O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 35
Capítulo 34 - A Carta


Notas iniciais do capítulo

Finalmente saiu, é! Quero dedicar esse capítulo a todos os meus leitores. MdB se aproxima cada vez mais do seu final! Depois de tanto tempo com essa história no site, finalmente está chegando *O* Espero que gostem do capítulo e novamente desculpe pela demora pra postar e para responder os reviews maravilhosos que recebo, dessa vez foi por, digamos... Vadiagem. Passei cinco dias fora de casa passeando e quando voltei fui me inteirar das tretas que ocorreram no grupo do Nyah. Agora tenho que correr porque tenho dentista x_x Já sabem, qualquer erro me avisem, por favor!



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Muitos de vocês achariam perfeitamente plausível que Liese tivesse abandonado Leharuin em sua própria solidão. O próprio achava perfeitamente plausível.

Felizmente, para o ladrão, Liese era teimosa demais para se deixar abalar pela atitude desrespeitosa do amigo.

— Ela não irá voltar... — murmurou para si mesmo naquele dia. Em parte ele desejava que isso fosse verdade. Sentia vergonha de sua atitude e por mais que pensasse, não conseguia entender porque fez aquilo. Eu desconfio, meus amigos, de que Leharuin desejava que a princesa o odiasse. Ele acreditava que merecia aquilo. Obviamente o ladrão jamais chegará a essa resposta, se há algo que eu possa dizer a vocês é que jamais conseguiremos nos entender. Somos confusos e misteriosos demais para nossas mentes traumatizadas e inocentes.

Como vocês já sabem e porque eu já disse, Liese voltou. A jovem reconheceu o sentimento da vergonha presente naqueles olhos dourados que se recusavam a olhá-la. Ela apenas deixava a refeição e partia, feliz por saber que ele estava arrependido.

E por mais que a dor de perder Clara fosse eterna, o ladrão sabia que não poderia continuar daquele modo. Tinha que sair daquele quarto, daquela imundice... tinha que se desculpar com Liese.

Quando finalmente tomou coragem para enfrentar a vida e sair daquele cômodo, não havia ninguém em casa. Estranhou o silêncio e a solidão, porém ficou satisfeito com ela. Não queria que o vissem naquele estado ou que sentissem seu cheiro. Explorou a casa até achar o quarto de Henry e após roubar vestes limpas do amigo procurou um lugar onde pudesse se limpar. Havia um banheiro no primeiro andar com uma grande banheira de madeira. Deixou-se ficar ali por longos minutos até ouvir um barulho na cozinha. Decidiu abandonar o banho e se vestir. Com sorte, seria apenas Liese...

O que de fato era. A princesa estava pegando uma velha panela de bronze quando o viu. O inocente objeto quase despencou dolorosamente até o chão, no entanto ela conseguiu segurá-lo bem em tempo após se recuperar do susto.

— Desculpe... ahn, olá. — Se para nós é estranho ver o ladrão falar desse modo, para Liese não era nada diferente. Ela franziu o cenho e continuou o encarando. — Eu fui um idiota.

— É bom que saiba — respondeu em meio tom enquanto lhe dava as costas. A realidade era que a princesa havia se acostumado com a imagem de um Leharuin destruído e contemplá-lo inteiro novamente fazia seu coração palpitar mais rápido. Era quase se esquecera de sua beleza.

Um silêncio desconfortável se seguiu e ela logo se arrependeu de ter dado uma resposta tão fria. E se ele se deprimisse outra vez? E se voltasse para aquele quarto?

— Onde estão Henry e Eruwin? — questionou quando aquela mudez começou verdadeiramente a lhe incomodar.

— Henry foi tentar arrumar um emprego, Eruwin foi atrás. Está numa fase de ciúmes exagerado. — Seu tom era desgostoso e aquilo lhe arrancou um sorriso. Ela ainda permanecia de costas para ele, fingia limpar algo na panela. — Como se não fosse difícil o suficiente arrumar um emprego tendo um braço só, ela ainda o atrapalha perseguindo-o por aí...

— O quê? — sentiu sua respiração morrer. — Que quer dizer com um braço só?

— Um homem enfeitiçado pela Eruwin o atacou, eles brigaram e Henry teve que amputar o braço. Era isso ou morrer para o veneno. — Virou ligeiramente a cabeça para observar a silhueta do ladrão, não conseguia ver seus olhos, contudo pelos ombros baixos ela pode perceber como a notícia o abalara. — Henry tentava esconder a ausência do braço quando ia falar com você. Ele não admitia, mas ele sempre ficava meio de lado quando ia conversar. É uma surpresa que você não tenha notado, só que no seu estado...

