O Vazio escrita por Liminne


Capítulo 7
Capítulo 7




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Mais um dia de aula. Eu ainda segurava o celular dentro do bolso da calça. Mas minhas esperanças estavam se esgotando. Um erro pode mesmo acabar com tudo. Eu tinha conseguido. Agora a pessoa que um dia quisera preencher minha vida, tinha sumido como se nunca tivesse aparecido. Não... Errado. A dor da lembrança de que ele realmente esteve aqui provava a existência dele. E não, ele não tinha sumido. Tinha sido rejeitado por mim.

Avistei a porta da sala de aula. Meus pensamentos começavam a tentar conformar meu coração. Quem sabe um dia não nos encontrássemos de novo? Quem sabe essa falta que eu sentia não cicatrizasse como uma ferida? Quem sabe tudo não tivesse passado de uma paixonite intensa e em breve estaria pronta para apagar-se?

Quando empurrei a porta de correr, porém, meu pensamento calou-se. Meu coração começou a pular e gritar para que ele se calasse. Não tinha mais razão para todo aquele conforto irritante. Não tinha.

Porque ali, na carteira atrás da minha, estava ele. Com os olhos mais azuis do que eu me lembrava. Com os cabelos combinando com a gravata apertada no pescoço. E com aquele sorriso enorme, onde se concentrava toda a sua essência.

Pensei que não fosse conseguir andar. Eu estava tão pasmo. Mal podia sair do lugar. Tirei a mão do bolso quase inconscientemente. Eu não precisava mais esperar uma ligação idiota. Eu o tinha ali. De volta. Na minha frente.

Meu coração estava tão quente e apertado, que entrei em pânico por um momento. Achei que fosse... Sei lá, chorar!

Por algum milagre, consegui ir até a minha carteira. Não, não sei se foi um milagre. Acho que foi a necessidade de chegar mais perto dele mesmo.

- Oi Ichigo! – ele foi o primeiro a falar. O sorriso crescendo, mesmo que parecesse impossível. – Nossa, eu não me lembrava que seus olhos tinham ficado assim tão brilhantes... – um pequeno lampejo de ternura passou pelo rosto dele. – Estou feliz de ter voltado.

Que droga. Ele sabia. Sabia muito bem. Eu pertencia a ele. Não importava quantas mil diferenças nós tivéssemos ou quantos atritos e choques aconteciam quando chegávamos perto um do outro. Ele era a pessoa que despertava a minha alma. Que fazia meu coração bater audivelmente e meu sangue correr com alguma direção. Só com ele eu me sentia vivo.

E pelo modo como ele estava rindo da minha cara emocionada, ele demonstrava o quanto estava ciente de tudo isso. Ele sabia que meus olhos só brilhavam daquele jeito para ele e ninguém mais.

Não demorou para que a professora chegasse. E eu acabei não conseguindo falar nada até a hora do almoço.

 

****

 

- Onde é que você esteve?! – eu explodi quando estávamos finalmente no terraço. – Por que sumiu desse jeito?!

Ele parou de comer e ficou me encarando tão surpreso quanto se eu tivesse começado a dançar o frevo do nada na frente dele.

Mas alguns segundos depois sorriu.

- Olha... Deixei mesmo você em pânico, não foi?

Fiquei escarlate da cabeça aos pés. Minha pele toda formigava de tão quente.

- E-eu... Eu só... – droga, se eu continuasse tentando falar só ia conseguir gaguejar cada vez mais.

Ao invés disso então, cruzei os braços e fechei a cara. Acho que já era uma boa resposta.

Ele largou o almoço e veio até mim.

- Não vai almoçar? – perguntou com um sorrisinho de arrepiar. – Parece que até perdeu a fome ao me ver! – riu. – Acho que vou levar isso como um elogio.

Eu não disse nada, continuei tentando evitar olhar nos olhos dele.

Mas, como eu imaginara, ele não ia permitir tamanho desrespeito com o seu ego. E, claro, não ia perder a oportunidade de satisfazer seu momento de diversão sádica do dia: me provocar. Aposto que estava com saudades.

Agarrou meu queixo e virou meu rosto para o dele. Os olhos pareciam estar me engolindo, todos reluzentes.

