Saint Seiya Memórias: História Oculta Do Santuário escrita por Katrinnae Aesgarius


Capítulo 44
Livro 2 :: Dualidade - Ato 5


Notas iniciais do capítulo

Halfeti de Peixe Negro, outrora um Cavaleiro de Ouro honrado e adorado no Santuário, revela às causas de sua errônea condenação ao seu aprendiz (e admirador) Aiolos de Sagitário. Teria o ex-Dourado despertado para a verdade?



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Um sorriso maligno estava estampado no rosto de Halfeti quando ele atirou a sua primeira rosa contra Aiolos. O projétil negro e impregnado com o seu cosmo reluzia, traçando uma trajetória em linha reta na direção de seu alvo que desviou no último segundo.

— Não acha que deveria se preocupar com você agora, garoto? — zombou o Peixe Negro, dando um passo à frente. — Vou fazer você voltar para o Santuário em pedaços, nas mãos de sua amiguinha.

Aiolos voltava à sua postura defensiva. Por muito pouco não sentiu ser atingido por uma das rosas, sentindo seu perfume quando passou bem rente ao seu rosto e raspar na máscara de seu elmo. "As rosas são serrilhadas...? Por isso a máscara...", pensou ele se voltando para seu antagonista.

— Por quê...? — questionou Aiolos levando seu punho até frente à joia em seu peito e removendo a máscara que cobria parcialmente seu rosto. — Eu não entendo...! — ele abria e fechava a boca escolhendo palavras, tentando se expressar com as mãos, sem sucesso, sua indignação. — O que o transformou assim, Halfeti? Você era respeitado e admirado por todos...!

O Cavaleiro de Peixe Negro fez apenas uma careta, sem esconder o desdém ao revirar os olhos enquanto ouvia aquilo.

— É tão simples, Aiolos... — respondeu com um suspiro. — Mas não espero que alguém tão iludido compreenda. — falou o Cavaleiro.

— Iludido...? — repetiu, tentando rir daquilo, mas apenas mordiscou os lábios. Fechou momentaneamente os olhos enquanto falava. — Lembro que disse essas palavras quando foi condenado pelo próprio Grande Mestre... —  e voltou olhá-lo. — Assim como também disse que Sólon era um iludido.

— Sólon sabia bem o que fazia... diferente de você, garotinho, não estava sendo manipulado. — afirmou o pisciano, assumindo sua postura de guarda. — Ele traiu a todos plenamente consciente de seus atos.

E lançou sua investida na forma de oito rosas negras que cortaram o ar na direção de seu alvo. Desta vez Aiolos precisou saltar com maior precisão para desviar das rosas, usando as suas asas, até então recolhidas, como escudo contra algumas poucas que chegaram até ele. No processo, uma fina nuvem de pólen das rosas ganhou o ambiente.

Era um perfume agradável, mas que o deixava, pouco a pouco, atordoado e seus reflexos mais e mais lentos a cada instante. No entanto, essa não parecia ser, naquele momento, sua maior preocupação, e sim as últimas palavras de Halfeti com relação ao antigo Cavaleiro de Gêmeos.

"Sólon traiu... a todos...?!", pensou Aiolos ouvindo aquilo, arregalando os olhos com aquela afirmação que soava tão sincera e espontânea. "Não. Ele está mentindo. Sólon era um homem honrado demais... assim como Halfeti um dia foi. Será que...".

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— Athena nos ensinou a arte da guerra, a lutar por esse mundo. O que nos resta é retribuir com nossa fé e coragem, sem jamais recuar em nosso dever de proteger esse mundo. — dizia Sólon para um grupo de jovens no anfiteatro, dentre eles estava Aiolos em seus 11 anos, ouvindo tudo atentamente.

Sólon era um homem com certa idade para um padrão dos Cavaleiros, já na casa dos 40 anos apesar de um físico e aparência que o rejuvenescia. Era um típico grego, com uma pele morena queimada de sol apesar dos cabelos claros como palha até acima do ombro, e pequena mecha trançada à esquerda. "Uma tradição de família", era o que dizia.

Era alguém que honrava o código dos Cavaleiros e fazia prevalecer as leis do Santuário. Era um homem piedoso e de bom coração apesar da casca séria.

Quando encontrou os dois irmãos — Saga e Kanon — próximo ao rio, durante a Plyntheria, reconfortou-os e assumiu o treinamento de ambos. Halfeti era seu amigo e principal companheiro de missões, coordenando juntos os aprendizes e auxiliando o Grande Mestre no gerenciamento do Santuário.

