Universo Em Desequilíbrio escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 18
O roubo das lembranças




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– Puxa... que saudade... – ela falou para si mesma admirando as fotos dos seus amigos no seu antigo celular. Havia muitas fotos e vídeos que ela olhava constantemente com lágrimas nos olhos.

Apesar de ter feito muitas amizades naquele mundo, ela ainda se sentia sozinha sem sua turma original. As coisas não eram mais as mesmas sem a Magali, Cascão e especialmente o Cebola.

A Magali era uma valentona, ela nem tinha coragem de aproximar do Cascão e o Cebola dali era bastante esquivo. Que realidade complicada aquela!

E para piorar, ela não estava conseguindo progredir com o piano. E nem havia como, já que nunca tinha aprendido a tocar aquela coisa. Mônica tinha tentado pesquisar na internet e até leu seus livros na esperança de se lembrar de algo. Nada. Era como se houvesse um bloqueio, alguma coisa que a impedia de entender aquele instrumento. Ou seria porque ela não tinha talento para aquilo?

As aulas de taekwondo também estavam sendo um fiasco. Apesar de ter muita força, ela não sabia lutar e acabava sendo jogada no chão várias vezes, para a surpresa dos seus professores. Como uma pessoa podia lutar tão bem num momento e depois ficar pior que os alunos iniciantes?

Com todo o restante as dificuldades eram as mesmas, como se portar a mesa, se vestir e andar. Se bem que aquelas coisas não eram tão urgentes assim. O importante era não passar uma vergonha monumental na frente de duzentas pessoas.

O visor do celular mostrou uma foto dela com o Cebola, ambos abraçados e rindo. Aquilo fez com que as lágrimas rolassem pelo seu rosto. Pelo visto, ela não ia conseguir nada com o Cebola daquele mundo.

– Mônica! – Durvalina chamou do lado de fora do quarto. – Tá na hora de ir pra escola, menina! Sua mãe tá esperando.
– Já vou, peraí!

Ela enxugou as lágrimas, fez uma maquiagem apressada e saiu dali ainda fungando. A saudade doía, mas se quisesse reencontrar seus amigos ela teria que arruma um jeito de se adaptar a aquele mundo para poder ir embora. Era a única saída.

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Cascão observava de longe sua ex-namorada. Ela estava tão bonita e ele nem podia chegar perto. E para piorar, aquele filho do sorveteiro estava conversando com ela e se desmanchando em sorrisos. Que droga!

– Tá olhando pra ela de novo? – Franja perguntou chegando perto e retendo um pouco a respiração. – Você sabe que não adianta.
– E daí? Você fica babando pra Marina e sabe que também não vai conseguir nada!
– Pelo menos eu não cheiro a bicho morto.
– Quer levar um murro, é?
– Segura a onda aí vocês dois! – Tonhão falou estalando os dedos. – Magali detesta briga entre a gente.
– Ela não tá aqui. – Cascão falou encarando o outro com cara feia.
– Mas eu tô.

Os dois resolveram ficar quietos só para não apanharem do Tonhão e mais tarde da própria Magali.

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“O que ela tanto olha praquele celular?” ele perguntou a si mesmo enquanto observava Mônica sentada no banco do pátio da escola. Pelo que ele sabia, ela tinha um celular melhor e mais moderno. Então porque ela levava dois? E por que gastava tanto tempo olhando aquele?

Desde o dia em que ela descobriu sua identidade no jogo, Cebola passou a vigiá-la mais de perto. Os conhecimentos que ela tinha de computação eram pequenos, por isso ele descartou a hipótese de ela ter invadido seu computador ou hackeado o jogo. Então o que sobrava?

Durante as aulas, ela não fazia nada de diferente ou incomum a não ser enfrentar Magali de vez em quando para defendê-lo. Era outra coisa que o intrigava. Por que ela sempre o defendia? Por que se importava tanto? De tanto vigiá-la, ele também descobriu fatos interessantes, como o fato de ela ter adivinhado o nome de vários alunos, ou saber tão bem seus gostos e preferências como se os conhecesse. Cada pequeno detalhe da vida dela ou do que ela fazia pareceu ter adquirido grande importância para ele.

E aquele celular estava se tornando o ponto central. Se ele ao menos pudesse colocar suas mãos naquilo...

– Tá olhando pra burguesinha de novo, seu cobaia? – uma voz falou atrás dele, lhe dando um forte tapa na cabeça.
– Eu... eu não... – ele falou tentando se esquivar da surra iminente.
– Seu bobalhão! Acha mesmo que ela vai querer alguma coisa com um perdedor como você? Se liga! Burguesinhas ricas querem sujeitos com grana, não um pobretão que nem você!

Ele trincou os dentes com raiva, procurando esconder o rosto com o capuz. Perdedor? Ele não era nenhum perdedor e sim o futuro líder mundial!

