As Cores da Liberdade escrita por Ryskalla


Capítulo 12
Décima Segunda Carta - As Cores da Liberdade




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Caro Céu,

Acordei com Alice em meus braços. O rosto dela estava escondido em meu peito. Eu basicamente sorria como o verdadeiro bobo que eu era. Desviei meu olhar para o teto, tantas coisas ocorreram desde que saí da Fenda. Nunca imaginei que o mundo era um lugar pequeno, no entanto... Surpreendia-me descobrir a imensidade do seu tamanho. Um lugar imenso que abrigava os mais variados tipos de acontecimentos que o eu da Fenda jamais seria capaz de imaginar.

— Cedric... — Sobressaltei-me ao ouvir a voz de Hexabelle. Ela estava ao meu lado com um olhar urgente. Tentei não olhar para Alice e se Belle viu que eu estava corando, não deu sinal de ter notado. — Você deveria ir até a praça. A Nyx...

Hexabelle foi impedida de completar a frase, pois Alice havia acordado e puxara meu rosto cuidadosamente para beijar meu queixo. Seu rosto exibia um sorriso divertido, como se eu estivesse fazendo uma expressão muito engraçada.

— Bom dia, loirinho. — Suas mãos acariciavam meu rosto lentamente que queimava como o fogo. Tentei ver se Hexabelle ainda estava ali, porém meu campo de visão era limitado e não dava para ter certeza se ela realmente tinha ido embora. — Qual o motivo de tanta vergonha?

— Ahn... não estou envergonhado. — Minha voz me traíra e saiu ridiculamente fina. Levei minha mão até minha boca e tossi, num apelo desesperado para ela voltar ao normal. — Não estou com vergonha.

Alice começou a rir e aquilo de certo modo me incomodou. Hexabelle tentara dizer alguma coisa sobre Nyx... será que ela estaria na cidade? Mordi o lábio levemente. Tentava imaginar se aquilo era uma situação preocupante. A risada de Alice transformava meus pensamentos a respeito de Nyx em algo mais urgente. Certo, era definitivamente preocupante ela estar na cidade. Levantei em um pulo e corri para o banheiro. Precisava lavar meu rosto, isso sempre clareava minhas ideias. Fiquei alguns minutos ali, tentando organizar meus pensamentos.

— Está tudo bem? — Ela parecia estar preocupada e um sentimento de culpa me invadiu. Eu deveria ter contado para ela que Hexabelle havia voltado, explicado sobre tudo o que havia acontecido... contudo, não tive espaços para isso e a situação certa não surgiu. Busquei dar um leve sorriso enquanto balançava a cabeça negativamente.

— Não está exatamente bem... estou com um mau pressentimento... queria ir até a praça, se você puder vir comigo. — Dependendo do que fosse, gostaria que Alice estivesse lá para me apoiar... Mesmo que isso significasse que eu provavelmente não conseguiria apoiar Hexabelle. Um sentimento de medo esfriara meu sangue, era como se a morte estivesse respirando na minha nuca.

— Claro, claro que irei com você. Eu apenas preciso de alguns minutos, se puder esperar. — Acenei positivamente e saí do banheiro para que ela tivesse privacidade, embora isso parecesse meio estúpido considerando os acontecimentos... 

Eu andava em círculos pelo quarto, o medo tornando-se cada vez mais presente. Por quê? Por que Nyx me transmitia tanto medo? Talvez porque ela também fosse capaz de ver espíritos. Talvez porque ela de alguma forma me fizesse lembrar a história de Charles sobre minha mãe.

— Estou pronta. — Fui até ela em passos rápidos e a abracei com força. — Cedric?

— Eu te amo... mais do que já amei qualquer garota em minha vida. — Permiti que ela fosse libertada de meus braços para que eu pudesse visualizar seu rosto. Algo dentro de mim precisava fazer aquilo com urgência e desesperava-me não saber a razão.

— Cedric... você está me assustando. — Não podia culpá-la, eu mesmo estava assustado.

— Desculpe... eu apenas senti a necessidade de dizer isso. — Um sorriso meigo iluminou o rosto de Alice, que me beijou docemente. Foi o beijo mais longo que tivemos e o mais carregado de sentimento. Era como se nós dois quiséssemos demonstrar a intensidade do nosso amor através de um ato tão simples. Nem mil beijos poderiam demonstrar a intensidade do amor que sentíamos um pelo outro.

