A Gotinha De Amor Que Faltava escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 22
Capítulo 22 – Adaptação Escolar


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoinhas! Como vocês estão?

Bem, vamos para mais um capítulo o/. Mas antes quero agradecer a Melanie pela recomendação linda. Obrigada Mel, adorei cada palavra que escreveu.

A todos boa leitura :), e não esqueçam de ler a notas finais.



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Três dias depois...

Durante os dias que se passaram, Emmett visitou algumas escolas especializadas em educação infantil. Teve que se desdobrar para conciliar sua participação na empresa da família entre cuidar da filha, e frequentar as reuniões no grupo de apoio.

Depois de conhecer algumas escolas, e ainda assim persistir na dúvida buscou a opinião sábia de Esme.

Julia foi matriculada, embora Esme ainda não estivesse muito satisfeita com isso. Ela insistia em dizer que a neta tinha traumas demais e que, talvez, ainda não estivesse pronta para se afastar, mesmo que por algumas horas, do pai. Sobretudo, admitia que era um processo natural e muito importante para o desenvolvimento intelectual e social da criança.

Como a escolha pela escolinha foi demorada, Julia daria inicio a sua vida escolar no meio da semana, em uma quarta-feira.

Emmett já havia comprado todo o material que constava na lista. E os uniformes; dois para dias quentes e dois de inverno.

Buscando familiarizar Julia com o assunto que envolvia sua nova rotina, ele foi explicando aos poucos como funcionava a rotina de uma escolinha e o porquê dela precisar frequentá-la.

Inicialmente a ideia a assustou, o choro foi inevitável. No entanto, Emmett passou a desenvolver o assunto de forma que despertou sua curiosidade.

E então o grande dia chegou.

Quarta-feira, sete da manhã de um dia nublado. Uma brisa fria soprava através da brecha na porta da varanda, da suíte do casal, gerando um farfalhar suave nas cortinas de seda.

Emmett acordou com o barulho insistente do despertador do celular. Depois de mais uma noite de terror, Julia dormia colada às costelas dele, usando fralda e apenas a parte de cima do pijaminha com temas infantis. A chupeta estava pendendo no canto da boca e o paninho grudado à bochecha.

Ainda sonolento, ele desativou o alarme do celular. Deu um beijinho na testa da filha, depois lhe beijou a cabeça. Ainda meio confuso com a nova rotina, ele fechou os olhos novamente, consequentemente acabou cochilando por mais alguns minutos. Tornou a abrir os olhos, dessa vez, sobressaltado, sabendo que tinha algo a fazer, mas o que, não conseguia lembrar. Somente depois de puxar na memoria, recordou que tinha que prepará-la para seu primeiro dia de aula.

Olhando Julia dormir ao seu lado, depois de mais uma noite sofrida, ele se viu na dúvida. Inseguro, com medo de estar se precipitando, afinal, sua filha não era como a maioria das crianças. Ela era uma criança ferida, tanto emocional quanto fisicamente. Era uma criança com um histórico traumático.

Cuidadosamente, Emmett roçou o nariz na testa de Julia sentindo o cheirinho gostoso de bebê. O cheirinho que ele já conhecia tão bem.

De repente, o homem que uma vez fora tão ranzinza, se viu sorrindo. Teve a certeza súbita de que jamais amaria alguém da mesma forma que amava sua gotinha de amor. Principalmente por que sabia que jamais teria outro filho, pois a mulher a quem ama perdidamente não podia lhe dar um herdeiro. Sobretudo, estava certo de que não poderia viver totalmente feliz sem a companhia dela. Enquanto Rosalie estivesse longe estaria sempre lhe faltando um pedaço.

– Gotinha... – ele sussurrou, com a voz em um tom suave. – Acorda bebê – continuou a sussurrar, dessa vez, beijando os olhinhos fechados da filha.

Julia se remexeu, jogando a perninha direita sobre a barriga do pai. Um sorriso iluminou o rosto dele enquanto afastava alguns fios de cabelos do rostinho dela, continuando a chamá-la, aos sussurros, evitando assustá-la.