A imagem que melhor Aiolos lembrava-se deles era de ambos rindo, apesar de ser uma raridade. Divergiam, mas sempre chegavam num consenso que acabava em vinho e um fim de tarde livre dos treinamentos para narrarem as muitas histórias dos Cavaleiros do passado, de seus mitos e heroísmo.

— Um dia serão vocês a se tornarem esses heróis, aqueles a quem todos contarão histórias de seus feitos. Porém, lembrem-se de jamais permitir que isso seja maior que seu dever. Jamais se deixem levar pela confiança exagerada. — recomendava Sólon, sempre ao fim de suas narrativas e sob o olhar admirado dos aprendizes, igualmente de Halfeti.

Quando as diferenças começaram a surgir, ninguém foi capaz de saber. O que Aiolos percebia era que Halfeti e Sólon já não buscavam um consenso, mantinham-se destacados um do outro até culminar naquela tragédia.

A Armadura de Ouro de Peixes havia renegado seu Cavaleiro quando os dois mais antigos, e únicos Dourados, ensaiaram um desafio no anfiteatro diante de todos. A vitória havia sido de Sólon, mas ele sucumbiria horas mais tarde devido ao veneno enquanto Halfeti era condenado por conspiração e banido do Santuário ao ser degredado para a Ilha dos Espectros.

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Aiolos pousou novamente sobre o jardim, para mais distante de onde havia levantado a nuvem de pólen, mas o perfume já impregnava toda aquela câmara e sabia que seus sentidos já estavam sendo afetados.

A sua visão estava ficando distorcida. No entanto, manteria suas asas abertas por ajudar no bloqueio das rosas, mesmo sob o perigo de tornar aquela nuvem ainda mais densa.

E Halfeti sabia disso.

— O que foi que aconteceu... Halfeti...? — indagava Aiolos, sentindo a garganta cada vez mais seca, o que começava a dificultar sua fala. — Faço... a mesma pergunta que Sólon naquele dia... Quem é você... e o que fez a Halfeti de Peixe? Como pode... macular... aquilo que defendeu com tanta dedicação... e honra...?!!

Halfeti riu alto ao escutar aquilo.

— Como disse... Eu abri meus olhos, despertei para a verdade! — respondeu com convicção, mostrando outras três rosas negras criadas com seu Cosmo. — Sólon também era consciente, mas jamais contou isso naquelas suas histórias fantásticas, não é mesmo? Toda aquela conversa de lutar pelo 'amor e pela justiça' não passam de um discurso vazio! — disse com desprezo.

"Vazio?!", pensou Aiolos olhando-o incrédulo. Por um instante sentiu algo mais intenso emanar de Halfeti, como uma sombra espectral que o abraçava. Não sabia se realmente assistia aquilo ou se o efeito do veneno das rosas estava criando alguma vertigem.

O fato era que, conforme falava, o jardim à sua volta respondia silenciosamente seu comando e florescendo duas vezes mais rápido que antes, inclusive algumas sob os pés de Aiolos e estas liberando um perfume ainda mais forte.

— Se não consegue despertar por si só, Aiolos de Sagitário, farei que entenda e veja a verdade sobre aquilo que chamam de Santuário. — e sorriu de maneira vil. — Ou melhor dizendo... SEPULCRÁRIO!

Os olhos de Halfeti brilharam de maneira estranha e percebida por Aiolos pouco antes de lançar as três rosas negras em direção ao Dourado. Estas reluziam e desapareceram do campo de visão do Sagitariano. No entanto, uma força ainda maior desintegrou as rosas e fazendo todo o lugar estremecer.

"O que é isso?", perguntou-se Halfeti olhando o templo, olhando para trás ao sentir aquele crescente Cosmo. Mesmo Halfeti virou-se em direção ao túnel impressionado com a 'explosão' de Cosmo que foi capaz de anular seu golpe.

"Sim...! Já senti esse poder antes. Foi como... naquele dia...!", lembrou-se o Cavaleiro de Peixe Negro quando ele Sólon estavam assistindo aos eventos de Plynteria e foram atrás daquele poder, ainda que pequeno naquela época. "Foi um lampejo, mas agora, bem mais intenso mesmo que por alguns instantes...!"

Os olhos de Halfeti alternaram-se para seu oponente e ele somente levantou o braço, mantendo-se de costas, como se expulsasse algo qualquer. Uma rede de ramos impelia Aiolos de avançar como intencionou fazer naquele breve momento de distração.

