O Vazio escrita por Liminne


Capítulo 8
Capítulo 8




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Eu nem jantei direito. E como poderia? Estava morrendo de medo, de vergonha, de nervoso. A qualquer momento Grimmjow podia abrir a boca e soltar que estávamos, hun... Nada mais nada menos do que namorando.

Fora a minha paranóia. Quero dizer... A Yuzu bateu lá no quarto, estava tão perto de nós enquanto... E toda vez que ela olhava para mim na mesa, eu sentia a espinha congelar. Ficava me perguntando se eu não tinha esquecido a porta meio aberta ou se ela não tinha desconfiado pelo modo como meu rosto estava quando saímos do quarto. Chequei umas três vezes se minha camisa estava fechada direito. Podia ser outra prova!

E esse desespero todo não era porque eu tinha medo de assumir o que estava acontecendo nem nada... Era só que... Acho que não estava preparado para as reações. Eu nunca estava. Enquanto desse, podíamos ser discretos, não podíamos?

Mas acabou que o jantar correu bem. Meu pai e o Grimmjow estranhamente se deram bem e conversaram mais do que eu esperei que fossem. Percebia que a Yuzu tinha um certo receio. E a Karin, como sempre, parecia alheia a tudo e ao mesmo tempo, apenas observadora.

- É o que eu sempre falo para o Ichigo! – meu pai ia dizendo. – Pra que se matar por causa de notas no boletim? Como se isso fosse realmente importante para o futuro!

Grimmjow riu satisfeito.

- Pai! – eu ralhei. Era tudo que eu precisava, mesmo. Meu pai querendo destruir tudo que eu tinha conseguido fazer pelo Grimmjow. - Por favor! – fiz uma careta para demonstrar que estava puto da vida.

- O Ichigo é muito certinho! – Grimmjow disse. – E quer que eu seja também!

Olhei feio para ele. Parecia até que estava me dedurando, sei lá! Como se fosse algo ruim!
- Sendo assim, você podia ensinar ele a ser mais errado! – meu pai disse.

E eu quase deixei os hashis caírem. Levei um tempo para descongelar. E assim que consegui, o sorrisinho maldoso de Grimmjow me atingiu quase como se estivesse numa lente de aumento.

Eu estava ferrado. Ele tinha permissão até do meu próprio pai! Parecia que não tinha ninguém para me proteger mesmo.

- E então? Estavam fazendo trabalho de que? – meu pai resolveu mudar o rumo da conversa. Talvez tenha percebido que eu estava irado.

- Na verdade a gente...

- Química! – eu praticamente gritei.

Grimmjow sorriu de novo.

- É, química. – disse.

Arrrrgh! Eu quase vomitei a comida!

- Bem, já está tarde. Sua mãe vai te matar se você não for logo para casa. – eu me apressei. Tinha que tirá-lo dali, porque se bobeasse, daqui a alguns minutos meu pai ia convidá-lo para dormir, para passar a semana, o ano, morar com a gente...

Ele olhou o relógio e suspirou.

- É. – concordou milagrosamente.

Levantou-se, despediu-se do meu pai e das minhas irmãs, pegou suas coisas e aí eu fui com ele até lá fora. Não antes de o meu pai pedir que ele voltasse sempre. Ele é tão inconveniente!

- Que cara é essa, Ichigo? – ele me perguntou quando estávamos lá fora.

- É o meu pai que me deixa louco. – eu respondi emburrado.

- Seu pai é legal. É o único pai legal que eu já vi. – ele disse, o que me irritou mais ainda.

Fiquei quieto, com os braços cruzados e a cara fechada.

- Você parece com a sua mãe... – ele mudou o assunto do nada, olhando para mim contra o céu escuro.

Meu rosto suavizou-se e ergueu-se para ele. Eu descruzei os braços e... Não sei o que me deu. Meu coração disparou, mas não do jeito de sempre. Era como se estivesse feliz... Acho que tinha sido o melhor elogio que já me fizeram.

- V-Você acha? – eu perguntei idiotamente.