- “Será que não há nada que eu possa fazer para me desculpar?” – ele imitou a minha frase. Maldito. Eu podia morrer de vergonha naquele exato segundo. – Talvez haja, Ichigo. – o sorriso que só aumentava me estava parecendo sugestivo.

- Para com isso! – eu tirei a mão dele de mim e me afastei alguns passos. – Não começa!

- Mas você sentiu minha falta... – ele estava se controlando para não gargalhar, eu podia perceber com horror. – Você disse que sentiu. Parecia ser capaz de qualquer coisa para me ver de novo!

Eu apertei os dentes, os punhos e os olhos, mas nada ia me fazer escapar dele, eu sabia.

- E isso é tão importante assim pra você, é?! – perguntei irritado.

- Bem... Devo admitir que sua voz no telefone implorando por mim estava muito sexy.

COMO ELE ERA PERVERTIDO!

Depois daquela, eu não conseguia nem mais raciocinar sobre quem eu era, quanto mais responder ou me mover!

- Diz de novo pra mim que sentiu minha falta... – antes que eu percebesse, ele já tinha se aproximado novamente.

Olhei para ele quase que instintivamente. Mesmo desejando morrer para não ter que lidar com aquilo.

- Para com isso. – eu falei muito baixo mesmo. Parecia que minha voz tinha desistido.

- Você disse no telefone. Por que não pode repetir agora? – ele me deu um beijo perto da orelha. – Você sabe que é verdade...

Existia alguma maneira de ele desistir? Não.

Meus joelhos fraquejaram quando me vi obrigado a dizer aquela frase constrangedora diretamente para ele. E, sem que eu me desse conta, segurei nos ombros dele.

- Eu... – comecei e apertei-o. – Eu... – muito bem! E ainda estava conseguindo tornar a situação mais vergonhosa! – Eu senti a sua falta... – disse enfim. Pronto.

Só esperava que o pesadelo tivesse acabado ali.

- Aaai! – ele se afastou de repente de mim. A mão foi parar no ombro e seu rosto crispou-se numa expressão de dor. – Não precisava ter apertado tanto!

Apertado? Do que ele estava falando?! Eu estava completamente tonto de ter dito aquilo e ele reagia desse jeito todo esquisito?!

Não demorou muito para que eu lembrasse que estava agarrado nele. E que, quanto mais estava me esforçando para fazer a frase sair, mais estava descontando nos meus dedos em volta de seus ombros.

Mas eu não tinha apertado tão forte assim, tinha?

- D-Desculpe. – de repente me senti tão envergonhado por ter feito aquilo que quase saí correndo. Eu achei que ele não se importasse, afinal, eu sempre acabava fazendo isso e...

Claro. Como eu fui idiota!

- Grimmjow. – minha vergonha sumiu e eu olhei sério para ele. Diminui os olhos para observá-lo mais minuciosamente.

E eu tinha razão. Ele tinha um arranhão no rosto e um dos cantos dos seus olhos estava levemente, bem levemente arroxeado.

Fui até ele e tirei-lhe a mão que protegia o ombro. Toquei-o.

- Você se meteu em uma briga, não foi? – perguntei e acho que acabei usando um tom paternal. Ele ia se irritar com isso, certamente.

- Tsc. – ele revirou os olhos e fez um barulho com os dentes que eu conhecia bem. – O que você tem a ver com isso?

- Por quê? – eu quis saber. Ele não tinha tirado minha mão de cima dele ainda. – Alguém te provocou? Foi para defender algum amigo?

Ele riu debochando.

- Deixa de ser ridículo, Ichigo! – disse. – Foi só uma briguinha. Nada sério! É o que eu e meus parceiros fazemos para distrair.

- Uma briguinha? – eu arqueei uma sobrancelha para ele. – Ah, sim... Uma briguinha... – apertei de novo com força o ombro dele e ele instintivamente reclamou de dor.  – Não me parece que uma briguinha faria o Grimmjow gemer com um toquezinho desses. – provoquei. De certa forma me sentia vingado daquela vez que ele cutucou a minha testa apedrejada.