— Nossa luta ainda não terminou, Aiolos. — comentou Halfeti voltando-se para o Dourado. — Subestimei aquela Amazona, mas não é alguém a quem tenho que me preocupar. — e sorriu de canto. — Ao menos não mais. Vejo que serei muitíssimo recompensado agora.

— Do que está falando? — indagou Aiolos resignado.

— Que o grito dos derrotados seja a canção de nossa vitória... — declamava Halfeti abrindo os braços e de cabeça baixa, olhos fechados. Aiolos apenas franziu o cenho ouvindo aquilo. — Com a qual dançaremos ao redor de suas ruínas...! — e o Peixe Negro levantou a cabeça, exibindo olhos vermelhos e bestiais.

Aiolos arregalou os olhos, perplexo, para aquilo que ouvia. Em sua mente, reproduzia exatamente aquilo que estava sendo declamado por Halfeti:

"Para os guerreiros, oferecemos a glória!
Para os deuses, oferecemos nossos tributos.
Para os mestres da guerra, o sangue dos caídos.
Que o grito dos derrotados seja a canção da vitória,
Que o terror seja a ruína dos fracos e covardes,
Que bênção do Senhor da Guerra recaia sobre nós.
Que restem somente os mais fortes!
Que estes dancem sobre sua carne em sacrifício.
Saudemos ao Senhor Ares, o senhor das Guerras!"

— M-Mas... isso é... — Aiolos murmurou incrédulo.

 

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Saga havia retornado ao seu posto, em Gêmeos, mas seus pensamentos estavam longe. Pensara em trazer a pétala consigo, mas restou apenas as cinzas. Como o amigo poderia ter escondido aquilo dele? Ele sabia que o geminiano tinha o direito de reclamar a vingança por seu mestre assassinado naquele duelo covarde.

Até podia sentir o calor desaparecer lentamente das mãos de Sólon, enquanto a vida deixava seu corpo, por conta do envenenamento. Os irmãos se postaram ao seu lado, no leito de morte, fazendo o possível para que seu mestre sobrevivesse àquilo.

“Isso não é algo que um amigo deve fazer...”

Ecoou a voz meio à escuridão na Casa de Gêmeos, assustando Saga no primeiro momento. Buscou a origem daquela voz meio ao breu, mas sabia que estava sozinho. Kanon havia abandonado o Terceiro Templo na primeira noite em que Selene e Aiolos viajaram para aquela missão. Semanas havia se passado sem que soubesse do paradeiro de seu gêmeo. Os servos também já haviam se retirado para o descanso e ele faria o mesmo se não tivesse sentido aquela ‘explosão’ de Cosmo tão familiar.

— O que é ou quem é você a falar comigo...? — indagava Saga sem alterar seu tom de voz. — Por que está a me atormentar?!

“Não estou a atormentá-lo, apenas esclarecê-lo. Um amigo não deveria mentir...”

— Ele não mentiu para mim! — disse incisivo, andando de um lado para outro na suspeita da fonte daquela voz tão calma, ao mesmo tempo tão imponente. — O que você quer?!

 

Kanon chegara em Gêmeos sem quaisquer dificuldades. Viu o jovem Mu deixar Áries e Touro estava vazia, abrindo passagem pelas duas primeiras Casas Zodiacais. Chegando em Gêmeos, esperava encontrar Saga no pátio.

“Já deve ter se retirado, mas tenho certeza que sentiu o mesmo que eu. Aquele Cosmo...”, pensava Kanon lembrando-se do dia do teste de Selene, da maneira como seu Cosmo ascendeu e sincronizou com dele e de Saga naquele instante. “Eu nem deveria estar aqui... Kanon, seu idiota! Por que deveria se preocupar com... O que é isso?”

Kanon adentrara em Gêmeos, mas escondeu-se logo atrás de uma pilastra ao ouvir Saga falar. Não conseguia compreender, mas estaria com alguém àquela hora? Caminhou cautelosamente, acolhido nas sombras e vendo o irmão mais velho caminhar de um lado a outro, inquieto como um animal enjaulado.

Ouvia-o falar sobre traição e segredo. Alguém que parecia estar ausente e que estavam escondendo algo dele. Não era um assunto muito certo, principalmente por ter chegado na metade do mesmo.

Buscou em um possível alguém a falar com Saga, mas não encontrava nem mesmo uma sombra. O próprio irmão parecia perdido para quem se dirigir. “Mas o que diabos...!”

— Kanon...? — Saga se voltou na direção dele. Parecia cansado, arfando. — O que está fazendo aqui?