– Gotinha... Gotinha do papai.

– Tô xoninho, papai – murmurou ela, sonolenta, com muxoxos de choro.

– Está com soninho, gotinha. Papai já percebeu, mas preciso mesmo que você acorde, bebê.

Ela gemeu, de puro dengo, negando-se a acordar.

– Julinha tá com xoninho, papai. Quelo domí.

– Mas hoje é o dia de ir à escolinha... – ele sussurrou, novamente.

– Não quelo ecolinha. Não quelo. Quelo minha pepeta.

Mais uma vez Emmett estava sorrindo. – Mas a chupeta já está na sua boca, filha.

Com os olhinhos fechados, Julia levou a mãozinha à boca, esboçando um sorriso ao notar que realmente estava com a chupeta.

– Julinha já tá com a pepeta – comentou, achando graça.

Ela abriu os olhinhos, sonolentos, bem devagar. Emmett se viu, mais uma vez, admirando a herança genética da filha. Era impressionante, aos olhos dele, o quanto a obra de Deus era maravilhosa.

Julia coçou os olhinhos, seguido de um bocejo. A chupeta caiu, mas, ela a colocou de volta na boca imediatamente.

Devagar, Emmett sentou na cama.

– Hoje você vai para a escolinha. O papai já deixou tudo pronto ontem a noite, agora é só arrumar você.

– Não quelo í plá ecolinha, papai. Pô favô, papaizinho. Ecolinha não.

– Não precisa ficar preocupada, gotinha. Na escolinha tem outras crianças. Elas vão adorar te conhecer e brincar com você, filha.

– Não tem quiança. Não tem.

– Tem sim – afirmou Emmett.

– Não tem – ela negou novamente.

– Tem sim, gotinha. Elas vão ser suas amiguinhas. Aposto que você vai gostar de lá.

– Tem pessoa que faize o dodói. Pessoa má.

– Lá não tem pessoa má, bebê. Você gosta da Dra. Kate e Dra. Abigail, não gosta? – Julia afirmou com um maneio de cabeça. – Então, na escolinha tem uma professora muito legal, que cuida e gosta de crianças, igualzinho a Dra. Kate e Abigail.

– Jula, julandinho?

– Papai jura, jurandinho.

Julia estendeu os bracinhos para o pai, em uma das mãozinhas segurava o paninho – mantinha. Emmett a pegou no colo cuidadosamente.

– Calinho, papai. Calinho – ela se preocupou, achando que seu amigo inseparável fosse ser deixado para trás.

Sorrindo, com ela no colo, Emmett se inclinou e pegou o pônei cor de rosa.

– Eu pensei que ele estava dormido – ele brincou.

– Já tá acoldado esse Calinho – ela confirmou. – Papai tem xixi – comentou, encostando a mãozinha na fralda que usava.

Emmett beijou o rostinho dela carinhosamente. – O papai já vai retirar essa fralda, gotinha. Vou te dar um banhinho também – ele avisou, saindo da suíte do casal para logo em seguida entrar na de hospedes onde Julia estava ocupando temporariamente.

No banheiro, ele colocou Julia sentadinha na bancada da pia, e lhe escovou os dentinhos com muito cuidado.

– Não pode comê isso? – ela perguntou depois de ter cuspido o creme dental dentro da pia.

– Não, não pode. O papai já explicou um monte de vezes que isso não é comida. É só para escovar os dentinhos. Para deixá-los brancos e saudáveis.

– Eu gosti, papai.

– Papai já sabe que você gostou, mas não é para comer.

– Os dentinhos do montlo – ela mostrou os dentinhos, com a boca ainda suja de creme dental. – Que sou um montlo, e tenho essa baba – brincou, se referindo ao creme dental. – E vou pegá você, papai – ela imitou um rugido, tentando parecer um monstro.

Emmett gargalhou gostosamente, depois beijou o rostinho dela.

– Monstrinha linda do papai – brincou ele.

– Montlinha não. É gotinha do papai. O montlo só de mentilinha, tá bom?

– Tá bom – Emmett respondeu antes de colocá-la no chão.