- Se a mulher chamada Masaki, naquele pôster enorme for sua mãe... Bem, eu acho sim.

Sorri sem querer.

- Nos vemos amanhã, Ichigo! – ele sorriu também e me beijou rápido. – Vamos ter mais dias como esse. Sabe como... Trabalhos de química no seu quarto!

Por mais que aquilo tivesse me irritado, ainda estava sob efeito do elogio anterior dele.

- Até amanhã, Grimmjow. – eu disse, tentando parecer carrancudo.

- Não adianta fazer essa cara de mau. Seus olhos estão brilhando, idiota! – ele riu mais um pouco da minha cara.

Eu desviei o rosto, mas não consegui manter a careta. Ele tinha acabado com as minhas defesas.

- Tchau! – acenou e foi embora.

E eu demorei para acordar e voltar para dentro de casa.

 

****

 

A semana passou e começamos a agir como namorados. Bem... Na verdade, acho que agora eu estava enxergando assim. As coisas não tinham mudado muito. Não até aquele sábado, depois da aula.

- O que vai fazer amanhã? – Grimmjow perguntou enquanto íamos para a minha casa.

- Nada... – eu refleti ingenuamente.

- Nenhum dever de casa? Trabalho?

- Acho que não... – tentei lembrar. É, não tinha nada pendente.

- Ótimo! – ele sorriu satisfeito. – Então vamos sair.

Olhei para ele sem muito ânimo.

- Sair. Sei. Pra onde? Pro meu quarto?

Ele riu.

- Bem que eu gostaria... Mas como você ainda é muito inocente, acho que tenho outra idéia.

Franzi o cenho para ele.

- Que idéia?

- Cinema.

- Quê?! – eu me espantei. – Quer dizer... Você gosta de cinema?

- Gosto, por que não? – ele me olhou desafiador.

- Não sei... Não parece muito a sua cara uma coisa tão... Hun... Calma.

Ele riu de novo, mas dessa vez cheio de intenções misteriosas.

- Não tem nada de “calmo” no cinema, Ichigo. Não quando namorados vão juntos.

Droga. Fiquei igual uma pimenta de novo. Encarei os sapatos. Grimmjow tinha razão. Às vezes eu agia como uma maldita criança de dez anos.

E ele ainda tinha dito a palavra de novo.

O que me fez pensar... Íamos ter um encontro! Nós sempre estávamos juntos na escola ou na minha casa, mas... Era a primeira vez que teríamos um encontro!

Isso se eu aceitasse, baseado na informação básica dele para a criancinha aqui.

- Não sei não... – eu disse em dúvida. – A proposta não me parece atraente.

Ele não ficou com raiva como achei que fosse ficar. Às vezes gostava de ser desafiado.

- E se eu deixar você escolher o filme?

- Humm...

- E se eu pagar as duas entradas?

- Ahn...

- E se eu pagar as pipocas, os refrigerantes e os chocolates?

- Chocolates? – olhei para ele. Estava sorrindo vitorioso.

- Você gosta muito de chocolate, não é?

- É... – me senti um retardado. – Mas... Você não vai me convencer só com isso! – virei o rosto. – Quero dizer... Irmos nós dois ao cinema... Eu ia me sentir meio... E também não é só isso! É um lugar que costuma ter muita gente e você não sabe se comportar!

Ele enfiou as mãos nos bolsos atingido.

- Se eu prometer me comportar vai perder a graça pra mim. – murmurou.

Mas eu ouvi muito bem. Safado.

- Nada feito. – decidi.

- O quê?! – ele ficou claramente decepcionado. – A gente pode sentar lá no fundo, lá no canto, ninguém vai ver!

- Não. – fechei a cara. – Nem pensar. Se você não se comportar, não quero.

Pude ouvi-lo inspirando com força, como se quisesse desesperadamente se acalmar.

- Certo. – disse enfim. Chegamos à minha casa. – Então... Amanhã eu te ligo.

- Tá. – olhei para ele. Estava um pouco frustrado. O que custava ele dizer que ia se comportar? Ia ser um encontro legal...

