Saint Seiya Memórias: História Oculta Do Santuário escrita por Katrinnae Aesgarius


Capítulo 43
Livro 2 :: Dualidade - Ato 4


Notas iniciais do capítulo

Selene e Aiolos estão diante de um inimigo banido e condenado do Santuário: Halfeti de Peixe Negro. Porém, o lugar guarda mais perigos que nem mesmo podem imaginar.



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O som de seus passos era firmes. A sua indumentária reluzia mesmo com a pouca luz daquele ambiente, mas não tanto como seus olhos fixos nos dois Cavaleiros diante dele. A armadura negra era idêntica a dourada da qual Selene tantas vezes viu em Peixes em sua forma verdadeira, mas irradiando algo do qual a Prata não saberia explicar o que era.

"Há uma mescla de ódio, rancor e mágoa nessa armadura. Não sinto a espiritualidade como de outras... Eles não parecem como se fossem um, mas como se a indumentária parecesse... um parasita!", pensava Selene.

— Tornou-se um Cavaleiro de Ouro, Aiolos... — respondeu malicioso. — ... um Cavaleiro digno e honrado como ele sempre disse. Eu me pergunto se algum daqueles moleques também tenha herdado o legado dele, e se sim, porque não veio com você. — sorriu, com escárnio.

— Sinto decepcioná-lo... — mentiu Aiolos mantendo um semblante sério e olhar incisivo sobre Halfeti, sem piscar. — Não permitiria que o destruísse. Sei bem do que ele é capaz de fazer se o encontrasse, mas jamais deixaria que ele sucumbisse ao ódio por matar o mestre deles!

"Ele...?”, questionou Selene tentando imaginar de quem estavam a comentar, mas não era difícil concluir sobre quem estavam falando. De repente, a sua mente foi tomada por uma conversa um tanto tensa entre os dois irmãos que não perceberam quando ela chegou, podendo ouvir o que falavam com tamanho desprezo e ódio.

"Eu não teria piedade alguma se um dia o encontrar, Saga! Eu vou fazê-lo sentir dor de cada osso que esmagaria com meus punhos pelo que ele fez!", ouviu Kanon comentar fechando os punhos e destruindo a pedra que tinha em mãos, transformando-a em poeira. Saga estava ao seu lado, de braços cruzados, um semblante igualmente pesado e um olhar frio — uma imagem jamais vista até então do geminiano.

"Isso seria pouco pelo que ele fez. Se um dia o encontrar, não é alguém que mereça qualquer misericórdia...!", comentou Saga com uma tranquilidade na voz que fez Selene estremecer naquele momento, deixando a comida que trouxera aos dois ir ao chão.

Quando seus olhos recaíram sobre Halfeti, o semblante de Aiolos, o que ele contou sobre a Armadura... Aquilo a perturbou profundamente.

"Abandonado por armadura... o assassino do Cavaleiro de Gêmeos... um condenado do Santuário... Este é Halfeti de Peixes...? Agora, Cavaleiro Negro de Peixe?!", pensava Selene com seus olhos se voltando para ele.

— A jovem à sua costa parece bastante perturbada... — dizia ele inclinando a cabeça para fitar Selene com um sorriso sedutor, brincando com a rosa negra em suas mãos. — Foi ela quem o trouxe aqui, não é mesmo, Aiolos de Sagitário? Não imaginei que alguém seria capaz de seguir tão bem meu rastro, mas espero que aprecie o perfume de rosas!

Selene franziu o cenho, mas logo compreendeu o que ele quis dizer quando observou o chão. De repente, o chão arenoso e de pedras ganharam musgo sem que nem ao menos percebessem. Apenas próximo de Halfeti havia alguma vegetação mais rasteira. "Ele está criando...".

— Um jardim de rosas! — comentou Aiolos percebendo o que ele fazia, completando as palavras de Selene como se lesse seus pensamentos. — Todo o lugar está se transformando num jardim de rosas...!

— Não achou que os deixei chegarem aqui assim, tão deliberadamente, não é mesmo? — e seu sorriso desapareceu, dando lugar uma seriedade sombria. — Pensei enterrar aqueles dois, mas... — e deu de ombros. — De toda forma, enterrarei aqui seus corpos, tendo comigo a Armadura de Ouro como espólio... e uma de Prata como brinde.

