Capítulo 27

No dia seguinte, Lena já estava de pé, pronta para treinar. Não sabia o que ocorreria no decorrer dos três dias estipulados por Ethan, mas de certo modo sentia que, por mais que ela quisesse aceitar a proposta apenas para eles não se machucarem, ninguém ali permitiria. Levantou-se e colocou uma roupa mais confortável: calça larga e brusa pouco colada ao corpo, além de botas usadas em combates. Enquanto pegava a espada que ganhara há quatro anos atrás, que estava pendurada ao lado da janela, seu olhar encontrou Susana praticando arco-e-flecha, no pátio abaixo.

Decidiu-se por ir até lá. Atravessou todo o castelo de Cair Paravel, sem encontrar com nenhum dos reis ou de suas irmãs. Achou até mesmo melhor. Não estava muito a fim de encarar qualquer deles. Talvez Susana fosse a única que chegasse ao menos a entendê-la. Talvez não. Mas ela não tinha muita escolha, tinha? Apenas três dias era muito pouco para decidir o destino de toda a Nárnia. Uma resposta errada e podia-se inicar uma grande guerra que talvez só não fosse maior do que aquela contra a Feiticeira Branca, quatro anos antes.

- Bom dia, Lena. - ela ouviu a voz gentil de Susana e então percebeu que finalmente estava no pátio.

- Dia, Susana.

- Como está se sentindo? - a mais velha se aproximou de Lena, com uma expressão compassiva e o olhar compreensivo.

- Não muito bem, eu acho. - ela respondeu.

- Não se preocupe, Emma me prometeu que pensará em alguma coisa. - disse Susana, dando um abraço rápido em Lena. Sabia que ela não era muito simpatizante de contado físico que não fosse de Edmundo.

Mas Susana se assustou quando Lena a envolveu em um abraço apertado e longo; e soube que ela estava segurando tudo o que sentia. Então fez a única coisa que poderia fazer em um momento crítico como esse: apertou o abraço e sentiu que a cunhada estava relaxando aos poucos, como se todo o sentimento negativo que ela estava sentido se dissipasse apenas nesse abraço.

- Me ensina a usar arco e flecha? - Lena pediu, depois que se soltou de Susana.

Achava que talvez pudesse aumentar o laço que tinha com Susana. Ela sempre foi mais chegada a Edmundo e Lúcia e Emma que sempre fez o papel de melhor amiga de Susana. Se não tentasse agora, talvez seria tarde demais.

- É claro!

~*~

- LENA! SUSANA!

Lena ouviu alguém chamando-a do portão que dava para o pátio em que estavam e enquanto Susana abaixava seu arco, Lena soltou a flecha em direção ao som que a havia desconcentrado. E esse som seria Hailee, que se espantou ao ver a flecha cravada na madeira do portão, a centímetros de sua cabeça.

- Angelina Marie Campbell!

- Ops... Acho que arco e flecha realmente não é para mim... - Lena sussurrou para que apenas Susana pudesse ouvir. Esta, por sua vez, riu.

- Lena, o que pensa que vai conseguir me assassinando?! - Hailee se aproximou das duas, completamente vermelha. Lena só não conseguia descobrir se era de segurar o riso ou de raiva. Muito provavelmente seria a segunda opção.

- Consigo me livrar de uma irmã mais velha e mais enjoada. - Lena disse, abrindo um sorriso sapeca.

- Muito engraçadinha. - disse Hailee ironicamente, mas por fim acabou rindo, sendo seguida pelas duas. - Sério, Lena, seria bem melhor se voltasse a usar apenas suas habilidades de cura e com a espada.

- Sinto muito, Lena, mas acho que vou concordar com ela. - disse Susana, rindo.

- Engraçadinha. - Lena disse, fazendo as duas rirem. - Vem cá, Hailee, você veio aqui só para reclamar das minhas ótimas qualidades?!

De repente, a expressão de Hailee escureceu e Lena se preocupou. Se Hailee ou Emma ficassem sombrias, era por que tinha algo muito errado. Geralmente elas eram alegres e deixavam a parte melancólica apenas para Lena.

- Na verdade não. - ela disse. - Pedro pediu para que viesse buscar vocês.

- Para? - Susana quis saber.

- Tivemos um plano de como acabar com esse pesadelo. Precisamos apenas saber o que vocês acham, antes de colocá-lo em ação.

No momento em que ouviu a notícia que a irmã dera, Lena soube que talvez não fosse uma boa ideia. Sabia que a parte do "tivemos" envolvia Edmundo e Emma. E se algo envolvia Edmundo e Emma ao mesmo tempo, só sairia duas opções de tudo, sempre os extremos. Ou extremamente brilhante, ou extremamente trágico. E Lena esperava sinceramente que fosse algo extremamente brilhante, pois já estava cansada de fortes emoções na sua vida. Primeiro vir a Nárnia, depois descobrir que é uma anja, saber que seu protegido estava em perigo apenas porque ela não foi capaz de impedí-lo, se apaixonar por esse protegido e agora seu ex forçando-a a se casar com ele.