Ele me deu um beijo e foi embora.

Que vida difícil!

 

****

 

No domingo, pouco depois do almoço, a campainha tocou.

Fui atender, e como Grimmjow não tinha ligado até então, nunca ia imaginar que fosse ele.

Mas era. E parecia mais arrumado do que de costume. Ele ficava bonito assim... Quer dizer... De um jeito diferente, mas...

Ei! Ao invés de pensar nisso, devia estar perguntando:

- O que você está fazendo aqui... Desse jeito?! – perguntei antes que fosse tarde.

Mas de algum modo era.

- Vamos ao cinema. – ele disse com a maior cara de pau do mundo!

- O QUÊ?! – eu gritei, mas em seguida tentei me controlar. – Grimmjow... Acho que me lembro bem de ontem quando eu disse “Nada feito”.

- Já está pronto? – ele me ignorou!!!

- Não! Quer dizer... – E ainda estava me confundindo! – Pronto para quê?!

- Para o cinema. – me olhou como se eu fosse lunático. – Você dormiu direito, Ichigo?

- Grrr! – rangi os dentes com o nível de raiva estourando. – Eu não estou ficando louco! Eu disse que não ia, porra!

- Se não está pronto, então vai se arrumar. – ele fez uma expressão de impaciência. Como se ELE ESTIVESSE NO DIREITO!

- Eu já disse que eu não vou! – repeti. Será que eu estava naquele tipo de sonho em que a voz não sai de jeito nenhum? Se bem que eu estava ouvindo meus gritos claramente.

Então, com a sua classe equiparada a de um nobre, ele empurrou a porta, me jogou para um canto e invadiu minha própria casa.

- Seu pai está aí? – perguntou. – Enquanto você se arruma, eu vou ficar conversando com ele! – sorriu.

- EU NÃO VOU ME ARRUMAR!

- Então vamos logo. Você está bem assim.

- MAS EU NÃO VOU PRA LUGAR NENHUM!

Quando eu finalmente achei que ele tinha entendido, meu pai chegou. O que eu tinha feito para merecer?

- Se você não for se arrumar logo... – ele disse baixinho, tipo me ameaçando. Quase senti uma arma apontada para a minha cabeça ou algo assim. – Eu vou pedir você em namoro para o seu pai.

Meus olhos quase saltaram.

- Mas que...

- Grimmjow! – meu pai sorriu quando o viu. – E aí? Mais trabalho?!

- Nada! – ele levantou e o cumprimentou. – Eu e o Ichigo vamos sair... – olhei apavorado para ele. – Arrumar alguma coisa pra fazer por aí. Só estudar não dá!

- Ah, que ótimo! – ele olhou para mim com uma cara irritante de aprovação. – O Ichigo tava precisando mesmo de amigos mais animados!

Como sempre, não tive escolha. Fui para o meu quarto pisando duro.

 

****

 

Algum tempo depois, eu estava pronto. Tá, confesso que foi bastante tempo. Pode parecer babaca, mas era meu primeiro encontro e eu queria... Bem, eu queria estar bem. Mesmo que eu tivesse sido obrigado a ir.

- Estou pronto. – eu disse a ele com a minha cara mais ranzinza.

- Nossa, que demora! Senti que estava com o namorado da minha filhinha esperando ela se arrumar hahaha!

Ótima piada, pai. Agora pode enfiar uma faca no meu pescoço.

Grimmjow riu sem a menor culpa. Desgraçado!

- Estamos indo. – ele disse ao meu pai. – Até mais!

- Até! – meu pai acenou para nós. – Divirtam-se garotos!

Quando eu bati a porta, saí andando na frente com raiva.

- O que foi? – ele me alcançou rapidamente. – Ficou putinho com a piada do seu pai? Ahh, vai dizer que não foi boa?

Só olhei gelado para ele.

- Eu juro que não disse nada, sério! – espalmou as mãos na defensiva.

- O que quer dizer com isso? – perguntei com uma voz tão seca que nem parecia minha.