Todo o lugar transformava-se realmente num jardim, e Aiolos e Selene observavam aquilo surpresos.

— Ele está criando seu jardim de rosas venenosas... — sussurrava Aiolos para Selene enquanto apontava para as primeiras rosas a nascerem meio ao lugar que ganhava uma beleza mortal. — Digna daquele que foi o Guardião da última Casa Zodiacal.

— Eu recolheria as asas se fosse você. — disse Selene vendo mais e mais rosas se abrirem naquele momento, chegando até eles. — O bater de suas asas elevarão ainda mais o pólen... — e Selene se voltou para ele, vendo o ensaio de um sorriso. — Ele planejou isso desde o início, e num espaço fechado como este...

— Logo irão liberar o perfume que vai inibir, gradativamente os nossos sentidos...! — disse levando o braço frente ao rosto.

Ambos ouviram Halfeti rir, caminhando alguns passos e abrindo os braços. Ele aspirava o perfume que começava a impregnar aquela câmara com uma satisfação que acabava por aterrorizar os dois Cavaleiros já sentindo os primeiros sintomas.

— Por que não apreciam o perfume de minhas rosas? Não fariam uma desfeita assim para mim, não é mesmo? — fez uma falsa expressão de lamento, levando a mão direita ao peito. — Jamais verão rosas mais belas que essas que estou oferecendo a vocês.

Aiolos cerrava os dentes enquanto ouvia aquelas palavras tão ácidas. Havia feito uma promessa... Não. Duas promessas e não poderia quebrá-las. Uma era de que cuidaria que nada acontecesse a Selene, outra de que voltaria para seu pequeno irmão Aiolia. O Sagitariano não era do tipo que voltava atrás em sua palavra, e havia feito uma terceira com a própria Prata ao seu lado.

— Aquela câmara... deve levá-la até aquele... que nos trouxe aqui... — dizia ele cobrindo parcialmente seu rosto com a máscara providenciada de seu elmo e recolhendo as asas como havia sido aconselhado pela amazona. — Precisa seguir em frente...!

"Aiolos...!", pensou ela se voltando para ele. A sua máscara oferecia certa vantagem naquele momento, mas não seria por muito tempo. As habilidades de seu parceiro de missão era o vento, algo da qual Halfeti buscou garantir debilitá-lo ao máximo com aquele ardil armadilha.

— Aiolos, você não está em condições... — dizia quando foi interrompido por ele.

— Lembra do que combinamos. — disse a fitando por de trás de sua máscara. Ela percebeu que ele sorria com os olhos. Estava confiante. — Cumprirei a minha parte do acordo. Abrirei caminho pra você.

— Mas se usar seu golpe de vento... — Selene estava preocupada com ele. Era um suicídio.

— Eu tenho um plano. — dizia enquanto se voltava para o Peixe Negro diante dele, ansioso por uma investida dos dois.

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A vela tremulava a cada instante, conseguindo iluminar suficientemente o ambiente anunciando que a noite já estava a cobrir o Santuário. Sem mais cabeça para continuar a fazer aquilo, a pena foi largada sobre a mesa e o corpo jogado para trás. Os olhos verdes profundos estavam fixos num ponto qualquer como se esperasse alguma providência.

Quando passos ecoaram, piscou arregalando os olhos ansiando que suas preces tivessem sido atendidas. "São eles!", pensou engolindo a seco quando viu a porta ser aberta e frustrar-se com o que viu.

— Tudo bem, Saga? — comentou Mu com uma pilha de pergaminhos em mãos. — Posso estar enganado, mas não pareceu feliz quando me viu. — sorriu com simpatia.

— Não, nada contra você. — suspirou, levando a mão aos cabelos. Desceu o braço e apoiou-se na mesa cruzando as mãos. — Apenas achei que era Aiolos, retornado da missão. "Junto de Selene... em segurança... Não aguento mais essa espera infernal!".

— Eu também estou preocupado, não vou mentir. — disse ele aproximando-se e deixando o que trazia sobre a mesa dele após sua permissão. — Afinal, minha 'irmã' está com ele e tenho razões de sobra para estar preocupado. — sorriu. — Mesmo sabendo que ela se sairá bem.

