Universo Em Desequilíbrio escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 6
Bem vinda ao novo lar




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Quando o carro da mãe da Mônica chegou ao bairro, Cebola, Cascão e Magali esperavam com expectativa para conhecerem seus duplos.

— Como será o Cascão do outro mundo? Aposto que deve ser maneiro pra caramba, que nem o papai aqui!
— E o outro Cebola deve ser o dono da rua! Rapaz, se bobear ele deve ser dono de todas as ruas do bairro!

Ele sorria imaginando a si mesmo como um sujeito forte, seguro, valente e que mandava em todo aquele bairro. Tudo o que ele teria sido caso a Mônica não tivesse aparecido na sua vida. Que coincidência... no dia anterior, ele estava exatamente pensando sobre como seria sua vida sem a Mônica e agora ele ia ter a oportunidade de ver tudo em primeira mão. Será que ele já tinha dominado o bairro inteiro? Ou talvez toda a cidade?

— Pois o meu duplo deve ser uma garota linda, meiga, gentil, simpática que adora gatos e boa comida!
— Uma cópia de você... – Cascão falou com desdém. Que falta de criatividade!
— Ué, não tem como ser diferente, tem? Minha natureza é essa, então a do meu duplo deve ser igualzinha. Eu mal posso espera pra conhecê-la!

Os jovens ficaram comentando como seriam seus outros “eus” no universo paralelo enquanto Astronauta acompanhava a conversa em silêncio. Ele não estava muito preocupado já que seu estudo dos universos paralelos tinha mostrado que as pessoas tinham essencialmente as mesmas personalidades mesmo nascendo em mundos diferentes. Aqueles jovens não iam ter nenhuma surpresa.

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Quando o carro entrou na sua rua, por um instante ela suspirou aliviada. No entanto, seu suspiro foi cortado no meio quando o carro passou direto por sua casa.

— Mãe, a gente não passou do ponto?
— Claro que não, filha! Nossa nova casa não fica nessa rua.
— Não???

Luisa dirigiu por mais uns minutos e Mônica viu que elas estavam entrando na parte mais nobre do bairro, onde as casas eram maiores, melhores e mais bonitas. Elas até tinham passado em frente à casa da Carmem.

— Prontinho, chegamos!
— ... – a voz morreu em sua garganta, as palavras não saiam da sua boca e ela mal conseguia piscar direito. Aquela era mesmo sua nova casa?
— Eu sei, você ficou até sem palavras, não é? Essa casa não ficou um luxo?
— M-m-m...

A casa era enorme, tinha três andares e ocupava uma grande propriedade que seu pai tinha comprado e mandado demolir a antiga casa. O jardim da frente estava caprichosamente cuidado, com belas plantas começando a dar flores, pedras arranjadas de forma a dar um ar oriental, caminhos feitos com pedrinhas brancas, arbustos podados de maneira perfeita e simétrica e alguns holofotes destinados a iluminar o local durante a noite, dando um ar de magia.

Dava para ver que a casa tinha sido construída recentemente e tudo cheirava a novo. A aparência era moderna e arrojada, cheia de linhas curvas e suaves bem ao estilo Oscar Niemeyer.

— Ai, que lindo! Querido, os arquitetos capricharam mesmo!
— Não falei que ia ficar bom? – Souza falou orgulhoso por ter sido capaz de escolher profissionais competentes.

O casal foi olhando cada cômodo da casa, comentando empolgados entre si como tudo tinha ficado perfeito. Ela os seguia também olhando tudo e mal contendo o assombro diante de tanto luxo.

Além de grandes salas, muitos cômodos e uma cozinha enorme, moderna e bem equipada, aquela casa também tinha salão de festas com espaço gourmet e banheiros feminino e masculino. Do lado de fora, havia churrasqueira, quadra de esportes, piscina aquecida, sauna a vapor com vestiário e dois grandes quartos de despejo mais ao fundo.

Havia até um salão de jogos que seu pai tinha mandado construir e ele vibrava satisfeito por tudo ter saído como ele queria. Agora ele ia poder receber seus amigos sem incomodar sua esposa.

