O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 2
Capítulo 1 - Fagulha


Notas iniciais do capítulo

Capítulo betado!



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Eis que continuo com a história, meus belos amigos, do jovem Leharuin e suas borboletas. São poucos os que conhecem seu passado e é por isso que sinto-me obrigado a lhes contar.

Seus problemas começaram mais ou menos assim…

— Judith, você tem que controlar esse garoto. Ele é perigoso, ainda mais sendo filho do que é. Deveria saber o destino de crianças como ele, nunca achei que você fosse ir contra as vontades de Moros. Isso só traz infelicidade, não é, Marta? — Uma senhora que, merecidamente, possuía a fama de fofoqueira conversava com Judith, a amável mãe da formosa Elizabeth, e com Marta, uma moça que ainda não fora agraciada com o casamento, situação que se tornava ainda mais preocupante a cada aniversário que a jovem completava.

— Sim, é verdade — a moça comentou rapidamente, os olhos pregados no bordado que fazia, desejando não participar da conversa.

— A Marta é um exemplo. Contrariou o destino… agora corre o risco de nunca conseguir um marido, não é mesmo, Marta? — A pobre mulher lutava para conter as lágrimas; mesmo sendo um comentário de péssimo gosto, a senhora não deixaria impune aquela visível falta de atenção. Ela tinha que ser o centro das conversas, já que era ela quem possuía os melhores assuntos.

— Não acho que você o conheça tão bem, Lourdes. Ele é uma criança muito amável. E tenho certeza de que Marta irá se casar, o destino está lhe reservando um homem muito especial. — A jovem lançou à Judith um olhar agradecido, mesmo que fosse difícil acreditar naquelas palavras. Lourdes, que era impedida pela sociedade de falar mal de Judith, limitou-se a um olhar resignado, desejando que a boa fama daquela família logo desmoronasse. Coisa que não tardaria a acontecer, devido ao desgosto crescente que muitos nutriam por Leharuin. Desgosto que Lourdes fazia questão de alimentar.

— Ele, provavelmente, herdou muitas características da mãe dele, entende? Ele sabe como encantar alguém, mas eu não me deixo enganar por aquela aparência. Sereias são criaturas malignas, nada vindo delas pode ser bom. Roubam nossos homens e afogam os próprios filhos. — Algumas pessoas, meus amigos, não tiveram tantas oportunidades de formular um caráter corretamente. Mesmo que tenhamos raiva de pessoas como Lourdes, devemos ser pacientes. Certamente, nos íntimos dessas pessoas, elas também sentem raiva de si mesmas. Esse era o pensamento de Judith, que sempre buscava ser tolerante com Lourdes.

Porém, nem sempre esse tipo de pensamento ajuda. Acredito que se Judith possuísse uma postura diferente em relação à Lourdes, não temeríamos Leharuin e talvez não existisse uma lenda com o seu nome. São pequenas as atitudes que mudam toda uma história.

O fato, meus queridos, é que a inveja é como uma planta. Precisa de fatores para crescer e, infelizmente, Lourdes possuía todos esses elementos adicionados a um pouco de adubo.

Entretanto, a semente da inveja não era exclusividade de Lourdes. Para a infelicidade de nosso menino, crianças travessas observavam um solitário Leharuin brincar com suas fiéis companheiras.

— Olhe, te dou uma moeda de bronze se acertar uma das borboletas dele. — O líder do grupo, um menino de cabelos tão amarelos quanto a palha e olhos de um azul límpido como o céu sem nuvens, apostava com seu melhor amigo: um garoto que era seu oposto não apenas em personalidade, mas também em aparência. Da forma como Rick lembrava o brilhante verão, Travis poderia ser associado ao pacato outono, com sua pele negra, cabelos castanhos e olhos cor de mel.

— Ele é tão esquisito. Me falaram que o cabelo dele é azul por causa do xixi das borboletas — uma das crianças comentou. Rick era esperto o suficiente para reconhecer mentiras quando as ouvia, mas não maduro o bastante para escolher não utilizá-las; ainda mais quando se tratava de uma mentira tão criativa quanto aquela. 

— Borboletas fazem xixi? — outra criança indagou.

— Claro que fazem, por que não fariam? E, Travis, você vai ou não usar seu estilingue para acertar essas borboletas mijonas? — Rick comprou a mentira da criança criativa. Estava impaciente, queria um pouco de violência, um motivo para arrumar confusão.

— Não acho que seja uma boa ideia… E se elas atacarem a gente? São muitas! — Travis que, apesar de sua idade, era muito sensato, não acreditava que Leharuin fosse tão esquisito assim. Por vezes, Travis pensava se ele próprio não era esquisito, afinal, nem todos gostavam do tom da sua pele...

— E o que elas poderiam fazer? Xixi? — As crianças do grupo caíram na gargalhada, mas Travis não se deixou abalar, esperou que todos parassem de rir para falar outra vez.

— E se for venenoso? Com a quantidade de borboletas que nos atacariam, poderíamos morrer em segundos. — Todos se calaram e o assunto de acertar as borboletas com o estilingue caiu lentamente no esquecimento.

— Pois eu tive uma ideia melhor. — Rick continuava querendo arrumar algum tipo de confusão e, para a infelicidade de Leharuin, esse tipo de criança não desiste tão facilmente do que quer. — Iremos armar contra ele.

— Que quer dizer? — todas perguntaram em coro, com um pressentimento sombrio.

— Vamos encrencá-lo, deixá-lo de castigo.

— Não é uma boa ideia, Rick. Deveríamos deixá-lo em paz. — Travis ficava cada vez mais desconfortável com aquela situação. Conhecia Rick, e por mais que o respeitasse, sabia que ele não iria fazer algo que pudesse apenas acarretar um castigo.

— Claro que é uma boa ideia! Você é muito covarde, Travis! E sabe de uma coisa? O destino não gosta de pessoas covardes, afinal… é preciso muita coragem para aceitar seu próprio destino. Acho que todos concordam… — Queridos amigos, muitas vezes acredito que a ironia é a responsável por todas as coisas. Rick falava de coragem, porém aquilo era a única coisa que faltava naquelas crianças. Foi exatamente a covardia delas que deu liberdade a Rick.

Talvez, se apenas uma pequena chama de coragem houvesse brilhado naquele momento, Travis ainda estivesse vivo.

Entretanto, a única chama que viria a brilhar não seria a da coragem. Seria uma chama em um sentido mais literal: fogo.


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