— Eu também te amo, Cedric. E eu quero que você me prometa que não irá morrer. — Ela respirou fundo ao ver meu olhar confuso. Ficamos em silêncio por alguns minutos, até que Alice estava sorrindo novamente. — A forma como você fez isso... eu me lembrei das histórias onde o herói iria para uma guerra e se despedia de sua amada, pois não tinha certeza se conseguiria voltar vivo. Então ela o fazia prometer que voltaria vivo e ele sempre voltava.

— Só você, Alice. Eu prometo, mas terá que prometer que também não irá morrer. — Ambos estávamos sorrindo. A nuvem de desespero havia passado.

— Prometo. Assim como prometo sempre amar você, loirinho. — Nos abraçamos outra vez e permanecemos assim por alguns segundos, até que a voz de Alice quebrou o silêncio. — Acho que devemos ir.

— Sim, certo. — Dei um último beijo em seus lábios antes de sairmos do quarto.

Quando saímos da pousada, encontramos as ruas estranhamente vazias. Alice e eu nos entreolhamos e continuamos seguindo caminho até a praça. Chegando lá, descobrimos o motivo do desaparecimento das pessoas no caminho.

Porque todas pareciam ter se concentrado naquele lugar.

Apesar da grande quantidade de observadores, apenas uma voz era ouvida. Em meio a gargalhadas a voz de Nyx gritava palavras cujo sentido escapava a qualquer um.

— Es...tá quase na ho...ra! Vocês não veem? Hahaha, vocês não conseguem ver? O portão irá se abrir! Vai se abr-ir. — Praticamente todas as suas falas eram entrecortadas por um riso ou uma tentativa de sufocar o riso. Alice e eu tentamos abrir espaço na multidão até que conseguimos finalmente ver a dona da voz risonha. Nyx possuía cabelos loiros que não passavam de seus ombros, eles possuíam mechas aleatórias que estavam pintadas de rosa. Havia algumas coisas coloridas, que não faziam sentido para mim, presas a ele também. Suas roupas não seguiam um padrão de cores ou estampas. A frase aquela que vestia o arco-íris não poderia ser mais correta para descrevê-la. — Olhem para o céu, hahaha, não conseguem ver?

Um homem apareceu próximo a ela. Seu rosto possuía uma expressão horrorizada que só fez com que a garota de (eu reparei naquele momento) olhos dourados risse ainda mais. Não prestei muita atenção no que diziam, pois estava focado em outra coisa.

O grupo de crianças mortas que rodeavam Nyx. Hexabelle estava ali também, olhando para elas com profundo desgosto. Pensei em sinalizá-la, mas eu nada poderia fazer sem chamar a atenção de Alice.

Quando dei por mim, todos estavam correndo e Alice me puxava desesperadamente.

— Cedric, corre, Cedric! — Estava confuso demais para obedecê-la, olhei ao redor sem entender o que havia acontecido. Nyx ainda ria atrás de mim, entretanto ninguém queria chegar perto dela. — Cedric!

Fomos separados por causa da confusão. Meus olhos procuraram Alice e não a encontraram. Pessoas gritavam e se debatiam. Todos querendo fugir de algo que colocava fogo em tudo...

Foi quando eu reparei que lá no céu um glorioso castelo flutuava. Suas paredes pareciam ser feitas de cristais. Só que o castelo não era a única coisa que havia no céu.

Um dragão translúcido jogava fogo na cidade. Ele era quase tão grande quanto a construção voadora e pude imediatamente deduzir de onde ele havia saído. Suas chamas atingiram algumas pessoas e elas queimavam enquanto soltavam gritos de agonia. Eram essas pessoas que batiam nas outras. Queriam salvação, por que apenas elas estavam queimando?

Um homem me puxou pelo braço e começou a me arrastar pela cidade, tentei me soltar, contudo ele olhou para mim com um olhar tranquilizador. Era Hexabelle.

— Belle, o que está acontecendo? — Gritei, tentando me fazer ouvir através dos gritos e lamentos que vinha dos moradores.

— Um dragão celestial. Não entendi muito bem. Nyx disse algo sobre pecados, que ele estava aqui para queimar o pecado. — O homem que Hexabelle possuíra estava queimado. Ela deu um grito surpreso enquanto saía do corpo dele. Joguei-me no chão, tentando me tornar um alvo menor. Hexabelle estava a salvo, porque o fogo não poderia atingi-la... ao menos foi o que eu pensei.