— Ah... nada! Vim olhar para a cara de paspalho do meu irmão e perguntar a ele se ele também sentiu uma explosão de cosmo há alguns instantes. — falou o mais novo, olhando para o mais velho, com um certo ar de deboche, embora estivesse intrigado com o que vira.

— Sim, eu senti...! — respondeu Saga levemente perturbado. — Se era apenas isso, já sabe. O que foi? Ficou preocupado de repente? — completou com dentes cerrados e fitando o irmão de lado. — Aliás, o que está fazendo aqui? Não disse que era cada um por si? Ou por acaso veio me pregar alguma peça, Kanon? — e riu daquilo, levando a mão à testa, jogando o cabelo para trás. — Claro...! Por que não... Não seria a primeira vez a fazer isso.

Kanon estranhou aquilo vindo de Saga. O irmão o conhecia bem, podia ser desconfiado de seus atos, mas nunca lhe perguntaria ou insinuaria algo daquele modo.

— Ah, desculpe por vir aqui novamente, senhor certinho. — e fingiu uma reverência. —  Pode deixar que eu vou embora, para que você tenha o seu sono de beleza... — e levava a mão ao rosto numa falsa massagem. — Para que ninguém te veja com olheiras nesse rostinho bonitinho amanhã.

Saga o viu se retirando, resmungando qualquer coisa, e virou o rosto, levando a mão à boca.

— Aiolos encontrou Halfeti. — comentou, ainda de costas para o irmão. — Ele encontrou pistas que o levou ao Halfeti de Peixe... e levou Selene com ele.

Kanon interrompeu seus passos. Hesitou por alguns instantes e o fitou por cima dos ombros com indiferença.

— É?! — Kanon deixou escapar, mas logo se recompôs. — E-e o que eu tenho com isso? Não tenho mais nada a ver com ela ou... ou com qualquer coisa daqui, desse Santuário. Cansei de brincar de soldadinho.

Saga apenas olhou-o de canto, nada mais disse. Conhecia bem o orgulho do irmão, e exatamente por isso sabia que aquelas palavras não eram assim, tão sinceras como ele gostaria que soasse.

Ouviu seus passos, e somente então quando estavam longe que Saga se voltou em direção dele, vendo-o ganhar o pátio de Gêmeos. Recostou-se numa pilastra e se deixou escorregar. Jogou levemente a cabeça para trás e batendo por duas vezes. Finalmente a voz havia se calado.

Uma vez no pátio, percebendo estar sozinho, Kanon praguejou mentalmente, fechando o punho e socando o ar antes de levar as duas mãos à cabeça.

“Halfeti... seu maldito! Que aquele periquito dourado traga sua cabeça numa bandeja... Pois era exatamente o que pretendia”. Olhou em direção ao céu, vendo a constelação de Pyxis e engolindo a seco.

— Selene... eu espero que você volte bem. Ou o meu irmão vai ficar mais insuportável do que já é. — Rezou Kanon bem baixinho.

 

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— O que foi, Aiolos de Sagitário? Parece assustado... — e movia a mão, fazendo os ramos se moverem, mas sem fazer menção de ataque. — Você conhece, não é mesmo? Pela sua expressão...

— Esse hino é... é de... — tentava dizer, mostrando uma expressão pálida e olhos arregalados. — Então é isso? Você traiu Athena por...

— Não sou eu quem deve ser chamado de traidor aqui, Sagitário... — e sorriu. — Ao menos, não mais serei enganado... Diferente de vocês que continuam a querer se manterem cegos ao que está tão evidente...

— Maldito... — Rosnou o sagitariano, trincando os dentes tamanha raiva e decepção. — Você... O que você ganha com isso?! Athena é a deusa responsável pelo bem-estar dos homens! Qualquer outro apenas visa a extinção dos humanos ou a sua dominação!

Halfeti iniciou uma salva de palmas, caminhando alguns passos mais próximo de Aiolos. Exibia uma falsa admiração por aquele discurso, como se estivesse maravilhado e permitindo que rosas se desabrocham bem mais próximo a ele.

— Que belo discurso ensaiado. Estou realmente comovido por isso, Aiolos. Agora, refresque bem minha memória... — e o fitou incisivamente, com seus olhos arregalados e carmesim. — Quantos Cavaleiros padeceram nessa luta de Athena contra os deuses para se valer de sua vontade? — e riu de sua própria pergunta. — O Sepulcrário de Athena, era o que deveria se chamar aquele lugar. Fala de dominação dos outros deuses, de extinção humana... e por quem esses deuses ‘tiranos’ que tanto ouvimos falar seriam adorados?