Saga sorriu para Mu, agradecido por ser ele a tocar no assunto sem precisar que ele tocasse no nome dela. Sabia bem da relação entre eles. Tão logo havia os três — Selene, Kanon e Saga — se encontrado, foram horas de conversa para repor aqueles últimos anos afastado.

Embora tivessem passado algumas semanas juntos desde os gêmeos a encontraram, ao menos Saga sentiu-se responsável por ela. Kanon culpava-se pelo que aconteceu por mais que não admitisse, mas vendo-o desculpar-se e chorando nos primeiros dias. Ela contara seus anos em Jamir, ansiando por um dia reencontrá-los.

— Vocês têm uma ligação realmente forte. — comentou, logo percebendo o cuidado com suas palavras sem que denunciasse a relação entre eles. — Lembro quando ela ficou em Áries quando aconteceu... aquilo.

— Selene e eu temos certo parentesco. — Mu franziu o cenho. — O pai dela era um lemuriano da linhagem de minha família. — e deu de ombros. — Ela é uma prima distante, digamos assim.

— Apenas acho que ela não estava preparada para uma missão sendo que há pouco sofreu aquela... vertigem. — disse injuriado. Ao perceber os olhos de Mu, completou em seguida. — Por mais que Aiolos seja experiente...

— Quanto isso, não tenho o que me preocupar. — Mu sorriu confiante. — Selene é habilidosa, não a subestime. Se ela foi nomeada para esta missão, não foi ao acaso. — e franziu o cenho. — Se conheço bem, Aiolos também não permitirá que nada aconteça a ela e ambos chegarão bem.

Saga assentiu. Sabia bem de o porquê Selene ser escolhida e do quão apta era. Havia se tornado uma Amazona de Prata, embora em seu teste mostrou uma força bem acima disso ainda que num breve segundo. Entretanto, havia uma questão delicada e isso poderia causar um grande problema. "Não posso pensar nisso. Preciso confiar nela... mas principalmente em Aiolos garantir que ela chegue bem.", pensou o geminiano.

— Aliás, vim aqui deixar esses documentos do Mestre Arles na mesa de Aiolos... — disse apontando os pergaminhos que deixara sobre a mesa.

— Eu guardo. Aiolos deixou certa bagunça em sua mesa por conta de suas pesquisas... — disse Saga olhando em direção da sala e rindo. — Está numa busca e deixou tudo separado para continuar de onde parou e é melhor manter assim.

Ambos riram daquilo, deixando combinado que o Geminiano guardaria os documentos e o jovem lemuriano se despedindo. Saga ainda ficou sentado à mesa, decidindo se voltaria para Gêmeos ou faria um patrulhamento para distrair sua mente. Antes, guardaria aquilo na sala onde o Sagitariano trabalhava.

Removeu as vestes oficiais e apanhou alguns cones e livretos junto com material trazido por Mu. Olhou para o quadro onde Aiolos traçava um mapa de localizações, diversas pregações da qual estava ainda mais confuso que a primeira vez que viu.

"Então ele encontrou mais pistas", pensou ele enquanto deixava a pilha numa pequena mesa de canto quando sentiu ter derrubado algo no chão.

"Esse perfume...", pensou Saga olhando à sua volta, aspirando mais forte como se buscasse a fonte daquilo. Nada havia de suspeito sobre a mesa até derrubar um livreto de capa de couro. Em primeiro instante não percebeu, até que viu algo que o deixou estático.

Era uma rosa já ressecada, mas com um perfume forte característico. Os seus olhos se arregalaram naquele momento e sua respiração tornou-se pesada, falha. Fechou o punho e um Cosmo concentrou-se de tal maneira que fez aquela rosa se tornar cinzas.

Agora entendia tamanho segredo de tudo aquilo e não podia acreditar naquela possibilidade.

— Halfeti...!

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Os dois Cavaleiros estavam lado a lado diante do Cavaleiro de Peixe Negro. A estratégia de Aiolos era simples, mas também arriscada para o que pretendiam. A maior preocupação era a performance de Selene naquele momento e nas dificuldades para executá-la e nos resultados. De resto, ficaria por conta de Aiolos.

"Eu ficarei bem", foi o que ele disse, complementando que tinha não uma, mas três promessas a cumprir.