Foi preciso muito autocontrole para ela não desmaiar diante de tanta novidade. Pelo que ela se lembrava, nem a casa da Carmem era tão luxuosa assim! De onde seus pais tiraram tanto dinheiro? Será que ficaram ricos de um dia para o outro?

— Essa casa é enorme! A gente precisa disso tudo? – Mônica exclamou enquanto percorria os cômodos com seus pais.
— Com o tempo você se acostuma, meu bem! Nossa situação econômica melhorou muito, precisamos viver num lugar a altura!
— Sua mãe está certa. Aquele apartamento minúsculo não atendia mais as nossas necessidades.

“Minúsculo?” ela pensou consigo mesma lembrando que o antigo apartamento devia ser bem maior do que sua casa inteira. Quer dizer, sua antiga casa.

— Agora venha, nós temos uma coisa para te mostrar. – sua mãe chamou. Eles foram para uma das salas e ambos mostraram para a filha um belíssimo piano de cauda que reluzia refletindo as luzes e cores do local.

Ela inclinou o rosto para um lado, para o outro e falou dando um sorriso meio sem jeito.

— Er... Puxa, que piano bonito!
— Você gostou? É novinho, compramos especialmente para você!
— Pra mim? – A moça perguntou arregalando os olhos. O que ela ia fazer com um piano?
— Agora você poderá tocar suas músicas sem ter que sair de casa, com um piano só seu! – Souza falou sorridente e por um instante, Mônica pensou que fosse entrar em parafuso.
— N-não sei tocar piano!
— Não seja tão modesta! Nós sabemos que você é o talento musical da família!
— Eeeeeuuuuu?
— Claro! Bom, depois você vai ter bastante tempo pra ensaiar no seu piano. Vamos olhar o resto da casa, vem!
— M-mas... eu... eu...
— Ah, querido! Olha como ela ficou emocionada!

Luisa foi levando Mônica pelo braço, que ainda gaguejava tentando balbuciar qualquer coisa sobre nunca ter tocado um piano na sua vida.

Eles subiram para o segundo andar e Mônica também ficou abismada com a quantidade de quartos que havia ali. Tinha até uma sala de estar íntima com lareira e mini-copa. Outra sala tinha um home teather destinado ao uso da família e também havia uma pequena biblioteca, já com estantes repletas de livros. Sem falar das quatro suítes, mobiliadas e cada uma com seu armário embutido e floreira nas janelas. Ela nunca tinha visto tantos quartos com banheiro dentro de uma mesma casa. Após olhar cada quarto, Mônica quis saber.

— Qual desses vai ser o meu quarto?

Os dois deram uma risada e Luisa falou passando o braço ao redor dos ombros da filha.

— Querida, os nossos quartos ficam lá em cima, ora! Esses aqui são quartos de hospedes.
— Ah...

Finalmente os três chegaram no terceiro andar, que na verdade era uma espécie de cobertura que fora dividida em dois para fazer os quartos de casal e o quarto da Mônica. Ela mal podia acreditar que todo aquele espaço enorme era só seu.

— Isso tudo é pra mim? Gsuis! Eu vou me perder aqui dentro!

O quarto não era somente grande. Era enorme. O closet era grande o suficiente para uma pessoa entrar e dormir lá dentro e foi feito com pau marfim e acabamento em rosa e pérola. O ambiente era dividido, com uma parte para dormir e passar o tempo de lazer e a outra para estudar com mesa de estudos, computador, armários e estantes para os livros. A cama era de casal e bem espaçosa, coberta com bonitos travesseiros e bichos de pelúcia. Havia um grande espelho e também armários onde ela podia guardar seus pertences de forma organizada. E também aquela prateleira para os seus troféus da qual sua mãe tinha falado.

O banheiro também era muito grande, já com armários, espelhos, box e banheira com hidromassagem. Bonitas prateleiras feitas com vidro exibiam xampus, cremes, hidratantes, condicionadores, sabonetes líquidos, toalhas caprichosamente enroladas, sais de banho e graciosos enfeites como alguns cristais, pequenas bromélias e vasilhas com pot-pourri.