Primeiro ele retirou a blusinha do pijama que ela usava depois puxou os adesivos da fralda. Julia empurrou a fralda até que ela caísse no chão, depois disso correu até troninho para fazer xixi. Em pouco tempo ele estava tocando uma musiquinha divertida. Julia balançava a cabeça de um lado para o outro se divertindo com a canção já conhecida.

– Já terminou aí, gotinha?

– Só feize xixi. Só – disse ela, reforçando com um maneio de cabeça.

– Então vai lá pro box, pro papai te ajudar com o banho.

Ela ficou de pé e saiu pulando para dentro do box, as perninhas trôpegas e os pezinhos estalando ao entrar em contato com o chão.

– Papai – ela o chamou, tocando na perna dele. – Julinha vai tomá bainho plá ficá chelosa.

– Vai – disse ele, e um sorriso surgiu em seus lábios. – Vai ficar muito cheirosona. E o papai vai te encher de beijinhos, e cheiros. Muitos deles.

Julia sorriu, satisfeita. Colocou as mãozinhas embaixo do chuveiro, abrindo e fechando, como se quisesse capturar as gotas grossas que caíam. Durante o banho ela permaneceu brincando com a água que caia do chuveiro. Algumas vezes olhava para o pai, e ele lhe sorria.

Quando terminou, ele a enrolou na toalha branca, de capuz da gatinha Marie – sempre que usava aquela toalha Julia acariciava o capuz, como se estivesse acariciando a um gatinho de verdade – e então foi vesti-la. Depois de secá-la vestiu nela uma calcinha cor de rosa, e foi preparar a mamadeira. Quando a mamadeira ficou pronta ele voltou e entregou para ela, depois foi tomar seu próprio banho.

Minutos depois, Emmett voltou já de banho tomado, pronto para sair. Terminou de vestir a filha, e, no final, estava com a maior cara de pai coruja. Um sorriso maroto se formou no canto de seus lábios. Sua gotinha de amor estava usando uniforme escolar pela primeira vez. Ele não resistiu em fotografá-la. Ela estava usando camiseta branca, com o brasão da escolinha, com detalhes em vermelho nas mangas e na gola. Um short-saia vermelho, nos pezinhos meias brancas e um tênis all star, também vermelho. Depois de pentear os cabelos dela, ele colocou um arquinho combinando com a cor do uniforme, com um laço lateral.

[...]

Pouco tempo depois, Emmett estacionava o carro em frente à escolinha. Ele saiu do veículo e retirou Julia da cadeirinha agarrada ao seu inseparável pônei de pelúcia, Carinho. Ele recolheu a mochila cor de rosa – com temas da Moranguinho – e manteve pendurada no antebraço, deixando a mão livre para segurar a lancheira.

Com olhinhos arregalados, Julia observava as crianças que chegavam com seus pais e se despediam deles antes de cruzar os portões de ferro, alto. Todas elas já conheciam sua classe e a professora, dessa forma, algumas delas já entravam sozinhas.

Mas para Julia, no entanto, tudo aquilo era novidade. Dias antes ela sequer tinha conhecimento do assunto. Julia também nunca tinha tido uma amiguinha de sua idade, e os maus tratos que sofrera fazia com que ficasse aterrorizada toda vez que estava em local desconhecido, na presença de estranhos.

Insegura, ela se assustou quando Emmett fechou a porta do carro. Seu corpinho tremeu, e, no minuto seguinte estava agarrada ao pescoço do pai.

Emmett percebeu que ela havia se assustado, mas, ele sabia; o medo não era apenas pelo barulho que a porta fez ao fechar, e sim pela forma como o passado havia marcado sua vida. Medo. Insegurança. Pessoas estranhas, e o desconhecido. O desconhecido que, para ela, soava como um monstro.

Ele encostou o braço, que segurava os pertences, nas costas dela e massageou devagar, tentando lhe transmitir segurança. Lhe deu um beijinho no pescoço, seguido de um cheirinho.

Notando o medo que a filha estava, Emmett teve dúvidas de que não estivesse fazendo a coisa certa. Assim como Julia, ele estava inseguro agora.