— Está pronta? — comentou ele fechando o punho e concentrando seu Cosmo mediante o aceno positivo da Prata. — Você terá um centésimo, um décimo de segundo antes que ele reaja. — sussurrou para ela e colocando-se em posição de ataque.

Halfeti apenas sorriu de canto.

— TROVÃO ATÔMICO!

Após concentrar uma grande energia em uma das mãos, disparou uma rajada reluzente em direção de Halfeti fazendo o mínimo de movimento sobre o jardim da qual pisava. Não houve qualquer movimento visível do Cavaleiro Negro naquele primeiro instante senão 'esquivar-se' das rajadas que surgiam à centenas diante dele.

"Uma ilusão...?!", pensou ele quando viu um vulto sobre ele e sorriu. "Nem tão rápido, garota", e arremessou sua rosa em sua direção.

Selene havia esperado o momento oportuno para avançar em direção de Halfeti, esperando-o 'cegar-se' pelo ataque de luz e então saltar sobre ele.

Não seria uma investida que o enganaria tão facilmente, principalmente quando percebesse o truque de Sagitário. Exatamente como esperado, ele a atacou com a rosa negra que trazia em mãos, mas ela estava preparada para reagir se fosse preciso.

— ESCUDO REFLETOR!

Selene virou-se no ar, utilizando de sua técnica de alterar o campo gravitacional à sua volta e conseguir estabilizar-se, permitindo, então, criar um escudo e repelindo a rosa de Halfeti.

Entretanto, ainda que ela tenha se desfeito em inúmeras pétalas que voaram ao choque, as mesmas emitiram um brilho carmesim que alertou o perigo na Amazona de Prata.

As pétalas reagiram e voaram livre em sua direção e desapareceu de seu campo visual. Foi como há poucos instantes quando atacadas por aquelas mesmas pétalas. Selene tentou esquivar-se, sentindo algo queimar sua face e sendo forçada a desaparecer sob o olhar atônito do Cavaleiro Negro.

— Ela de... desapareceu...? Aquilo foi...teleporte?! — comentou Halfeti sério, piscando aturdido até ouvir um objeto cair próximo aos seus pés. Abriu um sorriso ao compreender o que tinha acontecido. — Claro... Muito esperto, Aiolos. Distraiu-me para abrir passagem para sua companheira.

— Esse embate é entre nós dois, Halfeti. — comentou Aiolos recolhendo o punho e acalmando o Cosmo que havia concentrado. — Ao menos um de nós cumprirá o objetivo dessa missão.

O Cavaleiro Negro se encontrava de costas para o Dourado. Não havia por que preocupar-se com um eminente ataque com alguém tão honrado como era Aiolos, agora o Cavaleiro de Sagitário. Era alguém que fazia valer o código de honra dos Cavaleiros, diferente dele que não perderia se houvesse uma oportunidade.

— Não contaria com isso se fosse você, Sagitário... — e mostrou parte da máscara de Selene em sua mão, mantendo-se de costas para o Dourado. — Mesmo que tenha se teleportado daqui, não deixou de receber algumas de minhas pétalas, e elas estão tão venenosas quanto essas nesse belo jardim. — e olhou por cima dos ombros em direção de Aiolos.

Aiolos ficou estático ao ver a máscara de Selene, cortada ao meio, nas mãos de Halfeti, sentindo o sangue gelar. Seus olhos se arregalaram na possibilidade de a Amazona ter sofrido os golpes meio ao teleporte. Ela seguiu seu plano e isso poderia tê-la comprometido gravemente.

O Sagitariano denotava desespero em seus olhos, notado por Halfeti quando o olhou por cima dos ombros, vendo aquele olhar já que parte da proteção facial oferecida pela indumentária dourada foi removida.

— Posso ser agora o Cavaleiro NEGRO... de Peixes, mas serei o eterno guardião do último templo zodiacal, a última fortaleza a guardar o Templo do Patriarca que garantia a imunidade da deusa Athena. — e virou-se para Aiolos, ainda com a máscara em mãos. — Acredita mesmo que ela passaria assim por mim, tão livremente? — e arqueou o semblante.

Os olhos de Aiolos estremeceram e ele cerrava os dentes ouvindo aquilo. "Não, não posso me deixar ser facilmente persuadido por ele. Preciso confiar em Selene", pensava Aiolos buscando manter foco e concentração sobre Halfeti. "Selene... fique bem. Alguém espera por você!"