Era um quarto que dava para pelo menos três pessoas e, no entanto, era só para ela.

Do lado de fora da cobertura, havia um espaço com mesas, cadeiras, uma bonita rede e até um lavabo para o caso de ela querer receber os amigos. Plantas bem cuidadas enfeitavam o lugar que era coberto com telhado de vidro para proteger tudo da chuva sem bloquear os raios do sol. Pelo que ela sabia, nem a Carmen tinha algo assim.

O casal acompanhava feliz as reações da sua filha, satisfeitos por ela ter gostado do seu novo quarto. Somente o melhor para sua princesinha querida.

— Então você gostou?
— Se gostei? Nossa! Esse quarto é demais! Nunca vi nada igual na vida! – ela pulou no pescoço da sua mãe e depois do pai empolgada com aquilo tudo. Talvez aquelas mudanças não fossem tão ruins assim afinal de contas e ela mal podia esperar para mostrar seu novo quarto aos amigos. Suas festas do pijama iam se tornar as mais incríveis do colégio.
— Que bom você gostou! Daqui a pouco os homens da mudança trarão suas coisas e aí você pode colocar tudo no lugar. Agora deixa eu descer porque ainda preciso arrumar algumas coisinhas. Divirta-se no seu novo quarto!
— Com certeza!

Depois que o casal saiu, Mônica se pôs a explorar melhor o ambiente, maravilhada com aquilo tudo. Assim que tivesse uma chance, ela pretendia ir até a casa da Magali para chamar a amiga.

“Ih, também tenho que falar com o Cebola e o Cascão... vai ver eles estão preocupados por causa daquele tornado maluco...”

—_________________________________________________________

As pessoas passavam pela rua e olhavam desconfiadas para aquelas duas moças com um visual tão agressivo e rebelde. Especialmente para a de cabelos curtos e pretos. Ela usava mini-blusa cinza-escura com as mangas rasgadas, botas militares, calças rasgadas e repletas de botões metálicos, correntes e outros acessórios que lhe davam um aspecto punk.

Uma corrente fina enrolava sua cintura, dando três voltas e também havia outra corrente um pouco mais grossa ao redor do seu pescoço. Dois piercings de argola enfeitavam o lábio inferior, também havia um no nariz, um na sobrancelha esquerda e vários nas orelhas. Seus cabelos estavam levemente arrepiados e ela usava maquiagem pesada e escura que lhe dava um aspecto ainda mais assustador.

— Parece que vai ter mais uma patricinha pra feder na minha escola! – a garota de cabelos pretos falou com cara fechada.
— Pois é. Olha só que casão, nossaaa!
— Fala sério! Tanta gente sem ter onde morar e esse porco capitalista acha que precisa de desse terreno enorme!

O tamanho da propriedade realmente impressionava e ela achou um grande exagero uma casa daquele tamanho só para três pessoas. Era bem provável que aquela patricinha tivesse um quarto enorme só para ela, cheio de bichinhos de pelúcia e toda aquela parafernália que as burguesinhas filhinhas de papai gostavam de ter.

Um caminhão de mudança chegou logo a seguir e os homens começaram a descarregar algumas caixas. Não parecia muita coisa.

— Ué, cadê os móveis?
— Quer apostar que esses burgueses compraram tudo novo?
— Acha mesmo?
— Você tá vendo alguma geladeira aí? Algum sofá, mesa, cadeiras ou qualquer outro móvel? Claro que eles compraram tudo!
— É mesmo...

Ao ver que não tinha mais nada de interessante ali, a garota de cabelos ruivos achou melhor as duas irem logo embora.

— Acho que isso aqui não tem mais graça. Melhor a gente ir que o resto da turma tá esperando... – ela falou colocando a mão no ombro da amiga e levou um forte safanão.
— Eu vou na hora que me der na telha!
— Olha que o pessoal vai achar ruim se a gente atrasar.
— Eles não têm que falar porra nenhuma, quem manda nessa merda sou eu! E não me enche o saco que eu só saio daqui quando me der vontade!
— Ih, tá bom...