Caminhando devagar, ele alcançou os portões. Sabia que não seria fácil o que estava prestes a fazer, entretanto, sabia que era algo pelo qual teria que passar mais cedo ou mais tarde.

A moça ruiva que recebia as crianças instruiu Emmett para onde ele deveria ir. Sem pressa, ele caminhou por um corredor ladeado de cercas coloridas, de madeira. De um lado podia ver o playground ao ar livre, do outro, um playground coberto.

Como já conhecia as instalações e, também, conhecia a moça que seria a professora de Julia, soube exatamente para onde deveria ir.

Ele parou em frente à porta da classe. A professora, uma jovem de pele clara e cabelos negros, falava com as crianças, seu tom de voz era suave. Enquanto falava ela ia passando por cada um deles ao mesmo tempo em que eles se acomodavam em seus lugares.

Na classe havia quatro mesinhas coloridas com quatro cadeiras cada. Armários abertos encostados à parede, nos fundos da sala, guardavam as lancheiras. Muitos desenhos pintados na parede. Um mural com desenhos feitos pelas crianças, em um canto da sala. Uma lousa branca. Estantes coloridas repleta de livros infantis. Uma caixa de brinquedos no fundo da sala. O piso era forrado com tapetinhos coloridos, que Emmett imaginou ser macio igual o que comprara para pôr no quarto temporário de Julia. Uma grande TV de plasma, em um suporte. Um sofá amarelo e muitas almofadas no chão.

Todas as crianças estavam falando ao mesmo tempo. Pareciam gostar de estar ali. Pelo menos foi o que ele imaginou. Levou alguns segundos até a professora notar a presença de Emmett à porta.

– Crianças, por favor, todas sentadas em seus lugares – ela pediu mantendo o mesmo tom de voz suave.

As crianças sentaram-se e, pouco a pouco, a sala foi ficando em silêncio. Olhinhos curiosos viraram na direção da porta onde Emmett estava parado com Julia no colo. Talvez estivessem se perguntando o que aquele homem tão grande estava fazendo parado ali. Ou que talvez, apenas talvez, fosse algum super-herói.

Emmett pareceu meio perdido, e então a professora continuou.

– Crianças hoje nós estaremos recebendo uma nova coleguinha. O nome dela é Julia – a professora olhou para Emmett. – E esse homem grandão – as crianças deram risinhos –, é o papai dela. Cada um pode pegar um desenho desses que está no centro da mesinha e colorir. Eu vou conversar com eles um pouquinho e já volto a ficar com vocês. Todos irão ficar quietinhos?

– Sim, senhorita Megan – todos repetiram em coro.

Megan sorriu, satisfeita. Virou de costas para eles e caminhou até a porta. Ela sorriu amistosamente para Emmett ao afagar as costas de Julia.

– Olá Julia – murmurou Megan, inclinando a cabeça para ver o rostinho de Julia, que estava escondido no vão do pescoço do pai.

– Não vai ser fácil – anunciou Emmett, preocupado.

– Está tudo bem – disse Megan. – Ela vai ficar bem. Vai dar tudo certo. Aos poucos ela vai se acostumando. Pode ser que leve um tempo, mas ela vai se adaptar. Não precisa ficar preocupado, McCarty. Você está nervoso e isso também está se refletindo nela. Se ela sentir que você está inseguro, vai ficar também. Mais do que já está.

Emmett assentiu. Megan pegou a lancheira e a mochila de Julia que estavam com ele e as levou para guardar junto as das outras crianças.

Enquanto isso, Emmett se abaixou para pôr Julia de pé no chão, mas ela, no entanto, não largou de seu pescoço.

– Olha filha – murmurou, afastando, devagar, os bracinhos dela –, tem outras crianças aqui. Você não quer ir até lá brincar com elas?!

Julia negou com um maneio de cabeça. Seus olhinhos assustados.

Megan voltou e se ajoelhou ao lado de Emmett.

