, Catarina tenta falar.

Catarina: E a minha filha?

Edgar: Sua filha? Eu nunca pensei dizer isso mas depois de tudo o que presenciei hoje, eu vou fazer de tudo p´ra ela se esquecer de você e quando ela crescer e perguntar pela mãe sabe o que eu vou dizer? Que você morreu no parto… eu vou dizer p´ra minha filha que a mãe dela está morta e enterrada.

O tom frio e agressivo do advogado deixa Catarina estupefacta. Jamais pensara que o doce e incauto Edgar pudesse agir daquele modo. Descontrolada ao ver que o seu plano falhara, a cantora desata num pranto e deixa-se cair de joelhos apelando ao drama.

Catarina: Não faça isso. Por favor Edgar, não afaste a minha filha de mim. Eu não ia fazer mal à Laura nem ao seu filho, eu apenas…

Edgar: Chega, pare de se lamuriar. Suas lágrimas não me comovem mais Catarina. Saia daqui e não volte nunca mais nessa casa porque se o fizer, saiba que terá a polícia à sua espera.

Decidido, Edgar pega novamente a cantora pelo braço e a arrasta até à porta, enxotando-a com veemência para fora da residência. Tentando se recompor, ajeita os cabelos com as mãos, reposiciona o paletó e volta para dentro. Junto à mesa da sala de jantar, Laura embala Francisco que entretanto parara de chorar. Edgar respira fundo e se encaminha até ela. Laura coloca o pequeno no carrinho e recebe o abraço de Edgar. A firmeza da atitude do marido secara suas lágrimas de aflição. Abraçados, permanecem em silêncio e nem se dão conta que Matilde regressara para levar Francisco. Não se contendo mais, Edgar se afasta ligeiramente e segura o rosto de Laura com ambas as mãos. Seus olhos queimam de saudade expressando o amor que sentem um pelo outro. Sério, e preparando-se para procurar os lábios da esposa, ele se declara:

Edgar: Eu te amo!

Laura: Então me faça sua mulher de novo.

Entre beijos cada vez mais intensos e a respiração descompassada, Edgar empurra Laura para o escritório trancando a porta atrás de si. Sem se soltarem, vão despindo as roupas com urgência até chegarem junto à secretária. Envergando apenas a camisola e de costas para o marido, Laura arrasta os papéis, canetas e livros para o chão e se vira de novo encarando Edgar de frente. Ardendo de desejo, ele a segura pela cintura e a senta na secretária. Laura o puxa mais para si e encaixa suas pernas no corpo de Edgar. Nenhum dos dois pensara que seria assim a primeira vez que se amariam depois do nascimento de Francisco mas, a adrenalina provocada pelos acontecimentos daquela manhã, só seria apaziguada dessa forma… nos braços um do outro.


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