A Clarividente escrita por Yuka


Capítulo 23
Capítulo 23


Notas iniciais do capítulo

Mais uma parte importante. A partir daqui, acho que todos os capítulos terão uma revelação importante. Espero que gostem de ler tanto quanto eu tenho gostado de escrever.
Obrigada a todos que tem me acompanhado até aqui!



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A tarde passou rápido para Martin, que tivera um dia agitado e incômodo. Passava o tempo inteiro pensando na Rainha Naama, no que ela fizera consigo, na raiva que estava sentindo e no encontro misterioso que tinha na biblioteca. Queria ir ao mesmo tempo em que não queria ir, e não sabia ao certo o que fazer.

“Eu vou” pensou, para si mesmo. “Para estragar os planos de Naama”.

Quando a noite se aproximava, seu coração começou a ficar mais inquieto. Pensou brevemente em Nirina, nas coisas que já havia falado para ela, e sentiu-se um pouquinho arrependido. Parte da maldade contra a aprendiz era inspirada pela Rainha, que sabia de seu passado. Naama havia pedido a Martin que dissesse que o pai dela havia morrido e sua mãe havia cometido suicídio. Com o sorriso travesso de costume, ela havia dito, com uma voz aveludada: “Diga a ela. Conte a ela a história da breve e miserável vida de seus pais”.

O mago não havia pensado direito na hora. Era cego por Naama. Pensou tanto, tantas vezes, que estava seguindo o caminho errado... Apertou os olhos. Por que estava tão reflexivo? Não era do seu feitio se importar tanto com pessoas que mal conhecia.

Agora que sentia raiva de Naama, que se sentia manipulado, conseguia enxergar as coisas com mais clareza. Ser arrogante e falar com os outros olhando-os de cima para baixo era quase um aspecto de sua personalidade. Sentia tanta raiva e sentia tão enganado que não conseguia pensar em mais nada.

Mas, de certa forma, quando pensava sobre a biblioteca, sentia-se perto da morte, por algum motivo que ele desconhecia. Talvez fosse essa a causa de tanta reflexão repentina.

Quando chegou a hora, Martin deixou o castelo em uma carruagem. Avisou para o cocheiro que não demoraria, e que ele poderia esperá-lo do lado de fora da biblioteca. O serviçal assentiu, distanciando um pouco o veículo da porta principal e esperando um pouco mais longe.

Martin engoliu em seco ao ver a porta de entrada. Apertou os olhos e respirou fundo, como se precisasse se preparar para passar por tal situação.

Finalmente abriu a porta e, logo adiante, na sala mal iluminada, estava uma moça, em pé. Ela estava com as mãos unidas à frente de seu corpo, com o semblante neutro. Continuou ali, parada, olhando-o, enquanto Martin continuava parado logo à frente da porta, olhando para a moça. Respirou fundo e prosseguiu.

— Boa noite — disse, usando o seu tom de voz arrogante e implicante de sempre. — Foi você quem me convidou para vir até aqui?

— Não, senhor — ela respondeu, calma. — Queira me acompanhar, por favor.

Martin estranhou o jeito calmo e reticente da mulher. Sabia que ela era amante de Reno, mas não conseguia encontrar um motivo para ela estar ali. Ela também era aliada do tal Rezon, assim como Reno?

— Suriel é seu nome, certo?

— Sim. — Respondeu, enquanto abria a porta da sala que dava acesso à sala subterrânea.

— Qual é o seu motivo para estar aqui?

— Não faça muitas perguntas. Isso facilitará.

— Ah... — Martin estava se sentindo estranho. O lugar era estranho. A bibliotecária também. — Facilitaria se você me respondesse.

Suriel manteve-se em silêncio. Levou Martin até a porta da escadaria para a sala escondida de Rezon e o instruiu:

— Apenas desça as escadas. Lá, sim, faça todas as perguntas que desejar. Desejo uma boa noite — disse, inexpressiva, mas com sinceridade; ignorou a última fala de Martin. Odiava Rezon e queria que todos os seus planos dessem errado. — Com licença.

Martin não respondeu. Apenas observou a moça deixar a sala com passos calmos e medidos, silenciosos. Ao ouvir o som da porta que Suriel havia fechado, deu o primeiro passo sobre os degraus que desciam. O corredor era escuro, iluminado por poucas velas fixadas nas paredes de modo medonho, por correntes, em pequenas luminárias. Apesar de um lugar frio e desconfortável, Martin não se importou e continuou seu caminho, sério e indiferente.

Ao chegar ao último degrau, já foi capaz de ver a sala. Havia uma mesa de madeira ao centro da sala; não, era mais como se fosse uma cama de madeira. Não havia nada ali além daquele móvel e várias estantes vazias. As estantes estavam em todas as paredes da sala, todas vazias. Eram estantes antigas, que não prestavam mais à biblioteca e ficavam ali, o que só dava um aspecto mais assustador ao lugar. Martin observou a sala inteira e só depois reparou em seu anfitrião, que usava uma capa comprida, preta, com um capuz sobre o rosto.