– Não precisa ficar assustada, Julinha. Aqui é bem legal, você vai gostar. A partir de hoje serei sua professora. O meu nome é Megan – ela sorriu, e apontou o dedo na direção das outras crianças –, e eles serão seus coleguinhas. Aqui você vai poder brincar, colorir e aprender bastante coisas novas. Você vai gostar – disse ela, tocando a pontinha do nariz de Julia com o dedo.

Emmett não parava de observar a filha, cada expressão de seu rostinho o preocupava, à medida que absorvia as palavras ditas por Megan.

– Diga “oi” para a senhorita Megan, gotinha – ele sugeriu. Agarrada ao pônei de pelúcia, Julia mal piscou encarrando o pai, como que pedindo ajuda.

– Quelo í pla casa, papai – ela pediu, com o beicinho tremendo. Os olhinhos cristalinos de lágrimas.

– Agora não, gotinha... – começou Emmett, e logo a professora o ajudou.

– Você gosta de pôneis, Julinha?

Julia maneou a cabeça afirmativamente.

– Gotinha, você pode falar com a senhorita Megan.

– Quelo... í... pla... casa... – murmurou aos soluços. – Julinha qué a vovó.

– Vovó não está na casa dela agora, gotinha. Vovó foi trabalhar.

Julia soluçou, e se engasgou com o próprio choro.

Mais uma vez Megan intercedeu.

– Qual o nome do seu amiguinho? – ela perguntou.

Julia olhou para o pai. Emmett maneou a cabeça afirmativamente, seguido de uma piscadela.

– Calinho – Julia sussurrou quase inaudível, encarando o pônei que segurava.

– Carinho?! – repetiu Megan. – E foi você quem escolheu esse nome tão bonito, e significativo, para ele?

Julia balançou a cabeça afirmativamente.

– Pode falar com ela, gotinha – insistiu Emmett, Julia se encostou às pernas dele buscando uma zona de conforto.

– Eu tenho aqui um livro ilustrado que fala sobre pôneis. Você gostaria de ouvir a historinha, Julia?

– Não sei... – murmurou ela, ainda sem olhar para Megan.

– Tem uns branquinhos e outros cor de rosa igual ao seu, sabia?! – incentivou Megan. – Eu vou mostrá-los para você – ela ficou de pé e foi até a estante de livros, onde pegou um livro de capa lilás. – Vem cá Julinha – convidou, sentando-se no sofá amarelo.

As outras crianças conversavam entre si, enquanto coloriam seus desenhos.

– Vai lá filha – Emmett incentivou, encostando a mão nas costas de Julia. Ele ficou de pé novamente, institivamente Julia estendeu a mãozinha para ele.

– Papai – disse ela, com imediato desespero no tom de sua voz, achando que o pai iria se afastar.

– Pode acompanhá-la, McCarty – instruiu Megan.

Emmett atravessou a classe segurando na mãozinha de Julia, que não desviava os olhinhos dele. Era algo como se temesse perdê-lo de vista.

– Põe ela sentadinha aqui ao meu lado, por favor – Megan pediu.

Com cuidado, Emmett fez o que a professora pediu. Mas Julia em momento algum deixou de olhá-lo.

Megan abriu o livro e mostrou na primeira pagina a gravura para ela, tentando atrair sua atenção. Emmett continuava de pé, pertinho do sofá, se sentindo um tanto sem jeito. Como se fosse um peixe for d’água.

Pela primeira vez, Julia desviou a atenção do pai. Seus olhinhos visualizaram a gravura no livro e então, somente então, ela pareceu relaxar um pouco.

– Bonitinho... – ela sussurrou.

Emmett sinalizou de forma que Megan entendesse que ele iria se afastar. Ela acenou com a cabeça positivamente.

– Você gostou desse? – Megan perguntou para Julia, mostrando outra gravura.

– Gosti – mais uma vez Julia sussurrou. Em seguida virou o rostinho, buscando a presença do pai. Quando Emmett notou que ela o procurava, fingiu estar vendo um dos desenhos na parede.

Megan continuou buscando a atenção de Julia com gravuras de pôneis e uma leitura quase teatral. A leitura seguiu por alguns poucos minutos. Vez ou outra Julia buscava a presença de Emmett, que sempre fingia estar vendo algo.