Ele sorriu e se aproximou. Resolveu me ignorar de novo.

- Você está bonito. – desceu os olhos despudoradamente. – E sexy, para não dizer outra coisa.

Parei no meio do caminho.

- Vou voltar para casa. – eu podia facilmente me camuflar em um carro de bombeiros se eu quisesse.

Que ódio! Será que foi a maldita calça?

- Ei! – ele segurou meu braço. – Você não vai para casa. Se você for, já sabe o que vai acontecer. – não tinha mesmo nenhuma vergonha em apelar para conseguir o que queria!

Eu suspirei tentando não encará-lo. Ainda estava difícil.

- Tá bom. – disse de má vontade. – Mas não toque em mim! – puxei o braço.

Ele soltou um risinho encharcado de ironia.

- Eu não vou. – abriu mão do meu braço e fomos andando.

 

****

 

Apesar de ter feito todo o caminho emburrado, eu estava animado quando chegamos lá. Para princípio de conversa, eu queria mesmo ir a esse encontro e tinha ficado decepcionado quando tive que desistir. E, tudo bem... Ele tinha me arrastado de casa com chantagens, mas... Era só porque ele queria mesmo sair comigo. Ou melhor...

Não. Chega de pensar nas segundas intenções dele! Eu também podia impedi-las quando quisesse. Apesar de ser insistente, incisivo, violento e teimoso, ele não ia me obrigar a fazer o que eu REALMENTE não quisesse. E mesmo se obrigasse, eu sabia me defender.

- E então? Qual vai ser? – ele já devia ter notado minha mudança de humor, porque parecia bem mais leve.

Escolhi um filme que estava querendo ver havia algum tempo. Ele não resmungou nem nada, será que eu tinha acertado em alguma coisa que os dois gostassem? Era difícil, mas ainda podia existir.

A sessão ia começar em alguns minutos, então fomos dar uma volta para passar o tempo.

- Eu falei de você pra minha mãe. – ele disse quase me matando do coração.

- COMO?! – meus olhos se esbugalharam. – Você disse sobre... S-sobre...

- Ela quer te conhecer, Ichigo. – ele sorriu adorando a minha reação.

Respirei fundo. Não tinha mesmo sombra de monotonia perto dele.

- Você só pode estar zoando com a minha cara. – eu devolvi tentando parecer calmo.

Porque ele não podia estar falando sério!

Mas ele me encarou tão sério quanto se eu tivesse acabado de xingá-lo.

- Acho que você não entendeu mesmo. – ele disse. – Eu e minha mãe não temos uma relação boa. Mas eu fiz questão de falar de você.

Meu coração disparou. Então ele estava querendo dizer que... Que...

- P-Por quê? – eu perguntei debilmente.

Ele parou de andar e fitou meu rosto.

- Você é importante pra mim, Ichigo.

Eu paralisei. O que tinha dado nele? Por que estava falando essas coisas? E por que meu coração não sossegava um pouquinho? Já estava ficando com falta de ar!

- O que foi? – ele quis saber, claro, porque eu estava parado no meio do caminho sem nem respirar.

- Eu só... – minha voz quase não saiu. – Eu só estou... Surpreso...

Ele riu, estalou a língua e passou o braço pelos meus ombros, me aproximando dele.

- Você é muito lento de não ter percebido, Ichigo!

Ele estava rindo de mim, mas eu não consegui ficar com raiva. Eu ri também. E nem tentei me afastar dele...

Eu estava sentindo uma coisa muito boa. E tinha certeza que nunca tinha sentido nada parecido antes.

 

****

 

Quando finalmente chegou a hora do filme, Grimmjow cumpriu a sua promessa. Pagou as entradas, as pipocas, os refrigerantes e os chocolates.

Eu insisti muito para que dividíssemos, mas ele ficou bem irritado e acabou ficando assim mesmo. Da próxima eu não ia deixar.

Sentamos na última fileira, lá no canto. A sala não estava cheia, mas mesmo assim... Quero dizer, pior assim!