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Quando em Jamir, Selene descobriu que era capaz de teleportar-se assim como seu primo-irmão Mu. Fatigava-se mais rápido, mas ainda era capaz de realizar o feito a grandes distâncias desde que conhecesse o espaço. Era uma regra simples que garantiria a sua segurança.

"É preciso saber para onde vai, que tenha conhecimento do espaço e dos perigos nele existente. O cuidado visa não teleportar-se para uma parede, uma pedra ou qualquer algo sólido. Jamais faça isso para o desconhecido", havia recomendado Arles.

Entretanto, ela desobedeceu a essa lei.

Quando Halfeti lançou seu ataque, não esperava aquele trunfo, e seu escudo não foi suficientemente forte para conter sua investida secreta. Acabou por fazer o impensado e forçando um teleporte que a mandou para dentro do corredor guardado pelo Cavaleiro Negro. O baque contra a parede próxima ao teto onde surgiu, recebendo outra forte pancada na queda.

Contudo, aquilo era o menor dos problemas. Não fosse sua indumentária, teria recebido boa parte daquelas pétalas carmesim que ainda reluziam. Algumas poucas ainda atingiram seu braço e provocara um corte em sua testa, permitindo o sangue manchar seu rosto.

"Minha máscara...!", pensou ao tocar o rosto e sentir a falta dela, mas logo voltou-se para outras questões mais incômodas naquele momento. Ela arrancou as pétalas presas em seu braço, sentindo elas não somente queimarem como rasgarem sua pele por serem minimamente serrilhadas, e depois se tornarem cinzas.

"Degraçado...!", pensou ela, sentindo a forte queimação no braço enquanto recostava na parede, olhando para os dois lados do corredor e para o teto onde tinha a marca de seu choque. Engoliu a seco. Um pouco mais acima, estaria presa naquela parede e aquilo a fez estremecer. "Que o mestre Arles jamais saiba disso", e soltou um suspiro de alívio.

Levantou seus olhos ao ouvir sussurros ecoarem naquele corredor. Incompreensíveis, mas era como um chamado silencioso, acompanhado de uma pequena manifestação de Cosmo levemente perturbador que a fez arrepiar-se como num frio repentino.

"O q-que é isso...?!", perguntou-se quando pareceu ver uma sombra descendo aquele corredor. "Seria uma alucinação devido veneno de Halfeti?", e umedeceu os lábios, olhando a ferida e a mancha arroxeada em volta. Não somente havia absorvido o veneno naquela câmara como também poderia ter sido envenenada diretamente naquele ataque ardil de Halfeti.

"Digno daquele chamado o guardião da Casa de Peixes...!", pensou ela enquanto se levantava, escorada na parede. Sentiu uma leve tontura, mas conseguiu manter-se de pé. A imagem do corredor parecia distorcer diante dela, perdendo gradativamente a nitidez, vendo dois espaços, depois um.

O veneno já começa a fazer efeito. Ela riu contidamente pensando sobre que armadilha ele teria criado ali após o que fez no paço do templo mais acima para quem violasse seus domínios.

— N-Não posso me entregar... E-Eu fiz uma promessa...! — falava com tom fraco, sentindo a garganta ressecada.

E mais uma vez veio o sussurro, acompanhado de um vento quente que soprou daquele corredor. Ela repetia o que conseguia ouvir, mentalmente: "como os guerreiros da glória...". Os olhos de Selene reluziram intensamente em duas orbes como uma iluminada ametista. Caminhou guiada pelo que ecoava, descendo o corredor. Sentia-se cansada e a respiração vacilante.

"O que é isso que sinto desde que cheguei aqui? É como se esse lugar estivesse... vivo...!!", pensava olhando para o alto e ouvindo o grasnar ecoar e dois corvos passarem rasante sobre ela. Eram as mesmas aves que viu no paço, com seus olhos vigilantes à esquerda e direita de cada um. Pareciam segui-la, ao mesmo tempo guiá-la por aquele corredor até chegar a outra câmara. Os sussurros continuavam e ela repeti-las, mentalmente.

“... Para os deuses, os tributos...”

— Sinto mais forte agora... — murmurou, sentindo a voz cansada e o corpo febril. Tossiu, buscando ar, novamente umedecendo os lábios levemente ressecados. — S-Sinto sua presença... a mesma que me... me guiou... até aqui...!