— Liese... e-eu realmente sinto muito por aquele dia. — Aquelas palavras não pareciam corretas. Sabia que deveria dizer mais coisa, que não havia perdão para sua atitude...

— Eu sei. — uma resposta simples que foi capaz de aliviar um grande fardo em seu coração. Não merecia ser perdoado e ainda assim, lá estava ela fazendo justamente isso por ele. A jovem tornou a encará-lo e deu um leve sorriso.

Talvez se Liese continuasse focada em sua panela, o ladrão nada teria percebido. Porque foi depois daquele sorriso que tudo pareceu tão óbvio.

— Você fez a burrice de me amar, não é? — Não teve jeito, a inocente panela caiu dolorosamente no chão e não houve nada que Liese pudesse fazer para impedir sua trágica queda. O rosto pálido da jovem enrubesceu violentamente e quando o ladrão fez o movimento para pegar o pobre objeto, ela imediatamente recuou e quase caiu no chão. Salva apenas pelo reflexo de Leharuin que segurou sua mão. Era uma cena um tanto engraçada, pois a princesa estava meio segura e meio caída. Com certo esforço, ela conseguiu se colocar de pé novamente. — Acho que isso foi um sim.

— Eu preciso me sentar. — Assim que conseguiu colocar-se de pé, soltou a mão do ladrão e buscou uma cadeira.

Ficaram em silêncio por alguns instantes, Liese continuava vermelha, tal como as rosas que enfeitavam a mesa. Aquela situação, por mais constrangedora que fosse, era engraçada para o ladrão. A ironia lhe era engraçada e talvez fosse por causa dela que Leharuin experimentou sua primeira crise de risos após seu luto.

Claro que a pobre princesa ficou ofendidíssima. Ele estava rindo dos sentimentos dela? Ora, que rudeza da parte dele! Quando Leharuin se deu conta do olhar magoado de Liese, ele imediatamente parou de rir. Do mesmo como como uma criança que leva um susto terrível. Ele próprio corou e aquela visão Analiese levaria em seu coração para o resto de sua vida.

— Não quis zombar dos seus sentimentos, desculpe... é que você dizia que não era capaz de amar e eu acreditava que jamais seria amado por alguém. Chega a ser ridículo você se apaixonar por mim e... — A escolha de palavras poderia ser melhor, de fato, e o ladrão percebeu isso apenas tarde demais. — Não ridículo no sentido de que seu amor por mim é ridículo, mas sim no sentido de que... ah! Eu sou um idiota.

Ele sentou-se em uma cadeira vaga e deixou que seu rosto se afundasse em suas mãos, seus cotovelos encontravam-se apoiados na mesa. Podia sentir que aqueles olhos prateados olhavam fixamente para ele, o ladrão apenas não sabia dizer que sentimentos encontraria se os fitasse. Tinha medo de encará-la.

— Sua voz mudou. — À princípio aquela informação lhe confundiu. Ergueu a cabeça apenas o suficiente para encarar a amiga. — Quando você falava, era como se houvesse uma melodia em sua voz. Não... dá pra explicar. Essa melodia em sua voz morreu.

— Não sei como responder a isso. — A única resposta óbvia que lhe ocorrera foi que a morte de Clara tenha sido a responsável, mas era evidente que Liese já soubesse disso. Na realidade, muita coisa morrera dentro dele. Não apenas a melodia em sua voz.

— Não precisa responder. Estou apenas puxando algum assunto para nos livrar do desconforto. Sua voz está mais bonita agora. Se eu pudesse explicá-la... — Ela parou por um momento, pensativa. As palavras que se seguiram foram ditas em um tom lento e cauteloso. — Eu definiria como uma voz carregada com a inocência de uma criança.

Na mentalidade de Leharuin, crianças já não eram inocentes. Fariam qualquer coisa para sobreviver, tal como os adultos. Porém ele não compartilhou sua visão, apenas deu um sorriso de lado e desviou seus olhos para a madeira. Uma vez mais o silêncio os afogou, contudo agora era a vez dele de espantá-lo.

— Você não parece muito feliz com Eruwin. — comentou em tom banal ao se lembrar do tom desgostoso de Liese. Não queria falar sobre o braço de Henry, ainda se sentia péssimo por não ter notado algo tão gritante. — Brigaram?

— Não, não brigamos. Eu só... a suporto. Clara ajudava e havia a questão da educação. As coisas melhoraram quando fui morar com a Lily... só que no estado em que você se encontrava eu não poderia deixá-lo sozinho. Por isso estou vivendo aqui. — Reprimiu um suspiro, a conversa estava novamente rumando para assuntos que ela gostaria de evitar.