Mas àquela altura, eu não estava mais tão tenso. Aquele desgraçado tinha me comprado com os galanteios raros dele. Não duvidaria se ele tivesse feito de propósito. Mas não podia reclamar, porque eu tinha gostado.

A história do filme já tinha engrenado. Mas uma parte do meu subconsciente estava esperando ser interrompido a qualquer momento, então... Estranhei muito quando não aconteceu.

Olhei para ele. O saco de pipocas já estava vazio. E olha que era grande! Uma de suas mãos segurava o copo gelado e a outra estava pousada na própria perna, inquieta.

Não acreditei no que estava vendo. Será que ele... Será que ele tinha decidido se comportar? Sorri quase imperceptivelmente. E peguei a mão dele.

Ele olhou espantadíssimo para mim. Eu senti o rosto corar e olhei de volta para a tela, apertando a mão dele de nervoso.

Ouvi quando ele suspirou e agarrou minha mão de volta.

- O que você quer, hein? – sussurrou pra mim.

- N-nada. – eu não ia olhar pra ele de jeito nenhum! – Só... Você sabe... Somos namorados.

Ele riu baixinho.

- Eu estou tentando me comportar, mas você está me provocando...

Antes eu tivesse ficado quieto!

- Um aperto de mão é provocar pra você? Realmente, você tem hormônios descontrolados. – emburrei.

- Na verdade não foi só um aperto de mão. Foi a sua roupa, o cinema escuro e a sua mão que me descontrolaram. – sorriu.

Eu olhei sem querer para o rosto dele. Erro.

- A culpa é sua. – ele se aproximou antes que eu pudesse perceber e alcançou minha orelha com os lábios.

- Grimmjow, não! – empurrei-o. – Eu só queria segurar sua mão, que droga!

- Tá bom, ta bom! – ele frustrou-se. – Eu vou ficar quieto. Mas se mexer de novo, eu não vou me segurar. – fez uma careta e forçou as costas na poltrona.

Suspirei aliviado.

Mas o tempo foi passando, o filme me entediando e eu descobri que foi uma péssima escolha. Olhei disfarçadamente para o rosto dele e ele parecia bem compenetrado até.

Bufei e quando tentei me focar na tela de novo, meus olhos foram atraídos por um casal que se beijava um pouco à nossa frente.

Por que para eles era tão fácil? Por que eu estava vermelho só de ver aquilo? E por que é que estava me dando vontade de imitá-los?

Que idiotice. Eu tinha dezesseis anos. Eu estava namorando. Ninguém tinha nada a ver com a minha vida. E eu podia querer... Beijá-lo, não podia?

Eu podia! Mas que inferno! Então por que ficava todo quente só de pensar nisso? Eu era uma pessoa normal, porra!

O negócio é que... Eu nunca tinha sentido aquilo. Nem com garotas. Nem com garotos. Nem com ninguém!

Mas se eu parasse para pensar, eu sentia muitas coisas agora que eu nunca sentira antes. Era ele. Era por causa dele.

E não era tão ruim.

Esbarrei o ombro no dele de propósito. Consegui que ele olhasse para mim.

- O que foi? – perguntou incomodado.

Eu fechei os olhos, desliguei meus pensamentos e encostei meus lábios nos dele.

Por alguns segundos ele não se moveu. Mas eu não podia culpá-lo. Afinal, eu nunca imaginei que fosse ter coragem de fazer isso. Imagine ele!

Mas, claro, ele não perdeu a oportunidade. Correspondeu meu beijo de um jeito tão desesperado como se fizesse séculos que não nos encostávamos. Na verdade, parecia que ele estava esperando ansiosamente qualquer sinal para atacar. E foi exatamente o que ele fez. Me atacou. Porque eu nem conseguia mais acompanhar o que estava acontecendo. Suas mãos apertavam minhas costas, minha nuca, passeavam com força pela minha barriga, desciam e subiam agressivamente.