- Olha aqui, garoto! – ele espantou minha mão bruscamente e agarrou minha gravata. Achei que ele fosse me enforcar ou me suspender no ar. O que acabou com a minha vingança e dignidade na hora. – Você já me encoleirou demais. Mas não vai dominar a minha vida inteira, entendeu? – ele estava muito, muito furioso comigo. – Nunca mais fale assim comigo! Ou você vai se arrepender! Não queira bancar uma de espertinho comigo porque você sabe quem manda aqui! – mostrou os dentes.

Nossa! Que bom que você tinha voltado, Grimmjow. Tão doce e amável como sempre!

Ou melhor... Mais doce e amável que sempre!

Hunf. Quem manda aqui. O que ele quis dizer com essa frase prepotente?

Porém, mesmo indignado, eu assenti com a cabeça para que ele me soltasse. Já estava ficando sem ar.

Ele me soltou e ficou resmungando sozinho.

- Você é um idiota! – eu gritei assim que me recuperei. – Eu não quero te encoleirar ou seja lá o que você disse! Eu também não quero mandar na sua vida! Eu só não quero que você saia por aí se machucando à toa! É tão estúpido!

- Não é estúpido! – ele gritou em defesa própria. – Eu não acho estúpido! Japonês moderno é estúpido, isso sim!

Está vendo? Foi o que eu disse. Estávamos sempre em conflito!

- Eu só não quero te ver machucado, droga! – gritei mais alto que ele. Nem estava medindo a gravidade das minhas palavras. – Eu me preocupo com você!

Ele amansou o semblante e ficou olhando para o meu rosto meio surpreso.

- Eu não preciso que se preocupe comigo. – disse, e não parecia mais que ia pular em cima de mim. – Eu sou forte e sei o que estou fazendo.

Que ele era forte era óbvio. Mas não, ele não sabia o que estava fazendo. Era um moleque cheio de hormônios e sem um pingo de juízo.

Mas eu não podia dizer isso a ele.

Ao invés disso, voltei a me aproximar e tirei a gravata dele. Os olhos azuis chocados estavam do tamanho de bolas de basquete. Comecei a desabotoar a camisa dele e parei de olhar para seu rosto. Eu já estava vermelho demais para isso.

Tirei sua camisa enfim e me senti tremer todo de olhar para... Bem... Para o corpo dele.

Mas logo recuperei o bom senso e resolvi parar de perder tempo com essas coisas... Hun... Desconcertantes e voltar logo ao meu objetivo. Depois que reparei nas marcas pelo peito, ergui os olhos para ele.

E não acreditei. Ele ainda estava com aquela cara incrédula para mim, mas assim que nossos olhos se encontraram, os dele relampejaram estranhamente e um sorrisinho pervertido começou a esticar seus lábios.

Ele não estava mesmo achando que eu estava... Argh! Como ele era ridículo!

Desviei o rosto que queimava mais que uma fogueira e dei a volta. Cheguei às costas dele.

É. Como eu suspeitara. Alguém o tinha atingido bem feio naquele ombro.

- Quando foi isso? – eu perguntei, obviamente me referindo ao machucado.

- Ahn? Isso o que? – ele pareceu confuso.

É, talvez não tenha sido tão óbvio assim. Não para aquela mente maliciosa.

- Esse machucado no seu ombro! – eu quase gritei impaciente. – Por que você não fez um curativo?!

Ele estalou a língua parecendo decepcionado e pôs a mão na ferida. Em seguida virou-se para mim. Ainda sem camisa. Droga.

- Isso aqui não foi nada, ta? – ele disse todo orgulhoso e irritado. Tentei me focar no rosto dele desesperadamente. – Eu só baixei minha guarda por um segundo e...

- Não quero saber. – eu cortei o assunto. Fechei os olhos. Achei que ficaria mais seguro assim. – Isso é um corte, não é? Você precisa cuidar disso!

- Eu já disse que estou bem. – eu não podia mais ver sua expressão, mas pela voz sabia que ele estava de saco cheio do assunto. – Será que agora podemos comer ou fazer alguma coisa mais interessante?

- Comer. – eu escolhi depressa.