Após a passagem do dragão, eu me coloquei de joelhos. Onde estava Hexabelle?

— Belle... — Como eu gostaria de estar sonhando. Porque aquilo não poderia ser real, certamente que não. O espírito de Belle estava envolvido por uma chama azulada. Era a única chama daquela cor. Eu a encarava sem conseguir compreender. Por que ela estava queimando? Hexabelle era um espírito, o fogo não deveria atingi-la! Hexabelle queimou até desaparecer e pela primeira vez em muito tempo eu me senti terrivelmente sozinho.

Os corpos que queimavam com chamas amarelas também desapareceram. Existia, no entanto, alguns corpos no chão. Pessoas que foram pisoteadas durante a fuga, ou pessoas que foram mortas por aqueles que estavam em chamas.

Era incrível como as coisas podiam mudar tão… rápido. Em um momento as pessoas seguiam suas vidas, fazendo seus afazeres diários e em outro havia diversas pessoas mortas pelo chão cheio de cinzas que eram sopradas pelo vento. Caminhei por aquele campo de destruição, cinzas e sangue. Queria estar vivendo na Fenda. Queria ser o estúpido Cedric que acreditava saber de tudo. Eu queria tantas coisas naquele momento… será que ainda dava tempo? Poderia levar Alice até lá, poderíamos fugir juntos e viver como uma família feliz naquele lugar que eu tanto odiava. A culpa, de que se eu jamais houvesse saído de lá Belle ainda estaria ali para conversar comigo e me dizer o quão ingênuo, tinha o mesmo de uma ferida exposta, uma que o tempo não poderia curar, uma que eu seria obrigado a conviver para sempre. Aquela certeza ocupava minha mente até que um corpo em meio a tantos chamou minha atenção.

Por favor... Ela não... Não...

Alice estava largada no chão, o corpo repleto de lesões. Até mesmo seu cabelo eles tentaram arrancar. Meu corpo me arrastou até ela, mesmo que o que eu mais desejasse fosse sumir dali. Primeiro Belle... Por favor, Deus, não tire Alice de mim também...

— Alice... Alice... — Lágrimas sem fim rolavam pelo meu rosto. Eu a segurei em meus braços, seu corpo pouco a pouco ia perdendo o calor. — Alice... você prometeu... Prometeu que não iria morrer... eu cumpri minha promessa, por que você não cumpriu também?

Minha mente parecia abandonar meu corpo. Enquanto eu chorava sobre o cadáver de Alice, eu desejava que nunca mais pudesse sentir. Não queria nenhum tipo de sentimento, não queria ter sonhos... porque eu era apenas uma concha vazia. Eu estava preso ao sofrimento, preso a dor...

Lembro-me de quando acreditei que a cor da liberdade era o azul, porque era a cor do céu que eu não podia ver. Acreditava que, no momento que eu pudesse vê-lo, estaria livre. Porém não estava. Lembro-me também que acreditei que o vermelho era capaz de libertar. Porque o vermelho era a cor do amor mais puro... porque eu me sentia livre por amar Alice.

Azul e vermelho... Ela sempre esteve ali. Sempre me dizendo que não existia liberdade.

 

Por favor... faça-me parar de sentir...

Não posso, está além de minha capacidade, querido. Tudo que eu posso lhe oferecer... é o esquecimento.

O esquecimento vai fazer a dor parar?

Vai ser como se ela nunca tivesse existido.

Quero pedir duas coisas, então...

Diga, meu querido.

Quero que minhas últimas lembranças sejam gravadas nas minhas anotações... Nas minhas cartas...

Por que desejas isso?

Porque um dia terei que enfrentar essa dor... eu quero ser capaz de lembrar quando eu estiver pronto...

Faz sentido, e o outro pedido?

Enterre o corpo de Alice...

Então está feito?

Sim... Pode selar o acordo.


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Notas finais do capítulo

Queridos! Aqui está a última carta do Cedric! Espero que tenham gostado! O prólogo da continuação já está disponível! Irei disponibilizar o link aqui: http://fanfiction.com.br/historia/359397/Os_Jogos_Do_Vicio/Quero agradecer a todos que acompanharam essa história até o final, vocês a fizeram ser mais que especial para mim! Enfim, é isso. Beijinhos! :)



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