- Grimmjow! – eu parei de beijá-lo e repreendi baixinho. Não queria chamar MAIS atenção, embora estivesse com vontade de gritar com ele. Tentei tirar as mãos dele de mim, mas pareciam pesar toneladas.

- Eu disse para não mexer. – ele sorriu maldoso. – Não venha se fazer de vítima porque eu te avisei!

Ele tinha razão...

Enquanto ele mordia de leve minha orelha e continuava me atacando com aquilo que parecia, no mínimo cinco mãos, eu segurei nos ombros dele.

Não tinha ninguém nos vendo. Estavam todos ali assistindo ao filme ou ocupados demais com seus próprios pares para tomar conta da vida alheia. Também não havia nenhuma criancinha no recinto...

Há. Mas a quem eu quero enganar? E se tivesse? Já teríamos provocado trauma em menores e pessoas frágeis. Pode até ser um exagero, mas...

Que se dane. Agora já era. E eu devia assumir a responsabilidade, porque fui eu que procurei pelo que estava acontecendo.

Me acostumando com o atrevimento dele, eu resolvi fazer o que queria fazer. Passei as mãos por baixo da camisa dele, bem devagar e hesitante, e alcancei suas costas. Deslizei os dedos pelos músculos dele e quase não pude conter um suspiro. Ele era tão... Perfeito. Apesar de não ser tão mais alto que eu, seus ombros eram muitas vezes mais largos e aquilo me fazia querê-lo mais perto de mim. Não sei por quê... Mas era assim que eu me sentia. 

- Porra de braço da poltrona! – ele resmungou quando tentou encurtar a distância e foi barrado. – Será que não é melhor irmos para um lugar mais...

- Não! – eu disse depressa. – Pelo menos alguma coisa coloca limites em você. – ri.

- Tá falando do que? – o sorriso dele no escuro sempre parecia mais expressivo. – O safado aqui hoje é você!

Arregalei os olhos. Será que dava para ver que eu tinha ficado tão vermelho naquela escuridão?

- D-Do que você está falando? – eu tirei as mãos dele morrendo de vergonha e olhei para o chão.

- Você está me seduzindo o tempo todo! – ele estava se divertindo.

- E-Eu não... – Droga. Queria evaporar!

Ele trouxe meu rosto para perto do dele. Nossos olhos quase se fundiram.

- Tudo bem, Ichigo... – sussurrou. – Eu gosto das suas mãos... - pegou uma delas e colocou na perna dele. Senti um calafrio. – Não fique envergonhado. – ele notou que eu tinha travado de novo. – Vamos comemorar que você é humano e tem sangue correndo pelo corpo! – riu.

Em seguida, me beijou apaixonado de novo. E eu não pude evitar perceber que ele também tinha pernas fortes.

Eu mal conseguia respirar, meu coração estava a mil! Grimmjow tinha razão... Eu realmente tinha sangue correndo dentro de mim. E, por incrível que pareça, por um tempo também foi difícil para que eu mesmo acreditasse nisso.

Mas não agora. Definitivamente não agora. Tudo tinha ficado muito óbvio!

De repente, os movimentos das mãos dele ficaram mais lentos, assim como o beijo. Mas em compensação, a intensidade parecia ter duplicado.

Os lábios ávidos dele escorregaram para a minha bochecha, desceram e quando chegaram ao meu pescoço, a respiração quente e forte que saiu foi um prelúdio para uma mordida. E de verdade! Parecia que ele não sabia fazer um carinho que não deixasse marcas. Reagi apertando a perna dele e ofegando um pouco. A mão dele parou embaixo do meu umbigo e eu me sobressaltei. Caiu para a lateral e também alcançou minha coxa. Mas ficou subindo e descendo de um jeito muito suspeito, como se estivesse tentando me distrair.

E de fato, consegui me desligar, porque ele agarrou meu rosto com a mão livre, forçando muito os dedos, contornou meus lábios com a língua, exibiu aquele sorrisinho descarado e voltou a me beijar. E como sempre, o beijo dele me obrigava a me concentrar em não morrer sufocado. Meu coração sempre enlouquecia por completo e ele não dava nenhuma brechinha para que pudesse respirar. Não adiantava eu tentar acompanhar seu ritmo. Ele sempre parecia estar me dominando.