De uma coisa eu sei: se voltarmos à Inglaterra, vou querer me aposentar o quanto antes, ela pensou, enquanto analisava Hailee.

Lena assentiu e olhou sugestivamente para Susana, que assentiu também, antes de seguirem a anja mais velha para dentro do palácio em direção ao escritório do rei. Ao lá chegarem, Lena percebeu que estavam reunidos apenas os reis e Emma. Sabia que se os acessores não estavam ali, era porque Pedro já sabia a opinião deles sobre esse assunto. E, mesmo que não quisesse, também sabia. Eles jamais concordariam com o plano que eles formaram. E por um segundo, Lena imaginou se também discordaria do que quer que eles tenham pensado.

Ela se aproximou da cadeira em que Edmundo se sentava e estava prestes a sentar ao lado, mas Edmundo a puxou pela cintura para que se sentasse em seu colo. Ela se aconchegou mais sobre o peitoral dele, enquanto ele lhe dava um selinho rápido.

- Acho que já deve saber por que está aqui, não? - Pedro disse informalmente, olhando diretamente para Lena.

- É, eu imagino. E espero que eu não tenha que entrar em nada parecido com uma igreja. - ela respondeu.

- Haverá sim uma "igreja", mas não será você que irá casar. - disso Lúcia.

- Como assim? - Susana deu voz à pergunta que Lena tinha em mente.

- Emma casará com Ethan em seu lugar. - disse Hailee e Lena deu um pulo do colo de Edmundo.

A informação chegou aos seus ouvidos e a primeira coisa que Lena pensou foi o quanto eles eram loucos em tentar desafiar Ethan. Ele jamais aceitaria que burlassem a proposta. Mas no momento não era com isso que Lena mais se preocupava, mas sim o fato de que eles ao menos chegaram a pensar que ela aceitaria que Emma se casasse em seu lugar.

- DE JEITO NEHUM! Não posso obrigá-la a casar com aquele troglodita filho de uma puta mal comida em meu lugar!

- Lena, se acalma... - pediu Edmundo, segurando sua mão delicadamente.

- Me acalmar como, Eddie?! Eu não posso...

- Você pode. - disse Emma pela primeira vez, sua expressão tão sombria quanto a de Hailee e Lena soube que não haveria mais discussão. - A ideia foi minha, Lena.

- M-mas...

- Mas nada. - Emma se aproximou de Lena, com a expressão mais suave, e deu-lhe um abraço apertado. - Eu prometi que daria um jeito. Não posso deixar você se casar com aquele canalha e se separar do Ed se eu posso mudar isso.

- Não faz isso, Emma. - Lena implorou, envolvendo os braços ao redor da cintura da irmã e segurando um soluço.

- Já era, Lena. - Emma se afastou, dando-lhe um sorriso sapeca. - "Você" já mandou sua resposta para a Calormânia.

- Como assim? - ela perguntou, completamente confusa.

- Emma se passará por você durante a cerimônia. - disse Edmundo, levantando-se e envolvendo a cintura de Lena por trás dela.

- Mas será fácil reconhecer a diferença! - insistiu Susana, ainda pasma com a ideia.

- Eu tenho meus truques... - disse Emma, sorrindo sapeca para ela e mandando uma piscadela cúmplice para Hailee.

Lena conhecia bem os truques que Emma mencionara, afinal, ela mesma já fora alvo de muito deles. Ela sentiu os cantos da boca se curvando levemente para cima ao se recordar. Lena observou cada rosto e cada expressão que estava ali naquela sala. Hailee e Emma olhando-a sorridentes, pois sabiam o quanto aquilo estava sendo um alívio para Lena, principalmente depois de tudo pelo que ela passara após terminar com Ethan há vários anos. Pedro, Susana e Lúcia, que mesmo indiretamente se tornaram parte de sua família, de sua convivência. Eles eram uma grande família que se amavam e se apoiavam em tudo; e Lena sentia-se bem em saber que fazia parte daquilo.

E Edmundo, que ainda mantinha os braços em volta de sua cintura de forma proterora, como se ele fosse o responsável pela segurança dela. Ela sabia que era muito mais do que isso. Ele era reponsável não por mantê-la em segurança, mas por trazer a sensação de estar segura de qualquer mal daquele mundo e de muitos outros. Ele era seu porto seguro.

E ali, analisando tudo aquilo, Lena soube que, por mais no fundo do poço que estivesse, sempre haveria aqueles que fariam de tudo para ajudá-la. Inclusive se casar com aquele que arruinou sua vida e sua personalidade inocente.