— Com o tempo isso pode mudar. — Não que acreditasse em tal afirmação, apenas queria apresentar uma visão animadora. Não sabia o que ocorreu entre elas, mas para Liese ter esse tipo de atitude...

— Ela mandou que um homem me violasse porque salvei uma vida. Ela estava errada e quase destruiu minha vida por puro capricho. Na vez seguinte que eu a vi, fui atacada. E agora ela me trata como se nada houvesse acontecido, como se ela apenas houvesse puxado meu cabelo. — Seus olhos estavam vermelhos, o ladrão apenas não sabia se era pela raiva ou por estar reprimindo as lágrimas. — Então, Leharuin, não acho que isso possa mudar. Acho que tenho o direito de não gostar dela.

— Eu havia esquecido, desculpe... — Diante daquelas palavras Liese se levantou e bateu com as duas palmas na mesa. Atitude que assustou consideravelmente o ladrão.

— Ora, quer parar com isso? — perguntou em um tom de voz contrariado.

— Com o quê? — A confusão em sua voz pareceu irritá-la ainda mais.

— De pedir desculpas! De agir desse modo, como se todas as desgraças no mundo fossem culpa sua!

— Então eu não deveria pedir desculpas? — questionou em um tom divertido que arrancou um leve sorriso da princesa.

— Bom, deve, mas de uma forma mais distante. Você não vai querer estragar sua imagem de ladrão que não dá satisfação à ninguém, não é? — Ambos riram com prazer. Devo dizer, meus amigos, que os dois sabiam que seria sensato ficarem juntos. Entretanto, eles também tinham conhecimento de que por mais sensato que aquilo parecesse... não era fácil. O fantasma de Clara estava presente em suas almas torturadas. Nenhum dos dois seria capaz de esquecê-la.

— Acho que tenho essa imagem por nunca ter tido ninguém para dar satisfação. Pelo menos nunca tive durante boa parte da minha vida. — O que Liese diria a seguir foi interrompido pela chegada estrondosa de Henry e Eruwin. Os dois estavam discutindo novamente, o que nunca preocupava nada a ninguém. Era apenas o jeito deles.

— Mas... mas... e se uma humana te agarrar no meio da rua? — ouviram-na gritando da entrada da porta. Liese revirou os olhos e Leharuin soltou uma curta risada.

— Pelo amor de Moros, Eruwin! Eu não iria retribuir o beijo! Iria segurá-la pelo ombro e expulsá-la para longe. — Pelo tom de voz de Henry, o ladrão podia notar que a paciência do amigo ia aos pouco minguando.

— E se você se apaixonar por ela?

— Então você reconhece o risco de que uma simples humana seja capaz de ser mais bela e mais interessante que você? — perguntou com voz de riso ao tirar a fala da sereia. — Por favor, quero conhecer essa humana mística.

— Odeio quando você usa meu orgulho como argumento. — respondeu em tom baixo e contrariado. — Ainda mais porque humana alguma chegará aos meus pés.

— Então não vejo razão para se preocupar. — Seu tom pareceu encerrar a discussão. O jovem pescador se dirigiu à cozinha. Ele ainda tinha um meio sorriso nos lábios quando avistou Leharuin, contudo o sorriso imediatamente desapareceu e sua boca assumiu a forma da surpresa, que se assemelha ligeiramente a um pequeno O.

— Mas... e se for uma sereia? — Eruwin, que claramente estava pensando em uma nova justificativa para seu ciúmes exagerado, invadiu a cozinha logo depois. A surpresa, porém, não passou pelo seu rosto. Estava zangada com o filho de sereia pela forma como ele tratara Henry.

— Nós dois concordamos que tenho agido como um idiota, imagino.

— Acho que eu lembro de termos entrado em um acordo quanto a isso — comentou em um tom divertido e com um sorriso mal disfarçado nos lábios.

— Sinto muito pelo seu braço, mas sabe... acho que você irá atrair muito mais garotas sem ele. — E o inferno estava feito. Eruwin olhou furiosamente para Leharuin e depois para Henry que soltou um suspiro exausto.

— Eu falei! — a sereia exclamou, em um tom vitorioso e irritado.

— Leharuin! — Apesar do tom irritado, os três acabaram rindo no final. Com a exceção, é claro, de Eruwin que estava preocupada demais com aquela brincadeira que a pobre sereia tomou como verdade.