— Olá — disse Martin, sério, mantendo-se seguro, aproximando-se com passos destemidos. — Como você é meu anfitrião, seria educado de sua parte se se apresentasse tão logo me visse.

— Boa noite, Martin! Chamo-me Rezon — disse, aproximando-se. — Esperei bastante por sua visita aqui. Sua ajuda será de grande valia.

— Minha ajuda? Com o quê?

— Eu sinto muito não poder recepcioná-lo melhor, convidá-lo para sentar ou tomar um chá. Mas vá com calma. Eu vou explicar a você tudo o que precisa fazer, e tudo o que pode ganhar com isso.

— Hm... — murmurou Martin, levando sua mão ao queixo, com uma expressão pensativa no rosto. — Isso muito me interessa.

— Como eu esperava de você — respondeu Rezon, sorrindo. — Eu serei direto: eu preciso de você pra me ajudar a conseguir vítimas para meus rituais de magia negra.

Martin manteve-se imparcial diante da revelação, com os braços cruzados; por isso, Rezon prosseguiu.

— Eu preciso de pessoas que possam ser sacrificadas em meus rituais, para tomar seus poderes mágicos. Qualquer pessoa serve, mas magos aumentam bem mais meu poder. Meu último aliado não foi de muita serventia. Espero poder contar com você.

— Pois poderá. Explique-me um pouco mais sobre isso, o que devo fazer, e o que eu posso ganhar — disse Martin, com um sorriso.

— Você é parecido comigo — comentou o mago negro. — Isso me deixa mais propenso a confiar em você. Existem algumas condições: você deverá trazer as vítimas para mim quando as conseguir, com um prazo máximo de três dias para cada uma. Se não conseguir uma a cada três dias, posso dar um prazo um pouco maior, como exceção... Mas tenha em mente que minha paciência não é muito grande. Tem mais uma coisa: você deve se submeter a uma leitura de mente sempre que eu solicitar. Se se negar, eu deduzirei que você tem algo a esconder de mim e eu o matarei sem hesitar.

Martin torceu a boca. Não gostava de ser obrigado a obedecer a ordens.

— Não gosto de ser obrigado a obedecer a ordens. Não há como mudar essa parte do contrato?

— Infelizmente, não. Como minha atividade é arriscada e eu posso ser denunciado a qualquer instante, preciso estar sempre atento.

— Tudo bem. Minha resposta final depende do que eu vou ganhar com isso, se te ajudar.

— O que você quiser. Eu serei dono desse país mesmo. Se for fiel a mim, você com certeza será um de meus homens mais importantes. Terá riquezas, e eu o considerarei como alguém que me ajudou a construir meu império sobre Sira.

Martin pensou durante alguns segundos. Estava em dúvida. Não sabia o que fazer. Com certeza o homem tinha uma grande ambição para pensar em destruir Sira e recriar. Ou ele era realmente poderoso, ou realmente ingênuo, pensara o líder dos magos do Rei.

— Eu aceito — disse. — Com uma condição.

— Pois não?

— Eu quero um maior prazo até trazer a nova vítima.

— Quanto tempo?

— Sete dias.

Dessa vez foi Rezon que fez uma cara de desagrado.

— É um pedido pequeno perto do que terei de aceitar, de submeter minha mente à sua sempre que for de sua vontade. E eu farei isso, pode ter certeza. E te ajudarei com seus objetivos, se me der poder em troca. Quero ser a pessoa mais influente do que você construirá sobre esse país. Não me importo com ele. Seria ótimo destruí-lo e reconstruí-lo da forma correta — adicionou um sorriso maldoso no fim, esperando pela resposta.

— Eu aceito. Quero poder contar com você. Então espero a primeira vítima dentro de sete dias.

— E a terá dentro de sete dias. Farei uma pesquisa das melhores vítimas e então virei em tempo. Não se esqueça que uma dessas vítimas pode até ser uma pessoa especial... A aprendiz de clarividência do reino.

— Você a conseguiria para mim? — perguntou Rezon, obviamente interessado.

— Dentro de sete dias, não posso garantir. Mas se estiver disposto a esperar mais poucos dias, claro que consigo. Eu consigo tudo o que eu realmente quiser.

— Excelente! — Disse Rezon, andando até Martin e estendendo a mão. O mago de água a apertou sem hesitar, com firmeza. — Era exatamente o que eu buscava em um aliado. Como eu costumo ser fiel com meus novos parceiros, eu não tenho o costume de ler suas mentes nos primeiros encontros. Seria rude, não?

— No mínimo desconfortável — disse Martin, suando frio. Ele não tinha a menor intenção de deixar Rezon entrar em sua mente. — Seria necessário um tempo para que eu me acostumasse com a ideia de deixá-lo explorar todos os meus pensamentos, mas não se preocupe. Diante dos sete dias de prazo que me deu, Rezon, eu com certeza deixarei que execute a leitura quando desejar.

— Muito bem, então. Quando quiser ir, está dispensado. Espero ansiosamente por nosso próximo encontro.

— Aliás — começou. — Nossos próximos encontros serão todos aqui?