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Ela abriu a janela para olhar a rua e reparou que as casas ali eram estavam mais ou menos no mesmo nível da sua. Se ela não estava enganada, a casa de Carmem devia ficar ali perto. Duas pessoas paradas no meio da rua lhe chamaram a atenção e Mônica logo reconheceu Denise por causa das maria-chiquinhas que davam para ver de longe. E aquela outra garota perto dela? Talvez alguma menina nova no bairro.

— Vixe, como a Denise descobriu que eu tô morando aqui? Ah, claro... é a Denise! Hahaha, ela deve tá louquinha pra entrar e ver a nova casa. Vou até lá falar com ela...

Sem pensar duas vezes, ela desceu em disparada, quase tropeçando nos homens que levavam as caixas e saiu para a rua à procura da Denise e da outra moça.

As duas estavam indo embora quando ouviram alguém chamando.

— Ô Denise, peraí! – elas se viraram rapidamente e viram a garota rica e bem vestida que acenava para elas.
— Por acaso você conhece a burguesa aí?
— Nunca vi mais gorda!

Mônica parou diante das duas e ficou surpresa com o visual da Denise, muito dark e agressivo. E seu espanto foi maior ainda quando ela olhou melhor para a moça de cabelos escuros que estava com ela.

— Magali?

As moças olharam uma para a outra e depois voltaram a olhar para a Mônica.

— Meninas, que roupas são essas? Magali, você colocou piercings? Achei que detestasse essas coisas! Credooo! Você cortou o cabelo?

Denise engoliu em seco ao imaginar a confusão que aquilo ia render. Uma patricinha criticando a aparência da Magali? Aquela pobre coitada não tinha noção do perigo!

— Ô burguesa, por acaso tá afim de arrumar encrenca?
— Hã? Ficou doida? Sou eu, lembra? A Mônica!
— E daí? Você é celebridade por acaso?
— Não, mas...
— Então eu não tenho que saber a porra do seu nome!

Ela abriu a boca e fechou de novo, sem saber nem o que pensar. Por instantes ela imaginou que deve ter se enganado. Talvez aquela moça não fosse a Magali e sim alguém parecido com ela.

— Ô Denise, o que ta havendo?
— Sai pra lá que eu nem te conheço! – ela disparou com medo de apanhar depois da Magali.
— Quê? Ficaram malucas?
— Você tá afim de apanhar mesmo, né sua vagabunda? Eu posso providenciar isso facilmente, sabia?
— Você? Me bater?

Ela aproximou-se mais da Mônica, encarando-a com desafio.

— Quer pagar pra ver?
— Claro que não! Eu não vou brigar com você, a gente nunca saiu no tapa antes!
— Pra tudo tem uma primeira vez! – Magali falou empurrando a Mônica com força, mas ela mal saiu do lugar.
— Ih, para com isso! Eu não tô com paciência pra essas brincadeiras bobas!
— Ó, melhor você vazar logo daqui senão o troço vai ficar feio pro seu lado! – Denise tentou avisar antes que Magali saísse do controle. Aquilo não costumava ser nada bonito.
— O troço já tá feio pro lado dessa vaca e é agora que ela vai apanhar!
— Mônica! Sua mãe mandou você vir arrumar suas coisas! – Durvalina chamou da calçada.
— Já vou!
— É, vai mesmo burguesinha! Corre pro colinho da mamãe que é mais quente!

Ela foi para dentro de casa com a empregada e as duas resolveram ir embora.

— Fala sério, primeiro dia nesse bairro e ela veio puxar briga comigo? Ela não me conhece mesmo!
— Acho que não. Ah, ela é novata, dá um desconto pra ela.
— Eu poupei a vida dela agora pouco, não poupei? Então já fiz minha boa ação do dia. Se essa vaca me encher o saco de novo, ela vai ver só uma coisa!

As duas foram embora dali, já que tinham um compromisso importante. Ainda assim, Magali pretendia depois dar uma lição naquela filhinha de papai. Ninguém a desafiava.


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