Doppelgänger: Primeiro Dia escrita por Rauker


Capítulo 2
Capítulo 01 - Nova escola




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Em um dia inesperado, vidas começam a mudar, mesmo que de forma lenta e imperceptível.

Nada como começar o dia com o despertador berrando desesperadamente! Parece que não acordei mal humorado, visto que tive cabeça pra fazer uma ironia. Tenho certeza que pouca gente acordaria sorrindo de orelha a orelha, quando estão sendo praticamente obrigados a se levantar com um zumbido eletrônico que denota todos os seus deveres diários. A bela frase “Que dia lindo!” está se tornando extinta atualmente, pois suspeito que a maioria pensa noutra palavra muito diferente de “lindo” pra definir seu dia, ainda mais quando esse dia é uma segunda-feira. No meu caso, não sei se será um “lindo” dia. Mas, com certeza, será curioso.

O “bip-bip” do despertador me fez inferir apenas isto: primeiro dia de aula numa nova escola; início do Ensino Médio. Não que eu desgoste do que me aguarda, sinto-me até ansioso, porém nervoso. Meu coração chega a acelerar quando devaneio as possibilidades de hoje; só não quero pensar nas piores.

Minhas mãos, como de costume, se lançam sobre o aparelho retangular na cabeceira da cama. Apalpo os botões apertando-os a esmo. Só quero que essa coisa pare de berrar!

Quando consigo desligá-lo, acumulo coragem para me levantar. Fico sentado na cama e suspiro satisfeito por ter barrado a preguiça. Diferentemente de quando acordo nos dias anteriores, não há luz matinal entrando pela janela do quarto, já que ainda nem são seis da manhã. Somente uma luz pálida, tonalizando o cômodo de forma fria e crua.

A penumbra na qual meu quarto está mergulhado fez despontar uma lembrança esquisita. Imagens de um estranho sonho, pesadelo, ou seja lá o que tenha sido aquilo, começam a me perturbar. Um corredor com paredes de tijolos de barro, luzes ofuscantes refletindo no chão, e passos na escuridão. Um local um tanto assustador considerando a sensação de impotência e temor que era estar lá. Melhor categorizá-lo como pesadelo. E, sendo um pesadelo, é melhor esquecê-lo.

Volto à realidade.

Eu era obrigado (e não reclamava disso) a dividir o quarto com minha irmã, cinco anos mais nova. No momento, ainda dormia na cama de baixo, que entra e sai lateralmente abaixo da minha. Invejo as horas extras de sono da Marcela!

Ao sair da cama, tomo cuidado ao pisar sobre o colchão onde ela dormia, evitando assim acordá-la, e ponho meus pés no azulejo frio. Meu quarto não é muito grande e também não é muito bonito. A tinta branca descascava em alguns pontos, deixando mostras de cimento na parede e no teto. Não é um quarto lá muito vistoso, mas ainda é o meu quarto (e da minha irmã).

Caminho até a porta e entro no apertado corredor de paredes claras, mais bem conservadas que o cômodo anterior. Alguns passos dados e estou na cozinha, já acesa. No cômodo de azulejos beges, vejo a despensa aberta, uma pia sem louça suja graças a minha mãe, e a mesa com o café da manhã razoavelmente abastado (quer ver o filho bem alimentado para o primeiro dia de aula?).

— Bom dia, Léo! — diz minha mãe com os lábios curvados. Sempre a admirei pelo fato dela manter esse sorriso matinal, independente do que iria enfrentar ao longo do dia.

— Bom dia, mãe! — respondo de volta, a boca tentando imitar aquela curvatura sorridente.

— Preparado para a escola?

Ela tinha que perguntar? Eu queria dizer não. Desejava contar todos os meus pensamentos a respeito desse dia “nebuloso”. Normalmente, quando estou prestes a ir num lugar desconhecido, minha mente viaja por mil e uma possibilidades de acontecimentos em tal lugar. No caso da escola, por exemplo, fiquei imaginando que tipo de alunos encontraria.

— Hum, acho que sim — digo, meio vacilante, mas sincero.

— Certo… — Traços de preocupação adornam seu rosto, mas desaparecem antes de um segundo. — Melhor ir se arrumar. Sabe que daqui até a escola é um longo caminho.

— É, eu sei.

Vou ao banheiro me aprontar, concebendo o fato de que todos os dias faria essa longa jornada. Só de pensar nisso, a preguiça retorna. Enquanto há gente morando no mesmo quarteirão do colégio, outros residem a quilômetros de distância, tendo de arranjar duas ou mais conduções para chegar ao destino final. É um saco! Mas esse grupo de alunos precisa fazer esse sacrifício. Provavelmente conseguirei me acostumar com o tempo, sem contar que terei pinta de… hum… esforçado.

Após o banho, visto minha calça-jeans e camisa polo branca. Olho-me no espelho para conferir se estou bem arrumado. Os cabelos escuros, curtos, e naturalmente penteados é o que menos preocupa. Acho minha aparência formal demais para ir à escola, mas, como tiveram um problema com a encomenda dos novos uniformes, permitiram que os alunos calouros usassem roupa comum na primeira semana.

Quando volto à cozinha, minha mãe está quase arrumada para ir ao trabalho, apenas terminando de pentear seus cabelos escuros e lisos. Ela não tem muita pressa, afinal, o mercado do Seu Valter não é muito distante daqui.

— Léo, já estou indo. Sua tia deve chegar daqui a pouco para levar a Marcela na escola. Não precisa esperar por ela. Sua irmã não terá medo de ficar sozinha em casa, desde que você tranque a porta e o portão.

Ela me dá um beijo de despedida e se vai.

Olho para o relógio e noto que também já está quase na minha hora. Tomo um meio copo de café com leite e uma fatia de pão. Vou até o quarto pegar minha mochila previamente arrumada na noite de ontem. Porém, quando estou para carregá-la do cômodo, noto minha irmã se remexendo na cama, provavelmente imersa em algum pesadelo. Ouço-a sussurrar alguma coisa, mas não consigo compreender. Tento me aproximar, mas os murmúrios subitamente cessam. Dou de ombros e saio do quarto.

Na cozinha, confiro novamente a mochila. Tudo certo! Hora de ir!

Deixo a casa e tranco a porta. Falta pouco mais de uma hora para o primeiro tempo de aula. O nervosismo só aumenta.

Enquanto o irmão se afastava de casa, Marcela se contorcia desconfortavelmente no leito. Como Léo imaginara, sua irmã mantinha-se mergulhada num pesadelo, ou, talvez, em algo maior. Não parava de murmurar:

Tome cuidado, Léo. Está vindo... Está vindo.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo: 10 de Março.
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Até a próxima!