– Ai! – um soco foi desferido no seu estômago.
– Olha pra mim enquanto eu estiver falando! – ela lhe deu outro soco, jogando-o no chão. Pelo visto, a surra daquele dia era para valer.

Ao perceber a agitação do outro lado do pátio, Mônica guardou o celular no bolso da calça e correu para ver o que estava acontecendo. Se bem que ela já sabia do que se tratava.

– Pára de fazer isso ou eu chamo a diretora! – ela falou alto passando por entre os alunos.
– E eu lá tenho medo da diretora? Vai cuidar da sua vida!
– Então pára de bater nele!
– Me obriga!

Mônica se calou mais uma vez. Droga! Será que não havia outra forma de acabar com aquilo sem ter que brigar? Era a última coisa que ela queria fazer.

– Você tá me enchendo o saco, garota! Fica me enfrentando e depois quer tirar o corpo fora?
– Eu não quero brigar, só quero que você pare de infernizar todo mundo!
– Eu faço o que me dá na telha! Se acha ruim, então vem pra briga! – Magali falou se colocando em guarda. Os alunos ao redor instigavam as duas e o clima parecia esquentar.
– Não vou brigar! Você sabe que isso é errado!
– Vai dar lição de moral na vaca da sua mãe, tá legal?
– Não fala assim da minha mãe! – Mônica gritou com o rosto vermelho. Colocar a mãe no meio era golpe sujo.

Magali deu uma risada e voltou a falar.

– Aê! Agora tá ficando bom! Vai encarar agora, vai? O que foi? Tá com medo de quebrar a unha? Ou de sujar a roupinha? Fala sério, você não é de nada!

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No mundo original, Cebola e Cascão estavam contando os segundos que faltavam para a Mônica explodir de vez e partir para cima da outra Magali com tudo. Mas isso não aconteceu. Ao invés de brigar, Mônica apenas respirou fundo, ajudou o Cebola alternativo a se levantar e o levou dali ainda sob xingos da valentona que cuspiu todos os palavrões que sabia.

– Eu vou te mostrar só uma coisa sua filhinha de papai! Uma hora eu te pego de jeito e aí arrebento essa cara todinha! – ela ia falando enquanto os dois se afastavam.

O Cebola original sentiu vários sentimentos conflitantes. Por um lado, ele ficou feliz ao ver que a Mônica se preocupava com seu duplo. Por outro, era humilhante ver seu outro eu tendo que ser defendido por ela porque não era capaz de se cuidar sozinho.

– Caramba, eu pensei que ela fosse dar na cara dessa Magali trevosa! – Cascão falou.
– Você queria ver meu duplo apanhar?
– Mals aê, não é isso não! É que... que... (ô careca, ajuda aí vai!)
– Engraçado... com ela a Mônica tem toda paciência do mundo, mas comigo desce o braço sem dó! Fala sério!
– Você fala isso mesmo depois de ela ter defendido seu duplo? – Xabéu ralhou. – Não seja mal agradecido!
– Hunf! Ele devia se defender sozinho, não pode ficar na barra da saia dela pra sempre!

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– Você não devia ter feito isso. – Cebola falou esfregando seu estômago para aliviar a dor.
– Devia sim. Eu não posso deixar a Magali ficar te maltratando desse jeito!
– Por que você me defende tanto? – ele perguntou olhando para ela.
– É complicado explicar, viu? Mas o importante é que você tá salvo dela.
– Por enquanto. Você não pode ficar comigo o dia inteiro... inteilo. – ele se corrigiu a mesma hora. Mesmo ela tendo prometido guardar segredo sobre seu troca letras, ele não queria correr o risco de outra pessoa ouvir a conversa. – Você não vai contar polque me plotege?
– E você não vai contar por que disfarça seu jeito de falar?
– Touché! Você é mais espelta do que eu pensei.
– Como é? Você pensou que eu era burra? Olha que eu te dou umas bifas e... e... – ela parou na hora ao ver como ele a olhava com os olhos arregalados, aparentemente espantado com aquela mudança de atitude. - (caham) deixa pra lá, melhor a gente ir pra sala.

“Ela é bem brava, heim?” ele foi pensando enquanto caminhava pelo corredor. “Rapaz, deu até medo! Se bem que ela ficou uma gracinha com aquela cara de zangada!”

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Dentro da sua sala de aula, Magali remoia sua raiva pensando em como se vingar daquela burguesinha metida e irritante. Como ela se atrevia a se meter em seu caminho? Ninguém naquela escola a desafiava. Se não fosse pelo DC, que de certa forma a protegia, ela já teria arrebentado aquela carinha de moça rica há bastante tempo. Mesmo não tendo medo de ninguém, ela não queria arrumar encrenca com o delegado da cidade. E como aquela garota era de família rica, sua situação poderia ficar pior. A justiça sempre funcionava melhor para quem tinha dinheiro, aquilo era um fato. Então como se vingar?