A câmara era uma versão menor na de cima, mas totalmente fechada como se criasse uma estufa. Havia ali alguns pilares sustentando um grande bloco rochoso sobre sua cabeça. Dois outros acessos eram vistos, mas não levando a corredores como aquele que seguiu, mas como salas anexas. Olhando à sua volta com mais atenção da qual forçou-se naquele instante, compreendia que lugar seria aquele.

— Uma... t-tumba...? — comentou ela com respiração falha.

Selene olhou à sua volta, engolindo a seco ao perceber onde estava e notando algumas vinhas crescendo próximo às pilastras timidamente. Sob seus pés também surgiam discretos musgos, mas nada similar como aquele que viu no salão acima.

“O Cosmo está vacilante, como se ele estivesse com medo... Ouço seus soluços”, pensava Selene enquanto assistia aquilo e observando um fio de luz numa das salas daquele lugar.

— E-Eu não vou machucá-lo... — dizia ela caminhando alguns passos em direção da sala, mas sentindo uma reação no Cosmo conforme tentou se aproximar. — V-Você... me guiou até aqui...

“Vai embora!”, ecoou através do Cosmo. Era uma mistura de medo e raiva naquelas palavras que alertaram os sentidos de Selene por mais confusos que estavam em virtude do veneno.

Foi quando percebeu algo sobre sua cabeça e se teleportando alguns segundos antes de ser presa por uma rede de trepadeiras entrelaçadas. Voltou sobre o mesmo ponto, sobre a armadilha que caiu sobre o chão.

— O chão... está sendo forrado por... rosas...?! — comentou ela olhando como aqueles ramos passaram a se multiplicar por toda a sala. Diferente da câmara anterior, não exalavam qualquer perfume, mas se mostrava igualmente uma ameaça. — Por que...?! Por que está fazendo isso?!

Não houve resposta pelo cosmo, mas na reação dos ramos, desta vez daquelas que subiam as pilastras e mostrando um fio que fez Selene arregalar os olhos. Seu tempo foi somente de invocar um escudo contra a força esmagadora que a pressionava. "E-Eu... não c-consigo...", e novamente se teleportou, surgindo do outro lado da sala. Pouco tempo teve de se restabelecer senão saltar contra o ataque simultâneo de três tentáculos de ramos com espinhos afiados.

— JÁ CHEGA! — exclamou Selene concentrando o Cosmo em seu punho e criando uma explosão luminosa fazendo os ramos se desintegrarem, outras se recolherem. — Não estou aqui para feri-lo. Eu...

E sentiu um pulsar em seu corpo, novamente os sussurros, um hino ecoando em sua mente.

"Que o grito dos derrotados seja a canção de nossa vitória...".

Inúmeras vozes voltavam ecoar, junto com bradar de espadas. Todo o cenário à sua volta se transformou, como se a câmara tivesse sido tomada por uma neblina e nela criasse imagem de um campo de batalha e o chão estava tingido em vermelho. Tão logo viu uma sombra se projetar, fazendo-a levantar a cabeça e ver o vulto sempre presente em seus sonhos com seus olhos em chamas. Ele levantou suas mãos para tocá-la, enquanto Selene recuava temerosa pela magnânima presença.

O Cosmo envolveu o corpo de Selene, ressonando intensamente, refletindo no vulto que 'estremecia' em resposta ao seu Cosmo. Todo o lugar parecia responder a isso, até que a imagem à sua frente implodiu e dissipando a neblina que havia tomado aquele lugar enquanto que Selene caia sem forças sentada sobre as próprias pernas. Foi então que percebeu que estava esvaindo em sangue das feridas pelas pétalas de rosas.

— Droga...! Preciso dar um jeito nisso... — Ela murmurou para si, antes de voltar-se ao redor. Tinha que descobrir onde a fonte daquele cosmo que a atraiu estava. — E-escuta... Eu não quero te machucar. Só... só quero conversar...!

Selene já se sentia bastante debilitada pelo veneno, agora também pela perda de sangue. Os sussurros em sua mente haviam se dissipado, mas ainda tinha os sentidos confusos o bastante para não perceber que a rede de ramos que escapara de outrora prendera suas pernas, impedindo-a de qualquer movimento.