O clima adorável, infelizmente, não dura para sempre. Ele seria interrompido por uma visita inesperada que os chamava da porta da frente. Liese imediatamente reconheceu a voz, Henry e Eruwin só lembraram quando viram a figura. Leharuin, no entanto, só desejou que aquela voz fosse embora.

— Enzo! — Liese exclamou encantada, porém o encanto logo morreu em sua voz ao olhar o braço esquerdo do garoto. — Tatuou a letra L no seu braço? Por quê?

— Não é óbvio? L de Leharuin, esse garoto me ama. — O tom debochado do ladrão não deixou o humor de Enzo muito melhor.

— Agora que uma morreu, já pode começar a correr atrás de outra, sereiano. — Foi quase inacreditável o esforço que Henry teve que fazer para segurar Leharuin, ainda mais possuindo apenas um braço. O ladrão só foi capaz de se acalmar quando a princesa colocou a mão em seu ombro e olhou feio para o garoto loiro que tanto lhe irritava. — Não vim aqui para brigar. Moros quer falar com você.

— Não veio para... o quê? — Aquela foi a coisa mais absurda que ouvira e veja bem, Leharuin já ouvira um par de coisas absurdas durante as vezes que se escondia para praticar algum furto.

— A princesa Cecille veio nos procurar para que viéssemos buscá-lo. O capitão está no navio, fazendo os últimos preparativos. Ela nos deu essa carta, disse que era para você. Que Moros quer vê-lo.

O grupo olhava espantado para seu pequeno informante que estendia uma carta meio amassada para Leharuin. Primeiro houve o medo de pegar o papel e então houve a curiosidade. Ela já estava aberta, como ele supôs. Leu e releu a carta incontáveis vezes, a letra era completamente diferente do que ele imaginara. Era absurdamente torta e possuía traços infantis.

Caro Leharuin,

Acompanho sua vida desde sempre, sei que me odeia. Quem não odiaria? Mas creio que muita coisa a meu respeito não foi explicada. Não sou tão vilão quanto pareço, a vida nos foi injusta e nenhum de nós somos culpados... estou divagando demais em minhas razões, peço perdão por isso. Não tenho muito espaço para colocar minha opinião, apenas escrevo sem parar histórias de pessoas adoráveis e odiáveis. Desejo a cada dia tornar a vida de todos mais fácil, entretanto o que minha mente vê não pode ser alterado.

Preciso que vá ao reino extinto de Themaesth, nas ruínas do palácio encontrarão informações para encontrarem meu esconderijo. Você, como o rapaz inteligente que sei que é, deve estar se perguntando o motivo de não dizer nessa carta. Seria, de fato, tão mais simples se eu lhe contasse tudo... mas o tempo não permitiria, ele é importante. Preciso do tempo. Não estão sozinhos, há mais um grupo. Este, no entanto, deseja me matar. E quem não desejaria?

Eis que peço para não trazer Henry nessa viagem. Você entenderá. Tenho certeza de que Seamus adorará vir, diga a Henry e a Eruwin que cuidem de Lillith.

Agora lhe apresentarei a recompensa. Novamente, peço desculpas se a carta lhe parece confusa. Nunca aprendi a escrever uma, a escrita me foi forçada... E em minha situação, se torna ainda mais complicado escrever qualquer coisa. Onde eu estava? Na recompensa, imagino... sim, você concordará vir, isso já é certo. Porque eu sei quem matou a Donzela Silenciosa e você certamente também deseja saber.

Nota: Por favor, queime essa carta assim que terminar de ler.

Uma nota esquecida: Suas borboletas deverão voltar agora, pois Seamus chegará em breve.

O ladrão estava pálido e com grande pavor ele viu as palavras da carta se tornarem reais. Seamus de fato aparecera momentos depois e com ele um grupo ligeiramente maior de borboletas, que imediatamente foram voar ao redor de Leharuin. Não havia escolha, acendeu uma das velas na cômoda e queimou o papel imediatamente. O motivo, meus amigos? Esse eu não poderei dizer, mas quem assumir meu lugar irá contar.

— O que houve? — O ruivo perguntou ao sentir o clima pesado que recaiu sobre a casa.

— Henry e Eruwin deverão cuidar de Lily. Seamus e Liese irão a Themaesth comigo e Enzo. Precisamos encontrar Moros. — As loucuras daquelas palavras? Elas preocuparam a todos, obviamente. Liese só conseguia se lembrar das palavras de seu irmão quanto a seu pai... mas essa história será contada em outra ocasião, meus queridos.

Eu finalmente me tornarei um personagem dessa história e não apenas um simples narrador. Breves minutos, tão breves... alguém entenderá o significado de minhas palavras desesperadas?


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