Como não estava preocupada em prestar atenção na matéria, já que o Franja sempre lhe ajudava a colar nas provas, Magali se pôs a traçar alguns planos de vingança. Tinha que ser algo não muito óbvio, de forma que ninguém suspeitasse dela. E ao mesmo tempo, precisava ser devastador. Como fazer algo cruel e devastador sem usar a boa e velha força física?

– Eu quero me vingar da burguesa, mas não consigo pensar em nada! – ela sussurrou para Denise.
– A gente pode espalhar uma fofoca bem brava com o nome dela.
– Que bobeira! Isso não vai resolver nada. Tem que ser algo pra valer!

Denise virou-se para a frente, mexeu um pouco nas Maria-chiquinhas, pensou por algum tempo e voltou-se de novo para Magali.

– Por acaso você reparou que ultimamente ela tem andado pra cima e pra baixo com um celular na mão e fica olhando pra ele toda hora?
– Eu? Claro que não! Patricinhas não vivem com celular na mão?
– Silêncio aí atrás! – a professora falou, fazendo com que as duas ficassem quietas por um tempo. Quando a mulher se distraiu, Denise voltou a falar em voz baixa.
– Ela tem um celular super bacana, mas parece que anda com outro também e vive mexendo nele. Aposto que tem alguma coisa aí.
– Hum... de repente... será que tem alguma foto dela pelada ou fazendo...
– Só tem um jeito de descobrir, não tem?

Magali deu um sorriso perverso com a idéia da amiga. Se aquele celular era tão importante para Mônica, então ela ia roubá-lo com certeza.

– Você acha que consegue pegar o celular dela?
– Pfff! Eu consigo despistar seguranças das lojas e até as câmeras, pra mim é moleza!
– Então beleza! Na hora do recreio, você passa a mão no celular dela e traz pra mim! Se tiver alguma foto comprometedora ali, eu vou pegar e publicar tudinho.

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– Mô, vamos lá pra sala de informática! Fiquei sabendo que atualizaram o jogo! – Marina chamou, sendo acompanhada pelas outras garotas.
– Já vou, peraí!

Ela guardou suas coisas na mochila e quando foi pegar seu celular, ficou em dúvida. Precisava levar os dois? Claro que não. Ela não ia ter como ficar olhando as fotos durante o jogo, então achou melhor deixar aquele na mochila e levar o oficial. Talvez fosse bom nem ficar olhando aquelas fotos o tempo inteiro, já que aquilo fazia a saudade doer mais ainda.

Todos saíram e como sempre, Cebola foi o último. Ele já ia correr para a sala de informática atrás da Mônica quando percebeu Denise perto da sala de aula. Aquilo não costumava ser bom sinal já que ela sempre ficava com Magali na hora do recreio.

– Tá olhando o quê, seu cobaia? Vaza logo daqui! Passa! – ela bradou batendo o pé no chão. Ele ainda ficou ali encarando. Diferente da Magali, Denise nunca ia para cima dele.
– O que você tá quelendo aqui?
– Não é da sua conta e se você me encher o saco, eu conto pra Magali e ela faz o Tonhão arrebentar sua cara. Sai logo, anda!

Mesmo não gostando daquilo, Cebola achou melhor sair dali. Se ficasse, não ia conseguir impedir Denise de aprontar e enfrentá-la ia criar mais problemas com Magali. Ele virou o corredor, esperou um tempo e depois espiou de volta. Ela não estava mais ali, com certeza deve ter entrado na sala. Pouco depois, ele a viu saindo colocando algo no bolso.

“Então é isso, ela deve ter roubado alguma coisa de alguém!” como não podia ficar ali, ele saiu correndo, preocupado na confusão que aquilo podia render. De quem será que Denise andou roubando?

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– Tá aqui o celular.
– Algum problema?
– Nenhum, foi moleza. – ela falou omitindo a intromissão do Cebola. De qualquer forma ele não ia causar nenhum problema. – E agora?
– Agora eu vou dar um jeito de esconder isso muito bem. Depois da aula a gente dá pro Franja. Se tiver alguma foto comprometedora, ele vai achar e publicar na net. Rapaz, eu mal posso esperar!
– Por que não faz isso agora? A sala de informática tá aberta!
– Se eu aparecer ali todo mundo vai desconfiar. E é bem capaz de essa burguesinha reclamar na diretoria que o celular dela foi roubado, então eu tenho que esconder muito bem pra pegar na hora da saída.
– Será que tem alguma foto quente aí? Ah, deixa eu ver, deixa!
– Eu heim! Deu pra virar fofoqueira agora? Você sabe que eu não gosto disso!
– Claro que não!
– Então segura a onda aí!

Magali guardou o celular no bolso e as duas foram para o refeitório. Ela torcia para que realmente houvessem fotos comprometedoras naquele celular. Aquela ia ser a vingança perfeita contra aquela burguesa filhinha de papai.



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