- Ichigo. – senti a mão dele em torno do meu braço. – Para com essa merda e abre os olhos!

Minhas bochechas formigaram.

Mas abri os olhos devagar. Porra, ele estava perto demais!
- O que houve? – ele riu. – Não está se controlando ao olhar para o meu físico? – tomou distância sinalizando para o próprio torso nu, de um jeito bastante exibido.

Eu sabia que minha cara de idiota estava me denunciando totalmente. Mas não podia alimentar aquilo.

- Deixa de ser ridículo! – desviei o rosto e me sentei junto às grades. – E veste logo essa camisa. – acrescentei tentando não parecer tão abalado.

- Foi você que arrancou ela de mim. – ele me provocou. – Se quiser que a vista de novo. – deu de ombros.

Que ódio! Mas era bem feito para mim. Quem mandou eu ser preocupado e protetor com alguém como ele?!

- Vamos cuidar disso aí. – revolvi dizer algo que realmente fosse importante. E aproveitei para acabar com o joguinho de sedução dele. – Vou pedir para a Inoue te levar para a enfermaria...

- Inoue?! – ele quase cuspiu. – Quê?! Por quê?!

Suspirei.

- Porque ela leva os doentes e feridos para a enfermaria. – respondi.

- Eu não vou MESMO. – ele fez birra. – Não iria nem por conta própria, quanto mais com aquela vadia.

Me irritava profundamente o modo como ele se referia à Inoue. O que ela havia feito para ele? Que inferno de boca suja!
- Então vou cuidar disso pessoalmente. Lá em casa. – disse. Mas acabei me arrependendo.

Eu sempre me esquecia de ser cuidadoso com ele. Ah, mas que se dane!

Precisávamos mesmo cuidar daquele corte e... E bem... Devo admitir que queria mesmo passar mais um tempo extra com ele... Sabe como é. Depois de tanto tempo longe...

- Combinado. – ele disse e começou a comer daquele jeito fino de sempre.

Eu sorri. Era tão bom que estivesse de volta...

- O que foi? – ele perguntou de boca cheia olhando para mim. – Ainda está babando por mim, é?

Eu franzi o rosto todo e joguei a porcaria da camisa em cima dele. Em seguida me virei para a grade e fiquei olhando o movimento lá em baixo. Tudo para não ter que ver a cara dele enquanto ele morria de rir de mim.

 

****

 

Fiquei muito nervoso quando chegamos na porta da minha casa. Quase desisti do propósito. Mas me lembrei de como aquele corte estava feio e resolvi tomar coragem.

Além do mais, eu podia dizer que íamos estudar, o que tinha de mais?

- Ichigo... – Grimmjow chamou minha atenção. – Tá esperando o que pra entrar em casa? Quer que eu te agarre aqui fora primeiro?

Cerrei o punho. Como ele podia me deixar mais nervoso quando isso parecia impossível?!

Ignorei aquele absurdo e abri a porta finalmente. Mesmo sendo estranho, me parecia a melhor opção.

- Onii-chan! – Yuzu me recebeu sorridente. Mas a expressão se congelou de medo quando ela viu quem vinha atrás.

De novo.

- Ahn... – me apressei em explicar. – Yuzu, esse é o Grimmjow, lembra? Nós vamos... Er... Vamos estudar.

- Tarde assim? – ela apertou as sobrancelhas.

- É-É, nós temos um...  Um trabalho de última hora. – inventei.

- Ah... – ela recuou alguns passos e ficou encarando-o.

Um frio começou a subir pela minha espinha. Ela não podia deixá-lo irritado, ela não podia deixá-lo irritado!

- Ichigooo! – mas aquele não era nem de longe meu pior problema. Na verdade, a catástrofe tinha acabado de aparecer na nossa frente.

Meu pai.

- O-oi p-pai. – Quem é que gagueja cumprimentando o próprio pai?!

- Olá, rapaz! – pelo menos ele pareceu não notar e dirigiu a atenção ao Grimmjow. – Caramba, se as pessoas implicam com o cabelo do Ichigo, imagino com o seu!

Ai não. Eu tinha que estar sonhando!