E foi enquanto eu tentava correspondê-lo à altura que percebi o perigo: ele estava com os dedos no cós da minha calça!

Felizmente, eu não precisei brigar nem protestar. Parecia que o filme já tinha acabado e então as luzes do cinema se acenderam.

- Hora de ir embora. – eu disse soltando-o, e ele fez o mesmo. Ainda bem!

Ele respirou com drama.

- É. – levantou-se. – Vamos.

Salvo pelas luzes!

 

****

 

- E aí? O que achou do filme? – ele ironizou.

Olhei para ele de cara feia, mas com vontade de rir.

- Entrou pro meu top cinco de filmes favoritos. – eu entrei na pilha.

- Pra mim foi o número um. – ele riu. – Não, o dois.

Franzi as sobrancelhas curioso.

- Tenho certeza que o próximo vai ser o número um. – ele explicou-se.

Fiquei vermelho. Será que ele quis dizer realmente o que eu achava que tinha?

Continuamos caminhando em silêncio. O clima estava esfriando. Mas mesmo assim não deixava de ser um lindo dia. O sol estava se pondo naquele momento e as árvores enfeitavam o vento com suas folhas amarelas e avermelhadas.

Não pude deixar de reparar como aquelas cores pareciam vivas. Vibrantes. Como se a paisagem fosse uma pintura de um artista muito apaixonado.

E, bem... Esse artista estava do meu lado. Com seus cabelos azuis, com seus olhos brilhantes e seu sorriso atrevido.

Não que fosse ele quem tivesse feito as árvores ou o sol. Mas foi ele que abriu meus olhos para enxergá-los com aquelas cores.

- Acho que evoluímos, Ichigo. – ele quebrou o silêncio e meus pensamentos românticos. – Você aprendeu um pouco de como não ser tão certinho e demonstrar o que sente e o que quer. Estou orgulhoso!

Eu sorri mesmo tímido.

- Eu também estou orgulhoso. Afinal, agora você também sabe ser um bom garoto. Se eu tivesse ficado quieto, você teria se comportado. – olhei para o ar de riso dele. – Eu acho...

Ele gargalhou com vontade.

- É claro que eu teria, seu idiota. – ele meneou a cabeça. – Você ainda não percebeu que eu faço qualquer coisa por você?

Pode parecer ridículo, mas meus olhos quase se encheram naquele momento. Meu coração começou a bater no ritmo mais doce que eu já havia experimentado.

- Grimmjow... – minha voz saiu um pouco trêmula. – Obrigado. Acho que o vazio da minha vida foi finalmente preenchido. E só você pôde fazer isso. – eu sentia aquilo, precisa dizer.

O sorriso dele ficou raramente mais suave.

- Você acha? – parou no meio do caminho e olhou para mim. – Você só acha?

Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, ele me puxou pelo braço e me levou para mais perto do rio coberto de pôr-do-sol que ladeávamos.

- Veja o seu reflexo. – ele disse apontando para a água. – Os seus olhos...

Eu sorri espontaneamente. Ele tinha razão. Meus olhos brilhavam agora. Assim como os dele. E meu coração estava gritando isso.

Eu notei que o rosto dele ao meu lado, parecia mais amável e tranqüilo. Será que eu também tinha conseguido mudá-lo?

- O seu rosto também está diferente. – eu disse. – Não está parecendo um mocinho de novela?

Ele resmungou e fez uma careta.

- Nunca! – cuspiu a palavra.

Eu ri.

Então ele pegou minha mão e entrelaçou os dedos nos meus. Continuamos a caminhar, sem saber para onde íamos.

E dessa vez, não me importei com as outras pessoas. Não me importei com o que podiam pensar.

Mentira. Eu pensei sim. Eu senti orgulho de estar ao lado da pessoa que extinguiu o meu vazio.


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Notas finais do capítulo

Fim o