Algumas crianças o olhavam com curiosidade sem entender o porquê de ele estar andando de um lado para o outro. Levou cerca de dez minutos para que conseguisse se retirar da classe. Já esperando pela reação da filha, ele não foi embora, permaneceu parado do outro lado da porta.

Algumas crianças começaram a se movimentar pela classe em busca de objetos pra sua distração. Foi nesse momento que Julia percebeu que Emmett não estava mais ali.

O par de olhinhos azuis, assustados, varreu a classe em busca da presença do pai. O medo se instalando tão rápido que ela mal conseguia respirar.

– Papai... – Julia choramingou se arrastando no sofá até aprumar os pezinhos no chão.

– Está tudo bem, meu anjo – Megan tentou tranquiliza-la, segurando sua mãozinha.

– Papai – ela repetiu sem ao menos olhar para Megan. – Eu quelo o papai – pediu desconsolada, forçando a mãozinha até que Megan a liberou. Correndo, Julia foi até a porta da classe.

O choro foi inevitável e chegou carregado de soluços, dificultando a respiração. Julia ficou nas pontinhas dos pés, tentando abrir a porta. Seu choro podia ser notado do corredor com facilidade.

– Pa... pai. Papai foi embola... – soluçou as palavras, virando o rostinho na direção da senhorita Megan.

Do outro lado da porta, Emmett ouvia tudo, porém, esperando que ela aceitasse sua ausência e parasse de chorar.

– Ele vai voltar, Julinha – Megan explicou, tentando pegá-la no colo, mas Julia recuou.

Tremendo da cabeça aos pés, Julia se encolheu no cantinho da parede, atrás da porta. Sentou no chão agarrada ao pônei de pelúcia, chorando de tal maneira que chegava a cortar o coração.

Algumas das crianças se preocuparam, e começaram a sair de seus lugares. Megan pediu que sentassem novamente. Outras começaram a chorar também.

– Quelo... pa... pai. Papai deixô Julinha... sozinha. Foi embola... – a cada palavra dita, ela se engasgava com o próprio choro.

Megan se ajoelhou ao lado dela, com o coração apertado por vê-la tão amedrontada. Com cuidado se aproximou um pouco mais, lhe afagando as perninhas.

– Está tudo bem anjinho. Não precisa ficar com medo. Seu papai vai voltar. Eu estou aqui com você agora. Eu vou cuidar de você.

– Papai – ela tornou a murmurar. Em meio ao choro e engasgos Julia começou a tossir.

Toda vez que Megan tentava pegá-la no colo Julia se encolhia ainda mais. Parecia um bichinho assustado, preso em uma jaula.

Sem que esperasse por aquilo, Emmett se viu com lágrimas nos olhos. E isso bastou para ele. Abriu a porta devagar temendo que Julia estivesse por trás dela. Varreu a classe com o olhar, ouvindo o chorinho cheio de engasgos e tosse.

Somente quando olhou atrás da porta, onde viu Megan de joelhos, foi que encontrou a filha. Megan continuava tentando acalmá-la sem muito sucesso.

Com tantas lágrimas no rosto, Julia nem viu quando Emmett se aproximou. Somente quando ele fez menção de pegá-la no colo foi que ela se deu conta de que seu papai estava ali.

Emmett beijou o rostinho dela, sussurrando palavras de conforto.

– O papai já está aqui – Julia fungou. – Mesmo que o papai saia sempre irá voltar. Porque eu te amo, minha gotinha.

Emmett afagou o peito dela sobre a blusinha do uniforme, tentando acalmá-la. O coraçãozinho estava tão acelerado que ele temeu um desmaio. Mais uma vez, beijou o rostinho dela sobre a enxurrada de lágrimas.

– Pulque você fez isso com Julinha, papai? – ela fungou, ainda sem conseguir respirar direito. – O colação tá muito pulano, papai.

Emmett afagou o peito dela novamente.

– Papai está aqui com você, gotinha. Não precisa mais ficar com medo. A senhorita Megan também está aqui para cuidar de você.