- Não faz diferença! – porém, Grimmjow não se ofendeu. – É só quebrar os dentes dessas pessoas e elas nunca mais vão querer abrir a boca para nada! – sorriu.

E meu pai riu. Não. Na verdade ele gargalhou, como se fosse a melhor piada que tivesse ouvido.

Será que ele não tinha notado que o garoto de cabelo azul e rosto arranhado estava falando sério?

- Essa foi boa! – piscou. – Kurosaki Isshin, pai dessa coisa que você chama de colega de classe! – ele se apresentou todo simpático enquanto desdenhava de mim.

Típico. Mas isso porque ele não sabia realmente quem ele era.

- Grimmjow Jeaggerjaques! – Grimmjow disse a ele e riu. – Na verdade o Ichigo é...

- BEM! – eu gritei. Que porra que ele ia falar?! Eu não podia jogar com a sorte. – Nós vamos estudar. Fazer um trabalho, certo? Lá no quarto. – Merda, porque eu falei ‘Lá no quarto’? E por que isso me fez corar? Agora todo mundo ia descobrir!

- Ah, claro, claro! – meu pai assentiu. – Vai ficar pro jantar, Grimmjow?

O QUÊ?!

- Não, ele... – eu tentei, mas...

- É claro! – a voz dele saiu mais alta do que a minha.

Isso não podia estar acontecendo!

- Ótimo! – meu pai parecia satisfeito. Ele tinha alguma idéia do que estava fazendo?! – Yuzu, mais um hoje! E parece que come bastante!

- E como mesmo! – ele não fez cerimônias.

Estava agindo como se fosse da família! Eu queria ser abduzido.

- Vamos fazer o trabalho antes que não dê tempo! – eu puxei o braço dele, mas soltei-o logo. E fui em direção às escadas, querendo claramente que ele me seguisse.

E ele o fez. Ainda bem.

Quando chegamos no quarto, eu fechei a porta e expirei com um cansaço súbito enorme.

- O que você ia dizer pro meu pai? – perguntei agressivo, admito.

- Vai começar? – ele me olhou com uma expressão enjoada.

Engoli essa.

- E como assim você aceita ficar para jantar?!

- Eu to com fome, ué! – ele disse como se eu fosse idiota.

- E sua mãe? Não vai ficar preocupada?! – inventei uma desculpa qualquer.

Ele só riu.

- Pelo amor de Deus. – mudei de tática. – Não faça nada estranho!

Ele sacudiu a cabeça ainda rindo e sentou-se na minha cama. Começou a tirar a gravata. E depois a desabotoar a camisa bem agilmente. Quando terminou, jogou tudo no chão e apoiou os braços nas pernas, olhando para mim.

- Ichigo?

- Ah... Sim? – droga. Eu tinha ficado olhando de novo.

- Vem logo! – resmungou sem paciência.

Eu assenti e fui andando até ele, tentando não... Sabe, ficar encarando tanto.

Peguei o que precisava para fazer o curativo e sentei-me na cama de modo que pudesse cuidar das costas dele.

- Aiii! – ele reclamou quando comecei a limpar o machucado. E puxou o ombro.

- Fica quieto! – eu ordenei. Na hora de brigar era bom né? Duvido que ele fizesse isso.

- Fácil falar. – ele rosnou pra mim.

Revirei os olhos e continuei, segurando com a outra mão as costas dele para que não fugisse.

E, tudo bem... Talvez eu estivesse me aproveitando da situação.

Ai, céus, não acredito que eu pensei mesmo nisso.

- Seu pai que te ensinou isso, é? – ele quis saber, de repente, me acordando dos meus pensamentos.

- Ahn... É. Eu e minhas irmãs ajudamos às vezes.

- Haha. Você é mesmo um exemplo, né, garoto?

Exemplo? Eu não estava me sentindo assim.

- Ajudar o pai não é ser um exemplo. – eu disse.

Ele procurou minha perna com a mão e pousou a mão com força.

Eu me afastei instintivamente.

- Tá vendo? É um exemplo. Santinho demais. – ele parecia ter feito aquilo mesmo só para provar que estava certo. Maldito.

- Tá bom. E o que tem de errado nisso? – eu desafiei.