Quando intencionou soltar-se com um ataque cinético, seu braço foi envolvido por outros ramos de roseiras. Logo seu corpo era envolvido dos pés à cabeça, deixando apenas parte do tronco e cabeça ainda livres, embora eles se multiplicassem envolvendo-a cada vez mais.

"Eu disse para ir embora", alguém falou via Cosmo, chamando atenção de Selene pela melancolia em sua voz. Sentiu ainda o Cosmo tornar-se mais forte e concentrado, refletindo naqueles ramos que parecia drenar o pouco das forças que ainda tinha e seu corpo pender para frente. Viu então os pés descalços sobre a grama de espinhos e rosas brancas que eram tingidos pelo sangue da Amazona.

Selene levantava a cabeça e o corpo com dificuldade devido a força exercida pelos ramos, mas somente viu o rosto sombreado pelos cabelos cheios e ondulados alourados. Em sua mão, trazia uma rosa negra, tal como Halfeti tinha em mãos.

"Não permitirei que saia daqui com vida...!", disse ele, mais uma vez, via Cosmo. Selene cerrava os dentes, sem conseguir se mover. Viu-o levantar a mão, preparando a rosa para golpeá-la, vendo o brilho dos olhos de seu algoz reluzir para ela.

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Kanon se levantou num pulo ao sentir aquela 'explosão' de Cosmo tão familiar. Estava sentado próximo ao anfiteatro à sombra de uma pilastra quando viu uma estrela cadente cortar uma constelação. Não era a primeira vez que sentia aquilo, embora foi apenas um lampejo.

"A última vez que senti isso... foi no teste...", pensava ele tentando resgatar de sua memória e arregalando os olhos ao se lembrar.

No Monte Zodiacal, o elmo de Gêmeos estava caído no chão bem próximo aos pés do Dourado. Havia sido deixada ali após aquela 'explosão' de Cosmo aturdi-lo e seus olhos se voltarem para o horizonte, onde a constelação de Pyxis parecia indicar o caminho de sua escolhida.

Saga estava no pátio da Casa de Gêmeos, e seus pensamentos só tinha um alguém.

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— Selene...? — comentou Aiolos removendo a máscara que cobria seu rosto, interrompendo sua manobra de ataque ao perceber aquele choque de Cosmo que 'explodiu' no último segundo.

Nem mesmo Halfeti foi capaz de ignorar em sentir tamanho poder que 'explodiu' naquele momento, acabando por recuar em seu ataque. Há pouco, ambos os Cavaleiros sentiram uma força abalar as estruturas do templo como se estas reagissem algo, mas não foi suficientemente forte como aquela surpreendendo-os.

"Jamais senti algo assim antes... Não! Eu já senti isso, mas há muito tempo...", lembrava-se Halfeti olhando em direção do corredor por cima dos ombros. Seus olhos se voltaram para seu oponente e ele somente levantou o braço como se expulsasse algo qualquer, e uma rede de ramos impeliu Aiolos de avançar como intencionou fazer naquele breve momento de distração.

— Nossa luta ainda não terminou, Aiolos. — comentou Halfeti voltando-se para o Dourado. — Subestimei aquela Amazona, mas não é alguém a quem tenho que me preocupar. — e sorriu de canto. — Ao menos não mais. Vejo que serei muitíssimo recompensado agora.

— Do que está falando, maldito? — indagou Aiolos resignado.

— Que o grito dos derrotados seja a canção de nossa vitória... — declamava Halfeti abrindo os braços e de cabeça baixa, olhos fechados. Aiolos apenas franziu o cenho ouvindo aquilo. — Com a qual dançaremos ao redor de suas ruínas...! — e o Peixe Negro levantou a cabeça, exibindo olhos vermelhos e bestiais.

Aiolos arregalou os olhos para aquilo, perplexo com o que assistia.


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Notas finais do capítulo

Primeiramente quero me desculpar com todos pelo hiato da fic. Não ficarei me justificando, mas estou retornando para mais uma tríade de capítulos das quais prometem ser intensas e com uma grande batalha e revelações. Porém, desde já agradeço a todos que me acompanham até aqui, todas as mensagens perguntando se tinha parado e dedico a todas vocês. Obrigada pelo apoio. :)



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