O Chamado das Borboletas escrita por Ryskalla


Capítulo 17
Capítulo 16 - Sonhos




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Meus queridos amigos, irei apresentar a vocês um novo integrante da nossa aventura. Devo alertá-los a ter muita atenção... ele é tão importante quanto o nosso querido Leharuin cujo destino se entrelaça a eventos marcantes. Convido-os agora a se aventurarem nessa história...

O nosso novo alvo de observação é um garoto com aparentemente dezessete anos. Sim, um garoto. Apesar do rosto fino e dos cabelos escuros na altura dos ombros, ele é definitivamente um rapaz. Esse rapaz tem um lema de vida: jamais tema seus sonhos. Claro que, esse lema já perdeu seu sentido há alguns pares de anos. Nada daquilo era um sonho... e como ele se irritou ao perceber isso. Conforme você for o conhecendo, você irá perceber que irritação é algo estranho para esse desconhecido. Entretanto, ele teve uma crise de fúria ao descobrir a realidade. Sentiu uma súbita vontade de destruir Moros, sentimento muito perigoso, contudo incapaz de ser contido.

O rapaz dormia serenamente em uma mansão abandonada. Tivera mais um sonho... sonho que não passava de realidade. Muitos sonhos são assim, fragmentos de realidade que se confundem em nossa mente. E aquele era um fragmento da realidade que o garoto não gostaria que estivesse em sua cabeça. Olhou para os lados ao acordar, sentindo aquela leve irritação costumeira. Não importava o quão longe ele fosse, sempre acordaria ali. Com um grande suspiro levantou e saiu da construção. Questionava-se quando aquele lugar desabaria em cima dele.

Caminhou para a feira do porto, gostava do cheiro de lá, embora não pudesse comprar nada. O Grande Rei cobrava impostos altíssimos. O que o fazia lembrar... era um dia importante, aquele grande tirano finalmente mostraria a cara. Na mente do garoto, o reino deveria se rebelar contra o rei. Sabia que os outros reinos não estavam satisfeitos e iriam entrar em guerra cedo ou tarde. Era melhor que o povo resolvesse o problema do povo. Nada de estrangeiros, afinal, o que eles sabiam sobre Anankes?

Grande parte da população se dirigia para as embarcações. O castelo real ficava em uma ilha próxima do reino. Aquela seria a primeira vez que estaria aberto para o público e ainda assim estava aberto para um número limitado de pessoas. A multidão empurrava-se ansiosamente, todos querendo garantir seu lugar. Hipócritas, era o que pensava, viviam reclamando da família real, mas todos agora agiam como se Thierry fosse o melhor dos reis. Aquilo o revoltava profundamente.

Espremeu-se em meio ao povo, tinha que garantir que conseguiria um lugar. Era magro demais para seu próprio bem e baixo demais para a idade. Sua presença passou despercebida e foi assim que conseguiu subir em um barco.

A segurança marinha estava aprimorada, provavelmente a família real estava amedrontada com um possível ataque pirata. Não podia culpá-los: Anankes era frequentemente atormentada por aqueles ladrões. O rapaz não gostava de ladrões. Havia apenas um que ele admirava, no entanto... o conhecia apenas por histórias e duvidasse que alguém assim existisse de fato.

A luz do Sol dava ao castelo uma aparência dourada... não, olhando mais atentamente ele constatou algo que o deixou terrivelmente indignado. O castelo era dourado. Era feito do mais puro ouro! Enquanto o povo passava fome... aquilo era tão injusto. Moros era terrivelmente injusto.

Os barcos pararam nas docas e as pessoas rumavam para os portões do castelo, que estavam abertos... convidativos. Tudo naquele lugar era esplêndido e carregado de beleza. O jardim parecia uma pintura feita pelo mais talentoso dos artistas. Aquilo tudo era tão... perfeito demais. O Rei Eternamente Jovem observava seu povo da sacada ao lado de sua irmã e de sua sobrinha. Muitos diziam que elas também não envelheciam e o rapaz não duvidava da veracidade daquelas palavras.

Thierry parecia nervoso e aquilo, de algum modo, deixava esse rapaz cujo nome ainda não compartilhei com vocês, meus amigos, feliz. Era assim que aquele maldito deveria parecer: amedrontado, acovardado. Porque era isso o que ele era. Um covarde.

— Meu querido povo. Quero pedir a vocês as minhas mais sinceras desculpas... o tempo foi realmente muito longo, porém... — Ele olhou brevemente para a irmã que o encarou duramente de volta. — A sua longa espera será recompensada. Irei justificar agora o aumento dos impostos e qualquer pergunta que os s-senhores tiverem.

Um burburinho geral tomava conta da multidão. Ninguém sabia o que aquilo significava, nem o alvo de nossa atenção, companheiros.

— A verdade é que estávamos fazendo uma pesquisa. Uma pesquisa que irá mudar o futuro de Anankes por toda a eternidade. É com grande alegria que digo... dominamos a arte da alquimia, ao menos parcialmente. Descobrimos o segredo do ouro! — Todos caíram em um silêncio surpreso e o rei pareceu receoso, buscou novamente o olhar da irmã que dessa vez lhe sorriu gentilmente. — Nenhum cidadão de Anankes passará fome outra vez, seus bolsos nunca mais estarão vazios. No entanto... há um porém.

Claro que haveria um porém, o rapaz pensava, com vocês sempre há. Respirou fundo e continuou prestando atenção nas palavras do rei.