- Eu não disse que tinha nada de errado. – ficou quieto por um tempo. – Mas você tem me ensinado a ser um bom garoto... Então acho que posso te ensinar a ser um pouquinho mais errado.

Eu não estava vendo o rosto dele, mas sabia exatamente como estava seu sorriso. Senti um arrepio.

- Terminei. – eu disse. O curativo até que tinha ficado bem feito. Agora eu não ia precisar mais...

Tomei um susto. Assim que eu acabei de dizer, ele virou-se, me pegou pelos braços e me jogou na minha própria cama, sorrindo, como naquele dia em que eu o empurrei com força de cima de mim. Foi tudo rápido demais para eu conseguir fazer meus olhos voltarem ao normal... Até mesmo para me situar!

- O que você está fazendo?! – quando ele vinha se aproximando para me beijar, eu consegui perguntar apavorado.

- Você sentiu minha falta! – ele justificou-se de qualquer jeito e beijou meu pescoço.

- Grimmjow! – eu continuava protestando. – Para com isso! Agora!

- Se você não estiver gostando pode me empurrar.

Argh! Como ele era seguro de si! Que irritante!

E o pior é que ele estava certo... Eu não estava odiando, mas... Eu não podia permitir assim!

Ele continuou beijando meu pescoço e começou a abrir minha camisa para descer os lábios úmidos.

Que droga, que droga!
- Grimmjow, estou falando sério! – comecei a empurrá-lo. – Sai!

Ele parou e me olhou nada contente.

- Você está me rejeitando de novo? Então a mensagem do celular era toda falsa, né?

Estava jogando sujo ainda!

- Não era nada falsa! – eu não queria ter que olhar para ele enquanto dizia isso. Mas meio que não tinha como evitar. – Só que... Eu... Não posso fazer essas coisas... – desviei os olhos do melhor modo que pude e falei baixinho a última frase.

- Mas que coisas? – teimoso, teimoso, insistente! – Não estamos fazendo nada de mais! – suspirou com força, como se estivesse tendo que lidar com uma situação super estressante. – Que merda, parece que estou namorando uma criancinha de 10 anos! – resmungou com uma careta.

Mas espera... Como é que é?

Ele disse mesmo...? Ele disse...? Namo... Namorando?!

Ele deve ter percebido a minha cara de choque, porque franziu as sobrancelhas e perguntou enfadado:

- O que foi agora?

- Você disse... – de algum modo, consegui dizer. – Você disse que nós... N-Nós... – quase engasguei com nada. – Na-namorados?

Ele soltou o ar e revirou os olhos.

- Não parece. É uma criancinha de 10 anos! – ele disse mais para si mesmo. – Achei que isso já estava óbvio, né? – voltou-se a mim.

E eu, bem idiota, ainda fiquei tentando absorver aquelas palavras. Quer dizer... Então nós tínhamos um... Um relacionamento? Digo... Um relacionamento sério?! Namoro é uma coisa séria, não é?

E desde quando estávamos assim tão sérios?

Tá, tudo bem que a gente sempre se beijava, ele sempre me trazia em casa e estávamos sempre juntos... E também, eu cobrei dele uma explicação pelo sumiço como se ele realmente tivesse a obrigação de me dizer.

Mas... O Grimmjow? Ele tinha mesmo dito aquilo com tanta casualidade?!

- É só que... – eu comecei a dizer alguma coisa. Não podia ficar travado com cara de babaca a vida inteira. – Eu não achei que... Quero dizer... Você não disse nada...

Ele não fez nenhuma questão de esconder a pior das suas caretas de aborrecimento.

- O que você quer? – ele perguntou. – Não estava esperando que eu te pedisse em namoro, estava? – apertou de leve as sobrancelhas, demonstrando certa incredulidade.

Eu só olhei para o lado. Quero dizer... Não é que eu estivesse esperando que ele me pedisse em namoro, mas...

Mas no fundo talvez eu estivesse.

Não, não sou tão ridículo assim! Mas eu pelo menos queria saber que estávamos namorando. Queria que tivéssemos chegado a essa conclusão juntos... Eu queria que isso tivesse ficado claro, será que dá para entender?