Mas Aiolos não respondeu. Limitou-se apenas a fechar os punhos com força e cerrar os olhos, injuriado com tamanha heresia e escárnio. Completamente avesso ao Halfeti que um dia ele conheceu e admirou.

Aiolos bem lembrava daquele Cavaleiro, que era um defensor das leis do Santuário e praticamente uma referência, ao lado de Sólon de Gêmeos, os últimos Dourados da sua geração. O próprio Sagitário foi um aprendiz dos dois e ambos muito ajudaram quando chegou junto com seu pequeno irmão Aiolia. Ouvi-lo dizer aquilo era surreal demais. Nem mesmo quando cometeu tal ato pareceu aturdi-lo tanto quanto ouvir tudo aquilo.

— O que diabos aconteceu com você? — Questionou o rapaz atordoado pela raiva e pelo pólen das rosas. — Quando foi que você mudou tanto?!

— Eu despertei para a verdade, Sagitário. Estava cego... surdo e mudo, não pelo perfume desse meu jardim de rosas, mas por sua ignorância! — comentou Halfeti mexendo os dedos e concentrando um mínimo de Cosmo e atraindo pólen das flores, algumas folhas e pétalas e criando uma rosa mista vermelha e negra em sua mão. — Demorei, mas percebi o quão tolo estava sendo servindo de joguete de uma deusa a brincar com humanos que tanto a enaltecem... Não serei apenas mais um, Aiolos.

— ‘Mais um’ de quê?! Do que está falando...?! — Questionou o rapaz.

— Enganado por uma deusa mimada e egoísta! — cuspiu Halfeti, com um tom de voz mais forte e dura. — Será que não percebe, Aiolos? Sólon tinha razão...  Athena não é uma deusa, mas uma humana que brinca de ser deusa e usando a nós, meros humanos, para sua diversão jogando-nos contra deuses, de morrermos por ela em inúmeras batalhas para ganharmos uma pedra com nosso nome? Não... Não é isso que quero. Quero a minha glória, e não será por Athena que terei meu reconhecimento.

— Fala como se Athena fosse a grande vilã em tudo isso quando você tantas vezes a defendeu e ansiava por seu retorno... — comentou, quebrando seu silêncio após alguns minutos assimilando aquelas palavras. — Não acredito que possa estar ouvindo isso de alguém que sempre foi tão leal e um exemplo para tantos aprendizes... — Aiolos lamentou, negando acreditar naquilo que ouvia.

— Não podia mais fingir, Aiolos. — respondeu com um semblante mais sério. Tinha os olhos fechados como se tentasse lembrar daqueles anos no Santuário. — Não podia mais suportar viver uma mentira, uma ilusão, uma utopia! — e sorriu de canto, mordiscando os lábios, deixando um filete de sangue escorrer. — Ele me despertou para a verdade e tentei ajudar Sólon que se negou a isso. Ele sabia da verdade, mas queria manter-se imerso em tudo aquilo... Enganando você e a todos os outros. Não entende? Eu tentei salvá-los!!

As palavras de Halfeti soavam esperançosas. O brilho em seus olhos denotava um desejo mesclado à decepção como naquela ocasião.

Diante do Grande Mestre, julgado como conspirador, rejeitado pela própria Armadura de Ouro de Peixes, foi ele quem se sentiu traído por todos, principalmente pelo amigo que o denunciara ao Patriarca do Santuário. “NÃO PODEM ME SILENCIAR! ELES PRECISAM SABER A VERDADE!!”, foi o que ele gritou para todos mesmo trancafiado em sua cela.

— Hipócritas! — respondeu reabrindo os olhos, ainda intensamente vermelhos e ainda mais sombrios. — Buscaram calar-me para que não proferisse a verdade daquele lugar. Eu tentei salvá-los, Aiolos. Se existe um traidor aqui, esse traidor não sou eu. Condenaram o homem errado...!!!

Uma luz foi a resposta para uma pergunta que não existiu. Foi uma reação impulsiva com uma rajada de luz em sua direção que obrigou Halfeti abrir caminho, pela primeira vez, para a entrada para a outra câmara, onde Selene havia seguido.

Aiolos o fitava transtornado e transformado em virtude das palavras ácidas e heréticas ditas pelo Cavaleiro Negro à sua frente. Halfeti ganhara o outro lado, auxiliado por seus ramos que criaram um escudo protetor que se tornara uma escultura de cinzas, desfazendo-se com leve bater de asas do Dourado.