— Sim — disse Rezon. — Sei que uma pessoa da Corte já sabe minha localização, mas não tenho planos de me mudar.

— Certo — respondeu, virando as costas. — Bem, nos veremos muito em breve.

— Muito em breve — sorriu Rezon, satisfeito. — Até mais, Martin.

— Até mais. Boa noite, Rezon.

Dizendo isso, subiu as escadas de volta, mantendo a mesma expressão séria e indiferente ao desconforto do corredor. Subir parecia, de alguma forma, mais assustador que descer. Ele não havia falado nada de Reno, nem de Naama. Mas também não esperava que ele fosse revelar tanto em tão pouco tempo.

Então se lembrou que Rezon havia entregado uma carta à Rainha. Naama era tão radical assim? Seu ódio por Nasser era assim tão profundo que ela chegaria ao ponto de ajudar alguém interessado a destruir seu país?

Terminou de subir as escadas e passou pela sala que dava para a subterrânea. Passou pela sala principal e viu Suriel ali, com a mesma expressão indiferente.

— Tenha uma boa noite — ela disse, quase automaticamente.

— Igualmente — respondeu Martin, com um aceno cortês da cabeça. Ergueu a cabeça e andou até o fim da sala, passando pela porta. Ao olhar para trás antes de entrar na carruagem, desejou nunca mais voltar ali.




Ian acordara cedo, espreguiçando-se sobre o sofá de Selene, enrolando o máximo que podia para finalmente levantar. Hazael ainda dormia profundamente no outro móvel e ele odiou a ideia de acordar cedo para escrever para sua irmã. Mas era necessário.




Rapidamente, levantou e se arrumou, pegando um papel e uma caneta. Endereçou a carta a Nali e calculou: a carta demoraria cerca de dois dias para chegar até Nali, que era distante do país de Sira. Aileen a leria então, e caso decidisse vir, sua resposta chegaria igualmente em dois dias. Isso daria quatro. Se esperassem quatro dias, então poderiam se preparar bem. Se ela viajasse a Sira, chegaria a aproximadamente dois dias, como as cartas. Teriam, ao todo, seis dias até que interviessem. Ian, então, decidiu: teriam em torno de uma semana até finalmente tomarem uma decisão definitiva junto com Aileen.




Segurou a caneta firme em sua mão e começou.





A Aileen, maga do Reino de Nali.


Olá, querida irmã. Estou escrevendo, pois tenho novidades. Como sabe, Hazael aceitou meu convite para vir até Sira procurar por nosso clarividente, sabe quem; além do fato de que tem seus próprios interesses para retornar. Estive interessado nos clarividentes desse país e tentando encontrá-los em todos os lugares, mas não havia encontrado o paradeiro de nosso alvo até então.


Recentemente, fiquei sabendo que havia um assassino na cidade. Primeiro, um garoto chamado Rob havia sumido. Então comecei a ficar atento a cada movimento. Cada pista que pudesse me levar a ele. Eu sabia que podia nada ter a ver com Rezon, mas e se tivesse?


O próximo assassinato me fez crer que eu estava perto de encontrá-lo. O rosto da vítima estava desfigurado, mas eu a reconheci pelos símbolos que ela usava nos braços. Reconheci. Era Lilian. Sabíamos do amor que Lilian nutria por Rezon, sabe-se lá como ela era capaz disso. Sabíamos também que ela estava desaparecida desde que os magos se dispersaram. Então ela seguiu para Sira com Rezon. Como ele sabia que eu tinha vindo pra cá? Ele veio por minha causa? E agora está com outros planos, além de mim. Mas ele não me esqueceu. Ele sabe que eu fui o responsável pela denúncia.

Por algum motivo, Lilian foi morta e jogada às ruas. Mas não foi a última até então. Um professor da corte de Sira, um mestre de magia, também foi morto. Não sei qual seu envolvimento com Rezon.

Sabemos onde ele está. Viaje para Sira. Venha, Aileen. Nós precisamos de sua ajuda. Você sabe que é a única capaz de praticamente superar a força mágica de Rezon. Espero uma resposta. Por favor, responda o mais rápido que puder. Temos aproximadamente sete dias até agir. Não queremos que ele faça mais vítimas.

Estou com saudades, irmã.

Atenciosamente, Ian.




Releu algumas vezes e achou que estava bom. Selou a carta e, ainda sentindo preguiça, andou até o lugar da cidade em que as cartas eram depositadas e entregadas. Depositou-a no lugar certo, já que as cartas para os outros países tinham lugares exclusivos para serem deixadas, e saiu. Apertando uma de suas mãos, torceu para que desse tudo certo.











 

 

 

 









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Notas finais do capítulo

A imagem no final eu encontrei enquanto olhava imagens aleatórias na internet. Quando a vi, imediatamente pensei em Rezon, porque é exatamente assim que o imagino. Achei ela tão legal que resolvi postar no final desse capítulo em que ele aparece mais uma vez.
(Infelizmente não sei quem é o autor da imagem para mencionar aqui.)