Só que não podia falar para ele. E, diante do meu silêncio denunciador, ele gargalhou.

- Você ainda consegue me surpreender, Ichigo! – olhei para ele e os seus olhos azuis faiscavam.

Cada expressão minha era pura diversão pra ele. Incrível!

- Então... – ele passou os dedos pelo meu rosto e quase entrou nos meus olhos enquanto dizia mais baixo. – Você quer namorar comigo?

Eu sabia que estava parecendo que tinham pintado meu rosto com tinta vermelha. Mas, por causa da mão dele no meu rosto, não consegui fugir daquele olhar.

Meu coração estava tão disparado e eu estava tão sem graça, que achei que, sei lá... Ele pudesse ouvir tudo. Tudo que eu estava sentindo e pensando.

- E-eu... – tinha que responder. Mas não fazia idéia de como. – Eu... – droga, o sorriso dele estava tremendo de novo.

- Eu sabia que você ia querer. – ele tirou as próprias conclusões e me beijou.

Certo. Aquilo não tinha feito o menor sentido! Mas mesmo assim eu estava aliviado.

Vai entender!

No embalo daquela história toda de termos alguma coisa mais sólida, acabei me esquecendo do que estávamos fazendo. E deixei que ele me beijasse daquele jeito na minha própria cama...

Eu sei que não adianta dar desculpas para ter permitido isso, mas... A verdade é que eu estava sentindo muita falta dos beijos dele. E era a primeira vez que nos beijávamos em quase uma semana...

Então só deixei que ele continuasse. Enquanto roubava meu fôlego todo e quase matava meu coração de tanto trabalhar, eu o segurava pelas costas e pela nuca. Ainda estava tomando cuidado com o ombro machucado dele.

Percebi depois que quanto mais eu passava a mão pelas costas largas dele, mais rápido eu ia esquecendo as coisas e pessoas ao meu redor e ia me deixando ser seduzido. Era como se eu me sentisse estranhamente seguro. O calor do corpo dele que caía para cima do meu estava acabando com a minha razão. E ele ainda estava sem camisa! Vai ver era por isso que eu estava me sentindo mais quente. Estava mais perto da intensidade dele.

Ele tirou os lábios dos meus e respirou alto. Eu estava fazendo o mesmo, quase ofegando. Começou então a beijar e lamber meu pescoço. Com um pequeno empurrão, fez com que minha camisa se abrisse de uma vez e continuou o caminho pelo meu peito, pela minha barriga... Aquilo me fez sentir um frio estranho por dentro que contrastou com o calor da minha pele e me fez tremer e me arrepiar. Eu pensei seriamente em protestar e afastá-lo de novo, mas o meu bom senso estava fraco e amordaçado e então eu só consegui apertar a nuca dele...

- Meninos, o jantar está pronto!

Duas batidas na porta e a voz da minha irmã mais nova, porém, foi o suficiente para devolver a liberdade ao meu bom senso.

Meus olhos fechados arregalaram-se rapidamente.

- Já vamos! – Grimmjow disse e não se importou com meu estado de alerta. Não estava parecendo que tinha desistido.

- Grimmjow! – eu afastei-o e sentei-me na cama. Comecei a fechar a camisa tremendo mais do que eu já tinha tremido na vida e sem conseguir encará-lo. – T-Temos que descer.

- Mas ainda não terminamos o trabalho! – ele riu e me puxou para ele.

- Não! – eu bloqueei-o de alguma maneira. – Temos que descer agora! – eu tinha medo de que ele encostasse no meu rosto e sua pele derretesse. Porque eu estava fervendo!

- Isso é alguma técnica de sedução, é? – ele me perguntou erguendo uma sobrancelha.

- Ahn?! – não tinha outra coisa para responder. Do que raios ele tava falando?!

- Você sempre faz isso. Na melhor parte, você quer fugir!

Ele estava falando sério?

Fiquei olhando estupefato para ele, até que a Yuzu bateu mais uma vez.

- Onii-chan! A comida está na mesa!

- Quer saber, vamos jantar! – ele levantou-se da cama. – Agora lembrei que estou morrendo de fome.


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