– Não quelo... Quelo í na casa da vovó – ela fungou novamente, dessa vez, agarrada ao pescoço de Emmett.

– Eu não sei o que fazer – confessou quase em suplica. Sentindo o imenso desejo de ter Rosalie ao seu lado para ajudá-lo, e lhe dizer o que fazer.

Era verídico, Emmett havia aprendido muitas coisas desde que se descobriu pai, mas muitas vezes se sentia perdido na árdua tarefa de educar uma criança, sozinho. Principalmente quando a criança em questão carregava muitos traumas. Marcada pela violência, descaso e abandono.

Uma criança que nutria o imenso desejo de se sentir amada pela mamãe que nunca chegou a ver pessoalmente. A mamãe da fotografia.

– Eu não sei se fiz certo... – disse Emmett, arrependido. – Minha gotinha carrega tantos traumas. Talvez minha mãe esteja certa; Julia não está preparada para esse passo. Talvez seja mesmo muito cedo para ela, levando em consideração as circunstancias em que foi criada durante três anos.

– Eu entendo McCarty. Nós, educadores, sabemos que crianças que passaram pelo o que sua filha passou necessitam de uma dose a mais de carinho e atenção. Não é, e não será fácil, mas Julia vai se adaptar. Acredite em mim, sua filha vai conseguir de adaptar. À medida que for desenvolvendo confiança nas pessoas que estão por perto vai começar a interagir e, em pouco tempo, estará brincando com as outras crianças.

Emmett afagou as costas de Julia enquanto Megan falava. Julia já não chorava mais, apenas fungava com a cabeça apoiada ao ombro do pai. O coraçãozinho estava se acalmando aos poucos e a respiração voltando ao normal.

– Eu quelo í na casa vovó... – ela murmurou em um fio de voz.

Emmett olhou de Megan para Julia e depois para a porta da classe, que estava aberta.

– Durante os primeiros meses ela vai repetir que quer ficar com a avó – comentou Megan. – É o que quase todos eles fazem. Você terá que lidar com isso sem jamais ceder. A menos, é claro, que ela esteja doentinha, ou seja extremamente necessário. Veja – Megan apontou na direção das outras crianças, que agora se ocupavam com alguns brinquedos, até mesmo as que tinham chorado vendo o desespero de Julia. – Se você desistir agora não estará protegendo-a só estará adiando o inevitável. Você quer que sua filha seja criança. Que não tenha medo de interagir. Então você está no lugar certo. Fazendo a coisa certa. Acredite McCarty.

Emmett olhou para as outras crianças, depois para Julia em seu colo. O rostinho ainda estava molhado de lágrimas. O narizinho escorrendo. Nas bochechas alguns vasos sanguíneos estavam em evidencia.

Megan foi até sua mesa onde pegou um lencinho de papel dentro de uma caixinha, em uma das gavetas.

Emmett se preparou para receber o lencinho, mas Megan foi quem limpou o narizinho de Julia. Ela estava tão cansadinha por causa da crise de choro que nem se mexeu. Toda incerteza que Emmett atingiu nos últimos minutos o deixou naquele momento.

– Olha para o papai, gotinha – ele pediu. Julia piscou os olhinhos antes de olhá-lo, porém, sem afastar a cabeça do ombro dele. – Você não que ir lá brincar com as outras crianças? Vai ser divertido filha.

– Quelo í na casa da vovó com o papai.

– Vamos fazer assim – disse Megan. – O seu papai vai sentar lá pertinho das outras crianças. Você vai também se ele for?

Julia afirmou com um maneio de cabeça. Emmett e Megan olharam um para o outro.

– Eu posso ficar com ela hoje? – perguntou Emmett, já um pouco mais tranquilo.

– Pode, sim. Vai ser bom para ela te ver por perto enquanto vai conhecendo as outras crianças, com isso gerando confiança. Mas – frisou ela –, eu vou te pedir que não interfira. Não interaja muito com ela durante o processo de adaptação. Acredito que isso será necessário por alguns dias. Iremos diminuindo a sua permanência na classe relativamente, em um processo que desenvolverá a sensação de conforto e segurança. Pode acompanha-la até a mesinha, depois você fica sentado ali – Megan indicou o sofá amarelo, o mesmo em que esteve sentada antes.