— Somente aquele que renunciar ao injusto Moros poderá ser beneficiado com o ouro. Seremos nosso próprio deus! Nós traçaremos nosso destino a partir deste dia. — Certo, aquilo era inacreditável. Era perfeito demais, Thierry estava propondo criar um mundo perfeito. Um mundo que o alvo de nossa atenção sempre sonhou. Deveria aceitar? Existia um objetivo muito obscuro por trás daquela proposta. Os habitantes conversavam entre si, espantados. Ninguém sabia ao certo o que responder... era algo totalmente inesperado. — Darei a vocês três dias... deverão pensar com cuidado. Aqueles que rejeitarem Moros e aceitarem criar o seu próprio destino... irão receber um novo deus: Anankes. Ele será o deus da liberdade e dos sonhos.

— E se Moros nos castigar? — Uma pessoa gritou no meio da multidão que murmurou em concordância.

— A fraqueza de um deus é necessitar de que alguém acredite nele. Só serão castigados aqueles que acreditarem. — O silêncio se fez presente uma vez mais. Thierry observava a todos com um rosto inexpressivo. Ele sabia o preço do que pedia, tinha conhecimento de que não poderia forçá-los. É um bastardo manipulador, o jovem pensava enquanto olhava amargamente para Thierry. Como poderia não aceitar aquela proposta? — Isso é tudo. Podem voltar para os barcos, cada um receberá uma sacola com moedas de ouro. Há ouro para todos, não se preocupem. Peço que formem uma fila na saída. Quando o prazo acabar, quem aceitar Anankes como seu novo deus deverá retornar para prestar seu juramento. Quem não aceitar... deverá deixar o reino.

As pessoas rumaram para as docas em um silêncio pasmo e aquele que estamos observando era uma dessas pessoas. O Sol começava a se pôr e aquilo dava uma estranha sensação ao garoto. Não gostava do pôr-do-sol... Ssignificava que estava perto da hora de dormir e, mesmo que não temesse seus sonhos, não podia evitar sentir certa apreensão.

Quando todos desembarcaram, o Sol já havia partido e apenas uma lembrança de sua luz no horizonte permanecia. A Lua estava chegando e não tinha opção a não ser voltar para a mansão. Era a primeira vez em muitas semanas que corria para a mansão ao invés de correr dela. A sacola com moedas de ouro tilintava enquanto o garoto corria, se houvesse algum ladrão por ali... ele parou. Para onde fora seu bom senso? Começou a caminhar, talvez não fosse acontecer, talvez aquele dia fosse um dia de milagres... talvez Thierry estivesse certo, deveria parar de acreditar em Moros.

— Eu não acredito em você, Moros, definitivamente. — As palavras foram sussurradas pela sua boca enquanto caminhava, tentando ser o mais silencioso possível.

— De fato, nem Moros seria capaz de mudar seu destino. — Uma voz feminina que fez com que o garoto gelasse. Outra vez não, ele pensava, por favor...

Olhou para trás, mas não havia ninguém ali. Não existia ninguém no seu campo de visão... Estranho, de onde veio aquela voz? Havia alguém ali, certamente. Podia sentir a sua presença. Agora era tarde demais, de nada adiantaria andar devagar. Correu como se sua vida dependesse disso e uma risada o perseguiu.

Suas pernas finas tremiam violentamente. Por que estava com tanto medo? Por que pensou que seria diferente? As lágrimas começavam a nublar sua visão e, por conta disso, ele não viu o tecido. Caiu com força no chão e sentiu algo estalar. Era seu punho. O medo o dominava quando tentou movimentá-lo. E por fim o alívio: Não estava quebrado ou deslocado.

— Eu irei ficar com isso aqui. — Olhou para o lugar de onde acreditava vir a voz e encontrou a bolsa com o ouro. Uma mão pequena a roubara. Seus olhos subiram mais e tudo o que pode ver foi longos cabelos loiros e um sorriso brilhante.

— P-pode ficar. Fique com tudo, só me deixe viver... — O garoto implorava e o sorriso da ladra desapareceu. O medo parecia querer sufocá-lo. Ela iria matá-lo, iria roubar seu ouro e sua vida.

— Acha que tenho cara de assassina, garoto? — A contradição de sentimentos era muito forte. Não se lembrara de sentir desespero e alívio com tanta frequência. Era como um jogo doentio de Moros... não, Moros não existia. Seu destino não se encerraria ali. A ladra não iria matá-lo. Permitiu-se sorrir um pouco enquanto se levantava cuidadosamente. A mulher não estava mais ali. Recomeçou sua caminhada para a mansão. Moros estava errado. Ele estava vivo... e iria continuar vivo! O coração batia velozmente contra seu peito, tanto que era difícil respirar.

Eu não acredito em você, Moros, não acredito em você. O rapaz continuava a murmurar e a andar com velocidade. Temia que ela mudasse de ideia, temia que algo desse errado. Um assassino em um canto escuro, um telhado desabando, qualquer morte absurda tomava conta da sua mente agora. Não queria morrer, não queria...

— Brincadeirinha! Sabe, o ouro foi só um bônus... — A volta repentina daquela voz... todo o corpo do jovem congelou. Moros, as palavras tomaram conta de sua mente, você é um bastardo sádico. — Não há prazer maior... do que assistir a vida de um homem se esvaindo.

Fechou os olhos quando o vulto loiro apareceu na sua frente. Não queria ver o rosto dela, porém não pode evitar ouvir sua risada doentia, não pode deixar de ouvir o prazer em sua voz. Sentiu algo gelado perfurar seu peito... várias e várias vezes. Mal percebeu quando seu corpo caiu no chão, tudo o que conseguia prestar atenção era naquela maldita risada e o júbilo sombrio que ela carregava.

E naquela noite, se as palavras estivessem corretas da primeira vez, o jovem Aubrey dormiria para não acordar outra vez.


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