— O que foi, Aiolos? A verdade dói, eu sei... Como acha que me senti ao ser jogado diante dela, de maneira tão dura e crua? — e riu daquilo. — É uma reação até aceitável, mas posso ajudá-lo se assim quiser.

— Ajudar a mim? Eu não preciso de sua ajuda! Não preciso da ajuda de alguém que matou covardemente o melhor amigo. — Aiolos falou, desgostoso com aquilo. — Halfeti de Peixe Negro, você foi banido do Santuário por assassinar um Cavaleiro de Ouro e por conspiração! A sua veste sagrada ter lhe abandonado não é nada menos que a prova de seu crime maior!

— Ah, sim. Existe, Aiolos. Não existe crime maior que se manter cego para a verdade! De ser enganado, de mentir para atingir um objetivo pessoal. — disse ele em tom incisivo e levantando as mãos.

Foi um comando que surpreendeu Aiolos, principalmente por ver o jardim que ele havia criado naquela câmara responder tão prontamente. Os ramos envolveram seu pé, prendendo-o até quase acima dos joelhos, ao mesmo tempo que redemoinhos de pétalas circulavam seu corpo e concentrando a nuvem de pólen sobre o Dourado. Era quente e sufocante. Aiolos sentia a garganta queimar conforme aspirava aquilo sob o riso de Halfeti, assistindo a cena como se fosse uma obra de arte.

“N-Não... Não consigo... me mover...! O meu c-corpo... n-não me obedece...!”, pensou Aiolos buscando ar, tentando soltar-se, mas em vão. Do pouco que conseguia ver naquela bruma de pétalas vermelhas, alguns pontos negros envolvendo suas asas, como se estivessem a corroê-las, pouco a pouco.

— Uma pena, Aiolos... Seria uma grande aquisição, mas isso não será nenhum problema. — e Halfeti saltou de volta ao nível onde estava Aiolos, ainda segurando uma metade da máscara da Amazona de Prata. — Se assim deseja morrer por uma deusa assassina, farei sua vontade, mas... — pausou em suas palavras, esperando encontrar os olhos do Cavaleiro, lacrimejando por estar se sufocando, com a mão na garganta. — Cuidarei para que a sua amiguinha e o seu pequeno irmão não sejam envolvido em toda essa farsa de Athena!

Halfeti jogou a capa para o lado e deu uma volta sobre o calcanhar, caminhando em direção da entrada do túnel que levava a próxima câmara. Não havia o que realmente se preocupar. Se ele sentiu, certamente os dois também sentiram e ele já havia dado conta da Amazona de Prata. "Aquele rostinho, a personificação da inocência...", e riu ao lembrar-se do pequeno.

"Serei imensamente reconhecido, integrando suas fileiras após impregnar essa gema que trago comigo", pensava, olhando para pedra que brilhava no cinto de sua armadura negra. Ela respondia ao seu comando, permitindo mais poder exatamente como havia sido prometido.

"Finalmente serei mais que um mero peão...", pensava, até que arregalou os olhos, tendo seus cabelos esvoaçando com a rajada de vento que sentiu às suas costas. Halfeti virou primeiramente os olhos, depois a cabeça, arregalando os olhos com o que assistia.

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Selene estava caída no chão, inconsciente. Os braços estavam dobrados para frente, o cabelo espalhado e nublando sua face nua da máscara. Próximo a ela, alguém se aproximava e mantendo-se ali, observando-a quando o braço esticou para frente e a mão abrindo-se.

Girou-a como se trouxesse algo no ar e uma dúzia de ramos surgiu envolvendo completamente o corpo da Amazona que nem ao menos se moveu, desaparecendo completamente numa espécie de casulo.


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Notas finais do capítulo

Gostaria eu que as atualizações fossem semanais, mas meu perfeccionismo me impede de publicar qualquer coisa somente por postar. Eu pesquiso, reavalio as conversações de modo a permitir que visualizem toda a cena, sintam cada emoção dos personagens, e quando se cria personagens como Halfeti de Peixes a coisa complica ainda mais porque quero moldar sua personalidade, nascer um personagem e não um 'bonequinho de pau'.

Espero que estejam gostando dele (ou detestando, sabe-se lá!) e comentem sobre o que estão achando, tudo bem? XD

No próximo capítulo, a decisiva luta de Halfeti de Peixes x Aiolos de Sagitário.
E o que houve com Selene de Pyxis? Aguardem!!



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