– Certo – disse Emmett, colocando Julia no chão. Ele segurou a mãozinha dela e devagar se aproximou de uma das mesinhas. Puxou uma cadeirinha colorida para logo em seguida colocar Julia sentadinha nela. A garotinha ao lado sorriu para Julia.

– Clarinha, meu anjo, você pode passar um desses desenhos para a Julinha colorir também?! – Clarinha sorriu e no minuto seguinte sua mãozinha recolhia um dos desenhos.

Emmett se afastou um pouco. Institivamente Julia olhou para ele, preocupada.

– O papai vai ficar sentado ali – ele apressou-se em explicar.

Ainda insegura Julia colocou a mãozinha dentro do baldinho de giz de cera, retirando de lá o giz cor de rosa – o seu preferido.

Com o olhar resignado, Emmett atravessou a sala e se sentou no sofá amarelo. De lá observava com atenção todas as reações da filha. Ao mesmo tempo em que sentia orgulho de vê-la ali, também sentia culpa por fazê-la sentir tanto medo e insegurança.

Megan passou a mão na cabeça de Julia enquanto ela apoiava o giz de cera na mãozinha de forma desajeitada. Depois disso foi até onde Emmett estava sentado.

– Vai ser bom para ela te ver aqui até que se sinta confiante.

– Não sei se aguento ficar sentado aqui sem fazer nada.

– Vai passar rápido, você vai ver.

De canto de olho, Emmett viu Julia ficar de pé. Ele pensou que ela fosse pedir para ficar no colo, mas, em vez disso, ela puxou uma cadeirinha para o lado da dela e chamou Emmett para sentar.

–Vem papai.

Emmett passou a mão na cabeça, enquanto um sorriso se formava no canto de seus lábios.

– Essa cadeirinha aí é muito pequena, gotinha. Não vai caber o papai aí não, filha – Emmett explicou com calma, temendo que ela chorasse novamente.

Notando o desapontamento no rostinho da filha, ele ficou de pé.

– Tudo bem se eu me sentar ali no tapetinho, ao lado da cadeira dela?

– Tudo bem – concordou Megan. – Mas a deixe interagir com as outras crianças também. Evite falar muito com ela. Eu sei que é difícil, mas evite dar muita atenção durante o tempo em que estiver aqui.

– Tudo bem – ele concordou.

No minuto seguinte, ele estava sentado ao lado da cadeirinha de Julia. Ela abraçou o pescoço dele e lhe beijou a bochecha. Ele deu dois beijinhos na barriguinha dela por sobre a blusinha do uniforme, depois a colocou, outra vez, sentada na cadeirinha.

Os minutos foram passando lentamente. As horas pareciam rastejar, mas Emmett deixou que o dia seguisse seu curso sem interferir no processo de adaptação escolar da filha.

Em dado momento Julia voltou a chorar, dessa vez, por causa da chupeta. Megan o aconselhou a dar a chupeta somente na hora da soneca. E foi exatamente nesse horário que Julia chorou novamente. Queria ir para casa.

Emmett já estava exausto. E, para falar a verdade, estava um pouco incomodado por ter que negar tantas coisas a filha em tão pouco tempo. Para ele aquilo o fazia parecer que tinha voltado a ser ranzinza. Mas sabia que tudo isso iria passar algum dia. Pelo menos era nisso que ele confiava.


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Notas finais do capítulo

Ai gente meu coração ficou apertadinho em escrever esse capítulo, mas era uma parte fundamental da historia a ser contada. Era mais um momento importante pelo qual Julinha precisava passar.

Não se esqueçam de comentar. E quem sabe recomendar.

**
Agora estamos mais perto do capítulo que vocês tanto aguardam o/

**
Postei uma Short-fic hoje, passem lá para conferir.

Quem tiver interesse segue o link:
http://fanfiction.com.br/historia/486663/Direito_De_Amar/

Beijo, beijo

Sill